Toská -Angústia

Café da Manhã e Conversas de Travesseiro


Poderiam – e deveriam – ter voltado para a cama depois do banho que tomaram juntos, mas o estômago de Steve reclamou e Bucky decidiu que seria melhor preparar algo para comerem, teriam tempo para dormir logo depois do café da manhã. Steve pescou uma fatia de pão e se sentou em uma cadeira enquanto Bucky se aproximava do fogão, já com as mãos nos cabelos, pronto para prendê-los, e Steve ficou surpreso quando se deu conta de que aquela cena boba parecia muito mais bonita do que supostamente deveria mesmo parecer.

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Ele não era idiota, não havia ganhado superpoderes, no entanto havia algo diferente, sem sombra de dúvidas. Não sabia dizer o que exatamente, só estava ali, pairando no ar, ou no aroma daquela manhã, ou, talvez quem sabe, naquela camiseta velha num tom desbotado de cinza que o Barnes usava. Poderia ser também no movimento que seus músculos do braço faziam ao segurar os cabelos no alto enquanto ele os prendia toscamente com algum elástico que o Rogers sequer notou que ele trazia consigo. Deixou um sorriso bobo brincar nos lábios enquanto mastigava um pedaço do pão.

— Ovos mexidos? – Bucky questionou enquanto posicionava uma frigideira sobre o fogão.

— Como o que você for comer. – O moreno cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha em sua direção.

— Tenho certeza de que prefere comer algo no café da manhã, loirinho.

— Você está me dizendo que não toma café da manhã, Barnes? – Steve rebateu, também arqueando uma sobrancelha.

— É claro que eu tomo café pela manhã.

— Digo, comer algo junto ao café que toma, seu idiota. – Steve revirou os olhos e se levantou, caminhando até o armário. – Esqueça, vamos comer cereal.

— Er, Stevie? – Bucky o chamou quase no mesmo momento em que o loiro fechava a porta do armário e a expressão para o Barnes.

— Você não tem cereais na sua casa? Você é um caso completamente perdido, Buck.

— E é por isso que está por perto, para poder me salvar da pessoa horrível que eu sou. – Bucky sorriu de viés. – Então, ovos mexidos?

— Só se você também for comer. – Steve cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha.

— Porção para dois então?

— Porção para dois. – Steve sorriu e se aproximou da cesta de ovos.

Ajudou Bucky no que podia, tentando ao máximo não atrapalha-lo enquanto ele manuseava a frigideira concentradamente. Ele parecia outra pessoa enquanto cozinhava e, por um segundo, Steve chegou a vislumbrar uma época que parecia estar muito distante, na qual um pequeno Bucky auxiliava a mãe naquela mesma tarefa. Impensadamente, aproximou-se do moreno e o abraçou por trás no exato momento em que ele desligava o fogo. Bucky riu soprado e se permitiu ser abraçado, sentindo um selar carinhoso no meio das costas, sobre a camiseta. Acariciou o antebraço que pousara em sua cintura e despejou os ovos em um grande prato.

— Pronto, Steve, vamos comer e ir dormir, por favor. – Virou-se no abraço e acolheu o loiro, selando o topo de sua cabeça. – Eu preciso mesmo dormir um pouco.

Steve não respondeu, mas se afastou com um muxoxo, caminhando até a mesa. Sentaram-se frente a frente e começaram a comer em silêncio, roubando garfadas de um mesmo prato enquanto Bucky tomava um café que Steve não o vira fazendo. O Rogers chegou a rir soprado com isso, era quase como se a cafeteira tivesse vontade própria e preparasse o café enquanto Bucky terminava seus afazeres. Os ovos já estavam meio frios e quase no final quando o celular do moreno tocou e ele o atendeu com um sorriso brincalhão.

— Bom dia, senhora Rogers. – Ele olhava diretamente para Steve. – Ah, sim, ele passou a noite aqui. Aparentemente nosso pequeno Stevie teve pesadelos e não conseguia dormir, quando acordei, ele estava na minha cama, agarrado a um travesseiro. – Ele riu soprado. – Não se preocupe, fiz ovos mexidos e ele já se alimentou. Tudo bem se ele passar a tarde aqui comigo? É meu dia de folga e eu acabei de comprar um jogo novo, queria jogar com Steve. Almoço por minha conta, não precisa se preocupar. – Bucky riu outra vez. – Claro, jantaremos aí, como de costume. Eu cuidarei de Stevie por hoje. Até breve e tenha um bom dia, senhora Rogers.

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— Por que a minha mãe ligou pra você para perguntar onde eu estava quando ela sabe que o único local possível para onde fugiria no meio da madrugada é a sua casa e nós somos vizinhos? – Steve uniu as sobrancelhas enquanto o Barnes riu.

— Porque você deixou o seu celular em casa e ela se preocupa com você, é a sua mãe afinal. – Bucky deu de ombros. – Agora podemos, por favor, voltar pra cama? Eu preciso demais de algumas horas de sono, não dormi a noite inteira.

O sorriso nos lábios do Barnes não era maldoso ou sugestivo, era mais como um sorriso de derrota e cansaço. Steve prendeu um suspiro e concordou, levando o prato à pia e subindo com o moreno até o quarto dos pais dele. Tão logo se deitaram, Bucky o puxou para perto, abraçando-o e o mantendo próximo de seu corpo. Era mais como uma barreira de proteção do que posse e Steve se sentiu confortável dentro daquele abraço. Ficou acariciando o antebraço do Barnes em silêncio, observando as frestas da janela que deixavam alguns raios de sol escaparem e invadirem a escuridão daquele cômodo.

