Clichês

Tratado de Versalhes


Lembrei-me da minha recente paixão por ele e senti minhas bochechas esquentarem.

— Não daquele jeito – Corrigi o mais rápido possível – Mas eu te amo demais para te perder.

— Você não vai.

— James, eu já lhe disse que não há como afirmar esse tipo de coisa.

— Eu não estou entendo o que você quer dizer.

— Eu só acho que é melhor acabar com isso enquanto estamos bem.

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— Se estamos bem porque acabar?

— Para que não fique ruim.

— Você não está fazendo sentido.

— Você não quer ver outras pessoas?

— Não, você quer?

Franzi o cenho. No momento eu não estava preocupada com isso, mas como é que James, o garoto que trazia uma garota por dia para casa, não queria ver outras pessoas?

— Não sei.

— Pensei que eu era o suficiente para você.

Esse é um dos problemas.

— Talvez eu tenha ficado entediada em sair por tanto tempo com um homem cis e hetero, sabe como é, muito comum – Eu tentei fazer graça.

— Está me rejeitando porque eu não sou diferente?

— Claro que não. Porque você é diferente. É o único que acredita em fadas.

— Pelo menos eu não converso comigo mesmo.

— Eu não falo sozinha. Eu falo com as vozes da minha cabeça.

— Bem, isso certamente é diferente.

Sorri.

Sempre brincávamos sobre tudo.

— Você não está facilitando as coisas.

— Você está falando sério? Achei que era uma piada. Parece uma.

Revirei os olhos.

— Estou falando sério, parvo, e você também poderia fazer o mesmo.

— Dê um argumento válido e eu considero seu pedido.

— Eu pretendo ser a sua melhor amiga pelo resto da minha vida e é por isso que esse contato físico exacerbado entre nós deve acabar. Antes que um de nós crie sentimentos.

— Contato físico? Que eufemismo.

— Gosto de eufemismos.

— Você está com medo de sentir...coisas?

— Estou com medo de perder nossa amizade.

— Você não vai.

— Infelizmente, você não pode prometer isso. Você sabe como os seres humanos são.

— Complexos.

— Chatos.

— Coisados.

Nós sorrimos.

— Viu? Eu não quero perder isso.

Ele se mexeu, para ficar mais perto. Nossos rostos ficaram próximos.

— Não vamos. Eu prometo.

Suspirei. Aquela proximidade quase me fazia mudar de ideia.

— James, não é como se eu estivesse impondo o Tratado de Versalhes e você fosse a Alemanha.

Ele riu.

— Só não vejo motivo plausível para deixarmos de fazer o que estamos fazendo.

— Não colocar nossa amizade em risco não é um motivo suficiente para você?

— Você deveria ter pensado sobre isso há dois meses.

— Eu pensei e agora eu refleti de novo e cheguei a outra conclusão.

— Por que criar sentimentos seria tão ruim assim?

Afastei-me, abruptamente.

— Que?

— Parece ter dado certo para Fred e Dominique.

Ele estava insinuando o que eu acho que ele estava insinuando?

— Que? – Repeti, desnorteada.

— O que eu quero dizer é que se de alguma forma nossos sentimentos evoluírem, não seria um problema, assim como você pinta.

O garoto tinha ficado louco.

— Não somos eles. Nossa amizade é bem maior do que a que eles tinham e eu definitivamente não estou disposta a arriscar algo tão importante assim.

— Então, nós somos Joey e Rachel?

Arregalei os olhos.

— Nós somos Joey e Rachel!

— Devo agradecer por pelo menos ter transado, acho.

— Não acredito que eu me tornei a Rachel, sempre achei que eu fosse a Phoebe.

— E daí? Pelo menos você vai casar. Eu só vou ter patos e galos.

Eu ri.

Não resisti e passei a mão em seu rosto.

Ele se inclinou para me beijar, mas eu não deixei.

— O que foi?

— Não ouviu tudo o que eu disse?

— Sim, mas não vamos ter uma última noite?

Por que ele fazia aquilo comigo?

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— Não. Melhor não, James.

— Por favor? – Seus lábios roçaram minha orelha.

— Essa é a última vez – Cedi.

— Claro.

— Estou falando sério.

— Eu também.

— Não parece ser o que você está pensando.

— Você anda lendo mentes agora?

— Essa sua cara diz tudo.

Ele deu um sorriso malicioso.

— Esse não será o nosso fim, Rose, escute o que eu te digo.

Tive medo de que ele pudesse estar certo.

— Não sabia que você fazia profecias.

— Incrivelmente, existem coisas que você não sabe sobre mim.

— Tipo o que?

— Não prefere que eu mostre? – Ele me agarrou e me beijou com força. Segurei seu rosto e nos movemos para deitarmos no sofá.

