Um pequeno problema

Encontro consigo mesmo.


Abriu o portão de ferro do muro baixo e entrou rapidamente, adentrando a porta lateral e ao chegar à sala de estar encontrou uma mulher magra, de seus mais de oitenta anos de idade, porém, com cabelos castanhos bem escuros.

Ambos se surpreenderam.

— Olá menino, o que você quer? — Perguntou, embora surpresa, amavelmente à idosa senhora.

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— Aonde está a minha mãe? — Recomeçou a chorar perdido, o pequeno.

— Eu não sei onde está a sua mãe! Por que acha que ela estaria aqui?

— Aqui é a minha casa! O que você… — pensou um pouco e corrigiu. — …a senhora está fazendo aqui?

— Não, menininho — negou a senhora amavelmente. — Sempre morei aqui. Você está confundindo de casa. Por que você veio parar aqui?

Ofegante por ter caminhado quase correndo até ali, inconformado ele sentou-se no sofá da sala e ainda chorando insistiu:

— O que é que está acontecendo? Está tudo tão estranho? E eu não estou ficando maluco!

A mulher sentou-se ao seu lado e o acariciando sem saber o que dizer, arriscou:

— Vamos fazer o seguinte, você vai ficar aqui e a gente vai tentar descobrir onde foi parar a sua família.

— Não! — Negou ele se levantando e seguindo pela porta da saída. — Eu vou procurar eles agora!

Saiu pela rua, deixando a mulher ainda mais abismada com o que poderia estar acontecendo.

Depois que ele sumiu pela esquina abaixo ela se arrependeu. Não poderia tê-lo deixado sair. Teria que tê-lo mantido em segurança e ligado para a polícia que o ajudaria, já que com certeza ele, tão pequeno, teria se perdido.

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Quase metade do dia, Luciana preocupada com o esposo que não aparecia, apanhou o telefone e discou alguns números.

— Alô! — Respondeu o outro lado da linha.

— Dona Maria, o Regis apareceu por aí hoje? — Perguntou-lhe aflita, Luciana.

— Não! Hoje não! Por quê?

— Eu não o vi hoje! A princípio achei que ele pudesse ter ido ao médico. Às vezes ele faz isso sem avisar. Mas o carro está na garagem. Achei que ele pudesse ter ido a pé. Mesmo assim há essa hora já deveria ter voltado.

— Ele não falou nada?!

— Nada! — Pensou um pouco e decidiu. — Está bem, dona Maria. Não se preocupe que vou ver o que faço. Depois volto a ligar.

— Tá! Se ele aparecer aqui, te aviso.

— Tchau!

— Luciana! — Emendou a mulher. — Hoje de manhã apareceu um menininho aqui em casa dizendo que era a casa dele.

— Um menininho?! Como assim?

— Um menino! Chegou e foi entrando na sala, dizendo que aqui era a casa dele e queria saber aonde estavam os pais dele.

— Como era esse menino, dona Maria?

— Pequeno! Uns dez anos de idade, cabelos loiros…

— Como ele estava vestido?

— Deixe-me ver… parece que era uma camiseta branca e um short bem curto azul!

— Azul ou verde?!

— Isso mesmo! Acho que era verde!

— Faça o seguinte, eu vou levar a Maysa na escola e depois passo aí pra senhora me explicar melhor.

— Ainda estou pensando nele, porque acho que não poderia ter deixado ir embora. Ele é muito pequeno e pode estar perdido dos pais. Pode acontecer alguma coisa de ruim com ele.

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— Eu vou passar aí!

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O tal menininho já teria caminhado por vários lugares e então, cansado, desanimado e desorientado, passava defronte a uma pastelaria na rua central da pequena cidade.

Aquele cheiro convidativo de salgados e pastéis chamara-lhe a atenção, pois ainda não teria comido nada até àquela hora e estava faminto.

Sentou-se em uma das cadeiras sob uma das mesas quadradas e ficou apreciando as pessoas que apareciam, compravam e comiam com voracidade tais guloseimas apetitosas, geralmente acompanhadas por alguma espécie de refrigerante ou suco.

