Hastryn: Despertar

O Sangue dos Yorkan


Richard

A vida dos antepassados de Richard e Elizabeth havia sido sofrida, pois foram vítimas diretas da escravidão que assolou Hastryn. O regime escravocrata da época não capturava indivíduos de acordo com raças ou cores de pele, pois não havia distinções em relação a isso, mas perseguiam aqueles que pertenciam à classes economicamente menores, com o intuito de explorá-los até o fim.

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Após a abolição da escravatura, os Yorkan conseguiram sobreviver, mesmo com dificuldades financeiras. Ulrick cresceu em uma época na qual os pobres já estavam libertos, portanto, não se recordava de ter vivenciado o mesmo sofrimento que os demais parentes. Através de relatos, teve a ciência de tudo o que ocorreu.

Por ser um garoto de bom coração, tornou-se amigo do príncipe Lothar, que, mais tarde, se tornou rei e alegou que não existiria ninguém melhor do que ele para se tornar o seu conselheiro. Era praticamente o cargo mais alto depois da posição de monarca. Graças às condições oferecidas por esse trabalho, Ulrick e Esther puderam construir uma grande e confortável residência. O local escolhido, que antes consistia somente em uma vasta área florestal com matos extremamente altos, deu lugar a uma construção circundada por belíssimas árvores e com um jardim que passou a ser bem cuidado. Sobre ele, foi feito um chafariz, que possuía a estátua de uma sereia, uma criatura mitológica.

As raízes dos Yorkan ali foram fincadas. Meses após a mudança, Esther descobriu estar à espera de seu primeiro filho. Nasceu Richard, o primogênito daquela geração. Anos depois, foi a vez de Elizabeth chegar ao mundo. Ulrick e Esther se alegraram profundamente ao terem recebido dois maravilhosos presentes dos deuses e por terem realizado o sonho de serem pais de um casal.

As crianças foram criadas com muito amor e disciplina. Tornaram-se irmãos extremamente unidos. Para onde Richard ia, Elizabeth o seguia. O mais velho também seguia a mais nova, quando esta decidia fazer alguma travessura ou, por acidente, se encontrava em apuros. A família era conhecida por ser bastante atenciosa com os parentes e amigos. Mantinham diversas tradições especiais, como reuniões à noite, com o intuito de compartilhar histórias, almoços em conjunto e passeios a lugares bonitos nos dias livres. Separavam-se somente quando cada um se destinava a realizar as tarefas e funções que lhes eram submetidas. Richard assistia às aulas de Idioma e de História com Elizabeth e praticava treinamentos físicos com os garotos. Ulrick, diariamente, dirigia-se ao palácio, para auxiliar Lothar. Esther, por vontade própria, contava com o auxílio de uma equipe de serviçais de confiança para manter a casa arrumada e bonita, mas também fazia parte da ação. Era a responsável por preparar todos os alimentos e refeições, considerados extremamente apetitosos por todos.

Os irmãos Yorkan aprendiam sem dificuldades os conteúdos que lhes eram ensinados. Os indivíduos contratados para serem seus professores os elogiavam constantemente, alegando que a inteligência de ambos era algo admirável e incrível. Um grande potencial para o futuro.

...

O tortuoso período de guerra fez com que os estudos de Richard e Elizabeth se atrasassem um pouco. Em Horgeon, os irmãos ainda não haviam começado a frequentar todas as aulas que precisavam, pois os professores ainda estavam no processo de preparação das disciplinas. As únicas que estavam acontecendo eram a de luta, para Richard, e a de música, para Elizabeth. Estavam ansiosos para as demais, dispostos a conhecer o novo método de ensino.

— Tenho certeza de que irão se adaptar bem. — Elliot afirmou, sentando-se entre ambos. Puxou-os para um abraço em conjunto. — Se acostumar com a nova realidade é um processo que pode ou não demorar, mas vocês têm o nosso apoio e incentivo. Não hesitem em contar caso precisem de qualquer coisa.

