O Colecionador

O morador mais antigo


A despeito dos temores de Kiba, em determinado momento da madrugada o cansaço falou mais alto e ele adormeceu. Foi um sono pesado, sem sonhos do qual se lembrar no dia seguinte, que serviu ao propósito de recuperar as forças.

A maior dificuldade foi a consciência de não estar em casa. Não estar no próprio quarto, no colchão ao qual o corpo já está acostumado e reconhece como familiar.

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Acordou ao fim da madrugada, quando os primeiros raios do sol se insinuavam por uma fresta na cortina.

Suspirou, melancólico. Ainda estava na sua nova residência, cortesia d’O Colecionador. Mas o que ele pensou? Que voltaria para casa magicamente, tão misteriosamente quanto veio parar ali? Como se a vida fosse fácil assim...

Porém aquele era Inuzuka Kiba, o hiperativo número um de Konoha. Depressão e desanimo não combinavam muito com ele. Por isso levantou-se, respirando fundo e tentando mandar o abatimento para longe.

Arrumou a cama e fiscalizou melhor o guarda-roupas.

Sim, reconhecia seu estilo em cada uma daquelas peças, todas que tocou e observou poderiam ter sido escolhidas por ele sem grande hesitação. Pegou uma bermuda e um casaco com pelos nas mangas e na borda do gorro.

Ia saindo do quarto, porém resolveu voltar e ajeitar a cama e o lençol, dando um ar mais organizado ao local.

Passou pelo banheiro antes de ir para a cozinha e preparar o próprio café da manhã.

Encontrou uma panela de arroz e ficou feliz! Sabia muito bem usar aquilo! Também encontrou temperos e condimentos dos quais reconheceu a maioria. Seu olfato shifter ajudava e muito a distinguir aromas. O próximo passo foi desvendar o armário de mantimentos e encontrar o arroz, que colocou na panela junto com algum sal e ligou na tomada (ainda se encantava com aquilo: energia ainda que nenhum poste ou sequer fio pudesse ser visto. Será que dava choque? E, okay, até Kiba se sentiu besta com tal dúvida).

Depois foi a luta para decidir o que fazer como acompanhamento. Viu peixe e carne na geladeira. Tinha uma leve noção de pratos com carne. Peixe era um assunto mais delicado, que envolvia limpar escamas e entranhas, e Kiba não se sentia maduro o bastante para isso.

No fim das contas cozinhou umas cenouras mal cortadas, umas batatas e rabanetes e preparou uma omelete. Acabou com cortes nas pontas dos dedos e duas ou três queimaduras leves. Graças a isso descobriu um kit de primeiros socorros no armário do banheiro, junto com medicação leve do dia-a-dia, como pomadas, remédio para febre, indigestão e dor de cabeça dentre outras opções. Não usou nada do que encontrou: sua cura sobrenatural agiu mais rápido.

A primeira refeição que fez por sua conta não ficou lá essas coisas, mas saciou a fome de quem sempre se alimentou bem e foi dormir sem o jantar.

Por fim colocou as louças na pia e decidiu sair de casa, para ver o que estava acontecendo.

O sol já ia alto no céu, e isso surpreendeu Kiba. Ele estava tão absorto em cozinhar que nem viu o tempo passar! Jamais se deu conta do quão trabalhoso era preparar uma refeição. Nunca deu valor a mãe ou a irmão por isso, mais preocupado em encher a barriga, como o moleque folgado que era.

— Quando voltar para casa vou mudar isso! — se prometeu, cheio de determinação — Vou agradecer a okaasa e a Hana-nee por sempre cuidarem de mim!

Avançou alguns passos, então se voltou e admirou a fileirinha de casas. A sua era a última (ou a primeira, dependendo de que direção se olhasse).

Então havia uma, que ele não fazia ideia de quem era. Na próxima morava Hinata. E Naruto na sequência. As duas últimas pertenciam a Shikamaru e a Sasuke, que ainda não conheceu.

— Bom dia, Kiba — Hinata saiu da residência e veio se encontrar com ele.

— Bom dia!

A menina hesitou um pouco, um tanto tímida. Não tinha a facilidade de Naruto em socializar, mas era tão raro surgir alguém novo ali... e, a bem da verdade; Hinata, dos atuais moradores, foi a quarta a chegar. Cada vez que recebiam alguém novo, despertava nela um instinto um tanto protetor, algo quase materno, no sentido de ajudar na adaptação e não sentir solidão.

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Aquele shifter lobo era um tanto arrogante e cheio de si, mas Hinata tinha olhos especiais. Ela conseguia ver além do óbvio, como aquele traço de medo e insegurança que ele tentava disfarçar, talvez do qual nem desse conta.

— Como passou a noite? — perguntou suave.

— Começou como uma grande merda, nem pensei que ia dormir. Mas aí eu dormi sim. Hoje apanhei um pouco do café da manhã, não sei cozinhar — coçou a nuca. Viu que a garota entreabriu os lábios, provavelmente para oferecer comida, mas cortou a oferta antes que fosse pronunciada — Não se preocupe! Não vou ficar muito tempo por aqui. Não quero ser um folgado morcegando nas costas dos outros. Me viro com o que der.

