Looking for Lily Evans

002. Petunia Evans


No auge de seus seis anos, muitas coisas fascinavam a pequena Lily Evans. Truques de mágica. Palhaços. Fogo. Escadas rolantes. Qualquer coisa que mudasse de cor no sol. A própria chuva. Mulheres grávidas. Flores que só se abriam ao meio dia. Matemática e os números em geral. Caixas eletrônicos. A internet.

Muitas outras coisas também.

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Mas, o que mais lhe causava um entusiasmo único e inexplicável àquela altura da vida era uma casa de boneca que ficava no parquinho no fim da sua rua. A possibilidade de entrar e ficar lá por horas a deixava estranhamente animada para uma criança tão nova.

Lily tinha a estranha mania de fugir de casa e ir até lá, demorando horas consideráveis para voltar. Nas primeiras vezes em que isso aconteceu, era possível ver seus pais à sua procura, em um estado claro de desespero. Depois de algum tempo, no entanto, todos se acostumaram com seus sumiços ocasionais.

Porém, quase vinte anos depois da primeira escapada de Lily, sua família já não estava mais tão... tranquila com seu desaparecimento. Principalmente porque ela não estava mais na tal casa de boneca no final da rua. Nem lá e nem em lugar nenhum. Exceto, talvez, em todos os noticiários do país e do mundo, em sites de notícias e, claro, no trending topics das conversas populares.

Não era exatamente fácil que os amigos e familiares de Lily ouvissem o tempo inteiro estranhos comentando sobre ela, sobre sua vida, seus acontecimentos passados, e espicular sobre o que ela fazia ou deixava de fazer, sem saber nada sobre a verdade. Seus pais, em especial, alguns dias depois de seu desaparecimento ser declarado oficial, trancaram-se em casa e recusaram-se até a ir à delegacia.

Não queriam contato com a polícia.

Até descobrirem que o policial responsável pelo caso era James Potter. A notícia caiu sobre o casal Evans como um certo alívio em meio a um amontoado de más notícias. Potter era a única parte naquilo tudo capaz de os reconfortar um pouco, talvez o mínimo possível, e deixá-los minimamente à vontade para seguir com as buscas.

Eles não o viam como James Potter, o agente da polícia designado para liderar a procura por Lily Evans, a estrela em ascensão atualmente desaparecida. Não. Eles o viam como Jay, o melhor amigo da filha, a melhor amizade de infância que ela teve. Ele lhes passava alguma segurança e reconforto em meio a todo o caos.

Das vezes em que se obrigavam a falar de Lily, quando eram acompanhados por James, aquilo tudo se tornava um pouco menos difícil. Nunca mais fácil. Com James seria fácil falar sobre sua filha, a garotinha ruiva que sempre os encheu de orgulho, e como ela tinha sumido, como poderia estar correndo qualquer tipo de risco.

Mas, não era como se fosse fácil para ele também. Anos e anos sem contato algum, vendo-a apenas pela televisão, sempre sorrindo e aparentando uma felicidade inesgotável, e agora era o principal encarregado de descobrir onde ela estava. James passava grande parte do dia olhando aquela manchete de jornal, onde ela sorria em uma foto tirada algumas semanas antes, e se perguntava como.

— Como, Lily Evans? Como você pôde sumir do nada, sem nos deixar pista alguma? Sem me deixar pista alguma?

Depois disso, tudo o que ele fazia era continuar revisando os arquivos disponíveis sobre ela, colher informações de seus pais e se esforçar ao máximo para lembrar tudo o que pudesse sobre a infância que passaram juntos. Era um esforço grande demais, já que James fizera questão de apagar qualquer memória que tivesse ao lado de Lily. Era claro que ele não fazia ideia de que viria a precisar delas de novo.

Era estranho demais ter que conviver com ela mais uma vez, depois de tantos anos, em uma circunstância tão absurda e inimaginável. Diggory deveria ser menos inflexível e liberar que ele pudesse fazer buscas em campo, falar com os outros, colher depoimento daqueles que a viram nos últimos dias antes de desaparecer.

