Soundtrack

Prólogo


Carmem suspirou pesadamente, saindo do elevador no último andar do prédio. Por um instante era como se ela fosse a protagonista de um antigo filme romântico e estivesse prestes a reencontrar o amor de sua vida no topo do Empire State. Mas sabia que a realidade não era bem assim.

Ela o amava, é verdade. Mas levara muito tempo para descobrir e mais ainda para aceitar isso. Agora era tarde demais. Naquele momento ele devia estar em algum lugar da cidade, com sua maior rival aninhada nos braços, desfrutando do relacionamento que ela mesma ajudara a construir. Era o que ela também deveria estar fazendo, caso seu plano tivesse dado certo. Mas no meio do caminho alguma coisa saíra dos trilhos e ela ficara confusa, quebrada, totalmente sem controle de suas emoções.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Sabia que tinha feito tudo errado. Queria o amor de Cebola e para conseguir ela brincara com as emoções de muitas pessoas, fizera falsas promessas, contara mentiras nas quais apenas ela mesma acreditara. No fim das contas tudo o que conseguira fora um coração partido. Conquistara o que tanto havia sonhado só para descobrir que na verdade nem queria mais.

Talvez ela não fosse feita para amar. Talvez a arrogância tivesse destruído sua capacidade de ter um bom relacionamento. Talvez vivesse sempre correndo atrás do que não podia ter porque não tivesse o direito de ser feliz. Não depois de tanta sujeira que já dissera e fizera na vida.

Ela apertou os olhos para evitar as lágrimas e seguiu seu caminho, por fora aparentando ser a mesma menina metida de sempre. Os saltos de suas botas faziam um barulho oco ao bater no chão, que ela prontamente ignorou ao subir a escada que levava ao terraço do luxuoso hotel de sua família.

Por mais que muitas coisas houvessem mudado nas últimas semanas, aquele continuava sendo seu lugar favorito no mundo. Dali podia ver praticamente todas as casas e prédios do Limoeiro, assistir a vida de quem passava lá em baixo, as luzes dos carros cruzando ruas e semáforos. Mesmo quando parecia não haver nenhuma saída, ela assistia a tudo aquilo e se imaginava sendo qualquer uma daquelas pessoas. Inventava vidas para as famílias que via nas janelas dos apartamentos, criava um universo de possibilidades. Depois tinha que voltar a seu mundo normal, reassumir a fachada de jovem perfeita e invejada, mas nos instantes em que passava ali, podia ser o que quisesse.

Quando abriu a porta vermelha, a primeira coisa que registrou foi o frio. Corria um vento gelado que a fez agradecer mentalmente por ter colocado um casaco bem pesado. E a segunda, foi o fato de que não estava sozinha.

Ele estava lá, de costas para ela, debruçado displicentemente sobre a cerca de segurança que circundava toda aquela área. Vestia o mesmo jeans e a jaqueta preta surrada de sempre que ela já conhecia bem, embora tivesse passado anos sem reparar. Por um instante pensou que ele não havia percebido sua chegada, mas à medida que se aproximava percebeu os largos ombros dele se curvando levemente, num sinal de nervosismo.

— Maurício? – ela murmurou, a voz rouca pela falta de uso. – O que... – se interrompeu - Você não devia estar aqui.

— Tem uma parte do plano que a gente não calculou bem. – deu de ombros, ainda olhando lá para baixo, como se não tivesse coragem de encará-la ainda.

Carmem esperou, sem saber o que dizer. Para ela o plano fora executado com perfeição e já estava completamente concluído. Não havia mais nada a ser feito. Que acendessem as luzes do cinema, porque o filme havia acabado.