Oposto Complementar
Capítulo 23
Eu quase não dormi essa noite. Saí da cama cedo e fui fazer meus exercícios, a fim de esvaziar a cabeça. Essa coisa toda de achar um presente para Eleanor está me matando. E ainda teve a conversa com Matheus. Claro que depois que Harry foi embora, achando que eu tinha dormido, eu aproveitei para puxar a orelha da minha amiga, mesmo que à distância. Eu adoro a Marcela. Ela é linda, forte, determinada, confiante e não se deixa intimidar por nada nem ninguém, além de ser empoderada e feminista. Só que eu não estou conseguindo aceitar o que ela fez. Eu sei que devia uma conversa franca ao Matheus, mas fazer isso na frente do Harry foi estranho.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Agora estou aqui, sob o chuveiro, lavando meus cabelos molhados de suor. Sim, eu suei malhando mais cedo, porque depois de três meses, estou começando a sentir o resultado. Talvez seja por isso que eu ando abusando dos croppeds. O que tem irritado Harry sempre que alguém vem fazer entrega e ele não me permite atender. Eu nunca fui o tipo de garota que se preocupa demais com a aparência. O problema é que andei abusando do chocolate quente, já que preciso de algo para aquecer o meu interior, então, eu acabei ganhando uns quilinhos e resolvi me manter em forma.
Eu saio do banheiro, com os cabelos enrolados numa toalha, como se fosse um turbante e no closet, procuro o que vestir. Pego uma camisa de mangas e decote redondo, uma jaqueta de couro pretos, uma saia em suede de cintura alta e um pouco justa caramelo e um conjunto de lingerie preto da gaveta. Visto-me rapidamente, deixando a jaqueta sobre a cama e vou cuidar dos cabelos, secando um pouco com o secador. Penteio e prendo num coque. Calço botas de cano médio preta e saio do quarto, encontrando Harry entrando.
Eu já perdi as contas de quantas vezes o vi de terno e gravata, mas é sempre lindo de se ver e como se fosse a primeira vez. A partir da próxima semana, estarei me juntando a ele nessa forma mais séria de se vestir, se tratando do fato de que eu me tornarei uma funcionária e não apenas uma assistente. Eu adoro dividir a sala com Harry, mas infelizmente terei que ir para a minha.
— Bom dia, meu doce. — Ele me dá um meio sorriso, já com os cabelos presos num coque.
— Bom dia. — Termino de descer a escada e o cumprimento com dois beijos.
— Não dormiu bem? — Harry afaga a minha olheira e eu nego.
— Cabeça cheia. Embolei na cama centenas de vezes.
— Por que não me pediu para ficar? Eu teria o maior prazer em te fazer companhia.
— Você precisava dormir. Tivemos um dia longo ontem. Vamos comer. O dia de hoje não será muito diferente.
***
Por que eu não a olhei ontem? Eu me questiono no exato momento em que Harry para para conversar com ninguém menos que Olivia Davies. Ela tem a minha altura, os cabelos pretos compridos e levemente ondulados. O sorriso dela é formidável, ela é negra e magra. Provavelmente é modelo, do contrário, eu não tenho ideia do que ela faz. E se veste tão bem, apesar de estar de jaqueta de couro marrom, jeans e camiseta branca por dentro. Sua maquiagem é discreta, os olhos castanhos e os lábios volumosos.
Estamos diante do restaurante que descobri ser de Damon em sociedade com a chefe, Bella Turner, La Fleur D’or, onde costumamos almoçar e é um lugar divino. O que é de se esperar, já que é uma propriedade do Lundgren. Eu decido entrar, enquanto ela dá toda a sua atenção a ele e sou guiada até a mesa de sempre.
Eleanor está entretida numa conversa com o marido. E tão linda que dói. Claro que ela está usando um terninho preto, com camisa interna branca, mas isso só melhora a situação.
— Oi, mãe, oi, pai.
Ambos levantam e me cumprimentam.
— Cadê o Harry? — Eleanor volta a sentar, e eu me acomodo antes que George puxe a cadeira para mim.
— Lá fora, com a Olivia Davies.
— Como é?
— Eu vou embora. — George se afasta, mas a esposa segura em seu punho a tempo e ele a olha.
— Você não vai me deixar aqui sozinha.
— Ele a trará e eu não quero.
— Vocês têm algum problema com ela? — Questiono, de cenho franzido.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!— Você não pode fazer isso comigo ou Laila. Pela nossa filha, fique.
Ele suspira e senta.
— Eu não estou entendendo.
— Vai entender em breve, querida. — Ellie segura em minha mão, de frente para mim.
E Harry não demora a entrar com a mulher com quem conversava lá fora.
— Senhor e senhora Carter. Que prazer os rever depois de tanto tempo — diz ela.