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Mas, não. Diggory queria uma base boa o bastante para sustentar o resto da investigação antes de mandar Potter para fora da delegacia. E, bom, enquanto ele continuasse trancado ali dentro, tendo apenas um recorte de jornal e lembranças fragmentadas como pontapé inicial, as buscas pela estrela Evans demorariam muito mais do que o necessário.

¾¾¾

— Por favor, senhor! — James pedia enquanto tentava manter o tom no nível mais educado que conseguia. Até porque aquela deveria ser sua milésima tentativa de saída, todas negadas. — Tente entender que me manter aqui em nada ajuda a investigação. Posso ser muito mais eficiente lá fora do que aqui dentro, pense nisso. Pense nas possibilidades, e nas evidências ou pistas que podem ser encontradas...

— Vá, Potter! Vá! — Diggory respondeu visivelmente irritado. Talvez estivesse concordando apenas para que James não insistisse mais, e não por realmente querer que ele fosse, ou achar que já era hora de ir. — E só volte quando encontrar alguma coisa.

De repente, a imensa lista de possibilidades que tinha desapareceu. No segundo em que pôs o pé para fora da delegacia com o aval total de fazer o que bem quisesse e falasse com quem lhe parecesse mais relevante de início, as coisas pareceram simplesmente sumir de sua cabeça. Potter, por alguns segundos parado na calçada, dedicou-se apenas a observar o movimento, esperando que aquilo desse algum norte para o que devia fazer.

Se ele não soubesse, com tanta certeza, que Lily estava desaparecida, poderia facilmente dizer que era ela entrando em uma das lojas do outro lado da rua. A moça, pelo menos de costas, era uma cópia fiel dela, e não só pelo cabelo cor de fogo; seu biótipo e, inclusive, a forma como andava eram idênticos. Poderia ser ela ali, a poucos passos de distância, se não fosse a enorme manchete nos jornais que trazia seu nome seguido das palavras sendo procurada.

James precisava encontrá-la, e logo, ou cada pessoa que tivesse alguma mínima semelhança com Lily automaticamente o faria pensar nela. E pensar nela não era o que o deixava melhor, em qualquer aspecto, há muitos anos. Na verdade, pensar nela nunca o tinha deixado melhor, se valesse uma análise mais a fundo, e com certeza não seria àquela altura da vida que isso iria mudar.

Tinha uma enorme vontade de saber para onde ir e nenhuma ideia de como ir. Talvez devesse montar, mentalmente, uma lista de pessoas com quem falar, elencando-as com base na proximidade que com Lily. Isso, de um jeito ou de outro, o levaria aos pais dela de novo e ele já sabia, de antemão, que não adiantaria de nada falar com o casal Evans de novo.

Outra pessoa, no entanto, poderia ser de alguma valia para ele. Pensando bem, qualquer um poderia, mas ela, em especial, com toda certeza tinha algo interessante a dizer. Anos e anos sem contato algum poderiam ser resolvidos em algum lugar público e movimentado, e com uma conversa potencialmente desagradável.

Afinal, Potter nunca tinha sido o maior fã de Petunia Evans. E era um sentimento recíproco, ela ressaltava com recorrência.

Mas, lá estava ele, a caminho dela, depois de tanto tempo. Os motivos que a colocavam como a primeira da lista de pessoas com quem James deveria conversar eram, na maioria, devidos à proximidade com Lily — depois dos pais, Petunia certamente era a mais próxima — e, como não poderia deixar de ser, baseados no que podia se lembrar.

Ao que tudo indicava, e segundo a base de dados da polícia, Petunia agora morava em um bairro nobre, talvez um dos que esbanjavam o custo de vida mais alto de Londres — perdendo apenas para os redutos de pessoas famosas, como era o caso de sua irmã. Ele tinha mais do que a absoluta segurança de que a vida que ela tinha, aparentemente regada ao luxo, tinha elevado sua arrogância a um patamar até então desconhecido.

Petunia Evans era arrogante, esnobe, prepotente, atrevida, malcriada e insolente. Entre muitos outros adjetivos pouco gloriosos. Desde sempre, queria muitas coisas e queria que fossem feitas de imediato, assim que falasse, assim que pensasse. Não aceitava não como resposta e era capaz de levar uma discussão a qualquer nível para que sua opinião fosse enaltecida, suas vontades fossem atendidas ou seus desejos fossem realizados.

