Lilium

Invidebit lilium.


Ao retirar a espada da pedra sem hesitar, Artoria aceitou seu fadado destino como rei da Bretanha independente de qual fosse seu fim, seu dever viria antes mesmo de seu livre arbítrio, seria agora rei e não mais humana para que pudesse cumprir com seu papel. E como sua primeira expedição de reconhecimento, Merlin a levou em uma viagem junto de Sir Kay para conhecer cada canto de seu domínio, iniciando então seu treinamento.

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Já havia alguns dias que viajavam, visitando vilarejos, ouvindo os vassalos, a maior parte do tempo cavalgavam atravessando florestas e planícies sob o sol radiante de um reino alegre em receber o novo rei após um período problemático.

Cabia a Sir Kay controlar Merlin e sua falta de seriedade, seu caráter duvidável certamente não agradava ao cavaleiro, no entanto, Artoria não parecia incomodada nem quando o mago falava sem cessar. Ela mostrou-se atenta a todas suas instruções e entre outras conversas sem propósito algum.

Merlin esteve com a menina desde muito antes de seu nascimento. Tomou conta dela mesmo distante quando criança, sempre tão discreto que Artoria sequer o reconheceu antes da seleção na pedra. Todo o cuidado tomado foi para que ela crescesse feliz longe do castelo, e que assim, a profecia fosse cumprida. Contudo, estar realmente ao lado dela, agora como o mago da corte e conselheiro do rei, fazia-o sentir como se seus dias antes solitários fossem preenchidos pela presença contagiante de Artoria. E o que o incomodava nisso? Íncubos supostamente não desenvolviam qualquer tipo de sentimentos. Merlin achava os humanos muito sensíveis, ignorantes demais, para um mago abençoado com a clarividência como ele, tudo tendia a tornar-se entediante dado certo tempo. Entretanto, desde que iniciou aquela viagem ao lado da menina, jamais foi assombrado pelo tédio outra vez.

Ele de fato acreditava que seu gênero fosse irrelevante para governar Bretanha, mas era incapaz de ignorar que Artoria tornara-se uma menina adorável de um sorriso encantador, como um lírio inocente que se destaca no jardim pela sua cor tranquilizante e o perfume doce, assim ela se parecia aos olhos de qualquer um. Em especial aos de Merlin.

Seu treinamento rigoroso era sempre supervisionado por seu irmão Kay, mas naquele dia pela manhã, ele precisou voltar às pressas a um vilarejo que já haviam passado depois de receber a notícia de que saxões invadiram o lugar e tomaram famílias como reféns. Mesmo insistindo, ele não permitiu que Artoria o acompanhasse, preferiu deixá-la sob a tutela do mago e o fez prometer que não colocaria o rei em perigo.

— Artoria, seus ombros estão baixos outra vez. — Merlin a assistia brandir Caliburn incessantemente desde o almoço, tempo o qual ele aproveitou para ler e cochilar debaixo da árvore em que permanecia recostado, ao acordar encontrou-a ainda treinando.

O acampamento havia sido montado em uma clareira pela floresta que cruzavam. Os raios solares do final da tarde atravessavam a copa das árvores deixando que os feixes de luz iluminassem Artoria ao centro.

Merlin sempre viu nela o potencial de um verdadeiro rei, o que Uther não teve, e talvez estivesse atordoado pelo sono, mas isso nunca esteve tão claro diante de seus olhos antes de vê-la colocando tudo de si em cortar o ar com a espada de um lado para o outro naquela tarde.

— Artoria, seus ombros — repreendeu-a novamente, em um tom mais alto para chamá-la a atenção.

— Estou preocupada com o Kay-nii! — Ela abaixou a espada com certa relutância e levou uma mão ao rosto, claramente angustiada. — Ele saiu pela manhã e ainda não retornou, sinto que algo ruim aconteceu. Eu deveria tê-lo acompanhado!

— Sir Kay — Merlin corrigiu-a ao colocar-se de pé.

Ele puxou seu longo cabelo e o balançou para livrar-se da grama solta grudada a suas pontas, fez o mesmo com as roupas e caminhou até ela. Artoria mantinha o olhar perdido no limite da floresta, até onde era capaz de ver as últimas árvores antes de perdê-las em seu campo de visão. A ansiedade evidente dela incomodou a Merlin e ele resolveu tranquilizá-la da melhor maneira que pudesse.

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Tocou seus ombros tensos e desceu uma mão roçando os dedos em sua pele descoberta pelo vestido sem mangas, alcançando seu cotovelo direito, braço o qual segurava Caliburn. Merlin o levantou e sua outra mão endireitou a coluna dela, posicionando-a como deveria. Artoria virou a face para enxergá-lo atrás de si e o viu sorrir confiante, em seu sorriso não havia traços de preocupações, e ela sentiu-se tão motivada pelo mago que naquele instante seus medos apartaram-se de sua mente.

Ela sorriu de volta e foi como se próprio sol estivesse brilhando para Merlin ali.

Antes que pudesse prever seus movimentos, Artoria fincou a espada na terra e girou o corpo jogando-se em um abraço desastroso que envolveu a cintura do mago. A altura dele não permitia que ela sequer o alcançasse os ombros, então contornou-o com os braços e repousou um lado da face sobre seu abdome. Merlin mantinhas as mãos no alto, sem compreender o que ela queria com aquilo e sem qualquer outra reação.

— Obrigada!

Ele levou algumas piscadas para enfim entendê-la. Artoria era grata por ele simplesmente cumprir com sua função, e aquilo não podia pesar mais em sua consciência. Ela teria um destino do qual ele conhecia seu impiedoso fim e não moveria uma pena para mudá-lo. Merlin comprimiu os lábios, aceitando as coisas como eram e em seguida, ele descansou uma mão sobre os fios loiros da garotinha que havia feito rei. Tinha em mente o quanto ela ainda dependia dele, feito a criança que era. Talvez ainda tivesse tempo para que ela amadurecesse, não havia razão de ser duro agora.

— Não há de quê, Majestade. — Sorriu ao envolver seu rosto com as mãos, puxando-a para trocar contato visual. — Deveríamos começar o preparo da janta, Sir Kay pode chegar a qualquer instante! Aposto que você não gostaria de vê-lo irritado outra vez, como na semana passada...

— Não mesmo! — Ela soltou-se dele, com a mente tomada por lembranças do irmão de mau humor. — O que vamos comer?

— Veremos o que tenho nas mangas hoje.

Artoria o seguiu, pensando em seu olhar de instante atrás, tomado por atenção e empenho em servi-la. Ele podia ser tudo o que diziam, mulherengo, irresponsável e inconveniente, mas Merlin era sincero e estava ali por ela. Até mesmo quando lhe auxiliou a escolher novas roupas e Sir Kay protestou dizendo que impunha seus gostos pervertidos nela, Artoria não pode deixar de rir, seu humor a contagiava.

Aqueles eram os melhores dias do começo de seu reinado, e em todos que viriam, inclusive os maus dias, Merlin estaria ao seu lado, como o conselheiro e mago da corte, como um fiel amigo.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.