— Como vai, Olivia? — O tom de voz da Eleanor é contido.
— Bem e a senhora?
— Também, obrigada.
— Senhor Carter.
George simplesmente acena com a cabeça, ao meu lado direito. O garçom coloca uma cadeira para a negra e ela me olha.
— Oli, essa é a Laila — diz Harry.
— Sua governanta? — Ela pergunta.
— O quê? — Ergo as sobrancelhas.
— Como se atreve a questionar uma coisa dessas? — Ellie, dessa vez, se altera.
— Está tudo bem, mãe. — Tento a reconfortar.
— Não está nada bem, Laila. — Ela fuzila a Olivia com os olhos semicerrados.
— A Laila não é minha governanta, Olivia. Ela é minha vizinha, melhor amiga, confidente e meu tudo. — Ele me olha e sorri.
Desvio os olhos dos seus, sem graça, mas logo ergo a cabeça. Governanta. Era só o que me faltava.
— Desculpe, Laila. Eu te vi com ele fazendo compras ontem à noite e me precipitei. — Ela senta.
Fazemos os nossos pedidos. Quer dizer, Ellie pede para mim, já que é sempre assim.
— Harry estava me ajudando. Ele é tão organizado e controlado que é de grande importância que esteja comigo nessa tarefa, por mais simples que possa parecer. Ah, mãe, e o que vamos fazer para comemorar o dia mais importante do mundo? — Mudo de assunto.
— Que dia é esse? — Ellie me dá um meio sorriso.
— O dia dez de maio.
— O meu aniversário é tão importante assim para você?
— Sem sombra de dúvidas.
— Ah, querida. — Ela me pede a mão e eu lhe dou, recebendo um afago no dorso.
— Eu estive procurando algo para lhe dar, entretanto...
— Eu já tenho tanta coisa, amor. Você não precisa me dar absolutamente nada. Até porque, você já me deu.
— O quê?
— Depois que tive Harry, meu sonho era ter uma filha, todavia, não pude ter. Então depois que você me acolheu como sua mãe, eu tive o sonho realizado.
Eu sinto meus olhos marejarem.
— A senhora a adotou? — Olivia questiona e Ellie concorda.
— George e eu fizemos.
— Você é de onde? — Ela me olha.
— Brasil — digo.
— E nós não poderíamos ter feito coisa melhor na nossa vida. — Ellie continua.
— Acho bom parar antes que eu chore aqui. — Faço beicinho.
— E não apenas meus pais a acolheram na família, como todos os Carter — diz Harry, orgulhoso. — Principalmente depois de Laila ter feito a Alexis voltar a falar.
— Como? Contando alguma piada? — Olivia me olha outra vez.
Eu fico calada.
— Mais uma dessa, Olivia, e eu retiro você da minha mesa. — Dessa vez, é George quem vem em minha defesa.
— Calma. É que dizem que no Brasil é muito comum ter humoristas. Achei que ela também fosse uma.
— Se você soubesse da importância desse ato, não continuaria com suas piadinhas. — Ellie a repreende sem hesitar.
O garçom traz nossos pedidos.
— Ih, tem anchova? — Questiono ao ver e o homem concorda. — Desculpe. Eu tenho alergia.
— Eu não sabia, querida — diz Ellie. — Eu quem devo pedir desculpas.
— Eu posso trazer outra sem a anchova — diz o garçom, pegando o prato.
— E sem pimentão, pois eu também tenho alergia. Desculpe por isso, senhor.
— Não precisa se desculpar.
— Pode, por favor, pedir a Bella que faça algo mais simples? Eu sei que posso estar abusando...
— Eu vou pedir que ela venha aqui.
— Oh, não. Não a atrapalhe.
— Acredite, vai ser melhor assim. Com licença. — Ele se afasta.
— E o que vamos fazer para comemorar seu aniversário, mãe? — Volto ao assunto.
— Fui praticamente intimada a fazer um coquetel — diz ela. — A Elena Champoudry estará presente.
— E quando vai ser? — Eu tento me controlar.
— Na sexta-feira à noite.
— Com licença — diz Bella, se aproximando. — Laila, querida, desculpe pelo erro.
— Por favor, não se desculpe. Eu não olhei os ingredientes. A culpa é toda minha.
— Soube que deseja algo mais simples.
— Pode ser somente uma salada de tomate e alface.
— Pode deixar. Eu vou cuidar para que não venha mais nada com anchova ou pimentão para você.
— Muitíssimo obrigada pelo carinho e atenção.
— Amiga do Damon é amiga minha. — Ela me dá uma piscadela — E, acredite, eu não ia ficar muito feliz se você tivesse dispensado a minha presença.
— Desculpe.
— Não precisa se desculpar nem agradecer. Seu pedido será trazido em breve. Com licença.
