Venha Comigo. vol 2: Onde Está o Doutor
Estou aqui
Era um dormitório enorme, e duas crianças estavam ali, dois garotos, distintamente se comportando e agindo, onde um se encontrava cabisbaixo e calado de costas para o outro, e de frente à parede sem graça. Mas, já o outro garoto, arrumava animado e bastante feliz a uma pequena maleta, enchendo-a de roupas e alguns dos seus poucos brinquedos, quebrados e sujos. E fora do dormitório, mas observando tudo lá dentro, um homem e uma mulher conversavam baixo um ao outro.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!— Você disse que havia gostado do mais quieto. - Lembrou o homem.
— É, mas não sei... Todas as outras crianças disseram ter medo dele!
— Como poderiam? Não é sobrenatural, é?
— Não, apenas frio e impaciente, antissocial e meio esquizofrênico.
— Todos querem ir embora daqui. Vai mesmo acreditar nas outras crianças?
— 20 vezes.
— O quê?!
— Foi o que as funcionárias disseram, aquele garoto foi recusado 20 vezes.
— Coitado.
— Coitado?! Deve ser um futuro psicopata, isso sim.
— Bem, psicopata ou não, ele tem um coração. Só espero que consiga sair daqui algum dia, e ser bem sucedido talvez.
— Hum, você devia dizer isto para o nosso novo filho ali. - Apontou para o outro garoto. – Já terminou com as malas, rapazinho? Venha para a mamãe.
E assim, correu o garoto feliz com a maleta, para os braços de mãe. A felicidade estava no sorriso do garoto e de seus pais, e a tristeza na parede e no olhar do outro, que continuou cabisbaixo, e deixando lagrimas escorrerem por suas bochechas. Mas a tristeza encontrava-se em outros lugares também, como em uma solitária galeria, enorme e fria, onde o velho Felix admirava agora de olhos sedentos por atenção ao seu tão precioso objeto de imponência, o tão caótico Juiz Das Estrelas. A ferramenta que ele faria com que todos o-escutassem.
— Por que você voltou para mim? - Pergunta Félix à máquina. – O seu julgamento caiu sobre o mundo, tudo foi recolocado em algum lugar novamente. E você voltou. - Continuava encarando. – Por quê?
Obviamente, o Puritano Cego nada iria responder, era uma máquina, semi-consciente... Porém, sem qualquer capacidade de expor a opinião que fosse.
— Acho que nós pensamos igual. - Esperava respostas. – Somos iguais. Nunca irá me responder, mas sei que pode me ouvir. Bom... Na verdade não sei, mas tenho esperança. - Admirava o brilho da abóboda da peça. – E tenho algo que sei de que irá gostar.
Trazendo uma espécie de cadeira de rodas, cheia de cabos, aparelhos eletrônicos e com um tipo de capacete metálico, apresentava sorridente aquilo, para a outra coisa.
— É assim... - Sorri. – É assim que conseguirá me ouvir. Está me escutando?
Gargalha vestindo o equipamento.
***
Olhando pensativa através da janela da van e enquanto ia sentindo o leve balanço da viagem, Grace pensava em toda a história que Dodo havia lhe dito, sobre o que havia acontecido com todos os que sumiram do mundo, e sentia-se agora absolutamente culpada ou fracassada. Não estavam indo para lugar algum em especifico, estavam apenas tomando distancia de Felix e seus homens, e encostava agora a van, entre algumas arvores na beira da estrada. Lá dentro, entre os muitos equipamentos e a sua bagunça, Dodo preparava agora um café em um mine fogão, e servia à colega abatida.
— Obrigada. - Agradeceu Grace.
— Não fique triste! Não foi sua culpa.
— Não é por isso.
Dodo esperava uma resposta. A ruiva esclarece:
— É que eu fico pensando... E se ninguém nunca mais puder voltar? E o Doutor? E todos? E o mundo, como ficará?
— Problemas... Sempre ocupando a nossa mente, mas eles não merecem a nossa mente, pense em outra coisa.
— Você faz isso?
