A M O N G U S

I N S I S T U S


Compreender é o primeiro passo para aceitar, e somente aceitando ele pode se recuperar.

Ou sobre insistência, realidade e conversas francas entre (quase) desconhecidos—

— Pela última vez, Uzumaki, vá para sua cabine. Não me faça te azarar de novo. – Hinata lutava para manter a voz adequadamente calma, mas sua paciência estava se esgotando.

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— Só se você concordar em sair comigo. – o garoto retrucou, sem se abalar, levando os dedos até o cabelo e jogando-os para trás, a fim de bagunçá-los. Hinata reprimiu um rolar de olhos, porque ele realmente acreditava que estava sendo charmoso com aquele ato ridículo.

Ao redor, os amigos não prestavam mais atenção no pequeno espetáculo protagonizado pelos dois – aquele era mais um dia normal –. É claro, era incomum que suas brigas começassem já no trem, rumo à Hogwarts, mas passados alguns segundos, não havia nada novo. Os últimos meses do terceiro ano se converteram em verdadeiras provas de resistência para a sanidade dos grifinórios e dos sonserinos. Naruto tornara-se obstinado em sua missão de levar Hinata para sair; a Hyuuga, por sua vez, era categoricamente objetiva quando negava todas as tentativas frustradas de pedido. Embora fosse rude – e, por muitas vezes, utilizasse de alguns feitiços quando perdia a paciência –, o Uzumaki não se abalava. Tentava no dia seguinte, cada vez mais criativo, e alguns de seus colegas até se divertiam com a situação.

Naruto não sabia o que estava fazendo de errado. Ele era charmoso, havia conseguido certa popularidade quando ganhou a Taça das Casas, tirava notas aceitáveis e não cabulara nenhuma aula optativa o resto do ano letivo. Sua aparência não era exatamente notória – a puberdade trabalhava lentamente, e ele sequer ganhara alguns centímetros naquelas férias, mas agradecia ao pai pelos dias trabalhados nos fundos da casa, arando os campos sob o sol –, entretanto as garotas com quem saíra não reclamavam, sequer uma vez. O quê? As pessoas realmente pensavam que ele ficaria esperando pela Hyuuga até que ela se decidisse?

Ele encarava como um treino. Quanto mais encontros tivesse, mais experiência adquiria, e mais confiança acumularia para enfrentar o desafio final. Desafio, esse, que ele aceitara de cabeça erguida muito cedo naquele ano. Assim que o trem deixou a estação, o loiro obrigou Kiba e Shino, um colega lufano, a acompanharem-no para procurar a cabine da Hyuuga, na ala sonserina, e, ignorando piamente os olhares tortos e irritados, o garoto invadiu o compartimento, jogando toda sua lábia para a morena.

— Eu não vou sair com você. Recomendo que você lave suas orelhas, a não ser que tenha um prazer doentio em ser rejeitado. — enfatizou a palavra, mas o Uzumaki sequer abalou sua postura, enquanto Gaara ria sarcasticamente junto de Itachi, enquanto o Uchiha mais novo rolava os olhos, entendiado – Agora, saia daqui, está infectando o ar. Mas sinta-se à vontade, eu também adoraria ver os monitores lhe dando uma detenção sem sequer chegarmos a escola. – sorriu debochadamente, e Naruto fez uma careta, cedendo. Ele não poderia começar o ano com uma detenção manchando seu histórico (quase) imaculado, não se quisesse participar dos testes de Quadribol na primeira semana. Desencostando do batente, o garoto a olhou sério, preparando-se para sair.

— Tudo bem. Eu vou. Mas isso ainda não acabou, Hyuuga. – fechou a cabide, enquanto Hinata suspirava e soltava a postura rígida, massageando as têmporas.

— Isso nunca começou. – resmungou, enquanto os amigos riam da sua cara abertamente agora.

A garota permaneceu de cara fechada enquanto os outros faziam piadas com a sua cara. Permaneceram rindo por longos cinco minutos, até que Hinata ameaçou azará-los caso não parassem. Ainda indignada, pôs-se a bufar e resmungar palavras não muito bonitas. Não conseguia acreditar que seu ano já começara daquele jeito. Quando passou a última metade do terceiro ano rejeitando repetidas e repetidas vezes o irritante grifinório, pensou que bastaria para que ele a deixasse em paz. Aparentemente, estava errada.

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Ela só não conseguia entender o que, por Merlin, levaria o Uzumaki pensar que poderia levá-la para sair. Ora, que piada! Ele com certeza não estava em juízo perfeito, porque ela nunca, jamais, sob hipótese alguma, ousaria sair com um grifinório sangue-ruim nojento – ao menos, ela tentava se convencer fortemente disso –.

