Don't bless me father

Capítulo três: Um encontro entre dois pontos.


Casa dos Herondale - 5:15 pm - Quarto do Jace.

Jace saiu do banho com a toalha enrolada na cintura e vapor saindo da pele. Era do tipo de pessoa que tomava banho fervente até no verão. Secou o cabelo com a toalha de rosto e seguiu em direção ao armário, pegando então uma camisa de botão branca e jeans escuros. Já estava vestido e penteava o cabelo com os dedos quando sua mãe irrompeu no quarto.

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— Jonathan, Michele Garcia perguntou se você poderia ajudar a Ashley com Álgebra antes do teste dela. Eu sei que sua rotina é lotada, mas como você vai reduzir seu tempo na igreja, pensei que fosse ficar mais fácil. - Ela então o viu aprumando-se em frente ao espelho do banheiro. - Ah, não venha me dizer que o padre Ródrig está precisando de você.

Hodge. E não, ele não está.

— Eu juro que tento entender essa sua fixação pela igreja. Mesmo. Eu só não entendo o que de tão bom vocês fazem lá dentro. - Disse ela, sentando-se em sua cama.

Ele suspirou e virou-se para ela, saindo do banheiro. - Nós rezamos. Bastante. Falamos com Deus. E participamos de pastorais que ajudam os pobres, os enfermos, os necessitados. É realmente gratificante olhar pra minha vida e ver que posso melhorar a vida de pessoas, ajudar pessoas, com as minhas ações. - Ele respondeu. Então pegou o telefone, a carteira e o casaco que estava dobrado por sobre a cama. - E pra sua informação, não estou indo para a igreja. Vou sair. Com uma garota.

A cara estupefata de Celine foi ótima. Os olhos se arregalaram e a boca se abriu e ela ficou parada, sem falar nada. Depois de alguns segundos constrangedores, ela fechou os olhos e respirou fundo, para então gritar.

— AAAAAAAA eu sabia que você não era gay! Eu sabia! Stephen, eu estava certa! - Ela levantou-se em um rompante, correndo pela casa para encontrar seu marido. O encontrou na sala de estar, lendo o jornal. - Oh, eu sempre estive certa! Stephen, querido! Oh, céus, meus nervos!

— Querida, do que você está falando? - Stephen fez aquela cara de "tá louca, é?".

— Jonathan. Vai sair com uma garota. Hoje. De verdade.

— O que? Jonathan vai sair com uma garota?

O irmão mais velho, Sebastian, brotou no andar de cima, curioso. - Jace vai sair com uma garota? Aí sim, maninho.

Jace revirou os olhos, descendo as escadas após receber um "tapinha" não tão fraco assim de Sebastian. - Argh. Vocês todos são tão imaturos.

Sua mãe riu. - Não nos interprete errado, filho, mas nós pensamos que a igreja fosse só o seu jeito de tentar se "perdoar" pela homossexualidade. Não teríamos problemas se você fosse gay. É que fizemos uma aposta a qual acabei de ganhar. Seu pai apostou que você jogava no outro time e seu irmão...

— Que você é assexuado. - Sebastian sorriu irônico.

— Eu meio que odeio vocês agora. - Jace declarou, parte brincadeira.

— E então, com quem você vai sair, hein? Eu conheço? - Questionou Sebastian.

— Não. Ela não é de conversar com idiotas. - Jace respondeu, vestindo o casaco. - Pai, posso levar o carro?

— Claro. A chave tá na mesa da entrada. - Stephen disse.

Ele pegou a chave e seguiu para a porta da frente, sua mãe à sua cola. - Trate ela bem, filho. E não a deixe pagar a conta. Escovou os dentes duas vezes?

— Pelo amor de Jesus Cristo, mãe! - Ele soltou, destrancando o carro. Deu um beijo em sua testa e revirou os olhos quando o sorriso dela se ampliou. - Não chegarei tarde, ok?

— Você está um gatinho.

— Eu sei.

Casa dos Lightwood - 5:55 pm - Sala de estar.

Alec estava espiando pela janela da sala, o corpo atrás das cortinas para se esconder, enquanto Izzy terminava de passar o batom. Ele viu o carro do pai de Jace estacionar em frente à casa dos Parker e o mesmo sair depois de alguns segundos.

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— Aqui está o nosso garoto. - Ele murmurou.

— Ele chegou? - Ela questionou.

— Sim. E todo engomadinho. - Alec respondeu. - Cruzes, ele parece o papai.

— Oh céus, ele não pode simplesmente usar isso num encontro. Cadê o esquadrão da moda numa hora dessas?

— Pega leve, Iz. É a primeira vez dele. - Alec repreendeu. - Ai, que bonitinho! Ele foi buscar ela na porta de casa!

