Meu Eu Depois Dela

"Não pode fugir para sempre"


Ichiraku Lámen.

O lugar favorito de Naruto, em todo o mundo, estava lotado. O garoto soltou um suspiro cansado.

“É melhor pedir para viagem” concluiu. Aproximou-se do balcão, assustando os amigos que não notara, tamanha sua distração.

— Naruto! — Kiba também o assustou. — Senta aqui com a gente!

“Aqui” era um tanto complicado. Não havia banco disponível, tampouco uma mesa em que pudessem sentar. Naruto avistou também Shikamaru, Chouji, Shino e Hinata. O sorriso do loiro sempre se alargava quando via a Hyuuga.

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— Oi, gente! — cumprimentou os quatro garotos. — Oi, Hinata!

— B-Bom dia... Naruto-kun.

Ela ainda gaguejava, o que o deixava sempre confuso. Eles se conheciam há anos, fizeram várias missões juntos, lutaram lado a lado na guerra. E ainda assim Hinata ficava tímida em sua presença.

— Não poderei ficar. — O loiro coçou a cabeça, envergonhado. — Ainda tenho que arrumar a casa. Estou adiando já tem algum tempo.

Pediu duas tigelas para viagem, que chegaram antes da segunda rodada dos outros ninjas. Despediu-se e saiu apressado. Chegou em casa em tempo recorde, soltando outro suspiro. Não era como se estivesse rejeitando companhia, ou que não tivesse mesmo que limpar a casa. Mas ainda era estranho fazer algumas coisas perto dos amigos e conhecidos. Nunca pensou que ficaria tão limitado...!

Negou com a cabeça. Foi necessário, ele pensou. E em pouco tempo estaria com a prótese nova que Tsunade estava criando, então tudo voltaria ao normal.

Seus pensamentos foram interrompidos com uma batida tímida na porta. Naruto não teria ouvido se ainda não estivesse parado na sala. Deixou as sacolas na cozinha e voltou rápido.

— Hinata?

Ela se esforçava para olhá-lo diretamente, mas às vezes fraquejava, desviando o olhar para os próprios pés ou para as mãos que se entrelaçavam nervosamente.

— E-Eu... — Ela engoliu em seco, tomando coragem. — E-eu queria saber se... se queria ajuda.

— Em quê?

— V-Você não sabe disfarçar muito bem, Naruto-kun. — Ela não o olhou, envergonhada com a frase espontânea. Naruto também foi pego de surpresa.

— Como assim?

— Já tem algum tempo que eu notei... você não come mais com a gente. Está com vergonha, por causa... por causa do braço.

Ela apontou para a manga comprida e solta ao lado de seu corpo. Naruto sentiu o rosto esquentar.

— Está tudo bem, Naruto-kun. Somos seus amigos. Não vamos julgá-lo ou rir de você.

O garoto não sabia se estava surpreso com a atitude de Hinata ou se era porque ela falara uma frase inteira sem gaguejar.

— Está tudo bem, Hinata. — Ele pôs a mão na cabeça, sorrindo nervosamente. — Não estou fugindo. Eu realmente preciso limpar a casa. Vê?

Ele lhe mostrou a bagunça na sala. Hinata olhou tudo rapidamente, concordando com a cabeça e entendendo que tinha sido dispensada. Ela reforçou que poderia ajudar se ele precisasse de alguma coisa e então partiu. Naruto fechou a porta com um sentimento pesado no peito.

Há meses se sentia só. Antes de Sasuke sair da vila novamente, os dois passavam a maior parte do dia juntos, ambos com medo dos olhares julgadores dos moradores da Folha. De vez em quando passavam o tempo com Sakura e Kakashi, mas preferiam o silêncio confortável de quando estavam somente os dois. Desde que o Uchiha partiu, levando consigo a bandana que Naruto guardara por tanto tempo, o loiro passava boa parte dos dias sozinho, esperando pela prótese prometida. Sakura vinha visitá-lo com frequência, mas falava pelos dois! Naruto gostava de sua companhia, mas suas limitações o deixavam constrangido, o que o fazia dispensar a amiga mais rapidamente.