— Parem de rir, seus babacas. – Hinata resmungou, ainda funda no banco, com os braços cruzados. Sentiu Gaara rodear seus ombros e puxá-la, com o riso intacto. A garota não entendia como o amigo era sempre tão risonho e bem-humorado, mas, na presença de outros, tornava suas piadas sarcásticas e ácidas. No fundo, eles precisavam viver de aparências, e um bom sonserino não poderia ser palhaço.

— Calma, Hina. Não estamos rindo de você, juro. É que ele é um verdadeiro filho da puta descarado. – mais uma onda de risos, e, desta vez, até Hinata se rendeu, disfarçando com uma tosse – Não desistiu, e olha que você humilhou ele. Até eu estava ficando com pena. – Hinata lhe dirigiu o mais fuzilante dos olhares, e o ruivo engoliu em seco – Ou não. Enfim. – pigarreou – Você tem que admitir. Uma vez grifinório, sempre grifinório.

— Não lhe dê tanto crédito. – Sasuke retrucou, gesticulando. As férias serviram apenas para salientar a beleza já notória dos Uchiha. A puberdade havia se instalado e positividade, elevando seus músculos e tornando sua pele mais vistosa. E Hinata demorara apenas alguns segundos para listar aquelas peculiaridades. — Ele é um idiota, apenas. Deveria deixar a Hina em paz. – a morena agradeceu fervorosamente o apoio em silêncio, com os olhos.

— Pois eu achei ele bem corajoso. – Itachi alfinetou, e Hinata apenas revirou os olhos em sua direção – Obstinado, eu diria.

— Ah, por Merlin! Um trasgo tem mais chances que o Uzumaki. – a Hyuuga zombou, já esquecendo-se do episódio presenciado na cabine alguns minutos antes – Não sei porquê ele continua insistindo nessa palhaçada. Sinceramente, só me faz perder a paciência. Aliás, Itachi, achei que você se formaria ano passado. – a garota o encarou debochadamente, desviando por alguns milímetros de uma caixinha de sapo de chocolate vazia, rindo.

— Estou voltando voluntariamente para me formar em matérias optativas antes dos exames para aurores começarem, obrigada por sua preocupação. – a cabine foi preenchida com novas gargalhadas.

Em outro vagão, pouco longe dali, uma outra cabine também se ocupava de piadas e brincadeiras, mas de uma maneira diferente do usual. As vestes pretas trajavam o chão, amarrotadas, e gravatas vermelhas e amarelas permaneciam dando cor ao lugar, frouxas nos pescoços. Malões, pacotes, doces vazios e revistas misturavam-se nos assentos e sobre o colo dos estudantes, que faziam algazarra, alheios ao barulho que repercutia pelas finas portas de correr. Curiosamente, havia um único garoto quieto, indiferente aos amigos.

Naruto não conseguia compreender porque tantos foras. Por mais que pensasse e martelasse a mesma tecla de novo e de novo, apenas não fazia sentido. Aquilo afetava seriamente seu ego e sua autoestima, ambos cuidadosamente construídos e moldados sob uma sólida base de confiança externa e falsa modéstia. Diante do espelho, o garoto convencia-se constantemente de que era o suficiente, e as garotas com quem saía também o faziam. Excluíra, então, a ideia de que talvez fosse sua aparência. Depois de mais um período de férias e apesar do inexistente crescimento, ele jurava que seus bíceps estavam maiores. De qualquer maneira, sua aparência era irrelevante – e ele compensava com a personalidade! Era charmoso, engraçado e conseguia preencher silêncios desconfortáveis com conversas cuidadosamente preparadas para parecerem casuais. Ele era ótimo para um adolescente de 15 anos, e apenas aquela louca sonserina não enxergava isso.

Resmungou consigo mesmo, sem se preocupar em participar da confusão, cuja esta ele sempre era protagonista. Permaneceu com seus pensamentos, cada vez mais convencido de que venceria aquele desafio, e levaria a Hyuuga para sair, e provaria que ela estava errada.

— Alô? Terra para Naruto? – o garoto despertou com a voz de Sakura em seu ouvido, e a fitou com cansaço – Que foi, parece que comeu titica de coruja por engano no café. – a garota não perdeu a chance de provocar o amigo, enquanto os outros riam. O loiro apenas rolou os olhos, bufando.

— Vai encher o saco de outra pessoa, Sakura. Merlin, que garota enxerida.

— Não liga, Sakura. Ele levou outro fora da Hyuuga. O primeiro do ano. – Kiba quem respondeu, escapando de uma capa enrolada e jogada em direção ao seu rosto. Sakura voltou-se para Naruto, entre uma risada e uma careta surpresa.

