Querido São João

O prêmio do touro mecânico - Castiel


Olho meu reflexo no espelho novamente, não sei se isso é uma boa ideia.

Espero que elas realmente estejam vestidas a caráter também, se não eu juro que vão se arrepender profundamente. Pego a bolsa e dou uma última alisada na roupa. Pelo menos não me fizeram usar um vestido, me sinto menos cafona numa calça jeans e camisa xadrez.

Pego o molho de chaves, tranco a casa e ligo o carro. Eu não ia para a festa junina da empresa, só faz pouco mais de três meses que fui contratada, não me sinto completamente integrada à equipe. Alessandra, minha gerente, diz que vai ser bom para socializar, para me enturmar. Eu não consigo me imaginar numa social tomando cerveja com meus chefes, imagina numa festa caipira.

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Movo o cambio, mas esqueço de apertar a embreagem e a caixa de marcha arranha. Qualquer hora ela fica na estrada. Estaciono a lata velha no pátio da empresa, pego a carteira e aciono o alarme.

— Não acredito, você meio mesmo – Letícia me recebe – e vestida de jeca! Quer dizer... Quase.

Encaro minha colega de trabalho. Ela não fez sequer uma pintinha no rosto.

— Foi o que combinamos. Sua traidora!

— Desculpe, eu não achei que você realmente fosse aceitar essa – ela tenta esconder o riso frouxo.

— Você me paga – serro os punhos de tanta raiva.

— Oi Roberta. – Alessandra acena – Uau! Isso que é querer se destacar.

Percebo Letícia lhe direcionar um olhar de cautela.

— Como assim? É uma festa junina – olho de uma para a outra em busca de resposta.

— Certo, então vamos logo – Letícia desconversa me arrastando para o galpão.

O lugar está todo decorado, há um caldeirão gigante de quentão, um carrinho de pipoca, uma barraca de espetinho e uma carrocinha repleta de guloseimas. Sem contar no touro mecânico, a pescaria e uma cama elástica. Me pergunto quem vai ser o doido de brincar naquilo.

Parece que contrataram serviço terceirizado para cuidar da alimentação e limpeza da festa. Mas o que mais me surpreende naquilo tudo é o fato de eu ser a única vestida, ridiculamente, a caráter. De botas lustradas, chapéu de palha e trancinhas feitas com fita, certamente chamo muita atenção.

Como se já soubesse da encrenca, Letícia me trás um espetinho de carne com cebola e um copo de vinho quente para tentar me distrair. Eu a fuzilo com os olhos, ela se encolhe, e eu a deixo livre de minha ira por algum tempo.

— Soube que o filho do chefe vai aparecer – ela pula animada. – Deve ser o maior gatinho.

— E o que te faz pensar isso? – pergunto sem muito interesse.

— Olha para o patão – Letícia aponta o senhor de cabelos grisalhos.

— Um coroa com mais de sessenta anos.

— Eu pegava.

— Arg! Você diz isso de todo mundo. Semana passada estava dando em cima do Guilherme.

— E daí? Vai dizer que ele não é um gato?

— Ele é gay Lety – reviro os olhos para o céu estrelado.

— Ale. Ale. – ela chama nossa gerente – me ajuda aqui. Fala sobre o filho do chefe.

— Castiel? – Alessandra se demora a continuar, pois está embuchada com pé-de-moleque – acho que é bem bonitinho até, mas minha sobrinha contou que ele se acha um badboy conquistador.

— Viu Roberta, seu tipo favorito – Lety me cutuca.

— Mas eu não vejo nada de mais – Ale conclui.

— Você diz isso porque já é uma quarentona.

— Eu tenho trinta e sete!

— Isso é quase quarenta.

Deixo a duas ali discutindo e vou para perto das atrações. Minha colega de trabalho é uma apaixonada incorrigível, mas eu também tenho que admitir que adoro me envolver com um canalha. Nunca me apaixono sabe, é só pela diversão mesmo.

Um rapaz de cabelo vermelho, preso num rabo de cavalo alto, chama a atenção de todos com um microfone acoplado a uma caixa de som.

— Hora dos prêmios – ele anuncia. – Quem vai ser o primeiro a enfrentar o touro?

Ele tem os olhos cinza tempestuosos do senhor Louis, mas a malícia neles é mil vezes mais atraente.

— Você! – ele aponta para mim, surpreendendo-me. – Já está até vestia para a ocasião.

Eu sabia que essa merda iria me causar problemas.

— Obrigada, mas dessa vez eu passo.

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Ele anda ao meu encontro e aproxima os lábios de minha orelha. – Vamos lá, eu quero ver o quanto você aguenta.

Sinto a sexualidade de suas palavras esquentarem meu sangue. Estendo-lhe a mão e ele me ajuda a montar sobre o animal mecânico. O maquinista dá inicio a rodada e eu me seguro firme na capa preta que reveste o maquinário.

Já estou girando por trinta segundos, começo a tontear, o touro dá uma empinada brusca para frente e eu sou lançada ao ar. O ruivo intercepta meu salto, me segurando firme contra seu próprio corpo.

— Obrigada – digo arfando.

— Parece saber muito bem o que faz – ele mordisca os lábios.

— Você não tem ideia – sussurro em seu ouvido.

Ele parece tentado pela minha provocação, mas é obrigado a voltar ao trabalho quando recebe um olhar severo do senhor Louis.

— Me abana colega que eu estou passando mal. – Lety se despenca em um banco ao meu lado – eu não te falei que ele era o maior gostoso.

— Então é ele o tal Castiel? – pergunto analisando-o.

— Sim... – ela se derrete – uma pena não poder se envolver.

— Por que não?

— Achariam que estamos desesperadas por uma promoção.

— Claro que não.

— Não?

— Se ninguém souber... – pisco para ela. Hora de buscar meu prêmio.

As brincadeiras continuam. Até que vejo graça agora. O patrão é bem generoso com os prêmios, apesar de achar que muita gente ali não mereça.

— Acho que você fica melhor só de bota e chapéu – Castiel aparece arrepiando-me a nuca.

Ele é direto, descarado e se acha irresistível. Esses são dos que mais gosto de partir o coração.

— Cuidado que elas têm esporas.

— Aposto que dou conta – ele me enlaça a cintura, joga meu cabelo para o lado e mordisca meu pescoço.

— E eu aposto que você estará cedendo em menos de três minutos – roço as unhas em seu abdômen.

Castiel segura minha mão e me leva para o andar superior. A única luz que nos permiti enxergar precariamente é a da lua, que passa enfraquecida pelas cortinas.

Eu tranco a porta e desabotoo a camisa. O ruivo me ergue sobre a mesa do escritório, lançando papéis e canetas ao chão. Vejo uma plaquinha de metal cair de lado no carpete. “Diretor Jean-Louis”. Mas é claro, a única sala sem câmeras.

— Hora de exibir minhas habilidades na montaria – digo empurrando o filhinho do chefe sobre a cadeira luxuosa.

Ele sorri com o canto da boca, parece totalmente confiante.

Pobre coitado. Mais um iludido pelos ares sinuosos de São João.