— Quê? Você é um cara? — exclamou Marcelo. Ele cobriu a boca, olhou para o garoto da cabeça aos pés e riu. Mas quando Nelson mostrou a palma aberta, o sorriso sumiu. Ele estalou a língua e pegou a carteira. — Porcaria. Acabei de perder 50 contos… E tava certo de que seria grana fácil. — Ele suspirou e balançou a cabeça. — Então você é Cris Prado Maranhão, hã?

— Sim. Cristovão Prado Maranhão. Mas podem me chamar de Cris. É um prazer conhecê-los. Foi mal pela aposta — disse o rapaz para Marcelo, ainda sorrindo. Então ele se virou para Nelson com uma expressão séria. — A partir de hoje, digo, amanhã, serei seu assistente pessoal.

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— É um prazer conhecê-lo — disse Nelson. — Espero que nos demos bem.

— Eu vou deixar os dois sozinhos para começarem esse laço de parceria ou sei lá o que— disse Marcelo e se afastou com uma expressão desapontada, murmurando algo que soava como 50 contos.

A expressão de Cris se aliviou com um sorriso enquanto ele se movia do sofá para sentar bem na frente de Nelson.

— De nada por esse dinheiro — ele disse, olhando a nota com uma onça.

Nelson olhou entre a nota e o rapaz e riu. Ele pegou a carteira e guardou o dinheiro.

— Valeu. Dinheiro mais fácil que já arranjei. Vou te pagar algo.

— Eba. — O sorriso de Cris se alargou. No segundo seguinte, o sorriso ficou malicioso. — Mas você não está confiante demais?

— Hã? Confiante no quê?

— Que não vai se apaixonar por mim. — Nelson mostrou uma cara confusa. — Não é o primeiro homem que diz que não ia se apaixonar por mim — adicionou Cris.

Nelson abriu a boca, mas fechou logo em seguida, incerto de como responder. Ele se inclinou de volta no sofá e olhou para o garoto sorridente.

— É mesmo? E como acabou?

— Da melhor forma possível. — Cris mostrou sua língua de forma maliciosa.

Após um momento de silêncio, Nelson sorriu e riu.

— Que bom pra você, acho. Mas até com esse seu histórico, estou confiante de que não vou me apaixonar por você.

— Porque não curte homens? Já escutei isso antes. Mais de uma vez.

— Tem isso também — respondeu Nelson. — Mas mesmo que curtisse ou se você fosse uma garota, eu me esforçaria pra não me apaixonar por ninguém. Preciso dar tudo de mim pra conseguir meu objetivo.

— Então você é do tipo que diz que o romance atrapalha a natação, hein?

— Essa não é… a melhor forma de resumir.

— Mas é a verdade, não é? — disse Cris, dando de ombros. — Já fui assistentes de pessoas como você antes. Espero que não me culpe se não conseguir os resultados desejados.

— Sem problemas. Não sou um bebê chorão — disse Nelson, rindo. Então seu sorriso sumiu e a expressão ficou séria. — Mas, sério, é meio que não posso perder o foco. Não depois de tudo…

— Seu acidente…

— É… — A festa continuou, ninguém notou que os dois quietos. — Preciso recuperar o tempo perdido. Se eu perder um só segundo, posso jogar fora a oportunidade de uma vida — disse, abrindo os braços para indicar tudo.

— Recuperar o tempo perdido. Não perder nem um segundo — repetiu Cris, balançando a cabeça. — Realmente não entendo nadadores. Você, tipo, não acabou de fazer 18? Tem a mesma idade que eu, mas fala como se fosse o fim da sua vida. Aproveite mais sua juventude.

Nelson sorriu. Quantas vezes escutei isso antes?

— Sei do que você está falando, mas não penso que dar tudo de mim na piscina é perda de tempo — ele disse. — Acho que… talvez eu posso entrar pra história… deixar minha marca…

Cris encarou o jovem com um olhar confuso.

— Talvez isso seja algo pelo qual vale a pena apostar sua juventude… Mas, ainda assim, não entendo vocês. Eu prefiro me apaixonar do que ficar horas e horas na piscina.

Dessa vez foi Nelson quem riu. Até atraiu a atenção de algumas pessoas.

— É muito estranho ouvir isso de um Prado Maranhão.

