Durante o Fim

Décimo Sexto Dia - Rony


Quando o intruso mecânico saiu de ação, deslizando para fora pela mesma porta da qual entrou, não era o fim. O pesadelo não terminaria jamais… Ou só terminaria até que todos eles estivessem mortos ou subjugados por outra espécie. Foi com esse pensamento pessimista que Rony viu as coisas começarem a descer.

Acenando para os filhos, ele e Hermione acomodaram Hugo e Rose embaixo das pesadas prateleiras de ferro do quarto de armamento de Smith enquanto Rony implorava pela décima vez que o homem se calasse. “Eu prometo ajudar você a cavar aquele túnel”, sussurrou em desespero para o sujeito, afim de lhe oferecer alguma barganha. Ele acabou concordando, os olhos não deixavam de refletir o brilho alucinado de um louco incontrolável, e os três adultos se esconderam por detrás de um amontoados de caixas de metálicas da qual o ruivo não estava nem um pouco interessado em saber sobre seu conteúdo.

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Hermione quis se agachar para ficar o mais próximo possível das crianças, mas Rony a puxou de volta contra o seu peito, pois não havia mais tempo. Eles acabavam de descer no porão e, em breve, inspecionariam o quarto. Abraçando sua esposa firmemente, existia uma vasta possibilidade de ser a última vez que ele poderia fazer isso, desejou que os filhos se mantessem protegidos e em silêncio e, principalmente, que as coisas não os encontrassem.

Os barulhos no pequeno espaço sala-cozinha iniciaram. Coisas sendo derrubadas, arrastar de móveis contra o chão e os arrepiantes atritos, semelhantes a passos bípedes. “Eles deveriam ter fechado a porta do quarto”, pensou Rony, apavorado. Então pensou de novo e, talvez, isso fosse suspeito demais já que a sonda inspecionara o porão com a porta justamente daquele modo.

Uma das coisas avançou pelo corredor, a escassez de luminosidade ali criando formas extraordinárias e inimagináveis ao que viria. Hermione agarrou o corpo de Rony com força, ela tremia. Ele não estava muito melhor, prendendo a respiração sem saber se a criatura poderia ter uma super audição igual a de um cão. Smith suspirou ao seu lado, agarrando uma maldita pistola que ele convenceu Rony, mais por falta de tempo do que por tato, a portar para o caso da coisa sair do controle. Quem causara aquele descontrole todo fora ele, oras!

O alienígena parou sobre a soleira da porta e encarou a vastidão escura do quarto. Era um ser baixo, do tamanho de uma criança de dez anos, mas com uma cabeça gigantesca em formato triângular. Sua pele translúcida refletia a baixa luz lunar provinda das janelinhas retangulares e sua postura corporal encarquilha.

Rony teve a impressão de que ele estava tentando cheirar o ar e esperava que não fossem os humanos, e sim a fossa séptica abarrotada, desembocando e causando um odor desagradável no sanitário ao lado. Ele começou a andar na direção das prateleiras e dos entulhos, a cabeça girando rapidamente para todos os lados. Quando se aproximou do local onde Hugo e Rose estavam, teve um desejo surdo de arremessar um dos objetos que o cobria e protegia, contra aquilo. Não o fez. Ficou muito parado concentrando todos os seus sentidos no movimento do alienígena. Ao fundo, a barulheira na sala-cozinha prosseguia. Haviam mais.

A coisa de cabeça geométrica pegou algumas das sucatas bélicas de Smith na mão para, em seguida jogar ao chão, desinteressado. Continuou andando, se afastando das prateleiras e inspecionando as caixas. Pela mínima fresta que permitia Rony visualizar o que acontecia no quarto, ele vislumbrou, muito de perto, o olhar da criatura. Eram dois olhos grandes e pretos, sem pupilas, tão frios e desalmados, que o ruivo imediatamente os remeteu a de um tubarão. “Então eram aqueles olhos, aquele bicho extraterrestre, que dirigia os tripods e dizimava a população humana sem pestanejar?”

O que eram? De onde vinham? Por que matavam daquele modo? Eram algumas das perguntas que passava pela cabeça do Weasley pai enquanto observava o alienígena de perto.

Um segundo alienígena passou pelo corredor e sumiu para dentro do outro quarto. Mais barulheira, mais anarquia, mais pânico contido. A coisa inspecionando aquele cômodo também não parecia ter hora para sair… Até que uma terceira figura, este parecia ter a cabeça um pouco maior, pela pouco que Rony conseguiu identificar de sua silhueta à sombra, produziu um estalido com suas cordas vocais, um som que ficaria impresso para sempre na memória do ruivo, e chamou a atenção dos outros dois iguais espalhados pelos quartos. A coisa próxima a eles retribuiu a comunicação e saiu dali jogando uma lata enferrujada que servia de alimentação do exército americano na Segunda Guerra Mundial, no chão, desinteressado.

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Quase uma hora depois que tudo se aquietou no porão foi que Rony e os demais tiveram coragem de se movimentarem e saírem de seus esconderijos…

***

Havia amanhecido. As máquinas extraterrestres voltaram a todo vapor, produzindo seus ruídos intimidadores pelo vale, trabalhando naquele grande açougue humano. Os Weasley reforçaram a porta do porão com os móveis mais pesados disponíveis e Rony entregou uma das armas enferrujadas do depósito militar do anfitrião, para Hermione. Ele portava outro. Nada era certeza, contudo existia a fatídica possibilidade de a próxima vez ser a última… Iriam até às últimas consequências...

Smith voltou para o quarto, batendo a pá contra a terra e gritando, como ele fizera durante a madrugada, embora agora chamando Rony para cumprir sua parte no acordo. O casal não tinha força para mandá-lo calar-se e o motivo era que durante o dia dificilmente os berros daquele sujeito sobrepujariam os sons dos tripods funcionantes, acima deles.

ー Eu não tenho mais escolha… ー Rony suspirou, sentado no sofá, Hermione ao seu lado. Ele torcia o cabo da pá que Smith pusera em sua mão minutos atrás, antes de retornar para sua tarefa insana.

ー Eu posso ajudar…

ー Não, Mione. Jamais vou querer que você suje suas mãos.

ー Mas e você? Eu me importo também… ー ela segurou em seu braço, o fitando com angústia.

Uma lágrima solitária escorreu pela bochecha dele ao encará-la de volta. Então baixou os olhos… Sentia que se ficasse mirando Hermione por muito tempo se reconectaria a sua humanidade e perderia a força… Não poderia perder a força, tinha de aproveitar enquanto a chama da vingança, o instinto protetor de um pai, de um marido, continuava queimando dentro dele. Ver Hugo, Rose ou Hermione despedaçados por uma mera imprudência, por covardia, o destruiria por completo. Ele precisava agir.

ー Saber que você se importa comigo desse modo já me conforta, Mione ー murmurou para a morena lhe dedicando um sorriso fugaz, sem alegria.

ー Ron… ー ela respirou forte vendo-o se levantar. Queria impedi-lo, Rony sabia, mas não poderia se também compactuava com a ideia de manter eles a salvo pelo máximo de tempo que conseguissem.


ー Só distraía Hugo e Rose… Por favor… ー ele pediu, agarrando o cabo da pá fortemente entre os nós dos dedos e se encaminhando para onde Smith estava.. para terminar o serviço.