Recomeçar

Com que roupa você vai à festa?


Narrado por – Renata

Os raios de sol invadiam o quarto pelo espaço entre as duas cortinas. O escuro morto tinha sumido, as pessoas não dormiam mais.

Levantei, e liguei meu ipod. Musica é tão tranqüilizador que eu nem sinto o tempo passar. Quando dei por mim, já estava vestida, pronta para ir à escola. Eu faço questão de ir maquiada, talvez porque eu soubesse que Tiago estaria lá. Foi difícil admitir que estivesse gostando de alguém tão repugnante e insensível como Tiago, mas ele foi se tornando meu amigo e com o tempo mais que isso.

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Amor? Pode ser.

A cidade é tão pequena que ir a pé até a escola nem é considerado um exercício. Uma quadra antes já era possível ouvir os gritos e as risadas.

- “Toda criança sonha em ser feliz
Jogada no mundão do crime, um aprendiz
Cheiro de morte espalhado no ar...
Papai Noel de preto veio me buscar...”
– cantam, não posso evitar rir, a letra é horrível.

Sentei em minha carteira preferida. Tiago chegou e sentou do meu lado.

- Ae loirinha.

- Oi Tiago – foi então que meu coração disparou, eu me lembrei da pergunta e fiquei com muito medo – Então pipoca, na minha festa de quinze anos eu tenho que dançar com um parceiro no final, quer ser meu parceiro?

- Foi mal Loirinha, mas eu não gosto de dança, pede pro Cheetos – disse ele, rindo alto.

“Idiota” pensei comigo mesma.

- Você gosto dele? – perguntei.

- Ele é legal, mas é um lixo no futebol, já o viu jogando? – perguntou rindo.

- Não. Mas ele é legal mesmo e bonitinho.

- Vou falar com ele, vou ver se ele quer ficar com você – Que garoto idiota, porque eu iria querer ficar com ele? Eu só o achei bonitinho.

- Não quero ficar com ele.

- Sei.

- Aff Tiago, para de ser assim.

- Calma Loirinha, eu só estou brincando. Eu sei que você me ama – quando ele fala isso não sei se ele realmente sabe ou só está brincando, por isso eu simplesmente incentivo.

- Nossa, você é o amor da minha vida!

- Falando nisso, você viu a pandinha... – ele começou a falar dela, mas como assim ‘falando nisso’? Ela por acaso é o amor da vida dele? -... Ela tá muito gostosa né?

- Não sei, não fico olhando pra ela.

- Ela está muito linda... – isso me assustou, ele geralmente diz que as meninas são gostosas e fáceis, não que elas são bonitas ou inteligentes, ele pode estar gostando dela -... Hoje vai ao quiosque com ela, pra gente conversar.

- ok.

Certo, eu sei que a Pandinha é minha melhor amiga desde que eu voltei pra cá, mas ele tinha que gostar dela?

- Oi Re – eu olhei pro lado e estava sentado ali o Igor.

- Cheetos? O que faz aqui?

- Eu estudo aqui.

- Na minha classe?

- É.

- Quantos anos você tem?

- 14

- Nossa, pensei que você fosse mais velho.

- Falae Cheetos!

- Oi pipoquinha.

Ele está bonito hoje, usando um jeans velho, uma blusa simples e um tênis all star. Seu cabelo está num topete igual ontem, seus óculos o deixa charmoso. Seus olhos cinza são lindos. Seu piercing no canto direito do lábio o deixa sexy e ainda dá para ver uns músculos se formando embaixo da blusa.

- Você está bonita – disse ele, dando um sorriso e olhando pra frente.

Não pude evitar corar, um garoto bonito falou que eu estava bonita. Tudo bem que a maquiagem ajuda bastante, mas não deixa de ser um elogio. Na verdade, não entendi direito qual foi a dele, me elogiou e depois olhou pra frente, não me cantou nem nada, talvez eu só esteja bonita mesmo.

- Em dupla pessoal, façam a página 42! – anunciou a professora, ela adora quando formamos duplas.

Eu nem pedia mais para fazer dupla com Tiago, na escola eu sou praticamente invisível ele me cumprimenta de manhã e não fala mais comigo, nem volta comigo pra casa.

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Igor foi a salvação para mim, já que eu não tenho mais amigos. Pandinha é rica, estuda na escola particular, então eu não tenho amigos.

- Quer fazer dupla comigo? – perguntei, de cabeça baixa.

- Claro – respondeu ele, juntando nossas carteiras.

Abrimos nossas apostilas na pagina 42.

- Você está triste? – perguntou ele.

