Depois de deixarem a praça para trás, Juliette e Sam caminham agora em direção a Loja de Especiarias.

Durante o trajeto, continuam conversando sobre os passados conturbados e o que almejam para o futuro. Juliette pretende investir no seu recomeço pessoal e profissional (voltando a trabalhar como veterinária, talvez). Sam, salvando o máximo de pessoas que puder pelo caminho, nada diferente do que já faz.

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Entre um tópico sério e outro, alguns comentários despretensiosos e flertes mantêm aceso o clima sugestivo entre eles.

É verdade que Juliette não se sente pronta para deixar um outro homem se aproximar do seu coração. Porém, mesmo sem perceber, já está permitindo que o caminho para ele se abra.

Sam tem plena consciência de que não tem muito a oferecer a ela, sabe que em breve deixará Portland para trás, como tantos lugares por onde passou ao longo dos anos caçando. Ainda assim, não consegue ficar alheio ao efeito que Juliette despertou nele. Quando tiver que ir embora, lamentará muito, então só quer que cada minuto valha a pena enquanto ignora a iminente despedida.

Por falar em despedida, eles enfim alcançam o quarteirão da loja de Rosalee e logo param em frente à porta. Uma pequena placa no vidro, pelo lado de dentro, informa que o estabelecimento ainda se encontra fechado.

— Foi muito gentileza me acompanhar até aqui, Sam. Não precisava.

Inspirado, o caçador ri um pouco e se arrisca num novo flerte:

— Não é gentileza; na verdade, é o oposto disso, chama-se interesse. Só uma desculpa para passar mais tempo com você.

Sem conseguir disfarçar que gostou do que ouviu, mas sem saber direito como agir a respeito, Juliette prefere responder com uma provocação divertida:

— Mesmo assim, um progresso. Há pouco tempo, você apontou uma arma pra mim, lembra?

Ele faz uma careta sem graça.

— Lembro. E algo me diz que você não vai me deixar esquecer disso tão cedo, vai?

Juliette esboça um sorriso mínimo, recordando a cena.

— E você pode me julgar? Foi um momento e tanto.

— É, foi sim — o caçador assente, o olhar perdido não só na lembrança, mas principalmente na mulher diante dele, que surgiu na sua vida de um jeito tão repentino e peculiar. — Inesquecível.

Algo no tom de voz de Sam, algo na maneira calorosa como encara Juliette, simplesmente algo nele faz a Hexenbiest abrir mais um pouco a porta que mantinha seu coração fechado e a salvo.

Sem pensar direito, movida por um único desejo, ela se deixa levar e dá um passo à frente. Toca o rosto do caçador com uma das mãos, fecha os olhos e beija os lábios dele suavemente apenas por um instante.

Quando ela se afasta um pouco e abre os olhos, meio incerta do que fez, ainda que não arrependida, pode vislumbrar a surpresa no semblante de Sam.

Uma surpresa muito boa, maravilhosa, que logo se transforma em puro desejo por mais dentro dele.

Então, também seguindo sua vontade mais primitiva, o caçador envolve a nuca de Juliette com as mãos, trazendo o rosto dela para junto do dele, e a beija de volta.

Dessa vez, não há nada de suave no movimento dos lábios quando eles se encontram. Há intensidade e urgência. Ardor à medida em que as línguas se buscam, se encontram, se envolvem. Um calor doce à medida em que o beijo se aprofunda mais e mais.

Com o corpo perigosamente colado ao dela, Sam parece não pretender soltá-la tão cedo. Segurando-se nele como pode, Juliette também parece não querer que ele se afaste e fica na ponta dos pés.

Mas, infelizmente e de repente, alguém abre a porta da Loja de Especiarias por dentro e exclama com choque:

— Ai, meu Deus!

E com a mesma rapidez com a qual se uniram, Sam e Juliette se afastam, se recompõem e olham para a mulher sob a soleira do lugar.

— Rosalee, oi... — Juliette murmura, o rosto em chamas em parte pelo efeito devastador do beijo e em parte pela vergonha do flagra.

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Também constrangida, torcendo para que um buraco se abra sob seus pés, a Fuchsbau lamenta sinceramente:

— Eu ouvi uma movimentação lá dos fundos, pensei que fosse algum cliente chegando antes do horário. Desculpem, eu não quis interromper...