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— Há algo que gostariam de compartilhar conosco sobre as aulas que já estão fazendo? — Charlie perguntou, demonstrando sincero interesse. Richard se sentia à vontade para conversar com a rainha a respeito de qualquer assunto.

— Sim. — Elizabeth respondeu primeiro. O menino a olhou, curioso, aguardando a sua resposta. — Estou tão feliz por aprender a cantar melhor. Os professores são bondosos.

— Isso porque você já era boa no que fazia. — A mulher sorriu, orgulhosa. — As suas canções já estavam dentro de seu coração desde sempre. Precisavam apenas de uma sensação forte que fosse capaz de mostrá-la para o mundo. As aulas estão libertando o seu dom, Lizzie.

Elizabeth Yorkan, desde cedo, havia encontrado a sua paixão. A sua vocação. Richard se sentia feliz por isso, pois, assim como já fora dito, o talento da pequena era grande e precisava ser aproveitado. Ele também via a luta como algo assim, por mais que esta fosse uma prática que fosse se aperfeiçoando ao longo dos anos. Eram jovens, mas se dedicavam às suas pequenas missões.

Elliot disse:

— É importante que estejam estudando a História e a Mitologia de Hastryn. Os acontecimentos de antes são bastante interessantes e explicam como as coisas funcionam hoje. Vocês vão entender sobre as criaturas, os monstros, as pessoas, as cidades, as construções, as lendas. Literalmente sobre tudo o que podem imaginar. Terão um outro olhar sobre a sociedade!

— Fascinante! — Richard exclamou. — Estou tão animado!

Charlie riu.

— Religião é outra que também merece atenção. A nossa nos traz regras que podem ou não ser seguidas por nós, de acordo com o que acreditamos. Não somos obrigados a aceitá-las ou concordar com elas inteiramente, mas, caso formos pessoas interessadas em descobrir respostas detalhadas de como o mundo funciona, o Tempo Sagrado pode fornecê-las. E os estudos por livros que falam sobre os deuses também.

Além de História e Religião, existiam as disciplinas de Escrita, Matemática, Astronomia e Filosofia. Eram as que os dois faziam em comum, com exceção da única diferenciada para cada. Foi questionado se Richard tinha interesse por música ou Elizabeth por luta, mas estes recusaram a proposta. Eram atividades que iam completamente contra ao que cada um sonhava e desejava.

A porta se abriu e o pequeno Aaron apareceu.

— Vamos, Richard? Podemos nos atrasar! — Faziam a aula de luta juntos. Richard assentiu e, despedindo-se dos demais com um aceno, retirou-se do aposento, seguindo o menino.

— Obrigado por vir!

— Estava distraído, não é? — o caçula dos Trannyth o provocou, rindo. Aaron tinha somente seis anos, enquanto Richard tinha onze, mas a dupla convivia bem. A sua companhia era algo que o alegrava, fazendo-o iniciar um novo laço de amizade, já que seus amigos permaneceram em Arroway.

Caminhando apressadamente, conseguiram chegar a tempo, aliviados. Uma pequena arena já estava sendo devidamente preparada para os combates e treinamentos físicos que seriam intensamente realizados pelos garotos durante aquela manhã. Nem todos estavam presentes ainda. Richard acreditava que poderiam ter se atrasado, mas não era algo que costumava acontecer com frequência. Portanto, não seria um problema.

Aaron ainda era praticamente um iniciante, pois era jovem demais para ter anos de prática. Richard tinha cerca de três, estando um pouco à frente do amigo, que aparentava sempre estar assustado e inseguro com a possibilidade de ser chamado para lutar contra um colega. E, mais ainda, com a de perder a luta.

— Eles não devem rir de você. — O jovem Yorkan sussurrou, para que os outros não ouvissem o diálogo que estavam tendo. — É um treinamento. Se fizerem isso, são uns idiotas.