Será que fizera mal ao mandar Hinata embora também?


Mais um dia de exames. Naruto tremia na cama metálica, a túnica verde do hospital sendo insuficiente para abrandar o frio do inverno. Mesmo sem janelas, a sala estava gelada.

— Vai demorar muito, vovó?

Tsunade o mandara calar a boca pela décima vez. Tirou as fotografias de raio-x mais uma vez e pediu que ele a esperasse no quarto ao lado.

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— Posso trocar de roupa, pelo menos?

— Pode.

Naruto se trocou devagar, como tudo o que fazia ultimamente. Recebeu as chapas do exame da ex-Hokage meia hora depois, junto com advertências de como se cuidar e que, se Naruto o fizesse bem, poderiam injetar as células de Hashirama em poucos meses. Ele concordou, desanimado. Estava exausto daquela rotina de exames e promessas longínquas. Saiu do quarto distraído, topando com Sakura no meio do corredor.

— Naruto! — ela falou surpresa. Ele esperou pela bronca que nunca veio. — Nossa, como é bom te ver!

Não pôde responder. Sakura o puxou pelo braço, levando-o até o andar abaixo e parando na frente da porta da enfermaria.

— Não vim tomar remédio hoje, Sakura-chan.

— Não é para você, idiota! — Ela lhe indicou que olhasse a janelinha da porta. — Quero que veja uma coisa.

Naruto olhou. Não viu nada diferente. Sakura bufou, impaciente.

— É a Hinata!

O rapaz olhou com mais atenção. Hinata estava no fundo da enfermaria. Vê-la sempre lhe arrancava um sorriso.

— O que ela tem? — desfez o sorriso bobo e perguntou preocupado.

— Esse é o problema! Ela não quer me contar! — Sakura o acompanhou, ficando na ponta dos pés e olhando pela outra janelinha. — Hinata estudou um pouco de ninjutsu médico comigo há alguns anos. Ela sabe como curar pequenos ferimentos. Mas chegou aqui hoje de manhã com hematomas horríveis nas costas, sem saber como tratá-los. Perguntei se estava treinando demais e ela levou isso como desculpa. Mas eu garanto a você, Naruto: aquelas marcas não são de treinamento! — O olhou seriamente. Naruto sentiu um arrepio. — Preciso de ajuda para descobrir o porquê de Hinata estar tão machucada.

— Mas, Sakura-chan... — ele falou nervoso, desviando o olhar para a morena distraída no fundo da ala. — Você sabe que Hinata fica toda estranha quando está perto de mim. Vive gaguejando, desviando o olhar. Isso quando não foge.

— Hinata é assim com todo mundo, Naruto! — A mentira não o convenceu. — Por favor, ao menos tente! — implorou. — Aqueles ferimentos me deixaram preocupada!

Não precisou pedir duas vezes. O loiro abriu as portas da enfermaria e se encaminhou diretamente para a Hyuuga. Hinata olhava através da janela, os pensamentos longe dali. Usava apenas a túnica verde do hospital, os cabelos compridos tampando as costas. A moça deu um pulo quando o notou sentado na mesma cama que ela.

— Na-Naruto-kun? — Ela se cobriu rapidamente com um lençol. — O-O que está fazendo aqui?

Ele apenas apontou para o próprio braço direito. Hinata fez um gesto tímido com a cabeça, compreendendo e desviando o rosto.

— E você, Hinata? — falou sério. — O que está fazendo aqui?

Naruto viu os lábios pequenos tremerem.

— Ma-Machuquei... as costas. — Ele também percebeu as mãos inquietas mexendo no lençol. — No... No treinamento de ontem.

— Então por que não veio ontem para o hospital?

— Só... Só doeu hoje.

— Posso ver?

Hinata arregalou os olhos em sua direção.

— N-Não vejo o... o porquê, Naruto-kun.

O loiro soltou um suspiro cansado. Levantou-se e, sem ligar para o nervosismo na moça, tentou tirar os cabelos das costas. Hinata deu um gritinho no lugar, assustando os pacientes próximos.