Dodo desvia o olhar à janela:
— Tenho que fazer! Estão sempre atrás de mim. Mas agradeço, foi um problema que me fez conhecer o Doutor. - As duas riam.
— Comigo também.
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— O Doutor até disse que você havia morrido.
Dodo toma um olhar desconfortável. Grace continua:
— Eu também morri um dia! Porém por incrível que pareça ainda estou no mundo real. Mas e você, como foi?
— Uma história de amor e ódio.
— São as minhas favoritas.
— Mas não as minhas, por que precisamos de ódio?
— Bem... Não precisamos. Mas somos assim, foi para isso que a nossa raça acabou evoluindo.
— Ou foi induzida. Quer saber como eu fui e voltei?
Grace confirma com a cabeça. Dodo revela:
— Vamos lá, acidente de trabalho. Mas na verdade, só o cotidiano, foi um dos seguidores do Mestre, ele me matou. Eu estava no caminho dele.
— Coincidência... Foi o Mestre que me matou também! - As duas gargalham.
— Então somos meio parecidas, só espero que não acabe como eu.
— E como você acabou?
Dodo permanecia calada, no seu olhar, apenas coisas como talvez... Decepção, arrependimento, cansaço e até temor, as suas ambições, capacidades e saudades buscavam alguém do seu passado, e nestes momentos... Ela se sentia até mesmo como o próprio Doutor.
— Continuando. - Diz Dodo. – Eu estava morta e estirada realmente, mas eu tinha alguém que nunca desistiria de mim.
— Era o Doutor?
— Não, ele era jornalista, não médico.
Grace se expressava saliente com as sobrancelhas. Dodo envermelha-se:
— Não! Pare de me olhar assim.
— Continue, é uma das primeiras histórias de amor que ouço desde que entrei na TARDIS!
— Enfim, ele voltou no tempo por mim, usou o Anel do Tempo, e... Ele me salvou.
— E o que mais? Casamento?
Dodo sorria chateada:
— Sim.
— Todos precisaremos disso um dia.
— Mas com missões mesmo assim, e brigas, e um filho.
— Filho? E as missões não acabaram? Como conseguiu tempo?!
— Parando aos poucos. - Dava uma pausa. – E depois de cinco anos de família, tendo o meu filho levado, sendo culpada, e abrindo mão do meu amor.
Grace desfazia imediatamente o seu vibrante sorriso, parecia uma história tão bonita a que Dodo havia tido, mas mesmo assim... Nada é tão perfeito o quanto parece, ou dura o quanto queríamos.
— Eu sinto muito. - Lamenta a médica, acabando de tomar o café. – Mas o seu filho...?
— Eu não sei, eu não sei onde ele está. Mas não, não foi o Ditador que o-levou, e é por isso que eu continuei nesse ramo, descobrir. - Tentava continuar. – Descobrir se quem levou ele foram os alienígenas ou... A brutalidade humana.
Grace apenas encarava o chão, sabia que o tempo todo na TARDIS elas estavam cercadas por aliens perigosos, porém, conhecia também e muito bem a maldade do seu povo.
— De onde você tira forças? - Pergunta Grace. – Para continuar, de onde vem?
— Desse café. - Levanta a xícara. – E de umas visitas num álbum de fotos, ou de encarar o espelho todo o dia de manhã.
— Mas e o seu marido, onde está?
— Com a esposa e filhos dele, tive que abrir mão disso. Ele nunca aceitou o meu trabalho, e eu tinha que continuar com isso, indo em busca de nosso filho. Ele desistiu, ele é ele, homens sempre são os primeiros a desistirem.
— É. - Encara triste a vista da janela. – Mas conhecemos um homem que é diferente.
— Sim, mas não apenas exatamente “um homem”, ele é a pessoa mais diferente, diferente de qualquer um. A pessoa mais bondosa, corajosa e amargurada, e o mais humano de todos no mundo. Porém, tendo que ser um alienígena.
— Mas ele sumiu. - Paravam um minuto caladas. – E há outra coisa errada nisso, eu estou sendo punida, mas você e Felix ainda se lembram dele.
Dodo revela um cordão envolta de seu pescoço, usando uma chave como pingente.