— Sério? Não acredito! – a garota riu gostosamente, jogando a cabeça para trás, enquanto o loiro fechava a cara, grunhindo palavras indecifráveis – E eu achando que você já tinha desistido. Qual é, Naruto, você não cansa de ser humilhado? Ela nem vale a pena! É só mais uma sonserina estúpida, e eu duvido seriamente que ela tenha sentimentos. – Sakura falou com um tom sério, mas com dificuldades para disfarçar os tremores de riso.

— Cala a boca. – Naruto resmungou – Eu só quero provar que consigo. Não é nada demais, parem com todo esse alarde. Aquela louca ainda vai sair comigo, vocês vão ver.

As piadas continuaram durante todo o caminho, e, em algum momento, Naruto convenceu-se a esquecer o episódio, e mergulhou em uma animada partida de snaps explosivos, resultando em pequenas explosões e nuvens de fumaça intoxicando todo o vagão grifinório.


A viagem ocorreu normalmente, e, quando os alunos do quarto ano desembarcaram rumo as carruagens, não houve tumulto – uma vez que as casas seguiam separadamente, mas é claro que a ordem foi mantida exclusivamente pelo bom comportamento e paciência dos estudantes –. Hinata, que ficara nos últimos grupos, distraiu-se com a vista, deslumbrada. Ela jamais se cansaria da imensidão gloriosa e imponente que se erguia sobre seus olhos. A silhueta do castelo era a visão que ela mais gostava – a enchia de algo quente, um sentimento acolhedor. Estar no quarto ano era uma vitória e, apesar dos infelizes contratempos, seus dias em Hogwarts haviam sido os melhores de toda sua vida – mesmo que fosse uma vida medíocre, ainda assim eram os melhores.

Esperou que Sasuke se despedisse do irmão, que aparataria em Hogsmead para resolver alguns assuntos pendentes (ninguém ousou perguntar o quê), e Gaara já se prostrara ao seu lado. Ainda absorta, Hinata percebeu que sentia falta de uma amizade feminina. Ela era grata pelos Uchiha e pelo Sabaku-no, mas não era como se pudesse falar sobre quaisquer assuntos com eles. Não se sentia confortável, e estava sempre a pregar uma pose dura e forte. Sentimentos não era algo que eles demonstravam abertamente. Claro, a Hyuuga reconhecia que nunca fora realmente adepta às novas amizades – seu sobrenome e sua personalidade também não eram fatores positivamente influentes, afinal –, e uma infância marcada pela ausência de outras crianças (e outras meninas, principalmente) refletiu-se como uma dificuldade em momentos como aquele. Naquele ano, Hinata decidiu que se esforçaria para conhecer novas amigas.

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Entretanto – é claro – havia um problema. Moveu seus olhos ligeiramente para a esquerda, observando um grupo de garotas que ria e conversava aos sussurros, encarando outros alunos que cruzavam entre elas. Todas trajavam vestes esverdeadas, com sapatos lustrados e joias adornadas no pescoço. Hinata imediatamente fez uma careta. Amigas da Sonserina estavam fora de cogitação – ela jamais ousaria interagir com aquela espécime repulsiva. Com um suspiro, observou mentalmente sua motivação se esvair, ao perceber que precisaria conhecer pessoas de outras Casas e, com sua reputação e sua personalidade, seria muito difícil.

Sasuke se juntou a dupla e ambos começaram a andar, a espera da fileira interminável de carruagens que andavam sozinhas. Aquele sempre fora um mistério entre as gerações de bruxos que frequentavam a escola. Embora a explicação lógica fosse passada entre os alunos – era uma escola de magia, dã –, havia algo estranho. Como uma sensação, que não se justificava totalmente.

— Vocês acreditam que as carruagens são mesmo mágicas? – Hinata perguntou baixo, apenas para que os amigos escutassem.

— Claro que sim. – Gaara a fitou como se ela fosse idiota – O que mais seria?

— Não sei. – Hinata revirou os olhos, impaciente – Talvez algum animal. Invisível. – deu de ombros, incerta – Só tenho essa sensação de que existe alguma coisa.

— Também sinto isso. – Sasuke falou por cima de sua voz e a garota o fitou com gratidão – Já perguntei para o meu irmão, mas ele não quis falar. Disse que era melhor eu não saber. – o moreno suspirou com indiferença – Talvez algum dia a gente saiba.

— É, talvez. – a garota respondeu, alheia, fitando os carros que seguiam, sistemáticos, seu caminho, sem sair da fila. Seus olhos vagaram para trás, observando alguma carruagem vazia que se aproximava, e acidentalmente fitou fios loiros que se destacavam na escuridão. Semicerrou-os, subitamente indignada.

