Morte e Vida de Julieta

Descobertas e Despedida


Eu já tinha cumprido meus afazeres na terra, mas não sei por que, não queria ir embora, era doido! Geralmente eu achava horrível estar na terra, mas dessa vez era diferente, talvez pelo fato de eu ter me arrependido pelo que tinha feito com a Bia e agora queria passar todo o tempo com ela, ou talvez porque era muito lindo ver a Bia e o Pedro.

—Ei, Bia — o Pedro chamou.

—Quê?

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—A gente... Sei lá, tá ficando sério?

(Esses últimos dias na terra me ensinaram que ficar sério era estar com alguém sem beijar outras pessoas, mas também sem namorar... Esses humanos têm cada coisa)

—Hm... A gente tá ficando de brincadeira — ela riu e ele olhou pra baixo — mas falando sério... Não sei... Eu não sei nem se tu gosta de mim.

Pedro fez uma pausa e falou:

—Eu gosto... Quer dizer, eu acho que gosto... É que quando a gente parou de se ver todo dia, eu fiquei com saudade.

—Own!!!

—E você?

—Eu o quê?

—Gosta de mim, Bia?

—Hm... Talvez... — ela deu um sorrisinho, olhou pro lado e depois voltou a olhar o Pedro — eu gosto sim.

—Então a gente vai ficar sério?

—Pode ser — Bia respondeu sorrindo.

Pra quem não queria nada sério, esse já era um passo bem grandinho até... Eu poderia ficar o resto da vida vendo aqueles dois. Era difícil mas eu necessitava ir embora, minha missão estava longe de ser findada e eu precisava descobrir quem eu tinha sido na vida anterior. Dei mais uma olhada nos dois, um abraço na Bia (que ela nem sentiu, mas tudo bem) e voei em direção ao céu.

Quando cheguei, lá estavam minha três amigas esperando por mim. Lola não disse nada, só pulou no meu pescoço com gritinhos estridentes.

—Eu sabia que você ia voltar atrás — Sarinha falou com seu sorriso doce de sempre.

—O Isaque disse a mesma coisa — comentei.

—Você seguiu as fases? — Bela perguntou.

—Com fidelidade — respondi.

—Isso merece comemoração! Todas para a Festa dos Serafins!!! — Lola gritou empolgada.

Guardei minhas coisas no quarto e fomos à Festa dos Serafins, dançamos, cantamos e conversamos bastante! Era bom estar bem, sem preocupações ou raiva invadindo meu coração, só a música da Festa dos Serafins e as vozes das minhas amigas (principalmente da Lola). Acabei descobrindo que o Rafa não era o tal melhor amigo da Luísa, a Sarah tinha achado melhor lançar a flecha pra outra pessoa, pelo menos por enquanto. A Lola disse que o período de sufoco da Amanda tinha acabado e que ela ficaria um bom tempo sem se apaixonar. E a Bela disse que o Alberto estava namorando com um rapaz maravilhoso. Estava tudo bem com todas nós e todas as nossas vítimas. Um sentimento de paz.

Peguei carona com a Bela, que alegou estar "cansada", pra fugir da Festa dos Serafins, deixando Lola e Sarinha por lá. Eu estava adorando passar aquele tempo com minhas amigas, mas precisava voltar à minha missão urgentemente, tinha aquela tal de "Claire" provavelmente era uma ótima pista, ela podia ser minha conhecida na vida anterior, ou eu mesma... Eram várias informações aleatórias sem conexão que só geravam mais perguntas, mas se eu tentasse juntar cada ponto, acredito que poderia chegar a algum lugar.

Quando entrei no saguão, ouvi uma musiquinha bem sinistra: se tratava de alguma coisa na televisão. Aqueles dois cupidos briguentos da outra vez estavam assistindo alguma coisa. Fiquei olhando para a TV sem entender, até que a tela congelou e eu ouvi a voz da garota:

—Oi.

—Ah, oi — respondi timidamente.

