Capítulo 03 - A Missão e a Descoberta

Fronteira entre a Ucrânia e a Rússia – Outono de 2010

E, depois de toda essa epopeia, aqui estou eu, congelando, sozinha, nesse fim de mundo, esperando a autorização vinda de Washington, para poder completar essa missão.

A demora é angustiante e eu não quero repassar a minha vida mentalmente de novo só para ter o que fazer.

Já perdi as contas de quantas vezes limpei minhas armas, chequei o perímetro, olhei para o relógio.

Espero que Vance não tenha esquecido que estamos quase no inverno, e que os dias por aqui, nesta época do ano são curtos. Se ele demorar muito para dar a ordem, meu campo de visão será restrito às luzes que saem das janelas do segundo andar da casa onde Dmitri se encontra. E nestas circunstâncias, a ação fica difícil, bem como a certeza de que voltarei viva.

Finalmente o telefone toca. Tenho a autorização e Vance iria acompanhar toda a ação direto do MTAC. Ele me deseja um boa sorte e diz que me espera para o almoço de amanhã. Não respondi nada. Sorte é para os despreparados e eu tenho esperado por estas quatro palavras por tempo de mais.

Vance nunca irá imaginar o quão feliz fiquei quando ouvi – Está Autorizada, Agente Shepard – elas não significavam apenas o início do fim de uma operação que dura dezenove anos, elas significavam minha liberdade.

Silenciadores ajustados nas armas, granadas acomodadas na cintura, faca limpa e em local de fácil acesso para o caso de combate corpo-a-corpo, e eu estava a um passo de poder voltar para casa.

Como já conhecia todo o local, não tive dificuldades para começar e terminar o que fui fazer. Dmitri estava tão confiante de que ninguém o seguia que ficou descuidado. Levou poucos seguranças e se deixou ficar bem à vista. No total, eram 12 pessoas. Testemunhas por aqui só se forem os malditos esquilos que ficam correndo para cima e para baixo, portanto, era entrar e sair em pouco tempo.

Os soldados caíram primeiro. Posso dizer que nem viram o que o atingiram. Os seguranças pessoais foram os próximos, sem desperdício de bala por aqui. Um tiro certeiro no meio da cabeça, e por último, ele.

Dmitri não era bobo, tenho que admitir, tivemos uma boa briga. Logo que ele notou um estranho silêncio na casa, buscou sua arma e um local de onde pudesse vigiar a porta.

Acontece que a porta não era o único meio de acesso ao cômodo, e a sacada do segundo andar estava desprotegida.

Entrei no cômodo sem ser notada, mas tinha que ter um maldito cachorro com ele! Como eu não vi isso?! Bati na parte de trás da minha própria cabeça por ser tão descuidada! E o cachorro deu o alarme de minha presença.

Bem, daí em diante fica meio complicado de explicar o que aconteceu. Só sei que quando a munição acabou, partimos para o confronto corpo-a-corpo e bendita seja a regra nº 9 de Gibbs (Nunca vá a nenhum lugar sem uma faca). E com uma facada bem no meio de seu tórax, e com o notebook contendo todas as informações sobre as contas offshores, receptadores e compradores de informações da organização, bem guardado dentro da minha mochila, a missão mais longa do NCIS foi encerrada. A CIA nos deve uma.

Ao final de tudo, seguindo as ordens recebidas quando parti de Norfolk há dois anos e meio antes, não deixei nada para a perícia analisar. Como na casa segura de Dmitri havia um gerador e vários tanques de combustíveis por perto para abastecê-lo, não vi problema algum em queimar tudo.

Com a casa ainda em chamas, contatei Vance dizendo que tudo estava encerrado e que o veria no almoço do dia seguinte. Ainda disse que Abby teria muito divertimento ao analisar os dados constantes no notebook. Só não contava com a voz irritada que ouvi do outro lado da linha:

— Mas que diabos é tudo isso, Leon?

Mas que diabos digo eu! Como Vance pôde ser tão descuidado e deixar que Jethro entrasse no MTAC e visse e ouvisse tudo o que se passou?

MTAC – outono de 2010.

— Está autorizada, Agente Shepard.

E lá foi ela acabar de uma vez por todas com toda essa bagunça que virou esta operação. Tudo era para ter sido finalizado por mim em Amsterdã em 1991. Não consegui. Em 1999, Shepard e Gibbs poderiam ter feito o serviço completo, mas Decker recebeu um não do contato no país, e foi ordenado que Jenny não matasse Svetlana. Ela passaria a ser monitorada pelo NCIS para que, não só os cabeças do esquema, mas toda a organização fosse a baixo e, onze anos depois finalmente tudo estaria acabado.

As imagens de satélite mostravam em tempo real o que ela estava fazendo. Tenho que dar crédito a ela. Ela era boa, por isso chegou até onde chegou em tão pouco tempo. Dos doze homens que entraram naquela casa, nenhum ficou vivo. Não sei exatamente dizer como foi o confronto, penas sei que quarenta e cinco minutos depois de iniciado, o local estava em chamas, e pude ver a silhueta dela se afastando da área. Se eu a conhecia bem, tinha certeza que ela tinha um sorriso de triunfo estampado no rosto.