— Tudo bem, não interrompeu nada — Juliette apressa-se em dizer, embora os três saibam muito bem que é uma mentira deslavada. — Esse é Sam Winchester. Sam, essa é Rosalee.

Os dois se cumprimentam e a dona da loja se pega sacudindo a mão do caçador mais do que o apropriado por puro nervosismo.

— Sam, claro... Monroe me falou sobre você e o seu irmão.

— Você é a famosa Rosalee? Muito prazer.

Ela finalmente percebe o que está fazendo e solta a mão dele com um sorriso constrangido.

— Bom, ele não mentiu quando disse que você era alto. Nem que tinha um cabelo bem legal.

Sam deixa uma risada sincera escapar.

— Por curiosidade, o que Monroe disse sobre o meu irmão?

Rosalee pensa por um instante antes de revelar:

— Muito esquentado, mas no fundo... um ursinho.

— Soa como o Dean pra mim.

Depois disso, ninguém diz mais nada. Não demora muito e o silêncio começa a pesar. Até que, aproveitando a menção ao Blutbad, Sam se obriga a recomeçar a conversa:

— Ãn... O Monroe está?

Aliviada pelo silêncio rompido, Rosalee não economiza em palavras ao responder:

— Não, ficou dormindo na nossa casa. Ele chegou muito tarde ontem. Bom, na verdade, muito cedo e hoje, estava quase amanhecendo. Mesmo assim, Monroe me contou por alto, entre um bocejo e outro, que vocês estão ajudando o Nick. E também o quanto se estranharam antes de chegar nessa parceria. Fico feliz que tenham colocado as diferenças de lado por um bem maior.

— É, eu também fiquei.

Dito isso, mais uma vez o silêncio se instala e se alastra de forma sepulcral. Os três evitam se olhar, mas acabam fazendo isso sem perceber.

— Então? — Sam balbucia, colocando as mãos no bolso da jaqueta.

— Então... — Juliette murmura.

Depois de olhar de um para o outro, Rosalee pisca algumas vezes, como se despertasse de um estado hipnótico, e dá um passo para trás.

— Prazer em conhecê-lo, Sam. Com licença e desculpem mais uma vez! — despede-se com pressa, já fechando a porta.

Sozinho com Juliette de novo, Sam esboça um sorriso amarelo e começa a dizer:

— Isso foi...

— Embaraçoso.

— Muito. — Ele ergue os olhos verdes na direção dela, franzindo o cenho de leve. — Acha que vamos sobreviver?

Olhando para ele assim, Juliette só consegue pensar num cachorrinho que caiu do caminhão de mudança e se perdeu.

Sam Winchester tem muitas facetas, como ela já notou, apesar de terem se conhecido há pouquíssimo tempo. Ele pode ser firme e agressivo, como se mostrou ao apontar a arma para ela e como deve ser caçando com o irmão. Pode ser misterioso ou simplesmente se abrir feito um livro. Pode ser naturalmente charmoso como um homem ou encantador como um menino. E pode beijá-la de um jeito tão intenso que suas pernas continuam trêmulas até agora...

Com uma leve nota de pânico, Juliette se dá conta que gostou de todas as nuances dele até agora. E muito do beijo. Talvez, mais do que seria sábio para alguém que não estava pronta para se envolver.

Ainda assim, e apesar de saber que em breve o caçador irá embora e esse momento será apenas uma lembrança para os dois, a Hexenbiest se ouve perguntando:

— Te vejo depois?

Ele sorri. Um sorriso que chega aos olhos, fazendo-os brilhar com uma chama inquieta enquanto os mantêm fixos nela. O coração dele acelera com a lembrança do beijo e a promessa subentendida por mais.

— Definitivamente.

[...]

Quando Sam volta ao Englewood Hotel e dispõe o café da manhã sobre a pequena mesa do quarto, Dean Winchester fica chocado. Não há outra palavra para definir o que o irmão mais velho sente ao dar uma espiada no interior da sacola.

Desconfiado por natureza, ele ergue o olhar para Sam e indaga sem rodeios:

— Qual é a pegadinha?

Sem entender o que ele quis dizer, o mais novo replica com outra pergunta:

— Como assim?

— Você trouxe a torta.

Sam olha para os lados, ainda confuso.

— Você pediu, não pediu?