Naruto ficou para trás porque não encontrava seu broche – parecia bobagem, mas sua mãe realmente tinha consideração pelo enfeite –, cujo qual estava em seu bolso. Ele planejava pendurar em sua capa de Quadribol, para dar sorte, mas teve de procurar duas vezes em cada vagão até encontrá-lo entre os trilhos de uma das portas de correr da cabine ao lado da que estava. Irritado, percebeu que seus amigos haviam partido há tempo, e poucos alunos do quarto ano haviam ficado, esperando as carruagens. Sozinho, procurou algum grupo para que pudesse se juntar, mas não avistou ninguém conhecido. Até ver ela o encarando, com sua careta habitual e seu ar gélido. O garoto xingou mentalmente, agradecendo pela boa sorte.

Perdido em um dilema, percebeu que se não embarcasse logo, perderia a cerimônia de seleção do primeiro ano e, possivelmente, o jantar. Muitos dos grupos já estavam organizados em quatro pessoas, e ele não via muitas alternativas. Bufando, puxou o casaco que estampava – orgulhosamente – o brasão da Grifinória, e se aproximou.

— Eu não mereço... – Hinata resmungou ao vê-lo andando em sua direção. Ela percebeu que eram um dos últimos, e que estavam apenas em três, mas esperava que o destino fosse, ao menos, colaborar um pouco com ela. Logicamente, aquilo era pedir demais. Gaara, ao seu lado, riu baixo, e Sasuke suspirou, cruzando os braços e fechando a cara.

O Uzumaki parou há alguns metros, sem falar nada, tentando não devolver o olhar fulminante que Hinata disparava contra ele. Permaneceu parado, esperando o próximo carro vago, rezando para que aquela experiência nada agradável terminasse o quanto antes. Envolvidos em um silêncio desconfortável, Naruto se deu conta de que nunca havia reparado realmente nos dois amigos da Hyuuga. O moreno sempre lhe deixava intimidado, mas o ruivo parecia alguém agradável de se conviver, embora seus olhos fossem estranhamente rodeados de olheiras e ele tivesse tatuagens. Aos quinze anos.

Permaneceram quietos, enquanto observavam a carruagem se aproximar. Aliviados, subiram, e Hinata sentou-se com Sasuke, enquanto Gaara, com uma carranca disfarçada, deslizou para o lado para deixar o Uzumaki se acomodar. Sentados, sentiram um pequeno solavanco, e agradeceram silenciosamente por estarem a caminho. Mais a frente, podiam observar os outros alunos, e logo mais atrás os quintanistas se acomodavam para esperar sua própria locomoção. Com sorte, chegariam com folga para o jantar.

Naruto brincava com os dedos, se perguntando como eles conseguiam ser tão calmos. Talvez calma não fosse a palavra – eles mal se moviam, como estátuas, e, se não fosse pelos ombros se movendo, o loiro podia jurar que estavam sob um Petrificus Totalis. Eram tão irritantemente controlados! O garoto sentia as mãos suando em bicas, enquanto, à sua frente, o sonserino moreno sequer piscava constantemente. Resmungando para si mesmo, xingou todas as gerações da Casa.

— Então... – Naruto prolongou a palavra, deixando-a no ar, enquanto passavam por um pântano viscoso. Ele, como um bom grifinório, se incomodava com o silêncio, e simplesmente tinha a necessidade natural de estar em contato com outros bruxos.

— Não. – Hinata o cortou antes que pudesse dar outra palavra, e sua voz era gelada – Não ache que exista a necessidade de preencher o silêncio com seus assuntos banais e dispensáveis. Apenas cale a maldita boca até chegarmos o castelo. Não torne sua existência mais insuportável que já é.

Naruto poderia ter se sentindo pessoalmente magoado – até mesmo Sasuke e Gaara engoliram em seco com as palavras rudes da amiga, embora nada demonstrassem –. Mas não. O loiro apenas ignorava as ofensas com a mesma velocidade que as escutava. Apenas grunhiu algo inteligível, sem se deixar atingir pela grosseira da Hyuuga. Ela era uma personalidade forte e difícil, então ele tinha apenas que se acostumar com aquilo. De alguma maneira – muito estranha e inexplicável – Naruto sentia-se atraído por ela. Por toda a frieza e a grosseria. Ele enxergava os muros, e estava convencido de que conseguiria escalá-los, se fosse paciente e perseverante – afinal, ele era um grifinório.

