— Droga, acho que dormi demais. - Bocejando, o sonserino bronqueou mal humorado.

Infelizmente, o barulho da chuva insistia.

Afastando um pouco a cortina, o aguaceiro embasando a vidraça, transformava o mundo afora num grande borrão. E, pela comodidade, Severus permitia que aquela magia abstrata lhe atingisse o cérebro e calasse aquela voz relembrando “o quanto ele não deveria estar ali”.

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Mordendo o lábio inferior em punição, "que droga havia falado para o Harry?".

Arrependido, o frio lhe atordoando o estômago não tinha relação com a baixa temperatura, e sim, com os passos leves cada vez mais próximos, a casualidade da fala cada vez mais calma...

Sem pedir permissão, aquele abraço lhe acolhia por trás, apoiando o queixo contra seu ombro e permanecendo em silêncio, temendo irromper aquele segredo.

Engolindo a saliva com dificuldade por conta do indescritível receio, Severus recitava mentalmente o encantamento "Protego Maxima. Fianto Duri. Repello Inimigotum".

Se o lorde descobrisse...

Todavia, era justificável não ser atrapalhado na missão e...

A quem queria enganar? Não deveria estar ali.

Ao mesmo tempo, não queria fugir daquela proteção, cujos batimentos cardíacos do amante só lhe aumentavam o peso da culpa. Contudo...

Libertando um longo suspiro nasal, lamentou desgostoso:

— Logo hoje que eu pretendia aproveitar a brisa noturna para fazer uma caminhada.

— Podemos fazer outros exercícios aqui. – James sorriu sugestivo.

— Potter! – Repreendendo, o sonserino aguardava algum comentário do tipo. Aquela maldita língua sempre estava pronta para interpor. Na maioria das vezes, ideias otimistas e idiotas, ou ainda, quando teimoso, somente pelo prazer em contradizer.

Todavia...

Optando por ignorar, aquele abraço se tornava mais forte e caloroso, um destemido soldado intimidando o avançar do ar gelado.

Percebendo-o ponderar, a carinhosa voz insistiu:

— Fica...

— Não.

hoje.

"...?"

um chá”, “ um minuto”...

Costurando aqueles instantes, a geladeira daquela casa já era o referencial para compras quando Severus ia ao mercado sozinho.

Tocando a pele daquelas mãos enlaçadas e tão decididas em não deixá-lo escapar, a casualidade não sobrepunha à amargura:

— E se o Sirius estiver correto? E se... E se você não devesse ficar perto de mim?

— Uma pena, pois adoro o perigo.

Desvencilhando do abraço, não se afastou.

Naquela altura, não conseguiria.

Deveria ter desprezado o Potter quando se beijaram pela primeira vez após a aula de herbologia, ou melhor, quando seus olhos se cruzaram em ódio durante a escolha do chapéu seletor para casas rivais.

Agora? Já era tarde demais.

Por isto, pondo-se de frente, só enfiou a cabeça contra o tecido do pijama recobrindo aquele peito, memorizando o adorável cheiro refrescante de sabonete, mantendo os olhos fechados.

No íntimo, comemorava pela vida abrigada ali.

A felicidade lhe preenchendo os sentidos pelo grifinório ter retornando bem, até o fazia se esquecer os ossos do ofício.

Um dia, realmente o perderia.

Sabia disto.

Ele não voltaria para casa e... Engolindo a saliva com dificuldade, Severus fechava os olhos para as lembranças sobre como os membros da Ordem demorava a padecer nas sessões de torturas dos comensais. Como também, reconhecia que poderia ser capturado e levado para Azkaban, trancafiado numa cela onde jamais desfrutaria de resquícios daquele carinho outra vez.

Em qualquer um dos caminhos, não existia a felicidade.

Ainda assim, aquele aperto no peito era evidência que realmente gostava de James Potter.

Depois de tantos anos...