Desde que colocara os olhos no garoto franzino, com cabelo desarrumado e óculos quadrados, ela soube que não se daria bem com ele. E assim tinha sido por todos os anos em que sua irmã manteve uma amizade com James. Por pior que pudesse soar, Petunia até comemorou — embora essa não fosse a melhor designação para o que fez — quando Potter já não era mais um amigo bem vindo.

No que tangia sua relação com Lily, as coisas não eram lá muito boas. Discutiam com frequência, quase sempre discordavam e, para que mantivessem uma boa relação em público, era preciso quase uma terapia de choque. Tinha sido sempre assim, desde que eram crianças, e provavelmente tinha sido até a fase adulta, mas ele não tinha muita certeza. Com base no que sabia, e se lembrava, não seria espantoso encontrar Petunia em algum baixo nível de alegria pelo desaparecimento de sua irmã.

Não era incomum, pelo contrário, que as duas se ameaçassem constantemente. Coisa de criança, seus pais diziam sempre que uma delas dizia que daria fim à vida da outra. Agora, no entanto, já não parecia mais uma frase tão sem importância assim.

James respirou fundo antes de tocar a campainha da casa 202. Respirou porque precisava, como sempre, se manter calmo para uma conversa informal, com chances potenciais de ser um interrogatório. Mas, sobretudo, respirou fundo porque quem encontraria ali dentro era a última pessoa que, um dia, achou que iria rever.

— Polícia — se identificou para um homem de meia idade, baixo e gordo, que lhe recebeu na porta. Não parecia muito afim de receber visitas, e deixava isso explícito na expressão fechada e em nada receptiva. — Procuro por Petunia Evans.

— Entre — Potter assentiu e fez o que lhe foi mandado. — Aguarde aqui enquanto a chamo.

No tempo em que ficou sozinho na sala de estar, aproveitou para dar uma boa olhada no que a vida de Petunia tinha se transformado. Um grande e brilhoso lustre — possivelmente de cristais — pendurado no teto; sofás grandes e espaçosos todos no mais limpo e bem cuidado couro branco; uma mesa de jantar com bem mais de dez lugares e fotos. Muitas fotos de família espalhadas por uma prateleira de madeira tratada e lustrosa.

Em nenhuma fotografia, no entanto, ele a viu ao lado de Lily, embora várias delas fossem de seu tempo de criança.

Toda a casa estava em silêncio, como se não morasse uma só pessoa ali. Mas, de um segundo para o outro, tal silêncio fora preenchido com o som irritante e repetitivo de salto batendo contra o chão. James soube, de imediato, que ela estava se aproximando.

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— Potter — a voz dela ainda era a mesma, mas com maturidade evidente. O tom, sempre seco e sem qualquer vivacidade, tinha permanecido intacto ao longo daqueles anos. — O que faz aqui?

Petunia não tinha mudado em nada, e isso era visível. Continuava com a antipatia exposta no rosto, os olhos azuis gélidos emoldurados por longos fios loiros. A pele, sempre pálida, dava a qualquer um a impressão de que ela não tinha cor, não tinha vida, e, na maioria das vezes, isso mostrava-se verdadeiro.

— É sobre o sumiço da Lily? — ele concordou. — Ah, pelo amor de Deus! Está em todos os jornais, não precisa vir até a minha casa espicular sobre isso, basta ler.

— Petunia, em primeiro lugar, eu não vim espicular nada. E, se essa fosse minha intenção, eu não viria até você. Em segundo, eu sei que está em todos jornais. Por último, eu vim fazer perguntas — respondeu, já sem paciência, mostrando o distintivo ao terminar de falar. — Por favor, sente-se e colabore.

Com certo desconforto, ela se sentou. Talvez estivesse desconfortável pelo motivo da visita — não era tão certo categorizar dessa forma — de Potter; ou por ter que falar sobre Lily, mais uma vez, quando esse era um assunto no qual ela não gostava de tocar. Sobretudo, seu desconforto provavelmente era devido ao fato de estar sendo obrigada a obedecer alguém.

E, sendo James Potter esse alguém, a pessoa com quem Petunia nunca tinha se dado tão bem nos anos em que conviveram, ter de obedecê-lo era particularmente difícil. Mas, atendo-se ao pensamento de que, quanto antes colaborasse e terminasse com aquilo, antes estaria livre, acabou dando a ele a permissão de perguntar o que precisava ser perguntado.