— Como o bom garoto que ele é... - Isabelle revirou os olhos. - Vamos logo pro esquenta na casa da Jess antes da festa.

— Pffff. Até parece que eu vou prum esquenta na casa da Jessamine quando tenho uma diversão muito maior me esperando.

Izzy ficou curiosa. - No que você tá pensando?

— Em uma perseguição perigosa que provavelmente irá me ferrar se não executada propriamente. E então, você topa?

Isabelle sorriu. - De repente, o cinema me parece muito mais interessante.

Casa dos Parker - ao mesmo tempo -Quarto da Clary.

— Clarissa, Jonathan está aqui!

Clary deu uma última olhada no visual antes de decidir que estava perfeito. Ela nunca fora uma garota verdadeiramente feminina, mas achava que aquilo era devido a nunca ter tido a oportunidade de ser, se lhe conviesse. Usava saia, algo incomum para ela, escolhida pela sua mãe e uma blusa simples e agradável o suficiente para que não sentisse frio no ar condicionado do cinema. Tinha penteado os cabelos de um jeito mais caprichoso, mas não passara maquiagem. Pegou sua bolsa, apagou a luz do quarto e desceu as escadas.

Jace estava bonito. Usava uma camisa social simples, jaqueta e jeans. Mas tinha algo nele, algo interessante, que a fazia querer desenhá-lo mesmo em simples jeans. Ele estava dentro da casa dela, próximo à porta, conversando com Emma. Virou-se então, vendo-a ali, no pé da escada. Sorriu.

— Clary.

— Jace. - JACE? Que tipo de idiota era ela pra responder assim. Eles ficaram em silêncio, um constrangedor, até que a mãe dela resolveu interferir.

— Bem... Vocês têm que ir logo, para que não se atrasem pra sessão. Tenham uma ótima noite, crianças. - E sorriu enquanto eles saíam pela porta. - Qualquer coisa, vocês sabem o meu número.

— Ok. Boa noite, Emma.

— Boa noite, tia Em.

Eles caminharam até o carro. Antes que ele pudesse abrir a porta para ela, a mesma já havia entrado. Correu até o lado do motorista e adentrou o veículo.

Ficaram em silêncio enquanto puseram o cinto de segurança. Antes de dar partida no carro, ele virou-se para ela e sorriu. Ela estava levemente ruborizada, envergonhada. - Huh, você está bonita.

Ela virou pra ele, prendendo o lábio inferior com os dentes por alguns segundos antes de responder, sorrindo. - Eu sei.

O sorriso dele se ampliou. Deu partida no carro e, balançando a cabeça, disse: - É claro que sabe. - E então o silêncio já não era constrangedor. Era agradável.

* * * * * * * * * *

— Jace, se você está vendo esse vídeo, saiba que eu e o Alec estamos TÃO orgulhosos de você! - Izzy disse, olhando pra câmera do celular, antes de virar a câmera pro outro lado da rua, onde Jace e Clary compravam ingressos pruma sessão. - Fala com ele, Alec!

Alec sorriu, estacionando o carro e virando-se para a câmera. - Hoje as crianças se separam dos adolescentes. Você vai dar o seu primeiro beijo e nós estaremos lá para filmar tudo.

— Certo, agora que vocês já entraram, a gente vai atrás, então eu vou pausar o vídeo. Beijinhos. - Ela pausou e guardou o celular, saindo do carro junto de Alec.

— Você me assusta, Iz.

— Obrigada, maninho.

* * * * * * * * * *

Jace comprou os ingressos para a sessão disponível: A entidade. Não gostava de filmes de terror, nem de filmes de demônios, mas Clary parecia realmente apreciar esse gênero. Ela foi comprar a pipoca e as bebidas enquanto isso e encontraram-se na porta de entrada, ambos meio nervosos, meio embaraçados. Sentaram-se em suas cadeiras adjacentes.

— Você não curte filmes de terror, né? - Ela perguntou.

— Não muito. Pra dizer a verdade, nem um pouco. - Ele respondeu. Ela virou-se para ele na cadeira, pegando um punhado de pipoca e comendo.

— Por quê?

Jace suspirou. Ele sabia responder àquela pergunta. - Porque eles não me assustam. E os produtores brincam com demônios. Com isso não se brinca.

Clary sorriu. - Mas um filme de terror é muito mais que sustos. Tem toda uma estética, um jogo de luz e sombras, uma história que deve convencer o público. O filme que vamos assistir agora, por exemplo, está ficando conhecido pela boa estética e história.

— Você já estava querendo vê-lo há algum tempo? - Ele questionou.

Ela novamente segurou o lábio inferior entre os dentes, desmanchando-o em um sorrisinho bonito ao responder. - Estava. - E virou-se para a tela. Ele ia dizer mais alguma coisa, mas os créditos começaram.