- Não, só com sono.

- Pra mim você parece triste.

- O sono me deixa triste.

- Se você diz – finalizou ele.

Sim, Igor me conhece. Eu fico meio triste quando Tiago fala de outra garota ou não fala comigo.

- Você também não parece muito alegre – eu disse, me referindo as olheiras dele.

Ele parecia meio triste sim, tinha olheiras, o rosto meio pálido.

- Porque eu estaria alegre? – ele olhou para baixo, seus dedos mexem nas paginas do caderno.

- Por estar vivo.

- Não me importo de morrer – aquela resposta pareceu meio esquisita, me assustei um pouco.

- Você é sombrio – eu disse.

Ele sorriu. Não pude evitar rir de seu jeito.

- A vida não foi muito legal comigo – ele disse.

- O que aconteceu?

- Só o que eu já sabia o que ia acontecer um dia – eu sei, ele não me falou ao certo o que aconteceu, mas se ele não quer falar...

- Quer conhecer um lugar depois da aula? – eu sei, eu prometi nunca mostrar esse lugar para ninguém, mas ele parece sofrido igual a mim.

- Que lugar é esse?

- O lugar dos sonhos – sussurrei.

É o meu estilo, falar baixo, sussurrar, brincar com as palavras.

- Depois eu que sou sombrio – ele disse, rindo.

- Bem vindo ao clube.

- Você e Tiago são iguais, ele falou isso pra mim, mas usou “inferno” em vez de clube – eu não entendi o que ele falou, mas ouvir a palavra Tiago me fez olhar pra baixo de novo.

Não sei, mas acho que ele percebeu isso.

***

- Então, para onde estamos indo? – perguntou ele, quebrando o gelo.

- Para o lugar dos sonhos – eu disse, num tom de óbvio.

- Eu sei, mas onde fica?

- Calma, já estamos chegando, fica perto da praia.

- Eu adoro a praia – logo após de dizer, ele encarou o vazio.

- Então você vai adorar.

Andando na calçada, do lado da areia, dá para ouvir o som do mar, é tão tranqüilizador que as ondas sonoras paralelas não passam de pequenas moscas.

Eu entrei na areia e ele me seguiu, passamos uma ponte velha de madeira gasta. Subimos algumas pedras e chegamos ao lugar dos sonhos. Eu até fazia meu dever aqui, de tanto que eu gosto. É uma pedra bem grande que fica de frente para o mar, onde as ondas quebram contra o abismo.

- Com que roupa você vai à festa? – perguntou ele, olhando para mim com um tom curioso misturado com sarcasmo.

- Que festa?

Igor deu uma pequena risada e apontou para longe. Segui seu dedo até ver uma placa enorme de uma loja de vestidos, onde estava escrito “com que roupa você vai à festa?”.

- Eu estava pensado em ir com um vestido longo, que valorize meu peito – ele disse, parecendo uma garota de verdade.

- Se eu tivesse uma festa para ir eu iria com um tomara que caia, super fashion – eu disse, parecendo uma patricinha – Espera um instante, eu tenho uma festa para ir!

- Qual? – perguntou ele.

- A minha, de quinze anos... Espere.

Peguei minha mochila e comecei a procurar o convite da minha festa, eu sempre carregava alguns comigo. Devo admitir que eu usei essa brecha para falar do meu aniversario, eu queria convidá-lo, mas não queria ser a primeira a tocar no assunto.

- Toma, você vai precisar dele para entrar – eu disse, entregando lhe o convite - Vou por seu nome na lista.

- Quem disse que eu vou? – ele olhou para mim, com cara de brincalhão, por um instante achei que ele estivesse falando a verdade.

- Nossa, se não quiser ir então não vai – usei um tom manhoso.

- Vou checar minha agenda.

- Hum, o homenzinho é ocupado.

- Gente importante é um problema benzinho – Igor colocou a mão embaixo do queixo, parecendo gay, um estilista de moda para dizer melhor.

Eu ri, o que mais poderia fazer?

- Vamos jogar um jogo chamado “o que você prefere?”? - Perguntei, quase pulando, me virando para ele.

Estávamos sentados na beira da pedra, com o pé pendurando.

- Como se joga?

- Eu te dou duas opções horríveis e você tem que escolher uma delas.

- Tudo bem, começa.

- Certo, você prefere pular de um prédio de cinco andares ou... Vestir preto o resto da vida?

Ele me olhou com um rosto de assustado.

- Prefiro usar preto pro resto da vida.

- Por quê?

- Porque se eu pulasse do prédio eu podia morrer e não gosto de adrenalina – explicou, olhando o vazio.