— Hyuuga, embora você tente desesperadamente disfarçar sua atração por mim, não vai me enganar. – Hinata rolou os olhos, bufando – Qual é, vamos conversar. Essa é uma ótima chance de provar que Grifinória e Sonserina não precisam ser inimigos, que podem até ser amigos! – três pares de olhos descrentes o encararam, e Naruto percebeu que nem mesmo ele acreditava em suas palavras – Esqueça. Tem razão. Não dá. Cobras sem sentimentos. – resmungou baixo, cruzando os braços, e Gaara não segurou uma risada sarcástica.

— Devo admitir, Uzumaki. Você é um infeliz, mas é corajoso. – o ruivo confessou, enquanto Hinata o fitava, sentindo-se traída, mas sem remover sua habitual máscara de indiferença.

— Ora, obrigado. É o nosso lema, afinal. – o garoto estufou o peito, exibindo o leão rugindo, e os três sonserinos reprimiram um lufar desgostoso em conjunto – Qual é o seu nome? Você parece o mais amigável aqui. – frisou a última frase, virando o rosto todo para Hinata, em provocação, que o ignorou.

— Gaara. – o ruivo deu de ombros – Se você não fosse absolutamente irritante e tirasse a Hinata do sério, seria interessante conversar com você. Mesmo que sua mentalidade seja claramente inferior. – arreganhou os dentes, com uma risada quase canina, e Naruto bufou, embora exibisse um pequeno sorriso.

— Não posso ficar muito tempo exposto ao veneno. Faz mal, sabe. – riu baixo da própria piada, e Hinata gemeu internamente, resistindo a vontade de azará-lo até o próximo semestre.

O restante do trajeto foi percorrido em silêncio, mas a bolha interna se dissolvera, tornando a breve convivência mais tranquila. Avistavam o castelo, crescente em todo seu esplendor, e aqueceram-se, por estarem chegando em casa. Embora fosse um novo ano, e tampouco seria mais fácil, mas algo estava mudando. Quando desembarcaram às portas principais, Naruto andou depressa até a entrada menor, para encontrar seus amigos. Já do alto, ele se virou, lançando um último olhar indecifrável para os sonserinos.

Mais um dia, e Hinata cometeria um crime de ódio com uma maldição imperdoável. Não bastava o quarto ano estar sendo absurdamente difícil — muito mais do que ela previra no começo do semestre letivo, quando sua semana foi relativamente calma, e ela estava realmente gostando de Trato de Criaturas Mágicas, mesmo que o professor fosse o diretor da sua Casa e ela simplesmente adorasse ele –. Além da pressão escolar, ela ainda acordara com o humor de um trasgo montanhês. Fosse o período, fosse a escola, ou fosse quaisquer motivos aleatórios, nem mesmo Sasuke e Gaara haviam conseguido acalmá-la, e claro que sua cara já amarrada afastara ainda mais outros contatos humanos.

A garota andava em passos rápidos e duros, equilibrando três pesados livros entre os braços, enquanto sua capa escorregava pelo ombro. Embora fevereiro trouxesse um clima atipicamente agradável, não se sentia confortável sem a segunda parte do uniforme. Não precisava de mais motivos para as pessoas lhe encarando.

Na cabeça, recitava a lista de itens que precisavam constar no quilométrico trabalho de Poções para o próximo dia, e ainda precisava lembrar das tarefas daquela tarde, e as matérias optativas estavam lhe dando profundas olheiras. Distraída, não notou quando uma presença se juntou ao seu lado, sorrindo oportunamente.

— Belo dia, Hyuuga. – a garota resmungou quando ouviu aquela voz irritante em seus ouvidos. Ótimo. Era exatamente o que ela precisava naquele dia.

— Uzumaki, se você tem algum pingo de amor pela sua vida, dê meia volta e vá embora. Eu não tenho a menor condição hoje. – desabafou em um só fôlego, virando o corredor rumo a biblioteca, onde ela passava a maior parte do seu dia.

— Nossa. – Naruto colocou as mãos sobre o peito de maneira teatral, ignorando o aviso – Parece que alguém aqui chupou limão. Eu já vi dragões mais felizes que você. – riu da própria piada, enquanto a morena revirava os olhos, exausta – Enfim. Semana que vem vai ter uma visita a Hogsmead, e eu queria saber se você quer ir comigo ao Três Vassouras. – depois de tanto tempo, o convite saía normalmente, como se comentasse o tempo, ou o placar de algum jogo de Quadribol.

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— Não. – a garota suspirou, cansada de insistir na mesma coisa. No entanto, a negativa mal surtia efeito no loiro.

— Vamos, vai ser legal!

— Você poderia simplesmente levar uma daquelas garotas que ficam babando aos seus pés, Uzumaki. – Hinata comentou, enquanto checava uma das páginas dos livros, sentindo-os escorregar de suas mãos.