* * * * * * * * * *

Izzy e Alec estavam sentados duas fileiras atrás de Jace enquanto os créditos começaram. Izzy despausou a câmera do celular e, filmando o "casal", começou a sussurrar. - Esses são Jace Herondale e Clarissa Parker no cinema, vendo um filme de terror. Aposto dez pratas que ele irá ficar assustado e ela o abraçará para confortá-lo.

— Não seja malvada, Iz.

— Nunca, querido irmão.

— Shhhh! - Disse um garoto ao lado deles. Ele estava com a aparente namorada. - Tem gente aqui querendo ver o filme.

— Até parece que eu não sei que em quinze minutos o batom dela vai estar todo na sua cara, palhaço. - Isabelle respondeu, rude. - Meu primo está tendo o primeiro encontro dele, aos dezessete, então não encha a droga do meu saco.

— Você não tem saco, Izzy.

— Não encha meu saco você também, Alec. - Ela retrucou, voltando para o vídeo. - Então, Jay-cinho, vou pausar agora para que não pensem que estou filmando o filme pra vender um piratão depois, mas saiba que qualquer coisa que acontecer, estarei filmando. Beijinhos.

* * * * * * * * * *

Clary estava adorando o filme, mas pegava-se espiando com o canto do olho as reações dele. E ele parecia entretido, mas ligeiramente preocupado. Um dos vídeos macabros do filme estava passando. Ela foi pegar mais pipoca do balde, quando sentiu a mão dele também. Começou a puxar a mão, embaraçada, enquanto ele fazia a mesma coisa. Ele olhou para ela ao reparar e sorriu, oferecendo o balde para ela, que agradeceu silenciosamente, pegando um bocado. Ele fez o mesmo depois dela.

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— Awn... - Disse Izzy, gravando novamente com o celular, vendo a cena. - Que bonitinhos! Alec, eu falei que...

— Shhhh! - O cara interrompeu ela.

— Me. Deixa. Cara. - Ela disse, os dentes cerrados e a mão se fechando em um punho.

O cara resmungou, mas ficou quieto e voltou a assistir o filme.

O filme prosseguiu, mas nada de excepcional aconteceu com eles. Não ficaram assustados, nem aproveitaram as deixas pra um beijo ou outro. Pareciam mesmo bons amigos num cinema.

— Argh! Não acredito que você tá deixando essa oportunidade passar, seu mané. - Isabelle disse para a câmera. - Se o cara ao meu lado me mandar ficar quieta mais uma vez, vou pular no pescoço dele.

— Pra mim já chega! - O cara disse, saindo de sua poltrona. - Vou chamar o lanterninha.

— Vai lá, bocó. - Izzy mandou, debochada. - Essa gente que não para de falar, realmente...

Eles viram Clary levantar-se, pedindo licença. Provavelmente indo ao banheiro.

— Essa é a minha deixa. Já volto. - Ela disse para Alec e saiu em disparada para encontrar-se com a nova vizinha. Ela estava no banheiro, como Iz presumiu. - Olá!

Clary virou-se, assustada. - Isabelle? - Questionou. - Não quero ser rude, mas o que você está fazendo aqui?

— O mesmo que você. - Sorriu. - Vendo um filme.

— Nossa! Mas é claro! - Clary sorriu em retribuição.

— Sim... E eu também queria falar de algo contigo. Sobre o meu primo.

— E o que tem o seu primo?

— Super dou força pra esse lance entre vocês, mesmo. Mas você tem que entender também que meu primo é...

— Não precisa falar nada. Você está entendendo a situação completamente errada. Ele não está interessado em mim desse jeito. Nós estamos aqui como amigos.

— É exatamente isso que você não está entendendo. Conheço meu primo. Ele está totalmente na sua.

Clary riu. - Até parece. Ele quer ser padre.

— Ele ainda não é um. Não tem nada que o proíba de namorar enquanto isso. Mas é sério. Escuta o que eu tô falando. Ele me disse que estava super afim de te beijar, mas eu sei que ele é tímido demais pra tomar qualquer iniciativa.

— Isabelle, você não pode estar falando a sério.

— Eu estou, juro. - Quem jura, mente. Isso veio à cabeça dela, então cruzou os dedos atrás do corpo. - Se você corresponde isso, por favor, tome a iniciativa. Era só isso que eu queria falar mesmo. Agora eu vou voltar pra lá.

— Hum. Ok. E... Obrigada. Mesmo.

Izzy sorriu. - De nada.

* * * * * * * * * *

Eles foram numa lanchonete chamada Maia's. Ela pediu um sanduíche calórico e ele, uma salada de frango. Estava embaraçada, lembrando-se da fala de Isabelle. Ele queria mesmo beijá-la? Ou Izzy interpretara errado? Ela estava muito confusa.

