Lucca

XVI. Codifique-me


2015

Janeiro

— Tenho um pressentimento ruim — anunciou Grace, quebrando o silêncio da sala de Hemming.

Os dois agentes estavam sentados, inundados de papeladas de diversos casos diferentes, mas prestando atenção em nenhum deles. A psicóloga se encontrava de pernas cruzadas, também em silêncio, em uma das poltronas do local. Após o caso de Lucca, foi integrada oficialmente como parte da unidade de Doubleville, já que houvera gostado de trabalhar ali.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Sei como se sente — resmungou Luke, empurrando mais uma papelada para longe de si e checando as horas.

— Não — respondeu ela, prontamente. — Não sabe — concluiu, chamando a atenção de ambos os dois para si.

— Do que está falando? — perguntou Lisa, inclinando-se na poltrona ao observar os cabelos desalinhados presos em um coque frouxo de Grace. Estava em mal estado.

Grace tinha uma careta agoniada e suspirou algumas vezes, dividindo o olhar entre Lisa e Luke, decidindo se devia compartilhar sua apreensão. A pele estava pálida e havia perdido mais quilos do que podia contar. Estava exausta. Todos estavam, devido ao caso não resolvido do garoto.

— Eu... — começou, mordendo o lábio inferior. — Eu acho que estou sendo vigiada — disparou de vez, os olhos alargados ao observar as reações alheias.

Luke franziu o cenho em confusão, e Lisa sentiu o sangue em suas veias disparar.

— O quê? — perguntou Luke, levantando-se da cadeira e dirigindo-se ao sofá, onde Grace se encontrava. — Como assim vigiada?

— Aconteceram algumas coisas que eu não dei importância até... Até se tornarem estranhas — falou, levando o celular ligado em direção à Luke, que o pegou com confusão. — Algumas coisas sobre os casos estavam em desordem no meu computador, mas eu pensei que as havia mudado sem querer. Aconteceu mais de uma vez. E agora, que parei um pouco para checar meu e-mail, percebi que alguns foram lidos antes que eu os lesse, como este aqui. — Apontou no celular para Luke.

Luke franziu o cenho, claramente intrigado, antes de voltar os olhos para ela.

— Alguém hackeou meu e-mail, Luke — disse, os olhos alargados. — Alguém pode ter hackeado meu computador, mesmo protegido com o sistema daqui.

— Vocês são agentes — indicou Lisa, também levantando-se e sentando ao lado de Grace. — Os computadores que usam não são do Departamento?

— Sim — responderam os dois, em uníssono.

— Eles podem ser hackeados? — perguntou Lisa, surpresa.

— Todo computador pode ser hackeado, Clark — respondeu Luke, ainda mexendo no celular de Grace, intrigado. — Com o equipamento adequado, com as conexões adequadas, com os meios adequados — concluiu, erguendo os olhos para Grace. — Vamos ter que investigar isso.

Um silêncio ainda maior se abateu entre eles. Lisa engoliu em seco, balançando a perna com nervosismo.

— O que isso quer dizer? — perguntou Lisa, nervosa.

Grace suspirou, engolindo em seco.

— Quem quer que hackeou meus aparelhos tem que ter acesso ao tipo de equipamento que temos aqui — falou, obtendo um franzir no rosto de Clark. — Tem que ser algum hacker muito equipado — indicou, fazendo uma pausa. — Ou tem que ser alguém que nem sequer é hacker, mas possui o mesmo tipo de sistema da delegacia.

— Alguém da polícia federal? — perguntou Lisa, confusa.

— Exatamente — respondeu Luke, sombrio.

A porta abriu-se com brusquidão, dando espaço para o rosto tomado de suor e euforia do assistente de Luke, Jesse. Tinhas os olhos alargados em assombro, o rosto vermelho com animação, e o corpo se mexia de maneira inquieta.

— O que foi? — perguntou Luke, levantando-se.

— Lucca — respondeu o garoto, com algumas folhas em mãos. Fechou a porta rapidamente e voltou o corpo para seu chefe. — Eu acho que Lucca é daqui.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Eu agradeceria se você explicasse — replicou Luke, com ironia.

