30 Dias, 30 Contos

Dia Cinco – A Preguiça.


É interessante como os humanos são falsos e incontundentes. Cheios de egos e virtudes que não pertencem a si próprios e desrespeitosos com quem lhe provém toda sustentação da base de sua vivência. Não há magnificência naquilo que fazem, mas o fazem assim mesmo, sem perceber que tudo a sua volta perece por falta da atenção da cadeia superior. Os mais espertos? Talvez, mas não os mais compreensíveis.

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Eu não costumava falar. Na grande maioria do tempo eu era obrigada a estar aqui, presa, durante todos os dias da semana. Eu observava tudo; eu observava todos. Sabia onde iam, como iam, com quem iam. Sabia o que estavam levando em suas mochilas, bolsas e bolsos de suas calças. Sabia o que guardavam dentro de suas cuecas e vestimentas, eu sabia o que eles mais queriam.

O Rei era o pior. Tentado por prazeres obscenos, ele incentivava os locais a participar de seus eventos, usufruindo do mais puro vinho de nossa terra e desfrutando dos corpos desnudos daqueles que escolhera, homens, mulheres, criaturas. Não havia limite, hora ou local para suas orgias. Ele havia parado aqui por acidente e sido escolhido por acidente, era de se esperar que estivesse sempre engatilhado.

A Rainha também não era das melhores. Violenta, ela preenchia o vazio de sua alma observando os campeões de nossa terra batalharem contra aqueles que se opunham à atual conjectura real, novamente, desnudos. Por sorte, ou azar daqueles que são protegidos, ela lutava ao lado de seus companheiros, mostrando-se uma eximia esgrimista e estrategista em campo de batalha, mostrando que o ataque é a melhor defesa.

Juntos os dois desfrutavam de nossas terras sem se preocupar com qualquer consequência de suas ações, afinal, com qualquer situação demasiadamente complicada, o Rei conseguiria devolver os quatro a sua antiga terra, livrando-nos de sua presença.

Quanto aos outros, sem linhagem ou afinidade sanguínea com o Rei e a Rainha, o Príncipe se mostrava um nobre Rei. Disposto a ajudar e ouvir a todos que precisavam, ele oferecia seu tempo, habilidades e conhecimentos ao reino, tornando-o um lugar prospero, com maior tolerância aqueles que provinham de fora e unificando as tribos que aqui existem há muito mais tempo do que seu curto reinado. Digno, porém, triste. Em busca de algo que não sabe o que é, não dá valor ao que possui, buscando sempre além do que tem e não se contentando com as histórias já vivida.

A princesa, a mais graciosa flor de nosso palácio, nossa sacerdotisa. Cultivava a terra com suas mãos, tornando a mais pútrida semente em uma gigantesca árvore frutífera. Abençoada pelo conhecimento, fornecia respostas a nós como nenhum outro Rei ou Rainha houvera feito. Incomparável, impenetrável, exceto por já estar rachada. Em sua era de ouro trouxe glória e feitos inesquecíveis, protegeu, lutou, vingou e enterrou, mas seu coração nunca se curará; uma ferida tão profunda que se não fosse pelo príncipe, sua glória seria irrefreável.

— Abigail?

— Oi. – Acho que dormi, a reunião já havia acabado e o príncipe me observava, próximo de mais.

— Está tudo bem? - Balancei a cabeça lentamente.

— Tudo bem.

Ele deu as costas. Ele voltaria. Caminhou até as portas onde dois guardas a protegiam, parou e voltou em minha direção.

— Abigail, você acha que estamos fazendo a coisa certa?

Sobre o que ele estava falando?

— Sabe meu rapaz, há tanta coisa em jogo neste momento, mas as suas decisões são a última coisa que me preocupa. Se viver, ou morrer, vocês cairão ou serão glorificado pelo povo que representam. Eu não ouvi a reunião.

O príncipe riu.

— Você é a melhor Abigail. Nós, eu, me estresso tanto em tentar manter a ordem aqui, que me esqueço que há poucos meses vocês mantinham a ordem sem nossa presença.

— Por que eu estou aqui? – Questionei, descendo lentamente o galho onde estava deitada.

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— Ah. Nós achamos que os animais falantes queriam ter um representante na corte. Achamos que vocês ficariam ofendidos se não aceitássemos um de vocês.¹

— E nós achamos que vocês ficariam ofendidos se não mandássemos alguém. Engraçado como o mundo é cheio de mal entendidos, não é mesmo?¹ – O príncipe riu novamente. – Falta diálogo Quentin, falta diálogo.

— Você quer uma carona até lá embaixo?

— O quê?! – Parei, voltando-me para trás com o intuito de olhar em seus olhos. – Eu, Abigail, a preguiça que viaja entre mundos, que enxerga através da alma e conhece o desconhecido, aceitar ser carregada?! Aceito meu querido. E cuidado com a bacia, ela não é tão forte quanto antigamente.

Assim a sala ficou vazia. Entre palavras bem ditas eu saí do aposento carregada pelo príncipe, agarrando-me em seus ombros.

A guerra era inevitável e é melhor ter aliados do que inimigos.