Naquele momento observei como os dois se vestiam (como eu sempre fazia): a menina usava um short de cintura alta todo desfiado e uma camiseta amarrada de lado, o menino usava um vestido longo (mas não era horroroso como os do Miguel e do Gabriel, tinha mais estilo) e os dois usavam tênis brancos iguaizinhos.

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—Você conseguiu achar sua amiga? A gente tava distraído com o xadrez e nem viu no que deu — o cupido de olhos puxados perguntou.

—Ah, sim, consegui sim. Muito obrigada.

—Por nada! Ah, eu sou Jasmim e este é o Alec, ele não mora no prédio de Fortaleza, mas vive por aqui porque é meu melhor amigo — a garota falou.

—Meu nome é Julieta, mas pode me chamar de Ju. Que nome lindo "Jasmim".

—Obrigada. O Alec diz que na vida anterior eu era florista — ela disse dando risada.

—Mas o que tem a ver? — questionei.

—É porque o nome dos anjos que não estão na primeira vida tem relação com a vida anterior deles. O Gabriel me falou sem querer uma vez — Alec afirmou, rindo.

—Isso é bem a cara dele — comentei.

—Não é? É um bobão mesmo... Você quer assistir com a gente? — Jasmim perguntou apontando para a TV com o controle.

—O que vocês tão vendo?

—É uma série sobre uma menina que patina. — Alec respondeu.

—Mas e essa cena sinistra? — perguntei franzindo a testa.

—Ah, esse é o sonho dela — a anjo de cabelo vermelho começou a falar — Ela sonha com as coisas de quando era pequenininha que ela não lembra.

—Ela sonha com o passado dela?

—Isso — os dois responderam em couro.

—Isso acontece de verdade ou só em série?

—Acontece de verdade, humanos podem sonhar com o passado deles, que tá armazenado no subconsciente, por mais que eles não lembrem, tá lá — o menino respondeu.

—Já li na internet que tem humano que sonha com vidas passadas — Jasmim observou.

Assistimos juntos à série, que era bem legal, mas mesmo assistindo, fiquei pensando no que Alec disse dos nossos nomes terem a ver com a vida antiga e naquela história do sonho com o passado "será que se eu tentar dormir, dá certo? Anjos não dormem nem comem, mas acho que se a gente quiser fazer essas coisas, a gente consegue, por mais que não nos sejam necessárias..." pensei.

Depois de vermos 3 episódios da série, Alec voltou ao seu prédio alegando ter algumas coisas pra fazer e Jasmim desceu pra ver seu humano (eles não chamavam suas vítimas de "vítima" porque achavam violento demais, então diziam "minha humana" e "meu humano", ou simplesmente "meu" e "minha", eram fofos!) então aproveitei para analisar a informação de Alec sobre os nomes dos anjos, e testar dormir a fim de ver se sonharia com o meu passado, dormir era um costume humano, provavelmente eu sonharia comigo na forma humana, era genial!

Cheguei em meu quarto, peguei meu caderno e escrevi:

— os nomes dos anjos têm relação com a vida anterior

Primeiro peguei o computador e pesquisei o significado do meu nome, mas não ajudou muito, então comecei a refletir "Julieta, Julieta... Quem mais se chama Julieta?" Lembrei-me da personagem do Shakespeare, do livro que a Bela estava lendo na primeira vez que a vi e na hora me veio um flash à mente "em um universo onde existe Deus, não existe coincidência" uma das frases que aquele serafim do campo me disse "Não pode ser coincidência!" gritei "quais são as peculiaridades da Julieta?", voltei uma página do meu caderno e li "se suicidou", uma das informações que o Isaque me deu sobre seu antigo cliente, dei um grito e disse "estamos chegando a algum lugar então... Eu posso mesmo ter sido o antigo cliente do Isaque".

