La Guerre

Capítulo 2


Encarou a comida em seu prato com desgosto. Já não estava mais acostumada com a refeição monótona e sem gosto do orfanato. Sabia que não era a única que sentia aquela sensação, não que se importasse com o que as outras crianças pensavam ou sentiam. Nunca se dera bem com elas, nunca gostara delas e elas tampouco gostavam da menina. Nunca brincaram juntas, nunca conversaram ou riram umas com as outras.

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Brincou um pouco com a comida, seus lábios formando uma linha reta cheia de desgosto. Ergueu o garfo, provando um pouco do frango mal cozido que lhe fora dado. Terrível. Sentiu uma risada formar-se em sua garganta, tendo de conter a urgência para soltá-la.

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Mastigou a comida lentamente, um sorriso forçado em seu rosto. O homem sorria, aquele sorriso brincalhão e paterno, divertindo-se com a reação de Michelle. A mulher também sorria, porém, era um sorriso mais gentil, mais doce, mais materno- não via através do sorriso forçado da criança. Engoliu, hesitante, sentindo seu corpo protestar contra aquele ato.

— Como está a omelete, Michelle? A sua tutora me contou que era o seu prato predileto, entretanto, eu não sei se fiz do jeito que você gosta- A preocupação e insegura era evidente na voz suave da dama, seus dedos finos segurando o garfo com certa insegurança.

As habilidades culinárias da mamãe não eram boas. Ou colocava sal demais ou de menos, deixava vezes o fundo queimado e vezes cru, os legumes não eram bem cozidos e nem bem cortados e o cheiro da refeição já era o suficiente para apostar-se o terrível gosto. Mesmo assim, Michelle sorria, mastigando a omelete lentamente, prendendo a respiração como se assim não fosse sentir tanto daquele gosto horrível.

— Está deliciosa, mamãe!- Mentiu, uma mentirinha boba, uma mentirinha que formara um sorriso gigantesco no rosto da mulher.

O papai comia de um jeito engraçado, como se todo o seu corpo estivesse rejeitando a refeição, porém, ele forçava-se a comer, elogiando uma, duas, três vezes a refeição da esposa. A mamãe comia também, de uma forma mais despreocupada, quase como se acreditasse que o almoço realmente estava gostoso. Quase. De repente, largara os talheres, uma expressão surpresa em seu rosto.

— Oh, eu fiz-lhe, também, um suco de uva. É o seu predileto, certo?- Michelle concordou, sua segunda mentira do dia. Preferia de laranja. A mulher levantou-se, indo até a cozinha, não sem antes passear os dedos pelos cabelos negros da menina- Você é uma boa menina, Michelle.

Suspirou, contente. Com a saída da mulher, voltou a encarar a comida com o nariz torcido, até que sentiu outros dedos passearem por seus cabelos. Eram suaves e gentis, um pouco mais ásperos que os da mamãe. Ergueu o olhar, encontrando-o com os gentis olhos azuis do papai.

— Não se preocupe, fui eu quem fez a sobremesa.

Riu, alegremente. O papai também rira. A mamãe não estava no cômodo, mas, tinha certeza absoluta que ela também estava rindo- internamente, ao menos. Todos estavam felizes, do jeitinho que Michelle queria. Uma família feliz.