— Eu já saí com elas, não teria graça. Eu quero sair com você. – o outro insistiu, tentando acompanhar seus passos, e Hinata já estava perdendo a paciência.

— Eu não quero sair com você! Pelo amor de... – de repente, distraiu-se e todos os livros foram por chão, junto com folhas avulsas de anotações – Merda. – praguejou, recolhendo-as, enquanto Naruto permanecia de pé. Seu olhar já se avermelhava, e ela não tinha muito controle das mãos, que lutavam para ir até a varinha presa em sua cintura.

— Se você tivesse aceitado sair comigo, nada disso teria acontecido. – definitivamente aquele tinha sido o comentário errado. Hinata se levantou, com fúria, e levou apenas dois segundos para colocar a ponta da varinha na direção de Naruto.

Impedimenta!

Seu objetivo era apenas paralisá-lo o suficiente para fazê-lo deixar em paz – e se arrepender de ter cruzado seu caminho naquela tarde –, mas tamanha força foi aplicada que, quando o raio avermelhado saltou da ponta de sua varinha e atingiu o peito do Uzumaki, este foi jogado para trás, em uma pequena implosão, e o garoto bateu as costas contra o pilar, desacordando no impacto.

Hinata arrependeu-se no segundo seguinte, mas não pode correr para ajudá-lo. Manteve sua postura ereta e a máscara fria enquanto escondia a varinha, quando ouviu uma voz altiva atrás de si, e soube que, novamente, o universo não estava de brincadeira com ela.

— Senhorita Hyuuga! O que significa isso? – em sua direção vinha a diretora da Lufa-Lufa, e ela respirou um pouco (apenas um pouco) aliviada por não ser a Tsunade, ou então ela estaria em maus lençóis.

— Professora Kurenai, eu... – sua voz se perdeu no ar, baixa, e a diretora lhe cortou com um olhar severo, e Hinata se calou, embora mantivesse o queixo alto.

— Siga-me.

Com um movimento rápido de sua varinha, fez levitar o corpo caído do Uzumaki, que flutuou ereto, como em uma maca, ao lado da professora. Hinata seguia atrás da procissão, com a cabeça baixa, procurando não encarar o garoto. Corroía-se de um sentimento estranho, apertado, e suas mãos tremiam ligeiramente. Ela nunca tinha sentido algo parecido, e não era algo bom. Percebeu, subitamente, que não queria realmente ferir o grifinório. Queria apenas... parar de se sentir pressionada. Intimidada.

Subiram alguns lances de escada, e Hinata fingiu não perceber os olhares acusadores que os quadros pendurados nas paredes lhe dirigiam. Eram apenas personagens de milhares de anos atrás, de que eles sabiam? A garota bufou internamente, amaldiçoando algumas gerações – dela e de outras pessoas –, procurando se acalmar. Sua cabeça, no entanto, parecia martelar, incômoda, e o corpo do Uzumaki pairava bem a sua frente, sem demonstrar sinais de consciência. Embora suas roupas estivessem intactas, Hinata estava verdadeiramente preocupada com os danos internos.

Com esses pensamentos, não notou, de antemão, que o caminho parecia um pouco diferente dos corredores lufanos. Engolindo em seco, percebeu que reconhecia aqueles quadros, bruxos famosos e importantes honradores da casa vermelha e amarela. Com um latejar das têmporas, percebeu que, de uma maneira ou outra, era óbvio que ela acabaria na sala da diretora grifinória. Suspirou, temerosa, porque não haviam meios cabíveis dela escapar ilesa de uma detenção.

— Hm, professora Kurenai? – a garota perguntou, um pouco hesitante – Não deveríamos estar indo para a sua sala? Ou para a sala do professor Orochimaru?

— Eu não tenho a autoridade necessária para lhe aplicar as devidas detenções, e o entregá-la ao diretor de sua própria Casa seria amenizar sua sentença. Estou te levando para que a professora Tsunade cuide disso, uma vez que o senhor Uzumaki é aluno de sua Casa. – disse polidamente, sem olhar para trás, e Hinata rolou os olhos, porque não passavam de mentiras deslavadas. Todos sabiam que Tsunade era a mais severa dos professores, e o Uzumaki era seu preferido.