— Eu... — começou Jesse, encarando as folhas numeradas em suas mãos. — Eu não acho que ele seja um imigrante — declarou, deixando todos confusos. — Todos esses números, todos esses registros do Acampamento... Tentaram decodificar e como não conseguiram, foi suposto que não significava nada, que são informações irrelevantes e apenas números aleatórios. Não? — perguntou, obtendo um aceno de Luke. — Mas não são! — afirmou, eufórico. Então, fez uma careta e balançou a cabeça. — Quero dizer, eu acho que não.

— Jesse, por favor — interrompeu Grace, levantando-se também e arqueando as sobrancelhas. — Faça sentido.

Jesse suspirou, assentindo.

— Se eu estiver certo, e isto aqui — disse, apontando na folha — forem anos, isto aqui meses — continuou, indicando do outro lado — e isto, dias — falou, quase pulando em seus pés —, então faz sentido o motivo dos computadores não encontrarem um padrão. E nem a equipe — acrescentou, com rapidez.

Ao perceber que todos ainda estavam confusos, Jesse suspirou.

— Supondo que isso indica a data, e que cada junção de números e símbolos destes — apontou linha por linha —, em ordem, é um código para palavras e, neste caso, para o nome de cada pessoa que morou no Acampamento — continuou, chamando a atenção de todos —, então a junção dos dois se torna possível! Vejam — explicou, mostrando em todas as folhas de sua mão.

— Faz sentido — murmurou Luke, olhando as linhas. — O que mais?

— Espera — interrompeu Lisa, colocando o dedo onde deviam ser os anos. — Não vejo como aqui pode ser a data.

— Exato! — falou Jesse, e se não estivessem todos concentrados, teriam se deixado divertir com a animação do mais novo. — Os anos não são datados normalmente, outro motivo pelo qual escapou nossos métodos de decodificação. Os últimos registros datam como o ano de número nove — falou, arqueando a sobrancelha. — E o primeiro registro, data como ano de número um — falou, obtendo um "oh" por parte de Collins. — Então, riu sozinho. — Se estou certo, acabamos de descobrir que o Acampamento de Amoran durou nove anos. Se for assim, tudo começou em 1998.

— Ah, meu deus — murmurou Grace, arregalando os olhos.

— Eu não acredito que você descobriu a data, Jesse! — Riu Clark, colocando a mão no peito com espanto.

— Bom, ainda assim há uma margem de erro, é claro. E supondo que eles não tenham começado a anotar registros logo quando chegaram. Talvez tenham demorado alguns meses a se adaptar no local — acrescentou, logo ficando inseguro. — Isso se eu estiver certo, é claro — indicou ele, com uma careta.

Hemming deixou um sorriso alargar-se em seu rosto, batendo uma das mãos nas costas do garoto magricela.

— É claro que está — falou ele, assentindo. — O que mais, Jesse?

— Ah, sim — falou ele, animado. — Há registros de moradia, de plantio, de armamento, e de suas produções especiais — falou, arqueando uma das sobrancelhas com sugestão ao se referir às drogas. — As datas são feitas com números, de forma bastante óbvia, então só não foi revelado por conta da contagem diferente dos anos. Agora, para as palavras... São usados tanto os números, quanto símbolos e caracteres. Foi difícil decifrar, mas eu acho que consegui!

— Então você encontrou o nome de Lucca? — perguntou Grace, os olhos quase saltando das órbitas.

— Eu encontrei todos os nomes da lista e mais — indicou ele, arqueando as sobrancelhas. — Vejam — continuou. — Estes são os registros de todos que viviam ali, certo? — falou, indicando uma das folhas. — Só que alguns poucos nomes, que estão codificados em números, estão acompanhados de uma segunda data, geralmente repetida, entre parêntesis— contou, apontando para tais nomes. — As datas de moradia indicam o dia que eles chegaram ali, certo? Mas poucos nomes possuem uma segunda data entre os parêntesis, o que me deixava a indagar: seria data de nascimento ou de mortalidade?

— Teria que ser data de nascimento, já que os únicos corpos encontrados lá foram os do tiroteio — disse Luke, as sobrancelhas juntas. — Não acho que eles teriam tempo de registrá-las antes de fugir — completou, com ironia.

— Exatamente — disse Jesse, rindo-se mais uma vez. — E por que apenas alguns possuem data de nascimento registrada? — perguntou, arqueando a sobrancelha com mistério ao ver as engrenagens alheias trabalharem com afinco.

Lisa alargou os olhos azuis quase ao mesmo tempo que os agentes, deixando o queixo cair.