— Qual foi a última vez que você a viu, antes do desaparecimento?

— Um ou talvez dois dias antes.

— Onde?

— Aqui.

— Ela mencionou alguma coisa? Que alguém pudesse estar a seguindo, ou a observando? — Petunia negou enquanto ele anotava as respostas, embora fossem vagas e monossilábicas. — E quanto a nomes? Ela falava algum com frequência? Alguém com quem possamos conversar também.

— Black. Sirius Black, o namorado, ou o quer que ele seja dela.

Aquele nome causou a Potter uma sensação que mal podia ser descrita. Sirius era um diretor e produtor de cinema, tinha sido responsável pelo último trabalho de Lily — um filme de drama, muito bom, aliás — com o qual tinha conseguido mais do que algum reconhecimento e aumento na sua notoriedade. Aparentemente, segundo as revistas de fofoca e sites de tabloides, os dois engataram um relacionamento durante as filmagens.

Sempre que apareciam juntos, fosse em premiações ou em algum evento, esbanjavam um tipo até então não visto de conexão e harmonia. Formavam um casal bonito visualmente, além de rentável. Muito rentável. Qualquer entrevista exclusiva que dessem custava milhares de libras; ter seus rostos expostos na primeira página era sempre resultado de uma transação absurda de dinheiro.

Não poupavam elogios um ao outro, nem mesmo quando eram encontrados por paparazzis em algum momento particular. Se, sozinha, Lily conseguia atrair mais atenção do que muitas pessoas no mesmo ramo artístico, estando acompanhada do diretor de cinema mais ascendente da atualidade, era impossível que ela não fosse o centro das atenções.

De longe, estando na mesma posição que sua legião de fãs, James acompanhava algumas notícias porque simplesmente não tinha como desviar delas. Mas, se pudesse, com certeza escolheria não ser obrigado a ver o rosto da ruiva no noticiário do horário do almoço, quando o foco do programa era fofoca sobre artistas. Também optaria por não a ver nos jornais, na sessão de destaque.

Na verdade, ele sempre preferiria não precisar olhar para o sorriso, nem para os olhos, nem para o cabelo, nem para o nome, para nada de Lily, se tivesse a chance.

— Como era a relação deles? — voltou a perguntar.

— Por quê? Quer saber se era ruim o suficiente para ela te dar uma chance? Sabe, a chance do ensino médio, que ela não te deu naquela época.

— Petunia... Pelo amor de Deus — Potter respirou fundo, mantendo a maior calma que conseguia para que não acabasse respondendo algo que não deveria. A capacidade que Petunia tinha de tirá-lo do sério era enorme, com comentários desnecessários e, principalmente, que o atingisse de alguma maneira. — Responda as perguntas. Não diga nada além das respostas.

— Não era boa, na verdade era péssima, pelo menos o que eu via. Parecia a coisa mais linda do mundo na televisão ou na internet, mas, na realidade, era um pesadelo. Eu não iria querer algo daquele jeito para mim, e não sei porque Lily queria para ela.

— O que você quis dizer com era um pesadelo?

— Sirius Black aparenta ser o homem perfeito, sabe? Muitas mulheres com quem eu convivo dizem, com frequência, que adorariam estar no lugar dela, e eu acabo concordando porque infelizmente não posso discordar. Mas, de perfeito ele deve ter apenas a conta bancária — Petunia dizia como se precisasse, de fato, ter a chance de dizer tudo aquilo. Seu tom mudou de debochado para algo que beirava o confessionário. — Ele é ciumento, possessivo, explosivo. Gosta de mandar nos outros, e parecia ter um apreço especial em mandar nela.

“Mas, você sabe, Potter, Lily não é o tipo de pessoa que aceita ordens com facilidade, não é? — ele concordou, sem interrompê-la. — As coisas aconteciam mais ou menos em um ciclo: Sirius mandava, Lily não obedecia, os dois entravam em uma briga intensa e quase eterna, que a desgastava demais emocionalmente. Depois, sobrava que eu a consolasse. Por isso era um pesadelo.”