— O que é isso? - Pergunta Grace.
— A chave da TARDIS, acho que é ela quem está me protegendo.
— Mas a TARDIS foi embora pela alteração que o Castigador faz, como uma de suas chaves poderia ainda estar aqui? E por que eu também não tenho uma?! - Grace observa a peça.
— Porque o Doutor é muito desconfiado, espero que ele fique mais liberal algum dia! E eu também não tenho, tive que rouba-la do tumulo do Jamie, outro amigo do Doutor. Acho que a chave só não foi embora também porque mesmo com tantas alterações, alguma falha sempre deve restar, um pequeno cisco sempre consegue passar por uma peneira.
— E Felix, por que ele ainda sabe quem sou eu?
— O Puritano é semi-consciente, porém isto ainda é uma consciência, ele tem desejo de castigar, e Felix também, então com certeza modificou todo o espaço-tempo ao seu redor de acordo as suas necessidades. E já que o Doutor sumiu, ele nem deveria estar aqui, mas ele é esperto.
— E ele tem todo este poder?! O mundo, como fica? O universo aceita isso?
— Nem sempre, a natureza não consegue se reajustar completamente. E vemos todo este efeito por aí... Todos estes desastres naturais intensificados na virada do século, o aumento de doenças, e até o aquecimento global.
— Aquecimento global?! Bem, pode até ser, mas temos sim culpa em um monte de coisas. Mas se for assim... Faz todo o sentido aquilo que eu e o Doutor vimos. - Tomava olhos distantes. – Consigo me lembrar agora.
— O que vocês viram?
— Um mundo em ruínas, o Mundo da Antiga Era. Estava acabado, e aquele era o mundo do Puritano, era um mundo de descendentes de “deuses”, como se acabariam?
— Pelo Ditador. E é assim que acabará a Terra, desastres e mais desastres acontecerão, e temos um bem perto daqui.
— Do que está falando?
— Um furacão.
Grace encarava desentendida. Dodo explica:
— Sim, eu sei, na Califórnia não acontecem furacões! Mas como já discutimos, a natureza é sensível, e as leis do universo não irão digerir tudo o que o Ditador lhe oferecer.
— E não podemos fazer nada a respeito?
— Podemos, mas não significa que iremos conseguir. Mas se não revertermos isto logo, amanhã um furacão com ventos de aproximadamente 380 quilômetros por hora arrasará a sua cidade.
— Então vamos tentar trazer o Doutor! Você tem a chave da TARDIS, o Doutor me contou uma vez que... Energizando a chave por um certo fluxo de energia podemos chamar aquela nave!
— E você acha que eu nunca tentei?
Grace desmanchava completamente a sua face de esperança. Dodo finaliza:
— Estamos sós, Grace.
E antes de alguma frase indignada que a doutora poderia lançar, um estarrecedor som rouba completamente a atenção das duas, e o rádio começava a tocar sozinho, porém, não transmitindo músicas, e sim, transmitindo uma linguagem completamente desconhecida.
— Quem está falando isso? - Pergunta Dodo, se voltando para o rádio.
— Conheço essa voz! - Tentava ouvir melhor. – São os Minocrisos, eles chegaram. - Arregalou os olhos.
— E como nos acharam?!
— Não acharam, acho que isto não é para “nós”, é para o mundo inteiro. Afinal, o Juiz está escondido pelos equipamentos de Felix, não sabem onde ele pode estar exatamente.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!E aos poucos, as estranhas vozes acabavam se familiarizando, e estavam completamente legíveis às humanas.
— Aliens falando inglês, sempre é assim. - Diz Dodo.
— Tradução universal básica. - Escutavam atentas.
E em todos os rádios, televisores e telefones em geral, ouvia-se a mesma mensagem:
— Entreguem o Juiz, entreguem o Juiz. Tempo, uma hora, tempo, uma hora. Entreguem, entreguem, nossa propriedade, nossa propriedade. Contrario, tomar a força, contrario, tomar a força. - Continuava-se a repetir.