Ele pareceu reparar. - Huh, tá tudo bem?

— Sim, sim... Estava só pensando no filme. - Desconversou.

— Tenho que admitir: esse filme até que não é ruim. Eu tentei analisar a história e as nuances e você tinha razão. É mesmo muito impressionante.

— Que bom que você gostou. Mas realmente, os que têm finais sombrios são os melhores. Adorei o fato dele não ter conseguido evitar que acontecesse ali também.

Ele ia falar algo, mas a garçonete - Maia - chegou com os pedidos. - Aqui está... Sua salada de frango, Jonathan, e seu sanduíche, Clarissa.

— Muito obrigada. - Ela disse, pondo maionese no pão. - Ela lembrou do meu nome.

— Ela é assim. Sempre trata a gente como se estivéssemos em casa.

— Ótimo.

Eles comeram numa paz ótima, conversando coisas corriqueiras. Ela contou sobre seu gosto pelas artes e a vontade de fazer arquitetura. Ele, sobre seu irmão Sebastian, que, segundo ele, era desleixado, presunçoso e egoísta. E a conversa foi rendendo, até que eles tinham devorado a sobremesa. Dividiram a conta e foram para o carro. A volta para casa foi silenciosa e estranhamente curta. Ele estacionou em frente à casa dos seus novos pais e aguardou.

Um pensamento irrompeu na cabeça dela. Ele quer me beijar. Mas não vai tomar a iniciativa. Talvez se eu...

— Essa foi uma ótima noite. - Ele disse, olhando para ela, enquanto ela soltava o cinto. - Obrigada por me dar o prazer de sua companhia.

— Você não precisa ser tão formal. - Ela disse, meio nervosa com o que ia fazer. - E eu também me diverti muito.

— Eu quero que esse tipo de acontecimento se repita. Isso é estranho?

— Nem um pouco. - E, no instante seguinte, ela o beijou. Foi um beijo curto e raso, algo além de um toque de lábios, mas não intenso o bastante. Ela viu o olhar de choque no rosto dele quando ela se afastou. Opa.

— Por... - A voz dele falhou e ele pigarreou. - Por que você fez isso?

— Eu... - Opa. Opa. Opa. — Eu... Isabelle, ela me disse que era isso o que você queria.

Isabelle?— A voz dele não poderia soar mais incrédula, nem se ele tentasse.

Ah. — Ela suspirou, decepcionada. - Você não contou nada para Isabelle, não foi?

— Não.

— Foi o que eu pensei. É claro que eu sou idiota! - Ela bateu a mão na testa, tão envergonhada que a única coisa que ela soube fazer foi pedir desculpas, abrir a porta do carro e sair correndo para sua casa.

— Clary! Espere! - Mas já era tarde demais. Fúria tomou conta dos seus ossos. Saiu do carro e rumou para a casa dos Lightwood, batendo na porta. Maryse atendeu. - Boa noite, tia. A Iz tá aí?

— Oh, Jonathan, não. Ela e o Alec foram para uma festa hoje. Mas você quer esperar aqui?

— Não, não precisa. Mas, se não for pedir muito, me faça um favor. Peça para ela e o Alec pararem de se intrometer na minha vida.

* * * * * * * * * *

Já era tarde da noite, quase meia noite, quando Jace saiu do banho e se jogou na cama. Pegou o telefone e viu que tinha algumas mensagens de Isabelle.

Iz: Como foi??? Bjou ela??

Jace: .

Iz: Não esconda o jogo, pirralho.

Jace: .

Iz: Eu te odeio. Me desculpa?

Esse usuário bloqueou você.

Ele procurou, então, em sua agenda o numero dela. Pensou algumas vezes antes de mandar mensagem, mas não achou razões para mandar. Ela o tinha beijado. Ela provavelmente sentia algo por ele, algo que ele nunca seria capaz de retribuir. Ele deveria cortar relações. Assim, ela não sofreria e ele não se apegaria o suficiente a ela. Mas sua cabeça era teimosa.

Jace: Hey, Clary. Aqui é o JC. Vc pode conversar?

Ela visualizou, mas não respondeu. Ele não queria desistir assim tão fácil.

Jace: Foi tudo um mal entendido. Não fique chateada.

Nenhuma resposta.

Jace: Me desculpe. Tenho que ir dormir. Te vejo amanhã?

Jace: Clary...?

Jace: Ok. Boa noite.

E então, quando ele largou o telefone e encostou-se no travesseiro, seu telefone apitou. Era uma mensagem dela.

Clary: Boa noite.

Ele sorriu. Nem tudo estava perdido.