Caminharam em silêncio até o escritório da diretora grifinória. A professora Kurenai ordenou que Hinata esperasse do lado de fora, e o corpo flutuante de Naruto continuou pairando ao seu lado, desacordado. A garota evitava encará-lo, enquanto sentia um formigamento estranho nas mãos, inquieta. De repente, a professora lufana retornou, a encarando, e levou o Uzumaki consigo, enquanto a porta permanecia aberta, a espera da Hyuuga. Hinata respirou fundo e entrou, fechando a sala atrás de si. Tsunade estava em sua mesa, lendo algum pergaminho com seus óculos de meia lua. Por cima das lentes, seus olhos verdes intensos fitaram Hinata, indagando-a. A garota sentiu-se incomodada.

— Sente-se. – chamou, com a voz neutra, e Hinata se aproximou, sentando na beira da cadeira, as costas eretas – Eu estava até estranhando que o começo do semestre não tenha envolvido a senhorita e o senhor Uzumaki em alguma confusão. – comentou, tirando os óculos. De perto, sua feição parecia muito cansada – Hinata, quer me contar o que aconteceu para que deixasse Naruto desacordado com um feitiço de potencial nível cinco? – ergueu uma sobrancelha como se achasse graça, mas ainda dava medo. Hinata suspirou, relaxando um pouco.

— Foi uma infelicidade, professora. Eu estou passando por semanas absolutamente estressantes, e ele apenas apareceu na hora errada, com o comentário errado. – resmungou o final, grunhindo com a garganta. Tsunade assentiu, provavelmente já esperando por aquele tipo de resposta – Eu não pretendia deixá-lo desacordado, apenas imobilizá-lo por alguns segundos para que eu pudesse ir embora em paz.

— Hinata, você já pensou em abandonar alguma das matérias para que possa ter mais tempo livre? – a diretora perguntou de repente. Ninguém entendia como uma professora podia ser tão severa e tão surpreendentemente calma e compreensiva ao mesmo tempo.

— Não! – Hinata disparou, lançando-se para frente em reação. Quando percebeu, sentiu o rosto quente, e voltou a sentar-se ereta – Não. – disse, agora mais calma – Não posso. Se eu diminuir minha carga horária, meu pai vai perceber. Preciso de todas essas notas para um histórico impecável. Desistir é inaceitável para ele. – murmurou, apertando contra os dedos a barra da saia. Tsunade suspirou, recostando e apertando o vinco entre os olhos.

— Maldito seja Hiashi. – Hinata fingiu não ouvir o pensamento alto da professora – Ok. Tudo bem, eu entendo. Naruto não é uma das pessoas mais simpáticas quando ele quer. – Hinata quase riu – Mas você cometeu uma séria infração, e eu preciso te dar uma detenção. – a Hyuuga se desesperou momentaneamente, e Tsunade percebeu em seu rosto – Mas! – continuou rapidamente – Não vou anotar na sua ficha. – a garota quase escorregou de alívio e gratidão, embora não entendesse porquê a diretora era sempre tão compreensiva com ela – Neste momento, Naruto está sendo cuidado por Madame Chiyo. Quero que você a ajude na enfermaria durante a tarde, por uma semana. – Hinata gemeu internamente, mas não reclamou. Poderia ser pior – Espero que isso ajude no seu temperamento curto. – a grifinória sorriu, como uma piada interna.

— Muito obrigada, diretora. – a voz de Hinata transbordava de gratidão. Ela se levantou, com a bolsa e os milhares de livros sob os braços – Irei para lá agora mesmo. – se despediu e saiu da sala, satisfeita.

O caminho até a enfermaria foi rápido, e Hinata não teve muito tempo para se preparar psicologicamente. Quando entrou pelas grandes portas, em um supetão, surpreendeu-se com a calmaria em que o lugar se encontrava. Os leitos estavam vazios, exceto pelo último, que agora era ocupado pelo Uzumaki. As camas estavam arrumadas, e a mesa ao canto, lugar de trabalho da Madame Chiyo, era o único espaço minimamente bagunçado, com algumas plantas e poções fervendo.

A garota entrou, dando passos leves, e se aproximou da cama ao fundo, olhando ao redor em busca da enfermeira, mas não achou nada. Estava prestes a se virar e ir embora, quando assustou-se com uma voz atrás de si:

— Você é Hinata, não é?

— Merlin! – Hinata pulou, praguejando, e virando-se em um ímpeto. Seu coração agora disparava, e por muito pouco seus dedos não alcançaram a varinha e apontaram para a figura.

Quando se acalmou, percebeu que era apenas uma garota. Ela usava um avental por cima do uniforme, e suas mangas estavam puxadas e massadas até os antebraços. Seu rosto parecia repuxado com o sorriso, como se todas suas articulações respondessem ao movimento, mas não de uma forma assustadora. Ela usava o cabelo preso no alto, e Hinata não conseguia a reconhecer de nenhum lugar – o que a levou à conclusão de que não tinham aulas juntas.