Mas James nunca teve senso de espaço.

Caímos no chão.

— Ai. Saí de cima de mim, Sirius.

— Desculpa.

Ele se mexeu para sentar no chão.

— Você está bem?

— Estou, mas acho que isso foi um sinal – Falei, enquanto massageava meu pescoço.

— Sinal do que?

— De que não devemos transar.

Ele riu. Muito.

— Você é completamente louca, Rose.

— Sou louca por que não quero ignorar o que o Universo está me dizendo?

— Às vezes o Universo não quer nos dizer nada – Ele disse e tirou uma mecha de cabelo que estava caída em meu rosto.

— Ou será que você só é idiota o suficiente para ignorá-lo?

— Talvez.

James me encarou por um longo tempo.

— O que foi?

— Nada.

Ergui uma sobrancelha.

— Vem comigo, quero te dar uma coisa.

— Isso é algum tipo de cantada?

— Não.

— Ótimo. Eu não estava preparada para uma das suas.

— As minhas são ótimas.

— James, nós dois sabemos que não.

Ele me puxou para o seu quarto.

— Senta aí.

— Tiro a roupa?

— Se você quiser – Ele revirou os olhos e foi procurar algo em sua escrivaninha.

— Deve ser alguma coisa importante já que você guardou na sua gaveta com chave.

— Foi só para você não mexer.

— Eu não faço isso.

— Rose você vive explorando meu guarda-roupa e pegando minhas camisetas.

— Algumas vezes a moda masculina é melhor do que a feminina.

— Vocês têm decotes.

— E vocês camisas largas.

— Incrivelmente, você fica bem dos dois jeitos.

— Você também. Valoriza seus seios.

Ele riu e tirou um envelope pardo da gaveta.

Coloquei a mão no coração, fingindo alívio.

— Achei que você ia me dar um anel de noivado.

— Você não ia saber lidar com um.

— Não mesmo. Mas com um envelope eu posso tentar.

James ficou balançando o envelope nas mãos.

— Me promete uma coisa?

— O que?

— Que você só vai ler quando estiver no avião?

Minha viagem para França seria dali poucos dias.

— Você está brincando comigo, James? Por que você faz essas coisas? Eu fico ansiosa!

— Você vai conseguir se controlar.

— Vou passar mal nos próximos dias e depois vomitar no avião.

— Pense pelo lado positivo, você acaba de ganhar uma leitura para a viagem.

— Eu ia ler Alice Walker.

— Eu sou melhor.

— O melhor piadista isso sim. O que é que tem aí dentro?

— Algo que eu escrevi, pensei que estivesse óbvio.

Mostrei-lhe o dedo do meio.

— Lembra daquilo que eu estava escrevendo na sala?

Meus olhos brilharam.

— Você terminou? Pode me dar.

Ele estendeu o envelope e veio se sentar ao meu lado na cama.

— Lembre-se do que você prometeu.

— Ainda não prometi.

— Rose.

— Está bem, eu prometo. Aliás, sinto muito pela sua insegurança e pelo seu ego inexistente.

Ele bufou, mas não retrucou.

— Sobre o que é?

— Quando ler vai descobrir.

— Que resposta mais clichê.

— Estou tentando instigar meu leitor.

— Não funcionou.

James sorriu e eu achei que seria uma boa hora para sair dali.

Sorrisos podem destruir uma pessoa.

— Eu vou para o meu quarto – Falei, me levantando.

— Não, espera.

Ele segurou meu braço.

— O que?

— Não está se esquecendo de nada?

— Obrigada por me deixar ler sua história?

— Não. Tínhamos um acordo.

— Que acordo?

Ele me puxou e caímos na cama. Não rolamos para o chão o que eu considerei uma vitória.

— James!

— Uma última noite lembra?

— Mas o Destino nos deu um sinal de que...

— Rose – Ele segurou meu queixo - Foda-se o Destino.

Aquilo era uma blasfêmia, mas me esqueci disso quando seus lábios tocaram os meus.

Mais tarde enquanto ainda estávamos na cama, eu virei-me para poder ver seu rosto.

— Quem você seria num apocalipse zumbi, James?

— É nisso que você pensa depois de transar?

— Não, eu penso em transar de novo.

— Podemos resolver isso.

— Responda minha pergunta.

— Um sobrevivente.

— Isso quer dizer o que?

— Que eu iria fazer de tudo para sobreviver, matar alguns zumbis, roubar comida, essas coisas.

— Talvez eu te chame para o meu exército.

— Que exército?

— O que lutará contra os zumbis no apocalipse.

— Quando perguntam para pessoas onde elas se veem daqui 10 anos, elas vão responder coisas como “bem sucedida”, “rica”, “dona do próprio negócio” e etc., mas quando perguntam pra você é...