Pouco tempo depois de nota-la deixando a casa, recebo uma ligação de um número via satélite e criptografado.

— Coloque no viva voz. - ordenei ao analista técnico que me acompanhava dentro da sala.

— Está encerrada. Te encontro amanhã no almoço. E avise à Abby que ela terá muito trabalho pela frente analisando este notebook.

Acontece que, enquanto eu acompanhava a ação ao vivo, direto da fronteira Russa-Ucraniana, não percebi que a porta do MTAC fora aberta e que alguém entrara. E de todas as pessoas presentes naquela agência naquela hora da manhã, foi justamente Gibbs quem apareceu.

— Mas que diabos é isso tudo, Leon?

— Agente Gibbs, não esperava ver você tão cedo. Precisa de algo?

— Eu preciso saber o que foi aquilo tudo? E preciso saber se a silhueta que vi e a voz que escutei nesta chamada, ainda não encerrada, era da Jenny? Você me deve muitas explicações, Diretor.

Quando o restante da operação foi autorizado e com isso foi determinado a morte da Diretora para que ela pudesse encerrar a organização de Zukov, tudo o que foi conversado foi, Gibbs não pode saber de nada.

Ele foi levado a crer, por todos os envolvidos que a operação se encerrara em Paris, e tudo o que acontecera depois, já não mais o envolvia.

Contudo, Svetlana soube quem eram os agentes de campo designados para matar o seu marido e a ela. E, de uma forma que, mesmo passados três anos, ninguém do alto escalão do NCIS ou da CIA não entende, a russa conseguiu as localizações e armou um esquema onde ela conseguiria eliminar os três de uma única vez. Alguém passara à mafiosa estas informações, porém ainda não havíamos identificado o agente duplo.

E agora eu tinha um problema enorme nas mãos.

— Você não está autorizado a saber sobre o que se trata esta operação, Agente Gibbs, por favor, deixe-nos.

— Mas é claro que não! Até que você me explique o que está acontecendo por aqui, Leon, eu não vou sair.

— Gibbs, eu preciso me encontrar com os demais agentes e com o Diretor do Mossad na reunião agendada para hoje. Faça o seu trabalho de guarda e proteção do Diretor David como lhe foi ordenado.

— Ok, Senhor Diretor. A agente David irá ser sua escolta até à conferência. Os agentes McGee e DiNozzo atuarão junto com o Mossad na proteção externa.

E foi com estas palavras e um grande sorriso irônico que ele deixou o MTAC.

Agora viria a parte dois das reclamações.

— Como diabos você não ouviu Jethro entrando no MTAC, Vance? Como você não prestou atenção! Além do mais, ele não vai parar até descobrir o que foi esta operação e, pelo seu bem, está na hora de coloca-lo a par de tudo isso.

— Agente Shepard, a ligação está encerrada.

— Para você é DIRETORA SHEPARD, jamais esqueça disto, Vice-Diretor Vance.

É, estes dois se merecem.

Kiev – Ucrânia

Não dá para acreditar que aquele que se porta como o Diretor de uma Agência Federal pode ser tão descuidado.

Como ele não ouviu aquela porta de chumbo e aço ser aberta? Como ele não ouviu a aproximação de Jethro?

Céus! Já sabia que a minha volta não seria nada fácil. Explicar as coisas seria, para dizer o mínimo, difícil. Mas agora?! Agora tudo ficou extremamente complicado.

Sei exatamente o que Gibbs irá fazer. Irá mandar McGee entrar no sistema do MTAC, rastrear de onde veio a chamada. Tim sendo o gênio da informática que é, não terá dificuldade alguma em quebrar a criptografia do telefone e achar a minha localização.

E, do número de série que sei o que Abby será capaz de descobrir, eles irão chegar á identidade falsa que o NCIS criou para mim há onze anos. Disto até conseguirem acessar os arquivos e verem a quem pertence esta identidade será questão de segundos. E então, um esqueleto será tirado do armário, ou melhor da tumba.

Sei disso, porque é o que eu faria.

Parabéns, Vance! Você tem um furacão nas mãos. Mais um, já que qualquer reunião que envolva casos antigos e o Diretor do Mossad, já é uma tempestade.

Não dei conta de falava sozinha e expressava meus pensamentos em voz alta até que olhei ao redor e vi uma, muito aterrorizada, garotinha me fitando com seus grandes olhos arregalados. Espero que ela não fale inglês...

Tenho que chegar mais do que depressa à base aérea de Frankfurt e pegar esta conexão para Washington, afinal, se a bomba está para estourar, que pelo menos eu esteja perto para poder explicar, porque se depender de Vance, a única coisa que vai sair desse encontro vai ser ou ele ou Jethro dentro de um saco para cadáveres.