— Na-Naruto-kun! O... o que está fazendo?

Ela se debatia no lugar, mas mesmo com um braço, Naruto conseguiu contê-la. Afastou as madeixas e sentou atrás dela, segurando os braços agitados da moça. O queixo do rapaz caiu ao ver completamente as costas nuas. Soltou-a em seguida, voltando a sentar na frente dela. Hinata não o olhava.

— O que quer que tenha feito isso, eu sei que não foi por causa de treinamento algum.

— Os golpes dos Hyuuga não são fracos — rebateu.

Naruto nunca tinha visto o lado orgulhoso da jovem. Ela evitava o contato visual, claramente irritada por ter sido pega na mentira, mas não desistindo da desculpa.

— Dos Uchiha também não. — Ele forçou um sorriso, tentando aliviar o clima. Hinata olhou para seu braço um instante.

— Você e Sasuke-kun não estavam treinando. Ele queria matá-lo.

Estava outra vez surpreso por uma frase direta e, agora, rancorosa. Realmente deixara Hinata com raiva, e Naruto não gostava daquela sensação.

— Você lembra de me oferecer ajuda no começo da semana? — começou cauteloso. Ela confirmou. — O mesmo vale para você, ok? Se estiver precisando de ajuda...

— Não preciso de ajuda! — ela respondeu agitada. Levantou da cama e apontou para a saída. — Deixe-me sozinha, por favor!

Assustado com a reação da garota e igualmente impressionado, Naruto voltou até Sakura.

— E então?

— É sério mesmo — respondeu Naruto, olhando a morena pela janelinha da porta. — Nunca a vi desse jeito.

— Me ajuda a descobrir o que é?

— Com certeza. Hinata é minha amiga também.


Nunca tinha ido ao Clã Hyuuga durante o dia. Somente às noites, nos aniversários de Hinata e Neji. Deixando o luto de lado, Naruto seguiu adiante, pedindo ao primeiro guarda que avistou para avisar Hinata de sua visita. O homem estranhou, mas seguiu seu pedido. Ficou ali no grande jardim central, olhando tudo com mais atenção. Casarões e mansões predominavam o lugar, fazendo com que Naruto se sentisse pequeno.

— Pois não? — Uma voz o assustou. Era Hiashi, o pai de Hinata.

— Boa tarde, senhor — falou o mais educadamente possível, ignorando a seriedade que emanava do Hyuuga, tentando intimidá-lo. — Gostaria de levar Hinata a um passeio. Prometo trazê-la antes do anoitecer.

— Um passeio? Só com você?

— Não, senhor. — Naruto ficou corado com a ideia. — Eu e mais alguns amigos vamos até o vilarejo vizinho, para as fontes termais. Achamos que Hinata gostaria de ir.

— Hinata tem treinamento hoje.

— Mas... ela treinou ontem...

— Hinata tem que treinar todos os dias.

— Por quê?

A pergunta inocente fez aparecer uma ruga de irritação na testa do homem.

— Não é da sua conta o que Hinata faz ou deixa de fazer.

Hinata apareceu como que por mágica ao lado do pai, os olhos alegrando-se ao ver Naruto.

— Recebi o recado de Shino-kun — avisou mostrando a mochila. — Podemos ir, Naruto-kun.

Ela o puxou pela manga solta, sem se importar com a careta furiosa que o pai fazia atrás de si. Naruto seguiu a deixa, correndo para fora do clã junto a com morena. Hinata o soltou quando já estavam na saída da vila, esperando os outros amigos.

— Seu pai está ficando louco, Hinata. — Naruto tomou coragem para voltar ao assunto. — Estão treinando daquele jeito todos os dias? Não é à toa que está tão machucada!

A moça desviou o olhar, preocupada com que os guardas poderiam ouvir.

— Ele diz que, como boa futura líder, devo mostrar competência e habilidade nos treinamentos... diários.

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O rancor novamente. O rapaz não sabia se gostava daquela Hinata séria e sem timidez.

— Mas não era Hanabi quem iria assumir o clã? — perguntou surpreso. — Seu pai mudou de ideia?