— Líder de um exército – Dei um imenso sorriso – Eu mereço um nobel, não acha?

— Talvez, mas se perguntarem eu vou negar.

— Vai nada, você é o meu maior fanboy.

Ele riu, aproximando-se, e começou a distribuir beijos pelo meu pescoço.

— Talvez eu seja.

Eu sorri.

Tentei não pensar em como seria difícil o amanhã, mas era impossível.

— Pergunto-me se vamos conseguir.

— O que?

— Ficar distantes.

— Você não tem autocontrole?

— Não quando a Vênus está em Escorpião.

Por sorte eu iria para longe.

— Se você perder o controle, eu prometo não te impedir.

— Idiota.

Eu andava de um lado para o outro na sala, aguardando. Minha mala estava pronta. Eu estava pronta. Só faltavam duas coisas.

Roxy chegar com o táxi e James aparecer.

Desde a nossa última noite eu estava o evitando. Nos vimos poucas vezes e estava tudo desconfortável, mas eu não poderia acreditar que ele não ia se despedir de mim.

— Para de ficar andando de um lado para o outro – Fred falou.

— Cadê o James?

— Pela centésima vez: eu não sei.

— Ele sabia o horário do meu voo. Estava anotado na porta da geladeira, Fred!

— Talvez ele só tenha tido algum imprevisto.

— O que seria mais importante do que eu?

Ele revirou os olhos.

— Se ele não aparecer, vai ser um babaca.

— Ele já é.

— Vou ter que concordar. Aquele embuste.

— Seu objetivo é cavar um buraco para podermos espiar o vizinho debaixo?

— Muito engraçado você.

— Obrigado.

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— Dominique tem tanta sorte em tê-lo.

— Tem mesmo.

— Fred, você é um babaca.

— Pelo menos eu estou aqui.

Não respondi, só continuei dando voltas no mesmo lugar.

Quando a porta finalmente se abriu eu pensei que ia morrer de alívio.

Ou matar James.

— Até que fim! Onde você estava?

— Desculpa! Eu me atrasei com o...

— Zumbi? Está acontecendo o apocalipse zumbi é por isso que você atrasou? Porque essa é a única desculpa plausível.

— Eu ia dizer com o metrô, mas nele tinha vários zumbis do capitalismo, portanto, talvez você esteja certa.

Cruzei os braços e deixei que meu olhar lhe respondesse.

— Eu te trouxe uma coisa.

— O que?

— Chocolate – Ele abriu a mochila e tirou uma sacola de lá. Abri-a.

Eram os meus favoritos.

— Você está perdoado.

Ele colocou a mão no coração, fingindo alívio. O interfone tocou e Fred foi atendê-lo.

— Roxy está te esperando – Ele falou, assim que desligou – Vou descer.

Ele pegou minha mala e saiu pela porta.

— Obrigada – Eu disse, mas não sei se ele ouviu. Encarei James.

— Pensei que você não ia se despedir de mim.

— É claro que eu viria, Rose.

— Achei que você estivesse... – Balancei a cabeça – Esquece. É melhor eu descer.

— Espera aí – Ele segurou meu braço quando eu estava passando por ele – Não vai me dar um abraço de despedida?

Eu deixei escapar um sorriso e passei os braços pelo seu corpo.

Abraçamo-nos por mais tempo do que seria necessário.

— Está tudo bem entre nós?

— Sim, é claro que sim – Ele me afastou e roçou o dedo em minha bochecha – Vamos parar de nos ignorar e fazer isso dar certo, ok? Eu não aguento mais esse... Vácuo.

— Está bem. Eu não te ignoro se você não me ignorar.

— Eu nunca faço isso.

Ergui uma sobrancelha. Era parcialmente mentira.

Ele revirou os olhos.

— Eu prometo.

Eu sorri.

— O táxi está esperando.

— Ok. Boa viagem – Ele encostou brevemente seus lábios nos meus.

— Obrigada. Tchau, James.

Assim que cheguei na porta, me virei para trás.

Havia algo entalado em minha garganta e eu não podia ignorar.

— Não visite os pandas sem que eu esteja presente!

— Tentarei.

Estreitei os olhos.

— Parvo.

— Feliz natal também!

— Espero que você se engasgue com uma uva passa.

Fechei a porta.

As coisas seriam como antes, afinal.

Assim que nos acomodamos no avião, abri o envelope. Foi inevitável não rir logo na sinopse.

— O que foi? – Roxy perguntou.

— Só uma história clichê.

Era um conto bem humorado, cheio de acertos ortográficos, sobre uma ruiva e seus desastrosos clichês.

Sorri ao imaginar que talvez um dia o embuste do James estivesse na lista de best-seller.

Na Roseland já estava.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.