— Querem o Juiz, o que faremos? - Pergunta Grace. – Não podemos entrega-lo, eles também não possuem boas intenções.
— Mas também não podemos entrega-lo ao Felix. O que me faz perguntar, o que faremos?! As naves desses... Minocrisos já estão em orbita, e quando o tempo que deram acabar... Invadirão o planeta.
— E além de tudo, Felix está com meu amigo. Acho que talvez seja a hora de descobrirmos o que é isso então. - Grace tira de seu casaco o estranho aparelho que Mark havia lhe dado. – Você sabe o que é isso? Um amigo achou em um círculo no trigo. Tem alguns caracteres, mas não dá para entender. - Entregava a Dodo.
— É claro que dá! - Dodo observava os botões. – A tradução dos Minocrisos, deve ter sido ela, traduziu isso também!
— Então isto deve ser deles!
— Não, é melhor, aqui diz... “Sinalizador de área criminal”, e sendo assim, possivelmente são dos...
— Rinocerontes armados, a polícia do espaço.
— Você resume muito bem!
— Mas não podemos simplesmente chama-los!
— Por que não?!
— Começariam uma guerra! Eles e os Minocrisos lutando até a morte pelo Ditador, e a Terra sendo o campo de batalha. Temos que dar outro jeito, isto só pode ser a última escolha.
— Você já se aventurou muito, não é? Vejo dedicação e coragem em sua voz.
— Não estou há tanto tempo na TARDIS, mas já pascei muitas coisas com o Doutor. Aprendi coisas, e fiz coisas, já vimos um pouco de tudo. E além disso, sou médica! Tenho que ter coragem, as pessoas sempre entregam as suas vidas nas mãos de um doutor.
— Então você sabe o que faremos agora.
— Sei. - Respira. – Dar uma escolha ao inimigo.
***
E após ter recebido uma ligação minutos atrás, e já estando impaciente, tentava agora fugir do estresse, em sua sala, fumando charuto, e andando de uma lado para o outro, era isso que Felix fazia.
— Elas são sempre assim. - Soprava a fumaça, e Tim acabava tossindo. – Por que a sua namorada está demorando?
Tim responde:
— Ela não é minha namorada.
— E por que não?
Tim tentava imaginar uma resposta:
— Porque... Porque ela é muito ocupada? Ela é a senhora sem tempo.
— Que argumento mais patético. - Riu.
— Ou talvez porque... Porque a Grace não é assim.
Felix olhava desentendido. O ruivo prossegue:
— Ela é legal, divertida e... Bonita. Mas ela não sai com qualquer um, e sei que eu sou um desses.
— Então são “amigos”? Nunca entendi esta palavra.
— O senhor já teve um amigo?!
Felix encara feio. Tim conclui:
— Todo mundo precisa de um amigo.
— Amigo... É isto que irá leva-lo para o fundo do poço, é por causa de um “amigo” que você está aqui até agora, e é por causa de um amigo que você com certeza nunca mais sairá!
Encarando sem respostas, Tim desviava o olhar para a porta da sala.
— Pois o Tim está certo, Félix. - Chegava Grace. – Atrasada?
— Muito! - Soprou fumaça.
— Grace?! - Berra Tim, alegre.
— Eu! - Correspondeu, correndo para abraça-lo. – Você está bem?
Felix revirava os olhos. Tim avisa:
— Estou, mas não posso abraça-la. - Estava sentado em uma cadeira e de braços para trás. – Algemas.
— Ah sim, sempre algemas, alguém sempre tem que ter uma por aí! - Comenta Grace, sem jeito.
— Tem?!
— Esqueça isso.
— Temo que terei que interromper os dois.- interrompe Felix. - Mas preciso saber... Irá colaborar agora, doutora Holloway?
— Acho que ainda não.
Felix suspira impaciente. Grace avisa:
— Vim fazer com você o que eu sempre fazia nas horas vagas da faculdade. Conversar muito.
Após um falso sorriso, e ao invés de uma resposta, Felix apenas joga o seu charuto na lixeira. E nos computadores e televisões daquele prédio, cidade e planeta, a contagem da última hora da raça humana tomava inicio.
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