— Meu pai não pode interferir na vontade do Conselho. — Ela o olhou nervosa. — Se a maioria dos conselheiros deseja que eu me torne a líder, papai nada pode fazer.

— Isso não explica seus machucados.

Hinata levou as mãos involuntariamente às costas. Naruto reparou seu olhar triste antes de desviar a atenção para os indicadores que brincavam ansiosamente. Fazia anos que a jovem não ficava assim.

— Hanabi e papai estão chateados com a nova decisão do Conselho. Como eu lutei na guerra ao seu lado, os anciões me acham mais... — Ela hesitou, as palavras saindo amargas: — Digna de ocupar o posto.

Naruto a viu se afastar um pouco, envergonhada. Não falou nada. Apenas a seguiu até o portão, onde a moça se escorou e evitou seu olhar.

— Não tenho coragem de revidar... — ela soltou tristemente. — Hanabi e papai vêm com tudo para cima de mim, e eu não quero machucá-los, então... — O loiro a olhou chocado. — Tudo fugiu do controle de papai, por isso ele anda tão possesso. E Hanabi já estava acostumada com a ideia de assumir o clã e se casar com Neji-niisan, para perpetuar a linhagem e proteger o Byakugan. Com a nova decisão do Conselho, os dois me escolheram para descarregar a raiva.

Hinata falou tudo muito rápido e embolado com a voz chorosa. Ela respirou fundo antes de se recompor e finalmente olhá-lo.

— Não conte à Sakura-san, por favor.

Pouco depois ouviram o grito da moça de cabelos rosados, que se aproximava animada com o passeio para fora da Folha.


Por três dias inteiros Naruto ficou se martelando com o destino reservado à Hinata. Não acreditava muito em destino, preferia fazê-lo. E há muitos anos a Hyuuga jurara seguir o mesmo caminho ninja que ele: nunca desistir de realizar seus sonhos. Amassou o pergaminho que tentara ler antes dos pensamentos o levarem de volta à moça de olhos perolados. Sabia que o sonho da amiga não era virar líder. Então por que agora Hinata se submetia tão fácil ao desejo dos conselheiros do próprio clã?

Desamassou o papel. Era um convite para a cerimônia, dali a alguns dias, da nomeação do novo Hokage: Hatake Kakashi. Naruto não evitou o pequeno sorriso. Talvez pudesse levar Hinata, animá-la um pouco...

Os olhos azuis se arregalaram com a ideia. Era a segunda vez em poucos dias que se pegava pensando num encontro com Hinata. Mas eram só amigos, então não devia ficar tão preocupado, não é? A moça era uma ótima companhia, principalmente quando deixava de gaguejar e o olhava nos olhos. Naruto concluiu que os olhos dela eram a parte que mais gostava.

De novo com a mente na Hyuuga! Levantou do sofá, balançando a cabeça veementemente. Chamaria Sakura para acompanhá-lo.


— Parabéns, Kakashi-sensei! — Sakura se contia para não abraçar o ex-professor.

— Não seria Kakashi “sama” agora? — perguntou Shikamaru confuso.

— Ele foi meu professor por anos — rebateu a chunin.

— Mas é nosso líder agora.

— E qual o problema de eu chamá-lo assim?

— Você usava o “sama” para a Quinta.

— Mas eu já a conheci quando era a Hokage!

Naruto deu as costas para a discussão. Kakashi os olhava sorridente, deixando o aluno número um em confusões se afastar. Não era como se o garoto não estivesse se divertindo, mas sabia que não demoraria até alguém pensar em mais comemorações ou festejos. Nessa hora Naruto gostaria de estar longe.

— Não pode fugir para sempre...

Uma vozinha baixa chamou sua atenção quando já estava distante do grupo. Ele virou e se deparou com Hinata olhando para os próprios pés, quase que se escondendo dentro da roupa formal. Naruto lhe lançou um sorriso sincero.

— Não estou fugindo.

— Você é um péssimo mentiroso — falou baixinho, brincando com os indicadores. — Por que não aceita ajuda... ao menos uma vez?