James anotou aquilo tudo, sabendo que, querendo ou não, seu próximo destino seria Sirius Black.

— O que ela dizia sobre ele? Seja específica.

— Mais de uma vez, Lily falou em terminar, mas demorava um ou dois dias para que abrisse mão da ideia. Não sei o que a fazia desistir disso, mas tinha alguma coisa. Sempre tinha. Acho que eles eram rentáveis o suficiente para fazer valer a pena.

— Certo. Obrigado, Petunia. Vou lhe manter informada sobre qualquer nova informação que apareça — ele a agradeceu e, antes que se alongassem em algum outro assunto, caminhou até a porta. — Até mais.

— Até.

Falar com Petunia era sempre desgastante. Ela era dona de um humor ácido, que era sempre capaz de causar um enorme desconforto com algumas palavras. A capacidade que ela tinha de ser cínica, no entanto, era um atributo que James passou a conhecer naquele dia. Talvez por ter sido muito transparente nos anos em que conviveram, ele não tenha tido a chance de se preparar para o cinismo que ouviu.

Tal cinismo, no entanto, não era tão descarado. Nada com Petunia era. Estava sutilmente escondido entre as frases que descreviam a relação de Lily com Sirius. E Potter sabia muito bem disso porque, mesmo depois de anos, ainda conseguia lê-la e saber quando mentia.

Ela ainda mentia muito bem.

Àquela altura, com algumas informações a mais, ele já poderia se considerar com alguma coisa, como Diggory havia pedido. Com um sorriso duvidoso no rosto, mas um pouco mais de material do que tinha naquele mesmo dia cedo, James voltou para a delegacia. Não tinha mais nada para fazer naquele caso, no Caso Lily Evans, então esperava que, depois de fazer o que precisava fazer, pudesse ir embora mais cedo.

Ir embora mais cedo sempre, sem uma única exceção, significava deixar alguma quantia de dinheiro no balcão de um pub que estivesse no caminho. Potter até faria isso, e estava realmente animado com essa possibilidade, se, no segundo antes de levantar e seguir seu rumo para fora dali, uma confusão loira não tivesse adentrado a delegacia.

Já fazia algum tempo, algum tempo considerável, desde que ele não via a figura parada à sua frente. Por isso, talvez, tivesse levado um ou dois segundos a mais que o normal para reconhecer os traços e ligá-los à pessoa; mais dois segundos para que um nome surgisse diante de seus olhos, seguido de uma, infelizmente, incontrolável sequência de lembranças.

✣✣✣

— Por que você não pega toda essa sua futilidade nova, adquirida não sei de onde, e continua sendo o capacho daquelas duas? É um favor que você vai fazer para si mesma, e para mim! — ele gritava, sem se importar com o fato de sua voz estar muito mais alta do que o normal.

— O que você está falando? Pelo amor de Deus.

— Pelo amor de Deus digo eu! Você não percebe, não é? Claro que não percebe, mas vou te ajudar. Ninguém suporta aqueles dois projetos de patricinhas fúteis, mas você, milagrosamente, consegue essa proeza. Sabe por quê?

— Por quê?

— Porque você é tão fútil, mesquinha, insensível e, a partir de agora, detestável como elas.

— Não olha mais na minha cara, nunca mais! — a resposta veio num tom cortante e isso era quase palpável.

— Com prazer.

✣✣✣

Depois de piscar os olhos algumas vezes, talvez mais do que precisaria em outra situação qualquer, e de respirar fundo um par de vezes, James finalmente acabou com o silêncio. Pensou, em uma velocidade mental absurda, no que deveria dizer, ou no que dizer primeiro. Afinal, eram muitas e muitas coisas que precisavam ser ditas, mas não todas de uma única vez.

— Vance — disse, por fim. — Qual o motivo da sua ilustre presença aqui?

— Não banque o desentendido, Potter. Você sabe — ela respondeu, com a ironia ainda presente na voz. — Lily Evans é o motivo pelo qual eu vim, afinal, qual outro seria?

Potter fechou as mãos, apertando-as para que não acabasse dando alguma resposta indevida. Desde que podia se lembrar, responder coisas nada louváveis era praticamente tudo o que dizia para Vance, e vice-versa.

— Certo. O que é?