Astriferum

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"Um filósofo certa vez perguntou: 'Somos humanos pois observamos as estrelas ou observamos as estrelas por sermos humanos?' Pergunta sem sentido, de verdade. 'As estrelas nos observam de volta?' Agora, essa sim é uma boa pergunta."

— Neil Gaiman

De vez em quando, Tom tinha a impressão de que as estrelas queriam lhe dizer alguma coisa.

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A parte lógica de sua mente, muito provavelmente herdada de seu pai (ou cultivada por este), o lembrava que estrelas eram corpos celestes e não havia como estas tentarem falar com ele e nada parecido. A parte sentimental e sonhadora, vinda diretamente de Mary Riddle, lhe dizia que não fazia mal querer acreditar em algo assim: o mundo era cheio de coisas estranhas e ainda não explicadas, por que as estrelas e as nuvens e o mar não poderiam, de vez em quando, passar alguma mensagem para as pessoas?

E as estrelas, para essa parte sentimental e sonhadora que compunha a maior parte de Tom Riddle, falavam. O homem nunca soube explicar o que ou como, mas sabia que havia algo a mais ali, algo que parecia se intensificar em certos dias durante o ano, sendo que a noite de treze de Junho era um desses dias.

Ano após ano, a noite parecia mais limpa do que nunca, com as estrelas mais brilhantes e o ar mais silencioso, na noite do dia dedicado à Santo Antônio, o mesmo dia no qual, por acaso, Tom havia nascido.

Era sempre a mesma coisa: o dia passava de forma costumeira, com Riddle ignorando a data como estava acostumado a fazer, até a noite começar a cair e o céu azul primaveril se tornar arroxeado, de vez em quando rosado ou alaranjado, até ficar completamente escuro e o azul profundo da noite de East Yorkshire ficar salpicado de estrelas. Isso não era estranho, afinal, eles estavam no interior, longe das luzes ofuscantes de Londres ou de Leeds, mas havia alguma coisa diferente... O brilho parecia mais intenso, o fundo parecia mais escuro, o vento era mais suave e os barulhos pareciam sumir por completo. Era como se o mundo decidisse ir dormir e Tom ficasse sozinho com as estrelas, prestando atenção para ouvir qualquer sussurro vindo delas.

E às vezes ele ouvia. Se ficasse tempo o suficiente e tivesse bastante foco, era como se conseguisse ouvir um murmúrio suave e fugaz, algo que parecia mais ressoar como uma sensação do que como um som. Riddle não, como sempre, não sabia dizer o que ele ouvia, mas sabia que ouvia. Talvez fosse um ‘olá’ ou um ‘senti saudades’ ou até mesmo um ‘feliz aniversário’ ou um ‘boa noite’... Independente do que fosse, sempre lhe arrancava um sorriso (mesmo quando o dia não estava bom por conta de alguma lembrança ruim ou noite mal dormida) e ele se via murmurando de volta um agradecimento.

Também havia algumas memórias que aquelas noites traziam de volta. Coisas que o homem nunca sabia se eram reais ou inventadas (alguns médicos lhe disseram que era comum alguém criar memórias falsas para lidar com certas situações e muita gente parecia convencida de que ele era muito propenso a este mecanismo de defesa): uma voz conhecida, um brilho parecido com o das estrelas, uma sensação confortável, um sorriso familiar, um rosto que volte meia aparecia em seus sonhos... Todo ano, Tom tinha a esperança de que as memórias do ano anterior fossem se juntar às novas e lhe dar um entendimento melhor sobre tudo aquilo.

“Parece que o senhor está sempre esperando alguém,” disse Frank Bryce, certa vez, depois de encontrá-lo no jardim, sentado entre as flores da Sra. Riddle e olhando para o céu estrelado na noite de seu aniversário.

“Talvez eu esteja,” Riddle respondeu, encolhendo os ombros e rindo fraco, ainda sem tirar os olhos das estrelas.

“Uma moça?” o jardineiro perguntou e Tom podia ouvir o sorriso na voz dele. Abençoado fosse Frank por não o julgar louco depois de todas as conversas de madrugadas que haviam tido em noites insones.

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Não fora nem uma e nem duas vezes que Bryce lhe perguntara isso. O mais jovem conhecia Riddle, sabia das noites passadas em claro, parado no meio do jardim ou perambulando pela praia de Hornsea para tentar esquecer coisas ruins, e já havia percebido que havia alguma coisa diferente naquelas noites. Tom se perguntava se ele também notava o céu mais brilhante e o ar mais silencioso, ou aquele sussurro discreto e misterioso que soava todos os anos como um pequenino presente de aniversário vindo da noite.

O homem encarou os pontinhos cintilantes contra o fundo escuro, alguns se aglomerando de tal forma que pareciam ficar ainda mais intensos, formando um caminho brilhante no meio do céu.

“Uma estrela,” ele respondeu, sentindo o canto dos lábios se curvar em um pequeno sorriso.

E as estrelas lá no alto, como se lhe respondessem, pareciam cintilar com mais intensidade.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.