Permaneceu ali debruçado sobre a mesa tentando entender o que estaria acontecendo com ele. Lembrava que na noite anterior, por volta das dez horas, teria ido dormir normalmente com o irmão mais velho em sua cama de casal, usando apenas uma calça curta feita de tergal e uma camiseta de algodão.

Continuava sem conseguir compreender como teria acordado naquela casa estranha, usando roupas de adulto. Quem porventura teria o despido durante a noite sem que ele percebesse e o vestido daquele jeito e como fora parar ali?

A resposta para aquilo tudo só poderia ser que ele estava passando por um pesadelo e loguinho iria acordar. Mas que pesadelo era esse que estava demorando demais?

Arriscou um pequeno beliscão em seu próprio braço e sentiu dores. Então ele não estaria sonhando. Estava mesmo em um mundo adiantado ao seu. Teria entrado em uma máquina do tempo e ido para o futuro? Que bobagem, estas coisas bobas só existem na mente de escritores de ficção científica.

Depois de uns quinze minutos, com a barriga roncando, porém, sabendo que apenas olhar outros comerem não saciaria sua fome, resolveu levantar e já ia se retirando, quando um senhor moreno, estatura normal, de seus trinta anos de idade, que estava no caixa o chamou:

— Ei menino, você quer um salgado?

Ele acenou que não, completando com a boca:

— Não tenho dinheiro!

— Quer um salgado?

Ele até engoliu seco, acreditando que conseguiria comer algo.

— Qual você quer? — Insistiu o homem.

Mostrou pelo vidro da estufa um apetitoso pastel de carne.

O homem do caixa fez gesto para que uma moça toda vestida em branco atendesse ao pedido do menino.

Ele apanhou aquela delícia e tornou a se sentar na mesma cadeira, comendo-o com muito apetite em questão de dois minutos, sendo observado com atenção por tal homem.

Terminado tal desjejum, pegara um guardanapo de papel e limpara os lábios lambuzados de carne moída e molho de tomate.

— Quer mais um?! — Ofereceu em leve sorriso o bom samaritano.

O pequeno apenas acenou que sim.

— Pode escolher!

— Pode ser outro pastel de carne?

A moça o serviu.

Enquanto ele se deliciava, agora moderadamente com aquela guloseima, o homem apanhou no frigobar um refrigerante de guaraná, abriu-o, adicionou um canudo plástico e levou até a mesa para o pequeno.

— Posso me sentar com você?

Sem falar, balançou os ombros como a dizer “a pastelaria é sua”.

— Onde estão os seus pais?

Ele não respondeu.

— Você não fugiu de casa. Fugiu?

Acenou que não.

— Não está perdido. Está?

Tornou a dizer não com a cabeça.

Ele estava mais perdido do que filhote que caiu do ninho enquanto a mãe estava ausente, mas não queria dizer isso a ninguém. Por medo mesmo. Achava que se outros soubessem, acabaria levando-o para a delegacia e se tinha algo que lhe causava medo era a polícia e sua cadeia.

A polícia, com certeza iria querer levá-lo a uma instituição de crianças abandonadas ou delinquentes e aí sim, ele jamais veria seus pais.

— O que está fazendo sozinho aqui no centro da cidade?

Ele continuou comendo e bebendo tal refrigerante, sem responder.

— Você não gosta muito de falar, não é?

Acabou de comer e tomar o resto do refrigerante.

— Quer mais um? — Ofereceu em sorriso o homem.

— Não! Seria gulodice!

— Não seria se ainda tiver fome! Mas acho que pelo seu tamanho dois desses são mesmo suficientes.

O menino levantou-se e ao sair alegou:

— Não tenho dinheiro agora. Depois volto pra pagar!

— Não se preocupe. Já está pago.

— Obrigado! O senhor é um homem bom!

— Estou um pouco preocupado com você. Tem certeza de que não está perdido?

— Não! — Negou indeciso. — Agora eu vou indo!