Dean expira com força, resistindo ao ímpeto de devorar a torta logo, priorizando desvendar o mistério por trás da atitude surpreendente do caçula.

— Eu sempre peço, e você sempre esquece.

Sam indica a sacola entre eles e banca o engraçadinho:

— Nem sempre, pelo visto.

Perdendo a paciência, Dean insiste na questão, elevando um pouco a voz:

— Qual é a pegadinha, Sammy? Fala logo. Você sai para comprar o café, demora uma eternidade e volta trazendo tudo o que eu pedi? Inclusive a torta? Você acaba de quebrar um círculo vicioso e não quer que eu ache isso estranho?

— Qual é, Dean? Você sempre fica puto quando eu esqueço, agora que lembrei vai ficar puto também? Olha, se você não quer a torta...

Sam faz menção de pegar a sacola de volta. Dean, movido por um instinto impressionante, é mais rápido, pega a sacola e a segura junto ao corpo como se protegesse um tesouro, fechando a cara numa carranca.

— Deixe a minha torta em paz e poupe a sua vida.

O mais novo ergue as mãos em sinal de rendição e Castiel, em pé perto da cômoda, observa o embate com muito interesse.

— Você não é o meu irmão. Quem é você e o que fez com o Sammy?

— Como é?!

— Metamorfo, aposto. Cadê minha faca de prata?

Dean tenta pegá-la do cós da calça, mas tem uma dificuldade técnica devido ao receio de segurar a sacola apenas com uma mão e assim deixá-la desprotegida, à mercê das mãos enormes de Sam.

— Isso é ridículo... — O mais novo ri sem qualquer humor. Em desafio, sobe a manga da camisa. — Mas se quiser me cortar para ter certeza, vá em frente, faça as honras.

Dean não precisa ir em frente. Ainda está pensando em como fazer o teste e manter a torta a salvo ao mesmo tempo, quando Castiel decide intervir, afirmando:

— Dean, é ele. É o Sam.

— Tem certeza? — questiona, ainda em dúvida.

Depois que o anjo assente com um meneio de cabeça, ele volta a se concentrar no irmão e começa um interrogatório:

— Então por que demorou tanto? O que aconteceu com você? Tem alguma coisa diferente...

Antes que Sam possa pensar numa justifica — pois, por enquanto, prefere guardar o encontro com Juliette apenas para si —, Castiel estreita um olhar clínico na direção dele e toma a palavra:

— Tem mesmo. Acho que é o nível de serotonina. Parece muito elevado. Eu consigo sentir daqui.

— Serotonina? — Dean repete, puxando na memória onde já ouviu o termo. — Isso não é o hormônio da felicidade?

Tão logo pergunta, percebe uma oscilação no rosto de Sam, visivelmente acuado com o rumo da conversa. Arqueando as sobrancelhas e contendo um sorriso maroto, Dean pergunta quase de forma retórica:

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— Oh... Por acaso isso tem alguma coisa a ver com uma certa Wesen que conhecemos de madrugada?

A princípio, Sam pensa em negar. Porém, como sabe que será inútil e que Dean não o deixará em paz enquanto não tiver uma confirmação...

— Talvez. Ok, eu esbarrei com ela quando fui comprar o seu café da manhã. Nada de mais.

— Defina esbarrou? — o mais velho provoca.

E, desta vez, Sam opta por se esquivar:

— Você pode parar com isso, por favor? Ótimo, agora tome o seu bendito café e me atualize sobre o caso.

Sam senta na sua cama e encara Dean de um jeito que não deixa brecha para mais perguntas sobre Juliette.

Controlando um sorriso, Dean se acomoda na mesa e bebe um longo gole do café. Abre a embalagem da torta e pega uma colher descartável que veio junto com ela. De boca cheia, enfim explica:

— Eu vou levar o Cass para conhecer a vizinhança da vítima. Se o Abath estiver por perto, ele vai sentir a alma da criatura. — Ele olha para o anjo e abre um sorriso cretino. — Assim como ele sentiu a sua serotonina nas alturas, certo, Cass?

Sam fecha a cara e resmunga:

— Cala a boca. Posso ir com vocês?

— Claro. Se você não tiver nada de melhor para fazer. Como esbarrar em alguém por aí...

Sam respira fundo, fechando os olhos por um longo instante.

— Dean.