— Posso ensinar alguns pratos mais simples — ela ainda ofereceu.

Kiba pensou na oferta com mais cuidado. Uma coisa era ficar dependendo de Hinata para sobreviver em cada refeição. Outra bem diferente era aprender com ela como preparar a comida.

— Tudo bem! Obrigado! — sorriu largo — Por favor me ensine a cozinhar! — e aprender coisas não era tão ruim! Podia usar quando voltasse para Konoha. Se ficasse bom o bastante, cozinharia para a mãe e a irmã!

Reconsiderou o último pensamento. Mesmo que se não ficasse um cozinheiro de mão cheia faria várias refeições para a mãe e a irmã!

— Que tá acontecendo aqui?! — Naruto veio sorridente da direção do terceiro chalé. Hinata e Kiba estavam tão entretidos que nem viram o rapaz se aproximar.

— Bom dia, Naruto.

— Bom dia! — Kiba cumprimentou.

— Bom dia.

— A gente tava conversando sobre as refeições. Eu nunca cozinhei antes, minha mãe que cuidava disso, junto com a minha irmã. A Hinata disse que pode me dar umas aulas e eu aceitei.

— Jura? Quando eu cheguei aqui preferi aceitar os bento já prontos, né, Hinata? Esse hábito eu tenho até hoje! — era um folgado e não sentia vergonha em alardear como se fosse uma qualidade, ao invés de um hábito parasitário.

— Que cara de pau! — Kiba balançou a cabeça. Nem ele era tão sangue-suga assim. Então se lembrou de outro tópico e mudou completamente de assunto — Ne, quem mora naquela casa?

Apontou a construção que ficava entre a sua e a de Hinata.

— Essa é a casa da Ino. Ela chegou aqui antes de você, mas depois dos outros. As casas vão aparecendo em ordem de chegada — Naruto explicou — A primeira é a de Sasuke, depois do Shika, a minha, a da Hinata, a da Ino e a sua ali, por último.

De toda aquela informação, o cérebro de Kiba registrou apenas um fato que o deixou com a pulga atrás da orelha.

— Ino? Aquela Ino que eu conheci ontem? — soou confuso — Mas ela disse que não pode sair da água! Como que ela mora ali na casa?

— É simples — o garoto-Kitsune foi explicar, sem conseguir. Foi interrompido por Shikamaru.

— Yo — ele foi dizendo ainda mais perto da própria casa do que do grupinho reunido do lado de fora. O rosto levava marcas do travesseiro, sem dúvida alguma acabou de acordar e já saiu para o novo dia. Só Kiba não sabia, porém não era segredo que o rapaz preferia fazer a primeira refeição de um jeito mais ocidentalizado, preenchendo o café da manhã sobretudo com frutas. Isso o animava a ir para o pomar e colher frutas frescas. Na maioria das manhãs se acomodava nos galhos altos e comia por lá mesmo. Em outras, trazia as frutas para casa e preparava saladas vistosas e exóticas, que dividia com os vizinhos.

— Bom dia, Shikamaru.

— Bom dia!

— Yo, Shika!

Hinata, Kiba e Naruto responderam ao mesmo tempo, um tanto contagiados com a preguiça explícita nas feições do rapaz. Kiba ainda experimentou certa sensação de empolgação ao lembrar que aquele cara era mestiço com uma esfinge! Seu ego se sentia desafiado a tentar desvendar um dos enigmas mortais, apesar de saber que Shikamaru não os lançava. Talvez se insistisse um pouquinho... vai que...?

Entretanto, naquele momento, Kiba tinha outro enigma preenchendo sua mente. Dizia respeito a sereia e a casinha dela junto a sua. Ainda não entendia porque ela tinha uma residência, se não podia sair da água.

Tal pensamento o fez arregalar os olhos e abrir os lábios em um “oh” silencioso. Que besta ele era! Ino disse que sua cauda não virava pernas, o que não significa que ela não possa sair da água. Talvez um dos rapazes a tirasse do lago e a levasse para lá, todos os dias pela manhã e à noite! Assim ela podia viver no próprio lar!

Mistério resolvido.

Sentiu-se um gênio.

Ia comentar suas deduções com os outros, quando sentiu uma mudança no ar, algo leve, sutil... talvez passasse despercebido se Kiba não tivesse os sentidos ampliados por sua metade lobo. De qualquer forma, ele notou que algo estava diferente.

— Caralho! O Sasuke vem aí e a gente nem avisou o Kiba! Oe, Kiba? KIBA!

O garoto ouviu a voz de Naruto ecoando muito de leve, cada vez mais distante e longínqua, até desaparecer, como se ele se afastasse de perto de Kiba. Tudo o que restou foi aquele embotamento sobrenatural, inexplicável e maravilhoso.