— É claro — murmurou ela, piscando algumas vezes.

— Eles registraram aqueles que nasceram ali — concluiu Collins, balançando a cabeça com incredulidade.

— Ao longo de nove anos, cerca de trinta e duas pessoas, para ser exato — concluiu Jesse, então girando a folha e apontando para um código um tanto impreciso. — E o nosso garoto perdido foi o primeiro.

Todos aproximaram-se mais da folha, como se assim pudessem entender de maneira melhor. Lisa não tinha tanto costume com códigos de interpretação, então o emaranhado de números e símbolos não significava muita coisa para si. Mesmo assim, forçava-se a compreender.

— Ano 2? 1999? — perguntou Luke, intrigado. — Ele viveu lá por quase todo o tempo que durou? Ele nasceu e cresceu neste lugar? — perguntou, balançando a cabeça com assombro.

— Meu deus! — exclamou Lisa, levando a mão à boca.

Muitas teorias haviam se formado a respeito de Lucca e a respeito de sua linha do tempo. Mas a psicóloga sempre supôs que ele havia migrado, da Índia provavelmente, até Amoran. Nunca pensou que aquela floresta havia sido o único que conhecera com os próprios olhos.

— Por isso, eu repito: Lucca é daqui — reforçou Jesse, indicando o código com o nome do garoto.

Assim que discutiram a respeito e o espanto passou, deu-se lugar à fome de justiça que necessitavam para continuar a investigação. Jesse deu as costas, indicando que abriria a porta, quando Luke o impediu, com brusquidão.

Todos encararam-se por um instante, o ar tornando-se pesado enquanto os dois agentes trocavam olhares silenciosos.

— Devo falar? — perguntou Luke, obtendo olhares confusos de ambos Jesse e Lisa. — Devo dizer em voz alta o que todos pensamos?

— O quê? — perguntou o mais novo, confuso.

— Lisa, você sabe — murmurou ele, encarando o olhar confuso da psicóloga, com a sobrancelha arqueada. — Imigrantes ilegais? — perguntou Luke, dando de ombros. — Beleza. Imigrantes ilegais com acesso à armamento, drogas e com o conhecimento o suficiente para armar um acampamento no meio da floresta que os permitisse viver tranquilamente? Todos sabíamos que se trata de algo grande, não concorda?

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Lisa assentiu, desviando o olhar entre os presentes.

— Mas agora sabemos que isso durou nove anos sem ser descoberto — acrescentou Grace, séria. — Se tivessem sido dois, por exemplo, não teria sido tão preocupante.

— Do que estão falando? — perguntou Jesse, claramente confuso.

— Estamos falando dos códigos que você decodificou por conta própria — disse Luke, encarando as orbes confusas de Jesse. — Códigos que não são detectados pela nossa tecnologia e confusos o suficiente para distrair quem quisesse decodificá-los manualmente e não fosse tão dedicado quanto você, Jesse.

— Estamos falando de pessoas que têm acesso à armamentos e drogas, acesso à pessoas, que foram capazes de durar nove anos sem serem descobertos — falou, com a voz falha e o rosto pálido —, e que codificaram informações da mesma forma que se faria se isto indicasse as coordenadas de um tesouro ao invés de simples registros de uma vila.

— Estou oficialmente assustado — disse Jesse ao dar-se conta do rumo da história.

— Tem mais — continuou Grace, encarando o rosto endurecido de Luke. — São pessoas que têm acesso ao meu computador.

— Ah, meu deus — murmurou Lisa, os olhos azuis saindo das órbitas. — Você não quer dizer que... Você está dizendo que...?

— Estamos dizendo que você — interrompeu Luke, encarando Jesse — não vai compartilhar estas informações com absolutamente ninguém desta delegacia, a não ser o próprio delegado. Porque não podemos confiar em nenhum policial agora, especialmente daqui de dentro — concluiu, sério.

O ar pesado na pequena sala apenas se movia por conta do ar condicionado que os cercava. Luke pegou as folhas de Jesse, que quase as deixou cair com assombro, e as posicionou em cima de sua própria mesa, analisando-as com cuidado.

Seu olhar parou no pequeno código indicado por Jesse anteriormente, indagando-se de que exatamente Lucca era feito. Imaginava que era de titânio.

2-3-16. 2*,,4. (2-3-16).