— Não preciso de ajuda, Hinata. Preciso de um comprimido para dor de cabeça, só isso.

Ela lhe lançou um olhar triste e não insistiu mais. Confirmou com a cabeça e se afastou na direção dos amigos, visivelmente chateada.

Naruto bufou, cansado. Precisava pedir à Hinata que parasse de tentar salvá-lo. Não sabia mais quantas vezes aguentaria o semblante desapontado da moça.


Revirou na cama por horas. Nem sabia o porquê tentara dormir tão cedo, afinal. Não eram nove da noite ainda! Desistiu do sono e se trocou, rezando para que o tio do lámen ainda não tivesse fechado o restaurante. Olhou pela janela uma última vez para confirmar que não nevava e saiu. As ruas ainda estavam lotadas, todos comemorando e falando alto sobre o novo Hokage. Esperanças e sonhos para o futuro estavam sendo depositados em Kakashi, e Naruto não teve como não se sentir orgulhoso. Mal podia esperar quando fosse sua vez...

Estancou a poucos passos do Ichiraku. Apenas uma pessoa desfrutava do delicioso lámen: aquela que tentava tirar da cabeça a qualquer custo.

— Naruto! — Teuchi acenou em sua direção, chamando a atenção da moça também. Mesmo de longe o loiro notou seu rosto corar. — Já jantou?

“Não pode fugir para sempre” ela lhe dissera. Mas e quanto a ela? Ela não estava desistindo dos próprios sonhos e concordando em aceitar a liderança que nunca quisera?

Ele se aproximou, decidido a externar os pensamentos que o atormentavam há dias. Se Hinata se achava no direito de se intrometer na sua vida, por que ele não podia fazer o mesmo?

— Dois de porco e dois de legumes para a viagem, tio! — Ele abriu um sorriso. — Hinata vai comigo.

Mesmo chateado com a intromissão, Naruto se sentiu um bobo por gostar de ver o rosto da amiga tão vermelho.

— M-meu pai está m-me esperando, N-Naruto-kun.

— Prometo devolvê-la cedo. — Sentou ao lado dela, girando seu banco para que ficassem frente a frente. — Tem umas coisinhas que gostaria de lhe falar. Vai durar o tempo de nosso jantar, tudo bem?

Ela concordou silenciosamente, as mãos remexendo no cachecol incansavelmente. Se pudesse adivinhar pensamentos, Naruto apostaria que Hinata mal esperava a hora de sair dali. E, para o alívio da morena, a comida não demorou. Naruto pagou tudo e ofereceu a manga excessiva para ela, sorridente. Ela pegou, sorrindo tímida.

— Não ligue para a bagunça, por favor — ele falou ao colocar as tigelas sobre a mesa da cozinha e correndo para ligar o aquecedor.

Hinata ficou parada na cozinha, olhando curiosa para cada canto.

— Você se desorganiza facilmente — ela brincou. Naruto não entendeu. — Você disse que iria arrumar a casa há algumas semanas, lembra? E já está tudo uma zona de novo.

Naruto arregalou os olhos, sorrindo envergonhado logo em seguida. Nem se lembrou da primeira desculpa que dera para Hinata, mas ela recordou perfeitamente. Ele preferiu nem comentar que não arrumara a casa naquele dia... nem em qualquer outro desde que voltaram da guerra. Uma vassourada uma vez por dia lhe era o suficiente.

— Vamos comer antes que esfrie. — Fugiu do assunto.

— Você disse que queria falar comigo.

Os papéis pareciam invertidos. Dessa vez era o loiro quem evitava o olhar, enquanto que Hinata, agora que estavam sozinhos e que não tinha como fugir, parecia firme e decidida.

— Podemos falar sentados.

Ele sentou, ela o acompanhou. Não tiveram coragem de tocar na comida. O clima descontraído foi para o ralo.

— Você disse que eu estava fugindo...

— É o que parece.

— Mas... e você? – Olhou-a, ansioso. – Não está fazendo o mesmo?

— C-Como assim?