Quando percebi que aquilo era tudo que eu tinha conseguido (que era mais do que eu tivera até o momento), decidi usar a segunda informação dada pelos anjinhos briguentos. Escrevi:

—sonhos contêm o passado

"Beleza, como eu vou fazer isso?" tentei me lembrar de como a Bia fazia pra dormir, ela deitava na cama em uma posição bem confortável, fechava os olhos e dormia "não parece muito difícil" pensei. Segui os passos mas não conseguia dormir, anjos não sentem sono, como eu faria aquilo? "Tudo bem, nada é impossível!" pensei com empolgação, eu podia conseguir aquilo com força do pensamento, tentei novamente, dessa vez com mais fé do que concentração, mais relaxada, a princípio eu só repetia "tudo é possível" na minha mente, mas depois comecei a pensar em várias coisas completamente aleatórias.

Estava chovendo, não aquela chuva grossa e pesada, apenas pingos inofensivos. Estavam todos lá: minha mãe, meu pai, os pais da Claire. Ah, como doía olhar aquele cemitério, que dia frio e sem vida. O túmulo da Claire estava lá com seu retrato, ela era a menina mais bela do mundo... Ou tinha sido um dia. Ah, como doía pensar que eu nunca mais a veria. Eu não podia aguentar, não podia! Minha mãe me abraçou e falou:

—Ela foi pra um lugar melhor agora, filho.

Mas eu não queria pensar que ela estava em um lugar melhor. Eu queria ir com ela, mesmo se fosse um lugar horrível, mesmo se fosse o inferno, eu queria estar com a Claire!

—Por que ela tinha que ir tão cedo, mãe? Por que ela tinha que ir? — perguntei à mamãe sem nem conseguir falar as palavras direito de tanto que chorava.

—As coisas são assim, filho.

—Queria ter morrido no lugar dela.

De repente tudo começou a tremer e eu escutei a voz do Isaque:

—Julieta, Julieta, Julieta! Ju, acorda!

Abri meus olhos e dei de cara com meu companheiro anjo, que estava me chacoalhando.

—Você tava dormindo?! — ele perguntou atônito.

—A Claire, ela.... Ela morreu! — eu disse, ainda envolvida no sonho.

—Quê? Você tava dormindo e sonhando? Ei... Claire? Eu acho que já conheci alguém com esse nome.

Quando enfim voltei a mim falei:

—Deu certo! Eu dormi e sonhei com minha vida antiga!

—Por que você fez isso? Tá, depois a gente fala sobre. Você precisa vir comigo pra terra agora.

—O que foi? É a Bia?

—É sim.

—É bom?

Ele simplesmente lançou um olhar triste, pegou minha mãe e me levou até a terra.

—Acho que nós dois precisamos estar com ela nesse momento, principalmente você.

Franzi as sobrancelhas:

—Tá... Eu acho...

A Bia estava naquela mesma praia de sempre, sentada em um banco da calçada, sozinha. Tempo depois apareceu o Pedro, segurando uma muda com flores azuis pequenas (bom garoto, não matou as flores). Ele se aproximou e sorriu para a Bia, com aquele mesmo brilho nos olhos, que ela também tinha. Ele deu um beijo nela e sentou estendendo a muda de flores:

—Pra você.

—Que fofas.

—Sabe qual o nome dessa flor?

—Não-me-esqueças. Eu via um desenho que a personagem principal era uma — Bia falou rindo.

—Boa... É pra você não esquecer de mim, Bia.

Os olhos da Bia encheram de lágrimas e ela falou choramingando:

—Para!

—Tá bom... E aí, tu quer conversar sobre aquilo logo, ou...?

Olhei pro Isaque como que indagando, ele só fez um gesto com a mão para que eu aguardasse.

—Vamo esperar o sol se pôr.

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—O que tá acontecendo? Por que ele não quer que a Bia o esqueça? — perguntei ao Isaque.

—O Pedro, ele... Vai embora.

Apenas fiz uma expressão triste e nada mais questionei, estava mais preocupada em pensar como eu iria proceder diante àquela situação.

Os dois humanos ficaram conversando sobre várias coisas: músicas, acontecimentos da vida... Agindo como se aquilo não fosse uma despedida, enquanto eu e Isaque nos mantínhamos em silêncio. Até que o Pedro olhou o celular e disse que a mãe dele viria em mais ou menos meia hora.

