A Melodia das Águas

O pântano de luz


Ironicamente, aquela era sua primeira vez em uma embarcação. O rio, amplo e sinuoso, refletia a vegetação costeira, a qual tornava-se, paulatinamente, mais espessa em conformidade com a passagem das semanas. Passou a maior parte do tempo exercitando seus afazeres manuais, ao sentir gotículas respingarem-lhe pelo rosto.

Quando a mata escura tornou-se marcada por enormes raízes aéreas retorcidas, desembarcou solitária. A conformação de pedras do antigo píer há muito desabara parcialmente, entortando um poste de luz enferrujado. Desceu as escadas que a levaram para as águas paradas e seguiu nadando rumo à cobertura de folhas.

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Sinais antigos de civilização marcavam o caminho entre os troncos, onde cresciam flores azuis que cheiravam a rebotalhos. Estava no Pântano de Shie, famoso entre as histórias de terror dos filhos da terra, contadas com divertimento pelos povos do mar.

Chegou a uma formação semicircular e esperou pelo anoitecer. Lampejos passaram a cintilar pela floresta, imitando as estrelas ocultas pelas árvores. Não supreendeu-se quando, à sua frente, aflorou uma figura feminina. Longos cabelos lisos colavam-lhe na pele escura, que contrastava com a pintura corporal luminescente. Olhavam-se com cumplicidade, ao passo que outras se juntavam. Os habitantes das águas pantanosas brilhavam como as rainhas do passado.