- Interessante, sua vez.

- Você prefere dormir numa casa cheia de cobra ou comer uma aranha viva?

- Você gosta de animais hein – pensei um pouco – prefiro comer a aranha.

- Por quê?

- Porque eu odeio cobra.

O tempo foi passando e nós riamos. O sol foi caindo, eu fui me sentindo melhor.

- Nossa, não é melhor voltarmos agora? O sol já está se pondo – ele pediu.

- Melhor mesmo, vamos – eu me levantei e puxei seu capuz.

- Vamos andando na areia, eu quero sentir a natureza – ele pediu sorrindo. A essa altura nossos tênis já estavam sendo carregados na mão e nossos pés eram tocados pelo mar.

- A água do mar está muito boa.

Ela parece tão deliciosa e quente, chama meu nome, as ondas sonoras que quebram na areia. Senti um arrepio e desejei estar ali dentro, minha boca se encheu de água.

- Vem, vamos entrar – disse, colocando meu material no chão.

- O que, você está louca? – incrédulo Igor segurou meu braço.

- Por quê?

- Você está de biquíni? Sua mãe sabe?

- Não e... Não – eu disse, pegando os tênis de sua mão e colocando no chão – Vamos Igor, fala que você correu demais e acabou suando, eu fico aqui com você até nossas roupas secarem.

- Não, eu já tenho que bolar uma desculpa por chegar a esse horário, imagine se falar que entrei no mar, minha mãe enlouquece.

- Então tá, fique ai, eu vou entrar.

Sai andando em direção ao mar.

- Espere! Você vai entrar de roupa?

- Porque não?

- Me espere! – gritou ele, tirando a camisa e saindo correndo.

Tenho que admitir que ele tem um ótimo abdômen definido.

A água bateu em nossos tornozelos, estava gélida e harmoniosa.

- Nossa que gelo – disse ele, estremecendo.

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Sua pele branquinha e arrepiada dava vontade de tocar, só para sentir a maciez.

- Para de ser chorão. Quem mergulhar primeiro, ganha!

- Ganha o que? – perguntou ele, me seguindo.

- Um beijo.

- Onde?

- Onde você quiser – eu disse, correndo na água.

Foi quando eu o vi me passando e mergulhando na água. Igor levantou de súbito, abriu a boca, piscou os olhos, tentando tirar a água do rosto e estremeceu inteiro.

- Você me deve um beijo.

- Eu disse que você ganha um beijo, não disse de quem.

- Eu escolho você – não sei o que pensar, ele gosta de mim?

Ele quer um beijo meu, talvez isso não signifique tanto, mas afinal, ele me achou bonita e quer um beijo meu, deve ser bom.

- Vai ganhar um beijo do Tiago.

- Que furada hein, não quero um beijo dele.

- Então sem beijo.

- Vou sai.

- Não! Fica, vamos nadar – eu implorei, segurando seu braço.

- Só fico se eu ganhar um beijo.

- Mas você vai ganhar o beijo do Tiago.

- Eu quero um beijo seu.

Seu olhar era inocente, ele queria um beijo meu, isso é bom? Foi então que eu percebi, ele quer me beijar. Eu não sei beijar, a única vez que beijei não entra como melhores momentos, na verdade eu não gosto de lembrar.

- Não vai me beijar então? – perguntou ele, se virando para partir.

- Um selinho.

- Selinho não é beijo – Igor sorriu com minha cara de medo.

- Então sem beijo.

- Então eu saio.

- Saia então.

- Tudo bem, selinho – ele deu-se por vencido e se aproximou.

Fechei os olhos e esqueci-me de tudo. Eu senti sua boca encostando-se à minha, quente e molhada, o sabor do mar estava entrando em minha boca, junto com sua língua.

- Ei! Eu disse SELINHO! – o empurrei para longe.

Ele levantou uma sobrancelha, dizendo mentalmente: Eu sei que você gostou. Sorriu malicioso. Eu tive que sorrir também, mas o que eu faria? Passava-me por idiota que não sabe beijar?

- Venha, vamos boiar – me joguei na água, deixando as ondas me levarem, o sol estava se pondo e a noite gélida começou a aparecer.

- Você não adora o mar? – perguntou ele, boiando de olhos fechados.

Não acredito que perdi a chance de beijá-lo, ele é tão delicado, eu sei que não o conheço há muito tempo para dizer sobre sua personalidade, mas pode ter certeza que ele é espontâneo.

- Adoro.

- Tcs... Tcs... Tcs – sim, ele engoliu água.