—É, o sol já tá se pondo mesmo... — a Bia respondeu.

—Então fala aí, Bia.

—Eu não. Fala tu.

—Da outra vez fui eu quem falei. Fala tu.

—Tá! Bom... Ah, sei lá... Nós dois sabemos que relacionamento a distância não rola.

—Não mesmo — ele concordou.

—Então é isso, ué. Vamo fazer o quê?

—E a gente vai manter contato, né?

—Claro. Não quero que tu suma da minha vida assim... E se tu vier pra Fortaleza a gente se pega.

Ele riu e deu um beijo nela. Bia observou:

— nossa isso foi muito de boa, né?

—Acho que a ficha não caiu ainda.

Pedro e Bia ficaram mais um tempo juntos, até a mãe dele ligar avisando que já estava chegando. Foi aí que o dois se abraçaram e nenhum queria soltar, esse deve ter sido um dos abraços mais longos do mundo. A Bia não aguentou e chorou, não aqueles choros histéricos e escandalosos, só lágrimas sinceras que insistiram em escorrer. O Pedro percebeu, mas não falou nada, só limpou as lágrimas, beijou os olhos da menina e ficou lá com o rosto encostado no dela. Era lindo e triste ao mesmo tempo, eu e Isaque não aguentamos e acompanhamos a Bia no choro silencioso, era tão ruim ver nossa menina sofrer.

—O que tu vai fazer agora, Ju? Sobre as flechas pro Pedro e tal. Já pensou? — Isaque me questionou.

—Acho que pensei.

—E aí?

—O que você acha do Pedro?

Meu amigo anjo da guarda riu confuso:

—Eu o acho incrível. Ele combina muito com a Bia, é um cara legal, inteligente, uma pessoa muito boa... Às vezes tenho dúvidas que ele seja um humano mesmo.

Eu ri:

—Pois é. O Pedro é muito único, eu não quero esperar outro alguém como ele aparecer, até porque eu sei que não vai.

—Então você vai continuar lançando flechas na Bia pra ele?

—Você acha que eles dois se amam?

Ele pareceu um pouco frustrado por eu ter ignorado sua pergunta, mas respondeu à minha:

—Sabe... Eles nunca disseram que se amam, mas eu consigo sentir, sei lá. Você tem um colar que dá pra saber, não?

—O cordão de diamante rosa, eu perdi o meu...

—Vai responder à minha pergunta ou não, Ju?

Respirei fundo:

—Eu vou continuar lançado flechas pra ele sim, eu não sei por que sinto que isso é o certo a se fazer.

Ele não esboçou surpresa, só ficou calado por um tempo e por fim disse:

—Puxa... Sabe... Acho que dessa vez você sabe o que tá fazendo.

—Jura?

—Eles dois não combinam assim de graça... Eu... Eu tenho fé de que isso não foi o fim — sorri grata — eu vou deixar vocês sozinhas. Até mais, Ju — ele me abraçou, como sempre, e sumiu entre as nuvens.

Pedro, assim como Isaque, foi embora e Bia pegou o skate e foi pra casa, subiu para o seu apartamento, sem deixar de chorar nem por um segundo, tinha momentos em que ria e chorava ao mesmo tempo até. Ela chegou em casa e pôs a muda na mesa retangular de jantar, sentou em uma cadeira ficou olhando fixamente pras flores "não me esqueça" ela disse em voz alta e pôs-se a chorar com o rosto escondido nas mão, eu comecei a chorar junto e acariciei seus cabelos pretos com cachinhos verdes nas pontas. Ela levantou o rosto passou a mão na cabeça olhando em minha direção com as sobrancelhas franzidas (ela tinha sentido meu toque?), vendo que "não tinha nada", Bia pôs os cotovelos na mesa relaxando a cabeça nas mãos e ficou lá olhando as flores. Sentei na cadeira ao seu lado e fiquei na mesma posição.