— Qual é, Sammy? Me conta alguma coisa. Quero detalhes.

De novo, o caçador mais jovem percebe que será inútil manter o assunto só para si. Então, tentando não soar como um bobo apaixonado, ele decide revelar de uma vez:

— A gente conversou um pouco e... nos beijamos. Só isso. Satisfeito?

Com um largo sorriso, Dean não se importa em constranger o irmão ao parabenizá-lo com empolgação:

— E você diz que não foi nada de mais, danadinho... Eu disse que você ia conseguir, Sammy. É como andar de bicicleta.

— Eu te odeio tanto.

Sem se intimidar, Dean vai além:

— Ela tem tentáculos?

Com um sorriso azedo e imaginando como seria divertido se a torta encontrasse o rosto do irmão acidentalmente, Sam responde com firmeza:

— Não.

Depois de suspirar com alívio, Dean volta a comer a torta e continua falando:

— Que bom. Teria sido traumático para você se ela tivesse, não?

Sam prefere não alimentar a estranha conversa. Ao invés disso, levanta da cama e caminha rumo à saída, anunciando:

— Pra mim, chega. Vou esperar os pombinhos lá fora. Não demorem.

Diante do silêncio sepulcral que recebe de volta, ele sorri, sentindo-se vingado, e deixa o quarto.

Algum tempo depois

Highway to hell soa baixinho no toca-fitas do Impala, estacionado junto ao meio-fio perto da residência da família Johnson.

Para alívio de Sam, Dean não fez mais nenhuma pergunta sobre Juliette Silverton. Mesmo assim, para não dar qualquer brecha e o assunto seja retomado de repente, o mais novo resolve romper o silêncio dentro do veículo e falar sobre o caso:

— Você acha que o Cass vai descobrir alguma coisa?

— Se tiver algum Wesen por perto, ele vai saber.

— E se não tiver? E se a criatura estiver longe daqui a uma hora dessas?

Dean pensa um pouco.

— De volta à estaca zero então. Mas tenha um pouco de fé, Sammy.

Nesse momento, um farfalhar de asas se espalha pelo Impala e Castiel surge no banco de trás. Imediatamente, os caçadores se voltam para ele, ansiosos para ouvi-lo.

O semblante um tanto frustrado do anjo de sobretudo já anuncia o que ele diz em seguida:

— Sinto muito, nenhum Wesen na vizinhança. Eu olhei bem de perto, casa por casa, como você pediu, Dean.

— Droga... — ele resmunga. — Fé não leva a lugar nenhum mesmo.

Ao ouvir isso, Castiel inclina a cabeça meio surpreso com o desabafo.

— Sem ofensa — o caçador mais velho se desculpa. — Obrigado, Cass, eu sei que você fez o possível. É só que... esse caso parece um labirinto sem saída.

Também decepcionado, Sam expira com força e resume a situação:

— De volta à estaca zero.

Dean está prestes a concordar com ele e dar partida no carro quando Castiel, olhando algo a distância pela janela lateral, murmura:

— Talvez não.

Ao seguirem o olhar compenetrado do anjo, Sam e Dean o pegam observando a casa de Jacob Johnson. Especificamente, três pessoas que saem dela nesse momento. Margareth, a viúva, e os dois filhos do casal, William e Ted.

Os três entram na Land Rover da família, as crianças carregando mochilas escolares. A casa — a única casa que Castiel não tinha checado por motivos óbvios — contornada pelos raios de sol da manhã atrás deles.

Castiel continua analisando a família com muita atenção. Até que o carro passa por eles e segue o destino.

Curioso sobre o que pode ter atraído tanto a atenção do anjo, Sam indaga:

— O que foi, Cass? O que você viu?

Voltando o olhar para os caçadores, o anjo expõe de maneira direta:

— Eu vi três almas Wesen.

Atônitos com a revelação, os irmãos precisam de alguns segundos para assimilar o que ouviram. Depois, trocam um olhar cúmplice e não perdem mais tempo.

Dean faz o motor do Impala roncar e os pneus cantarem, decidido a seguir a família, embora ainda não saiba como irá abordá-la. E Sam, por sua vez, pega o celular e procura um contato recente na agenda.

Alguns toques depois, uma voz já conhecida deles atende:

— Burkhardt.

— Nick? É Sam. Temos um problema.