— Não sou que nem eles — disse Cris, bruscamente e com a voz baixa enquanto encarava Nelson. O garoto mordeu os lábios e respirou com dificuldade, toda a alegria de antes se fora. — Só por ser da Família, não significa que eu preciso amar a água ou qualquer esporte envolvendo ela.

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Nelson ficou olhando, sem jamais piscar.

— Desculpa. Não quis ofender.

Cris suspirou e olhou para o chão enquanto esfregava os olhos.

— Desculpe descontar em você. Não me ofendeu, só que… estou cansado das pessoas me olhando como se fosse uma aberração só porque não quero trabalhar com nada relacionado à natação.

— Se eu puder perguntar, se é assim, por que você é um assistente?

— Dinheiro — disse imediatamente com uma expressão séria, tão rápido que Nelson ficou em silêncio por um segundo e então riu. — Qual a graça? Não é um bom motivo para trabalhar? Sabe que é por isso que a maioria rala todo dia.

— Foi mal, é só que você é a primeira pessoa a ser honesta com isso — disse Nelson, tentando conter o sorriso. — Minhas assistentes anteriores diziam que era porque amavam nadar e queriam ajudar a próxima geração de nadadores do Brasil. Mas eu tenho certeza de que o dinheiro pesava mais do que esse ideal.

Cris abriu a boca e então a fechou com um suspiro.

— Eu prefiro ser honesto do que usar uma desculpa esfarrapada pra trabalhar com você. Se não tiver problema com isso, então ótimo. Só espero que não ligue de eu ser gay.

— Já foi um problema antes?

— A última pessoa da qual fui assistente era uma menina religiosa. Depois que descobriu que a gente curtia a mesma coisa, ela ficou me dando dicas sutis pra entrar pra igreja dela e salvar minha alma pecadora das eternas chamas do inferno. Foi muito divertido. — Cris ergueu os dois polegares com um sorriso forçado. — O cara antes disso disse que não tinha absolutamente nenhum problema, já que ele era 100% hétero. Segundo ele, mesmo que eu parecesse menina e tentasse seduzi-lo, ele não se importava, desde que eu o ajudasse. Tomei as palavras dele e comecei a trabalhar de maiô.

— O que aconteceu?

— Ele ficou insistindo que não ligava, embora eu pegasse ele olhando pra mim aqui e ali e com um monte suspeito entre as pernas. Comecei a suspeitar, mas quando peguei o cara num cinco a um com uma foto minha de maiô, suspeitei pra valer — disse com uma falsa expressão intrigada.

Nelson riu. Um maiô cairia bem nele, a ideia veio a sua mente e ele imaginou Cris em um maiô normal.

— Pelo que você disse, estava afetando o desempenho dele. Não quero que isso aconteça comigo.

— Ele era um babaca com talento. Mas o problema de verdade era o ego. Era maior do que o talento da criatura. Já é uma combinação ruim pra maioria dos atletas, mas no caso dele, era monstruosamente perigosa. E ele nem notava. Faltava treinos e me culpava, dizendo que eu que devia avisar essas coisas pra ele. E teve mais, mas o ápice foi o desempenho dele no Pan-Americano. Um dos piores resultados já vistos — disse Cris, balançando a cabeça. Ele tentou mostrar uma expressão desapontada, mas Nelson viu um sorrisinho escondido.

— Acho que sei quem é. Aquele cara era um idiota.

— Liga não. Você não tem cara de babaca, então não vou tentar isso contigo.

— Agradeço, eu acho. Mas já te disse. Se não fizer qualquer diferença, não tem problema de minha parte. Preciso de toda ajuda que puder conseguir agora.

— Fala do contrato? — perguntou Cris em voz baixa.

— Sim — admitiu Nelson depois de um tempo. — Acho que você já sabe, mas meu contrato acaba com o próximo Mundial. Deveria ser renovado depois de Londres, mas daí teve o acidente… Preciso dar o máximo de mim para ir pro Mundial do ano que vem. É o primeiro passo pra estar no Rio daqui a quatro anos.

— É… um objetivo e tanto na sua situação atual — disse Cris, olhando Nelson nos olhos.

— Pois é. Se estiver a fim de me ajudar, então aceito com todo prazer. — Nelson ofereceu sua mão.

Cris olhou para a mão por um momento e depois sorriu antes de apertá-la.

— Se não tiver problema comigo, então farei tudo que puder para ajudá-lo a chegar nesse objetivo