PRÓLOGO

Duas explosões subsequentes preencheram a câmara e, logo em seguida, duas criaturas quadrúpedes do tamanho de cachorros caíram chamuscadas no chão, mortas. De cima, um suave bater de asas diminuía à medida que o atacante preparava-se para pousar. Ao seu redor, toda a grande câmara de treinamento estava em ruínas; grandes blocos de concreto do teto e das infinitas pilastras de sustentação se espalhando pelo lugar mórbido. De repente, quando os pés descalços do sujeito alado tocaram o chão, ele foi surpreendido por um movimento furtivo vindo de uma pilastra à sua esquerda, no entanto, seus sentidos e reflexos aguçados foram ágeis o suficiente para alertá-lo da ameaça, fazendo-o desviar em uma velocidade assustadora das grandes presas que vinham em sua direção. A criatura quadrúpede passou direto por seu alvo e estacou repentinamente, sua boca repleta de milhares de caninos pontiagudos desorganizados, salivando, enquanto os quatro micro olhos o analisavam com cautela.

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Estalando a sua língua em decepção, o garoto de orelhas pontudas, cabelos pretos compridos na altura dos ombros, enfeitados por três chifres vermelhos — dois grandes nas laterais e um pequeno no meio de sua testa —, pele pálida, com o torso descoberto, revelando a musculatura proeminente e suas longas asas de penas negras, olhou para a criatura horrenda de pele branca deformada, que também não tinha rabo, orelhas e focinho, e pensou o quanto o seu treinamento havia passado de uma coisa complicada e suicida para algo chato e sem importância. Sentiu que seu treinamento estava completo e que finalmente poderia dar prosseguimento aos seus antigos planos ambiciosos. Ele suspirou quando a criatura em sua frente contraiu o corpo, pronto para atacá-lo, mas antes mesmo que ela pudesse saltar, o rapaz estalou os dedos, produzindo uma faísca negra que entrou em contato direto com a fera, explodindo-a em tiras de carne e sangue azul.

— Ai, ai, isso é o melhor que você tem pra mim? Essas coisas não dão mais nem pro cheiro — disse o rapaz, a unha pontuda de seu dedo indicador coçando o queixo enquanto ele se virava para encarar o grande portão de entrada da câmara, aberto e revelando do outro lado, uma escuridão silenciosa e vazia. — Ei, você está aí, não é?

— Claro que sim, Luiz — respondeu uma voz masculina distorcida, do outro lado do portão. — E com esse último teste, percebi que você finalmente está preparado para o Grande Dia.

Passos calmos e quase silenciosos surgiram da entrada, e um sujeito alto, vestindo um grande manto negro que cobria praticamente todo o seu corpo, se revelou para o rapaz, que sorriu com desdém.

— Ora, ora, vejo que você também fez progresso. Até que em fim decidiu parar de possuir o corpo de animais para poder se mostrar. Mas ainda não entendo por que esconder até a sua cara dentro desse lençol velho. Você é tão tímido assim? Ou tão feio, que tem medo que alguém morra só de te encarar?

— Dispenso seu escárnio, Luiz. Você sabe muito bem que eu ainda existo apenas como um espírito, e isso é o máximo que consegui fazer para não depender mais de animais.

— Entendo — o sorriso de Luiz sumiu. — E pensar que, depois que você possuía o corpo daqueles bichos, eles acabavam morrendo e apodrecendo lentamente com você ainda dentro. Bizarro! Mas acho que você ficou melhor agora assim, pelo menos evita aquela catinga chata. — Luiz fez um gesto de abano na frente do rosto, um novo sorriso irônico se formando, mas o comparsa misterioso não se importou, quando falou novamente:

— Bom, voltando ao assunto... Queria informá-lo que já tenho planejado todos os próximos passos para o Grande Dia, e para nossa sorte, um daqueles eventos nerds que você frequentava vai acontecer daqui a dois dias no Centro de Convenções. É a oportunidade perfeita para nossos planos, já que seu treino também está completo.

Luiz franziu as sobrancelhas, surpreso com a notícia.

— Uau, vai ter FAMS esse ano? Que bom! Eu achava que a crise financeira no país ia afetar o evento também, mas vejo que não atrapalhou em nada. Andei tão ocupado esses últimos dias, que fiquei meio desatualizado do que andava acontecendo lá fora.

— Sim, o evento vai acontecer, e nós agiremos lá. Os sacrifícios das pessoas daquele evento ainda são necessários para nossos objetivos.

Luiz suspirou, a luz violeta fluorescente de seus olhos destacando-se entre as escleras totalmente negras enquanto ele observava o parceiro, cujo lençol negro ocultava totalmente suas expressões frias quando falava.

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— Eu ainda não entendo por que você precisa especificamente das “pessoas do evento” para seus planos. Você me disse uma época atrás que precisávamos do sacrifício de pessoas puras e inocentes para o ritual final de que necessitamos, mas sempre achei que uma escola de Ensino Fundamental 1, cheio de crianças remelentas, seria bem melhor que isso. E vai por mim — Luiz fez cara de safado —, não é porque o evento é cheio de nerds, que eles sejam tão santinhos assim.

— Você ainda não entendeu o que eu tinha dito, não é? — O sujeito se virou, caminhando lentamente até o portão. — A pureza e inocência que me referi diziam respeito à imaginação, à criatividade e aos sonhos que esses jovens possuem; e os animes, séries, games, mangás e filmes que eles tem contato no dia a dia são excelentes estimuladores neurais que favorecem o perfeito desenvolvimento dos aspectos que nós precisamos para o ritual. — Ele cruzou o portão, sumindo na escuridão de sua grande morada secreta, mas finalizou: — Então arrume-se e venha me encontrar no salão principal, tenho coisas importantes a tratar com você, pois o FAMS acontecerá em dois dias e precisamos nos preparar.

Luiz vibrou, uma onda de ansiedade invadindo o seu interior. Finalmente o dia tão esperado em que poderia testar seus novos poderes aperfeiçoados estava chegando, e não apenas isso, mas também realizar o que mais almejava há tempos, e não se tratava mais da ambição que ele partilhava antes com seu comparsa. Não, ia mais além. Era algo pessoal, algo que ainda o atormentava em sonhos durante a noite e que o motivava durante os momentos em que estava treinando: vingança.

“Me aguarde, Time Ren! E me aguardem, cosplayers e pessoinhas do FAMS!” pensou Luiz, sorrindo com malicia. “Eu estou voltando!”