- Você é um pateta – eu disse, ajudando-o a ficar de pé.

- Você é muito abusada loirinha – ele disse, me empurrando na água.

- Assim não vale – pulei em cima dele, vingando-me.

- Você está doida?

- É melhor sairmos, nossa roupa ainda tem que secar.

- Ela seca no caminho.

- Não é tão longe – eu informei lhe, fazendo o caminho mentalmente em minha cabeça. Saímos da água, torcemos nossas roupas e começamos a andar.

- Então vamos devagar e passar em algum lugar, eu estou morrendo de fome – ele disse, passando a mão na barriga.

Senti meu estomago fazer um barulho.

- É, eu também. Vamos passar numa padaria, comemos alguma coisa.

- Nossa, tem uma padaria nesse fim de mundo!

- Ficaria surpreso de saber que aqui também tem shopping?

- Caraca! – disse ele rindo.

- Podemos ir ao cinema.

- Tem cinema também? Então não é uma cidade tão caipira assim.

- Ta brincando? Aqui é tudo de primeira qualidade – eu disse, fazendo-o rir.

- Ali é a padaria – eu apontei para um lugar.

A padaria sempre foi bem cuidada e chique, afinal todos sabem que aqui moram uma das pessoas mais ricas do estado.

- O que vão querer queridos? – perguntou uma senhora, eu sempre gostei dela.

- Eu vou querer um pão de queijo, uma Pepsi e um pedaço daquele bolo ali – disse Igor, apontando para um bolo muito delicioso.

- Eu vou querer uma esfirra de carne e um suco de laranja.

- Podem se sentar que eu já estou levando.

A comida chegou, e eu tomei quase a metade do suco de laranja em um gole só.

- Você estava mesmo com fome hein – disse ele, dando uma mordida enorme no pão de queijo.

- Olha quem fala, comeu o pão de queijo inteiro em uma mordida.

Ele abriu a Pepsi e tomou-a inteira.

- E o suco não conta, eu sou totalmente viciada em suco de laranja.

Eu não consegui acreditar quando ele já estava comendo o bolo e eu nem tinha mordido minha esfirra.

- Não come tão rápido, você vai ficar com dor de barriga.

- Tenho um estomago de ferro – ele respondeu, pegando o ultimo pedaço do bolo - Moça! Mocinha! – chamou ele a garçonete – Trás outro pedido igual a esse.

Eu tinha acabado com minha esfirra quando chegou o pedido dele. Igor percebeu que eu estava assustada.

- Se eu não almoço eu fico com muita fome depois.

- Eu percebi.

Passou um tempo, ele já tinha pedido outro bolo.

- A conta moça.

Ele colocou a não no bolso da calça e percebemos uma coisa horrível.

- Merda! – disse ele, olhando a nota de vinte reais, totalmente molhada e despedaçada.

- Oh não, oh não... Por favor não! – mas era tarde, minha mesada tinha ia por água a baixo, literalmente.

- Tudo bem, eu tenho dinheiro na mochila – ele disse, pagando.

- Eu perdi cem reais – eu ainda estava em choque, olhando a nota despedaçada – Eu... Perdi... Cem... Reais.

- Toma – disse ele me dando uma nota de cinqüenta reais – Não é cem, mas é a metade.

- Magina, não precisa.

- Sério, pegue, mão tenho nada que eu queira muito. Pode ficar.

- Eu não quero, é seu, obrigada – eu disse, recusando.

Ele foi muito gentil.

- Então vou ter que gastar esse cinqüenta reais com você. Quer ir ao cinema?

Eu sorri, ele tinha um jeito muito diferente de ser.

- Claro, mas não agora né.

- Porque não?

- Estamos molhados e são oito horas da noite.

- Você tem medo de escuro é? – perguntou ele, me provocando.

- Tenho – admiti rindo, ele também riu – Mas não é por isso que eu não quero ir.

- Então é por quê?

- Porque está frio, estamos molhados e eu não apareço em casa dês das sete da manhã.

- Eu te aqueço, vamos ficar secos e você não nasceu grudada com a sua casa.

- Melhor não, amanhã a gente vai, agora não.

- Ta bom, ta bom.

***

- Onde você estava? – eu sabia que isso iria acontecer.

- Calma mãe, eu mostrei a cidade pro Igor.

- Você entrou no mar? – perguntou ela, pegando na minha roupa molhada e no meu cabelo.

- Entrei.

- Você sabe que eu não gosto que você entre no mar quando não tem ninguém, e se você se afogasse?

- Mãe, tem salva vidas, tava cheio de gente.