— Mas é isso que eles são. — Aaron olhou Richard fixamente. Seus olhos demonstravam pavor. O mais velho o abraçou, com o intuito de transmitir um pouco de conforto e segurança. — Eu não vou conseguir.

— Você tem que acreditar mais! — O próprio Richard era inseguro em alguns momentos, mas, naquele em especifico, foi tomado por uma forte sensação de controle sob a situação. — E ninguém já chega vencendo... Se perder, não vou deixar eles te zombarem.

...

— Mamãe... Como vamos amar alguém que não conhecemos? — O filho perguntou, enquanto ouvia atentamente a narração de Esther. A mulher tinha a pequena Elizabeth em seus braços, enquanto o marido se encontrava abraçado com o menino.

— Ao vermos alguém na rua que esteja passando por alguma dificuldade, devemos nos esforçar para ajudá-lo. Ajudar cidadãos que vendem mercadorias para conseguirem comprar alimentos para os seus filhos, velhinhos que não conseguem carregar objetos pesados, crianças que podem ter se machucado ou precisam de algo para comer, deficientes físicos que estejam sentindo dores... É assim que amamos o próximo, mesmo que não o conheçamos. Se sentarmos para conversar com alguém que está triste e tentarmos fazê-lo um pouco feliz, já vamos estar contribuindo.

— Mas também precisam tomar cuidado quando forem fazer isso. — Ulrick se inseriu na conversa, alertando a parte perigosa do ato. — Existem pessoas más, que fingem estar precisando de apoio para se aproveitarem dos outros. Essas precisam ser evitadas.

Os Yorkan ensinavam os seus descendentes, desde cedo, a agirem como bons cidadãos. Apesar de possuir um amigo tão rude e sanguinário, Ulrick não desejava que suas crianças se tornassem como Lothar. Acompanhou de perto o sofrimento de Charlotte, sem poder fazer nada para evitá-lo. Aprendendo com as atitudes erradas do rei, Ulrick encontrou uma forma de proteger os filhos e tratá-los de uma forma diferente da qual a princesa era tratada. Esperava que, um dia, tivesse a chance de ajudar Charlotte de alguma maneira.

Richard, o descendente mais velho, tinha uma excelente memória, e guardou aqueles conselhos para utilizá-los no futuro. Jamais esqueceria as palavras do pai e da mãe, mesmo que se passassem muitos anos desde o momento em questão.

...

Ele soube que Elliot havia ensinado o irmão a montar a cavalo, e que isso o tornou um pouco mais otimista de que poderia sim realizar os seus desejos e aprender o que desejasse. Contudo, as dificuldades de Aaron era algo que precisava ser trabalhado a cada dia, moldado aos poucos, com delicadeza e sutileza, sem forçar uma rápida mudança. No dia a dia, por causa da pressão das sessões de prática física, o menino sorridente que tinha feito uma conquista parecia dar lugar ao mesmo sofrido de antes. E Richard se entristecia com isso.

Aaron foi chamado para participar da primeira luta naquele dia e, assim como previa, não foi o vencedor. Seus gestos eram lentos em comparação ao do outro menino, que atacava com uma verdadeira selvageria no olhar. Richard não compreendia exatamente como era estar em seu lugar, mas entendia que o amigo tinha problemas, deixando a emoção falar mais alto e perdendo a concentração.

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Surpreendeu-se com algo.

Aaron, após o fim do embate, ergueu a cabeça e ignorou as risadas de alguns meninos. Meninos estes que Richard encarou, segurando uma espada de madeira, e fez com que se calassem. Sentou-se ao lado do menino Yorkan, permanecendo em silêncio até o restante da atividade.

Quando todos se retiraram, permitiu-se descansar a cabeça sobre o ombro do amigo e chorar, fazendo com que toda a dor fosse colocada para fora. Richard não soube o que fazer a não ser continuar em silêncio e permitir que o pequeno desabafasse.

Ele seguiria os ensinamentos de seus pais até o fim.