Seus olhos começaram a pesar e ele estava quase se entregando ao sono quando lembrou-se do pesadelo que tivera. Os olhos se arregalaram com a dose de adrenalina que os pensamentos da noite anterior liberaram para voltar a assombra-lo e seu corpo enrijeceu automaticamente. Bucky se remexeu desconfortavelmente e balbuciou alguma coisa enquanto Steve suspirou audivelmente e pediu para que ele voltasse a dormir. O sono novamente voltava a vencer aquela batalha quando a voz do Barnes soou baixinha no seu ouvido.

— Só por questão de curiosidade mesmo – ele pausou para bocejar – o que o fez aparecer na minha casa às 4h da manhã?

Steve riu soprado.

Poderia inventar um milhão de desculpas para que o Barnes se calasse e pegasse no sono, mas isso não seria exatamente justo se levasse em consideração que sempre guardava algum segredo dele. Aproximou-se ainda mais do moreno e suspirou vagarosamente antes de começar a responder.

— Tive um pesadelo e precisei me certificar de que você estava bem, ou seria incapaz de pegar no sono.

— Que tipo de pesadelo? – Steve se remexeu desconfortável.

— Não quero falar sobre isso, vamos dormir.

Bucky percebeu a mudança sutil no timbre do loiro e selou demoradamente seu ombro, pousando a testa naquele local por um momento. Pensou se aquela conversa valeria a pena e se ele estava assim tão interessado em saber o que incomodava Steve. Então riu soprado e se sentiu um idiota, era óbvio que ele queria saber o que incomodava o loiro, ele sempre queria saber.

— Você pode me contar o que quiser, tá tudo bem. – Riu soprado. – Eu estou bem. Eu vou ficar bem.

Steve abriu e fechou a boca algumas vezes, engoliu seco outras tantas e fechou os olhos por um momento. Chegou a se esquecer daquele sonho estúpido em algum momento da madrugada, mas agora aquela sensação horrível voltou a assombra-lo com a mesma força com a qual chegara, assustando-o do mesmo modo que assustara durante sua busca pelo moreno.

— No meu sonho, você estava prestes a se matar e eu não pude evitar. Tive medo e decidi te procurar.

Steve esperou uma risada ou qualquer outro comentário, mas recebeu um silêncio fúnebre que cortou sua alma de um modo que ele não havia se preparado. Era uma sensação esquisita não saber o que passava na mente do Barnes, era como caminhar na escuridão, sabendo que o chão poderia desaparecer a qualquer momento, mas ter que confiar e continuar andando para chegar do outro lado. E o que assustava o Rogers não era o abismo, era a escuridão. E enquanto o loiro sentia que o seu coração poderia começar sua própria escola de samba e o seu estômago tentava manter o café da manhã dentro de seu corpo, ouviu o Barnes suspirar baixinho e apertá-lo um pouco mais.

Steve chegou a se surpreender com uma parte fria do metal no braço de Bucky e também com o fato de ter se esquecido daquele detalhe sobre o rapaz. E então, como uma brisa suave, a resposta chegou.

— Não vai acontecer, eu prometo.

Steve pôde sentir os músculos aliviarem a tensão, porém, seus sentidos permaneciam aguçados, seu cérebro estava alerta demais para descansar tão facilmente.

— Mas e se isso passar pela sua cabeça enquanto eu não estiver por perto? – A pergunta saiu quase naturalmente demais para a seriedade daquele assunto. Bucky selou novamente o ombro do loiro.

— Stevie, um ano todo na Rússia depois do acidente, vivendo sob condições inumanas e correndo o risco de pegar infecções inimagináveis pelas incontáveis brigas clandestinas não conseguiram me levar embora, não será agora que eu tenho você que eu sucumbirei a esse delírio. – Bucky suspirou, cansado demais para se retesar. – Quer dizer, é claro que esse tipo de coisa passou pela minha cabeça um bilhão de vezes naquela época. Seria fácil, rápido e ninguém sentiria a minha falta, mas toda vez que me imaginava fazendo qualquer coisa contra mim, eu me lembrava que havia alguém aqui e que, talvez, essa fosse a minha salvação. Você me segurou aqui, Stevie. Você tem me segurado aqui há muitos anos, eu não quero ir para onde você não esteja, entende?

Steve chegou a sorrir com isso, mas não disse nada num primeiro momento. Permitiu-se saborear aquilo que o moreno acabara de dizer e se convenceu de que estava tudo bem deixar-se sucumbir ao egocentrismo somente para se sentir feliz por ser importante para o Barnes. Então o loiro acariciou os braços do moreno.

— Então nada de suicídio, certo?

— Certo. – Bucky riu soprado. – Quer dizer, talvez eu tenha pensado nisso uma ou duas vezes enquanto você saía com Peggy. – Bucky tentou soar zombeteiro, mas se arrependeu pelo comentário logo depois. – Desculpe, foi uma péssima ideia, esqueça. O que eu queria mesmo dizer era que eu não penso nisso, Stevie, não vou te abandonar tão cedo, baixinho, pode se acostumar.