Tiberias observou solene enquanto o curandeiro real afastou-se do corpo fraco do Rei. Não havia mais febre, mas ele continuava piorando. O corpo desistira de lutar, a batalha estava perdida. As velas aromáticas disfarçavam o cheiro de morte que impregnava as pareces do recinto. Ele se aproximou com passos lentos e cuidadosos. O rei permanecia consciente, seus olhos azuis continuavam tempestuosos, tinham o poder de perfurar a alma de um homem. Tiberias vira muitos reis nascerem e morrerem em Umbria, mas esta morte seria especialmente sentida.

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— Tibe — O rei o chamou pelo seu antigo apelido. O homem começara a lhe chamar dessa forma quando ainda era uma criancinha e ele ia visita-lo no berçário. Décadas se passaram desde então e o menino se tornou homem e tomou o lugar de seu pai no trono, ainda assim, ele gostava de usar aquele apelido quando estavam longes dos olhos da corte.

O que não era o caso nesse dia, mas com a morte iminente, ninguém parecia de importar.

— Majestade. — Tiberias sentou-se na cadeira ao lado do rei e deixou que o homem agarrasse sua mão. Não devia ser assim, pensou sombrio. Ele não tinha alcançado seus cinquenta verões, mas a doença o fazia parecer ter pelo menos oitenta anos. — Eu estou aqui.

— Meu filho, Tibe. Meu filho. — O mago suspirou. — Eu sonhei com ele, sonhei que vinha me ver em meu leito.

— Seu filho não está aqui, majestade. — O mago respondeu com um suspiro e então olhou para o canto do quarto, onde uma menina permanecia escondidas nas sombras. — Sua filha, por outro lado, está aqui.

O olhar do rei procurou pela menina que rapidamente deu um passo a frente e deixou a luz da janela a iluminar.

— Gisa... Que os céus a abençoem minha menina. — A garota sorriu, mas havia uma terrível tristeza em seus olhos. — Se ao menos você... Se ao menos...

Se ao menos fosse homem e legítimo, completou a frase mentalmente. Tiberias achava terrivelmente equivocada a ideia de que apenas os homens foram feitos para o comando, ele já tinha visto rainhas reinarem em Umbria, boas rainhas, mais competentes que muitos dos homens que usaram a coroa. Se ao menos Gisa fosse um filho bastardo ou uma princesa legitima..., mas não, ela era mulher e bastarda dois fatos que seriam usados contra elas pelo conselho. Ela poderia ser uma boa rainha, mas ela dificilmente seria rainha por tempo o suficiente para provar isso.

— Não se alarme, pai.

O rei voltou a olhá-lo.

— Meu filho Tibe, você tem que achar o meu filho. — O rei apertou sua mão em desespero. — Estávamos perto...

— Ainda estamos. — Respondeu. — Designei alguém de minha confiança para formar um grupo de buscas e mais uma dezena de outros grupos estão sendo formados, alguém vai encontrar algo, eu garanto.

O rei ficou em silêncio e então olhou para a filha e depois para as outras pessoas presentes no quarto. Deixem-me a sós com Tiberias, ordenou ele e todos saíram cabisbaixos, o mago observou quieto enquanto a última pessoa passava pela porta e a fechava.

— Eu já aceitei que não irei ver o meu filho antes de partir. Essa maldita doença... — O rei começou. — Você deve me prometer, Tibe, não pare de procurá-lo. Meu filho deve sentar no trono, só assim haverá paz.

— Eu prometo, majestade.

— Porém... Eu devo me preparar para o caso de você não o encontrar. Uma crise sucessória é algo extremamente perigoso. — Ele continuou. — Os conselheiros já escolheram o regente?

— Vossa Majestade não está morta.

O rei riu, ou pelo menos foi algo próximo de um riso.

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— Eu já estou batendo nas portas da morte e já não sou um príncipe ingênuo. Sei bem que devem ter discutido o nome do regente. — Disse o rei. — Não tenho nenhum irmão vivo e nenhum sobrinho, meu pai foi filho único, assim como eu... Lorde Hastin poderia ser uma opção, ele é filho do primo do meu pai, mas até onde eu sei, não pode ter filhos e não está bem de saúde... Não, Hastin não será o escolhido... Então, diga-me Tibe, quem é o favorito.

Seu rosto ganhou um semblante sombrio quando o nome surgiu em sua mente.

— Hazik, Majestade.

— Hazik... — O rei fez uma careta. — Claro que sim, a avó dele foi a irmã mais nova do meu avô, estou certo?

— Sim.

— Como eu previ, estão escolhendo alguém com sangue real... Alguém que possa assumir o trono por definitivo. — O rei suspirou novamente e precisou de outra pausa, era como se estivesse juntando forças para continuar a falar. — Hazik é inteligente e forte o bastante para o trabalho, mas também é uma cobra gananciosa, ele não vai estar disposto a desistir do poder.

— Não importa o quão ganancioso ele seja, Majestade, o direito dele jamais será maior do que o do seu sangue. — Replicou Tiberias. — A família da falecida rainha é forte o bastante para apoiar o herdeiro deles. Hazik não terá chance.

— Não, ele não vai ter, mas eu lhe garanto que o homem não vai desistir tão fácil. — Não, ele não vai. — Alguém deve proteger o meu filho, Tibe.

— Eu o protegerei com a minha vida.

— Certo..., mas e se os céus não forem bondosos e não permitirem que o príncipe volte... Então devo nomear um novo herdeiro.

Tiberias o olhou confuso.

— E quem seria, Majestade?

O homem olhou para a porta do quarto e então o mago soube a resposta.

— Gisa... Gisa é do meu sangue e já houveram reis bastardos antes.

— Mas nunca uma rainha bastarda.

— Sempre tem uma primeira vez. — O Rei suspirou profunda e dolorosamente. — Sinto que estou colocando-a em extremo perigo, mas a verdade é que sem mim ou meu filho aqui, ela vai estar em perigo de qualquer maneira. Mande-a para a cada da mãe, o seu avô é poderoso o suficiente para mantê-la longe das mãos sujas de Hazik.

— Majestade... A menina não vai durar muito tempo, não com um alvo em suas costas.

— Eu não fui lá um pai muito bom para ela e creio que não estou sendo um agora, mas não tenho muitas opções. Ela terá uma chance se você a ajudar, mas eu espero que não chegue a tanto. Encontre meu filho antes do período da regência temporária acabar e então não terá que pensar sobre isso.

O rei voltou a apertar sua mão.

Prometa-me que vai proteger Gisa e que vai encontrar o meu menino.

Tantas promessas, pensou Tiberias. Já tinha prometidos muitas coisas a reis e rainhas que vieram antes deste, a maior parte das promessas foi capaz de cumprir e aquelas em que falhou ainda o assombravam. O rei ainda esperava por uma resposta e ele a deu:

— Eu prometo.

O semblante do homem se tornou mais suave, como se sua promessa tivesse tirado um peso de suas costas. O peso veio para as minhas.

— Chame o escrivão, uma testemunha e a minha filha. Esse será meu último decreto real. — Anunciou. — Minha filha deve partir logo depois, garanta que isso aconteça. Ela deve estar em segurança antes que todos fiquem sabendo.

— Sim, majestade.

— E então cuide de todo o resto quando eu me for.

— Eu irei.

— Prometa-me Tibe.

Outra promessa, outro peso para carregar.

— Eu prometo.