— Está passeando mais com nossos amigos, fazendo mais missões, me procurando e pedindo para me ajudar... Hinata, você está fugindo de casa o tempo todo — falou de uma vez, surpreendendo-a. — Por que não toma uma atitude? Por que está aceitando tão facilmente os castigos de seu pai?

Hinata desviou o rosto. Odiava magoá-la, mas sentia que precisava ajudá-la, do mesmo modo que ela tentava o tempo todo com ele. A moça ficou um bom tempo calada, deixando o garoto à flor da pele.

— Eu decidi que não vou mais recusar sua ajuda — rompeu o silêncio, deixando-a surpresa novamente. — Desde que você faça o mesmo.

— M-Mas...

— Quero falar com o seu pai, Hinata. Sei que não tenho nada a ver com o Clã Hyuuga, mas o que ele está fazendo com você está passando dos limites! São maus-tratos, pelo amor de Deus!

— E-Ele n-não está m-me...

— É claro que está! Hinata, você acha mesmo que ninguém notou essa maquiagem no seu rosto?!

A mão pequena foi até a face sem consciência. Hinata ficou cabisbaixa. Naruto se levantou e procurou um pano pela cozinha. Quando voltou, trouxe sua cadeira para mais perto dela, sentando na sua frente e levantando o rosto dela com calma. Os olhos perolados brilhavam, lacrimosos. Ele passou a toalha levemente úmida sobre as bochechas, tingindo o tecido de bege claro. Naruto não teve problema com a maquiagem... teve problema ao controlar a raiva enquanto o ferimento arroxeado perto da boca aparecia mais claramente.

— Quer me explicar como isso apareceu durante um treinamento comum?

Os lábios dela tremeram, uma lágrima caindo teimosa. Naruto a enxugou com a mesma toalha.

— Não foi um treinamento comum. — Ela tentou conter o choro. — Ele me deu um tapa quando eu o atingi. Di-disse que eu deveria respeitá-lo...

— Respeitá-lo?! Quando faz uma coisa dessas com a própria filha?!

Naruto se levantou nervoso, indo até a pia e jogando o pano ali com raiva. Apoiou-se na bancada, respirando fundo para não fazer ou falar alguma besteira. Como se adivinhasse seu estado de espírito, ela logo completou:

— Mas foi só dessa vez! — Ela chegou perto, puxando-o para olhá-la. — Juro! Briguei com ele pela primeira vez em anos e saí de casa! Fui para a Cerimônia de Nomeação sem o consentimento dele. Não pretendo aparecer no treinamento tão cedo, e...

Naruto não pensou antes de agir – nada fora do usual. Mas o gesto espontâneo e carinhoso foi demais para Hinata... o abraço que ele lhe deu, tão simples e apertado, pareceu tirar-lhe as muralhas que erguia ao redor de si, para se proteger da dor que a família causava. Ao sentir os braços dela o envolverem, Naruto soube que era disso que Hinata precisava há muito tempo: alguém com quem contar.

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O choro desesperado no seu ombro, as mãos apertando fortemente sua camisa nas costas...

Naquele instante Naruto prometeu a si mesmo que faria de tudo para Hinata nunca mais chorar daquele jeito.


— Promete que vai ficar bem? — perguntou mais uma vez.

Ela apenas confirmou com a cabeça, o sorriso leve.

— Se precisar de alguma coisa... — Hesitou. — Ou se ele a maltratar de novo...

— Eu sei. Vou procurar você no minuto seguinte.

Foi a vez dele de assentir. Olhou para as mãos unidas e em seguida para os portões dos Hyuuga. Não estava com um bom pressentimento. Não queria soltá-la. Não queria dar margem à dúvida, mas Hinata fez questão de voltar para casa. Se dependesse de Naruto, a morena nunca mais colocaria os pés ali.

— Boa noite, Naruto-kun.

A moça soltou as mãos devagar. Deu um último sorriso ao loiro e entrou. Ele engoliu em seco.

— Hinata...

Seu sussurro se perdeu com o forte vento que soprou. Voltaria a nevar em pouco tempo.

A respiração pesada saiu formando uma pequena névoa ao redor do rosto.

Só sentiu o frio quando a amiga se foi.