— Ah, me desculpe! Não quis te assustar. – ela se aproximou, ainda simpática.

— Não assustou. – Hinata respondeu com a voz baixa e cautelosa, um pouco murmurante. Havia algo de diferente naquela garota – Como sabe meu nome?

— Quem não sabe seu nome? – riu sozinha – Me desculpe por isso, mas você é bem famosa. Quero dizer, sua família é. Enfim. Você é da Sonserina, né? Não converso muito com pessoas de lá, mas acho que é porque vocês são intimidadores. Um primo meu foi sonserino, mas ninguém fala muito dele. – Hinata lutou para não abrir a boca, incrédula. Todo aquele monólogo fora recitado em apenas um fôlego – Que falta de educação a minha! Sou Tenten Mitsashi. – ela estendeu a mão, chocando ainda mais a Hyuuga, que, depois de alguns segundos, a apertou, um tanto confusa – Sou da Corvinal. Não temos aulas juntas ainda. O que você faz aqui? Está doente?

— Ahn, não, não. – Hinata balançou a cabeça, colocando as ideias no lugar – A professora Tsunade me mandou aqui, para ajudar a Madame Chiyo... – a frase morreu, um tanto incerta.

— Que ótimo! A Madame Chiyo acabou de sair para ir encontrar a professora Tsunade! Ela queria ajuda com uma das poções revitalizadoras. Eu ajudo a Madame Chiyo alguns dias por semana, porque eu queria ser curandeira, e ela me deixa ficar aqui. Você pode me ajudar! Estou terminando de cuidar de um aluno que levou um impedimenta dos bons. Ele ainda não acordou. – Tenten tagarelou, pegando algumas ataduras e sua varinha. Hinata a seguiu, sentindo algo em suas bochechas. Ela estava corando?

— Bem, sobre isso... – começou, um tanto envergonhada, e Tenten se virou para ela, com o rosto em choque.

— Pelas barbas de Merlin! Você azarou ele? Menina, que potência! – Hinata quase riu – Não machucou muito, mas foi um tombo feio. Eu já apliquei uma poção para curar e estou enfaixando o abdômen dele. Aqui, você pode ajudar. A Madame Chiyo não gosta que usemos muita magia.

Hinata a seguiu, arregaçando suas próprias mangas e suspirando baixo. O Uzumaki permanecia deitado, com a respiração calma e ritmada. Calado, imóvel, Hinata pensou que ele era até bonitinho. Mas afastou esses pensamentos tão rápido quanto eles vieram. Em silêncio, desenrolou as faixas nas mãos e as estendeu, esperando que Tenten subisse abrisse sua camiseta (nem fodendo que Hinata faria aquilo). O ambiente quieto durou apenas alguns minutos.

— Então... – a voz da corvinal ecoou pela sala vazia – Por que você azarou ele? – Hinata suspirou, esperando por aquela pergunta.

— Eu e ele não temos bem uma relação amigável. Ele me enche desde o primeiro ano. – resmungou, um tanto devaneada – Hoje eu só estava em um dia ruim. – lutou para que sua voz permanecesse impassível.

— Sério? Bem que dizem que a rixa entre Grifinória e Sonserina é forte. – a outra comentou, agora desabotoando botão por botão cuidadosamente. Hinata engoliu em seco, fitando a cena com um certo incômodo – Mas, uau! Olha isso. Ele ainda não tem tantos músculos assim, mas vai ficar tudo de bom. – a garota suspirou e Hinata grunhiu, procurando não fitar o peitoral exposto do loiro. Sua barriga ainda era lisa, mas a pele bronzeada era chamativa – Você não parece gostar muito dele, e não é só por conta das provocações. – apesar de espontânea e falante, Hinata esqueceu-se que a garota era da Corvinal, e sua percepção era assustadoramente astuta.

— É complicado. – murmurou, mas o olhar da garota sobre si deixava claro que ela esperaria o tempo que fosse preciso até que Hinata começasse a falar – Eu acredito que ele possa ser uma pessoa legal. Acredito mesmo. Mas... existem coisas maiores que apenas Casas diferentes. É como eu fui criada para ser. Acho que preciso insistir nessa barreira com mais intensidade do que qualquer um, porque ele sempre fica muito perto de derrubá-la. Ele é muito insistente. – sua voz era um sussurro, mas Tenten a olhou satisfeita, e não fez nenhum comentário.

Sobre a cama, Naruto lutava para não fazer nenhum movimento, mesmo que sentisse uma vontade quase incontrolável de sorrir. Permaneceu parado, quieto, e percebeu, enquanto era enfaixado, que as mãos da Hyuuga eram realmente muito macias.