Naquele dia estava chovendo, e então não pode sair para brincar. Em casa, ficava entediado facilmente, fora por isso que Talmer lhe dera um dorrem. Aquele livro antigo e fedido com folhas grossas que rasgavam fácil.

Lá fora, vez ou outra passava uma locomotiva com as rodas grunhindo contra os trilhos, deixando um rastro de vapor e cheiro de carvão queimando, enquanto isso Alek esperava apenas que seu pai chegasse, toda locomotiva era uma esperança que se quebrava. Olhava para a janela e não era ele. A nuvem de vapor então se dissipava e a espera recomeçava, assim como a leitura.

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— Tessara. Não, não Tessara, não mexe, não! — Repetia, correndo até a irmã, que era mais velha, mas era especial de certa forma. O pequeno Alek não entendia bem, mas sua mãe dizia que Tessara não saia crescer.

Tessara então largava o dorrem, olhava para Alek como se fosse chorar, queria brincar com o livro, mas ele sabia que aquele livro não era brinquedo algum.

— Não pode, você tem os seus brinquedos.

— Eu quero ler, igual, você. — A pequenina Tessara dizia, a voz chorosa enquanto puxava os cabelos presos em um rabo de cavalo.

— Eu vou te ensinar, amanhã! — Repetia, dia após dia, mas nunca conseguia ensinar Tessara a entender as letras e o que elas significavam.

Ele mesmo nem sempre entendia, não bastava apenas saber que letras eram, precisava fazer sentido de todo o arranjo.

Conseguiu fazer Tessara deixar o dorrem de lado e ir para o quarto brincar com as bonecas de pano que sua mãe fizera para ela, mas não sem ouvir muitas reclamações e sua mãe gritar do andar de baixo que não queria saber o motivo, Alek devia resolver.

Naquela noite esperava seu pai chegar justamente questioná-lo sobre o que lera. Sabia que ler era só parte, entender era o desafio, e as letras muitas vezes contavam algo de um jeito para ensinar outra coisa. Aquele texto mesmo, Alek jurava ser um desses casos, pois como poderia? Conhecia a ordem da qual seu pai vinha, sua família, e não entendia. Tem que estar errado!

Quando seu pai chegou, deixou-o cumprimentar sua mãe primeiro, depois quando encontrou tempo, abraçou-o e então, como uma criança apressada que passou o dia esperando por aquilo, levou-o até o livro, impaciente.

— Olhe, aqui, diz que pode ferir, mas você me disse que isso me ensinaria a ajudar as pessoas, a curar elas. Você disse que estava procurando como curar a Tessara.

— Não é assim... vou lhe explicar, Alek. — Talmer era um homem justo, honrado, bondoso. Sentou-se ao lado de Alek aquela noite, e contou-lhe longas histórias sobre o passado, sobre as pessoas, e sobre como nem todas eram boas.

— Mas todo ser vivo tem que proteger a vida. — Alek então questionou os olhos curiosos olhando o título no topo da página do dorrem “feitiço de combate”.

— É confuso, meu pequeno Alek. Mas infelizmente, é triste, mas nem sempre temos como salvar todos, ou poupar todos. Homens ruins às vezes precisam ser parados, ou muitos mais morrem pela sua maldade. — Alek percebeu que os olhos de seu pai se enchiam de lágrimas, Talmer olhou para cima e respirou fundo, abraçou o filho e pressionou sua cabeça contra seu peito. — Você não entende ainda, meu querido filho, mas um dia saberá o que quero dizer, infelizmente um dia entenderá.