- Não interessa, você não pediu minha permissão.

- Mãe, eu tenho quinze anos, sei nadar dês dos três anos e não sou mais um bebe! Que saco, para de me fazer ficar em casa.

- Então quer dizer que a culpa é minha?

- Não é sua! – eu gritei – Mas quanto mais você me prender, mais rebelde eu vou ficar – ele deu uma risada falsa de deboche.

- Vá para seu quarto, está de castigo.

- Grande merda! – eu gritei.

- Olha como você fala comigo mocinha.

- Sim madame! – gritei e bati a porta do quarto.

Eu não gostava de brigar com a minha mãe, mas não tinha jeito, eu gosto de liberdade.

Senti meu celular vibrar.

Tiaguinho diz: Vem pra quadra.

Respondi rápido: Estou de castigo.

Tiaguinho diz: Háhá, bem feito.

Moleque idiota.

Mesmo assim eu estava feliz, perdi meu bv e um menino bonito me acha bonita.

Senti meu celular vibrar de novo.

Igor diz: Furou com o cinema no shopping. Mas e cinema na minha casa?

Renata diz: Como conseguiu meu numero?

Igor diz: Tiago. Vem ou não?

Renata diz: Estou de castigo e tenho vergonha dos seus pais.

Igor diz: Também estou, minha mãe teve que voltar para Baitibá pegar as coisas que faltaram e não tenho pai. Pula a janela e tranca a porta do quarto.

Renata diz: Sinto muito pelo seu pai, estou ai daqui vinte minutos.

Eu sei, não sou de fazer isso. Mas minha mãe é uma chata. Tomei banho e pulei a janela de casa.

Foi então que eu me lembrei. Qual casa é a dele? Fui até o porteiro.

- Seu Pedro! – gritei.

- Sim?

- Sabe os novos moradores? – perguntei, olhando ele pela janela da portaria.

- Sei.

- Onde eles moram?

- Na casa 18.

- Brigada Seu Pedro!

- Boa noite.

Sai procurando a casa 18, não foi muito difícil de achar, é aquela que tem um 18 enorme na porta. Toquei a campainha.

- Oi – eu disse quando abriram a porta.

- Oi, entre. Não repare na bagunça, acabamos de chegar e a única coisa que tem na sala é o sofá e a TV.

A casa dele é linda. O sofá é vermelho e a TV é de plasma.

- Vou fazer pipoca. Você acredita que eu cheguei com fome?

- Acredito – eu disse, seguindo ele até a cozinha.

Eu vi Igor fazer pipoca, mas perdi meus olhos naquele abdômen sem camisa.

- Pega dois refrigerantes na geladeira e vamos ver o filme.

- Que filme vamos ver? – perguntei, pegando os refrigerantes.

- “Noite de amor em Las Vegas” dizem que é ótimo.

- Odeio romance.

- É comédia.

O filme até que é legal, mas depois que a pipoca e a Pepsi acabaram nós estávamos estufados.

- Preciso arrotar – disse ele.

- Então arrote – eu disse. Algumas pessoas me chamam de nojenta, outras de mal educada, mas não em importo de ouvir um arroto, sentir cheiro ruim ou qualquer outra coisa, todos fazemos isso.

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Ele arrotou.

- É só isso que consegue fazer? – perguntei, lançando um desafio.

- Ninguém me vence na competição de arroto – ele disse sério, brincando.

- Isso vai mudar agora. – eu disse.

- Primeiro os perdedores.

Eu arrotei alto e longo.

- Muito bem, esse foi bom. Agora ouça e aprenda.

Ele arrotou, mas foi fraco.

- Que mixuruca – disse rindo, ele riu também.

- Na competição de pum eu sou fera – ele se explicou.

- Quando meus gases descer a gente vê quem manda – eu disse, rindo.

- Eu nunca imaginei uma garota fazendo isso, nunca conheci pra falar a verdade.

- Não sou igual às outras garotas. Sou uma moleca.

- Eu achava que já te conhecia em dois dias, mas pelo jeito tenho muito que conhecer.

- Já já você descobre como eu sou. Acho que vou pra casa.

O filme já tinha acabado, estávamos só conversando.

- Até amanha – eu gritei da porta.

- TCHAU RE!

Abri a janela do quarto e deitei na cama. Dormi de roupa e tudo, pelo menos amanha estaria pronta, que ridículo, não faça isso Renata.

É tão bom fechar os olhos e se entregar ao cansaço.

Eu sei que Tiago é uma incógnita, mas é uma incógnita que eu amo. Agora eu só tenho que recomeçar do zero.