Pensando bem, talvez, só estivesse acomodado com a maneira em como ele o fazia se sentir bem. Ou melhor, certamente amava aquela boa sensação proporcionada, somente não havia encontrado outro alguém com braços tão fortes que lhe transmitisse aquilo.

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— Eu não acho que você seja tão masoquista. – James pontuou. Encontrando os confusos olhos diante a afirmação, prosseguiu. - Até porque, - Recostando as testas, a seriedade se perdia naquele fraco sorriso. - Minha vida é você, Severus.

Sem graça, o sonserino perdeu o raciocínio por um instante.

As bochechas ganhavam um vermelho involuntário, extremamente encabulado. Novamente, James lhe despertava aquelas sensações que tanto odiava. Mordendo a parte interna da bochecha esquerda para reprimir a boba alegria, não poderia deixar aquele idiota saber que havia vencido.

No entanto, a rouca voz lhe acalorava. Uma poltrona frente a lareira com uma xícara de chocolate quente e... Reparando a cara idiota que fazia nas reluzentes lentes lhe fitando, interpôs arisco:

— Foi assim que conquistou a Lily? – Erguendo a sobrancelha, desdenhava. - O mesmo argumento não funciona duas vezes, Potter.

— Não... - As extremidades dos lábios contentes pesaram em decorrência da vaga nostalgia. - Eu a conquistei enquanto difamava o melhor amigo dela para que o caminho ficasse livre somente para mim. Eu era bem... - ... - Ele me chamou de babaca muitas vezes. – Pensativo, James sorriu. Não abertamente como sempre, mas sim, em melancolia, triste. - Quantas bobagens não fizemos, Sev? Confesso que me arrependo, mas temo voltar no tempo para consertá-las e algo implique em não ter você aqui comigo, neste momento.

— Isto seria algo maravilhoso. – Severus uniu as mãos em felicitações, debochando com um miúdo sorriso descarado.

Diante a expressão indignada do velho Potter, retrocedeu alguns passos para trás.

— É isto que eu ganho por não arrancar sua roupa agora? – Fingindo indignação, deixava-se levar enquanto escondia a boca dramaticamente aberta com a destra, em passos lentos para diminuir a distância entre os dois.

Estreitando os olhos desconfiados para o cínico namorado, Severus prosseguia se afastando, terminando por esbarrar na parte traseira do sofá.

Quase tropeçava, se não tivesse sido segurado pelos braços atentos.

Mantendo-se sério, iria empurrá-lo, mas... Aquela respiração lhe acariciando o rosto era tão...

— Não ouse ou eu teria que castigá-lo por ser tão petulan... - Não conseguiu terminar a ameaça, pois teve o hálito roubado num beijo longo e intenso, o qual afugentava completamente o frio e lhe devolvia a vida.

Percebendo que o afastaria, James terminou utilizando o próprio peso para que os dois caíssem por cima do sofá.

Diante o murmúrio de protesto, rodopiou mais uma vez, conduzindo-os ao chão.

— Pare! – Pediu, empurrando-o para distanciá-lo com leves socos no ombro. Virando o rosto emburrado, as sobrancelhas apertadas em uma careta irritada, causando-lhe um engraçado bico, escondendo o quanto se divertia naquelas brincadeiras idiotas e tão costumeiras entre eles. Descrente por estarem no chão, Severus resmungou. - Por que ainda ponho dúvida quanto a sua petulância, Potter?

— Ei! – Ignorando a bronca, a guerra e toda aquela atordoante situação, James lhe segurou a mão, sentando ao seu lado. Sustentando o satisfeito sorriso idiota, quando lhe retinha a atenção, confessou repentino. - Eu te amo.

—... Não deveria.

— Não. – Corrigiu, embora a verdade permanecesse ali. Pegando o controle no sofá, ligava a televisão, explicando. - "P.S: Eu te amo" é o filme que eu escolhi pra gente assistir enquanto a chuva não passa.

— Deve ser uma porcaria, mas por falta de opção...