E Bella se afasta.
— Tem chefe mais atenciosa que ela? — Olho para os meus pais e eles negam.
— Mais uma vez, querida, me desculpe. Você sempre confia seu pedido a mim.
— Está tudo bem, mãe. Sério. Fica tranquila. Eu quem sou muito fresca.
— Isso não é frescura. É coisa séria.
— Certo. Voltando ao assunto: eu não tenho roupa para o seu coquetel.
— Podemos ir às compras depois do almoço. Ainda não fizemos um programa de mãe e filha.
— Tem toda razão, mas eu tenho que fazer umas coisas na empresa. Estou quase andando com minhas próprias pernas. O problema é que quando eu menos espero, encontro Harry segurando a minha mão.
— É para que você perceba que jamais estará sozinha — diz ele.
— Eu não me sinto só desde que você entrou na minha vida, meu amor. — Beijo a sua bochecha. — Mas seus dias estão contados.
— Eu ainda não consigo aceitar essa ideia. — Harry olha para o pai. — Por que a Laila não pode continuar dividindo escritório comigo?
— Porque você é o vice-presidente e a Laila vai começar a andar com a próprias pernas definitivamente. — George sorri para mim e eu pego o meu copo de suco. — Quem sabe, mais na frente, você não ocupa o meu lugar e ela o seu?
Eu me engasgo com o suco.
— Laila! — Harry se apressa a me ajudar, enquanto eu tusso.
— Eu... eu estou bem — digo, tentando regular a respiração. — Pai! — Bebo da água, a fim de refrescar a garganta ardida. — Ei, de onde tirou essa ideia?
— Você tem se dedicado tanto que, se permanecer desse jeito ou melhorar, claro que vai chegar à vice-presidência. Questão de tempo.
— E de estudos. Não quero chegar lá sem o doutorado, no mínimo.
— Certo. Vai ser o seu prazo.
***
— Eu posso pegar os meus pertences na empresa? — Questiono, quando estamos na calçada, esperando trazerem o carro do papai. — Além do mais, preciso escovar os dentes. Não abro mão dessa mania brasileira.
— Meu amor, você pode tudo. — Eleanor afaga o meu rosto.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Olivia puxa Harry para longe, antes que ele fale alguma coisa. Ellie me abraça e beija a minha cabeça. É tão maravilhosa a sensação que ela me passa que, por mim, eu ficaria o resto da minha vida. Quando eu menos espero, Olivia está beijando Harry. Eu fecho os olhos, querendo evitar ver onde isso vai parar e mamãe me guia para o banco de trás. Eu entro sem pestanejar, coloco o cinto e logo estamos saindo da frente do melhor restaurante francês de Londres. E, quiçá, do mundo.
Na CCC, eu saio do carro e abro a porta para Eleanor. Vamos os três em direção ao elevador. Ellie segura na mão do esposo e eu estou abraçada a ela. Entramos na cabine e no andar da presidência, eu me apresso ao escritório do Harry. Pego o meu chaveiro da sua gaveta, meus pertences e vou escovar os dentes. Como viemos de carro e ele foi andando, provavelmente terei um tempo de sobra. Eu apenas espero não o encontrar mais por hoje.
Somente quando estou dentro do carro da Eleanor é que eu me sinto relaxar. Eu vejo Harry se aproximar da entrada da empresa, porém coloco meus óculos escuros como se não o tivesse visto.
— Você está bem?
— Estou, mãe. — Apoio a cabeça em seu ombro e ela segura em minha mão.
— Entendeu por que George e eu não gostamos muito da Olivia? Ela é uma pessoa linda, mas as atitudes dela e palavras descabidas não me agradam nem um pouco.
— Você acha que tem alguma chance de ela e Harry namorarem?
— Sinceramente, eu não sei.
— Eu apenas espero que ele não se afaste de mim.
Logo estamos parando no estacionamento do shopping. Meu smartphone toca e eu o pego de dentro da bolsa, vendo o nome do Harry junto com sua tela. Eu silencio, espero pelo fim da chamada e coloco no modo silencioso. Saio do carro quando o John abre a porta para mim.
— Obrigada, John. — Dou um pequeno sorriso.
— Não tem de que, senhorita Vidal.
Caminho com mamãe, de braços dados, em direção ao interior do shopping, ciente de que o motorista nos segue.
Eu realmente me privei de certas coisas na minha vida durante o ensino médio. O que irritou a Marcela. E quando eu subia para a casa dela, não tinha como a convencer de me deixar ir descansar, depois de um dia cheio onde eu me dividia entre estudar, ser babá dos meus irmãos e ainda trabalhar.
E agora me bateu um leve arrependimento de ter terminado com o Matheus. O ruim é que eu realmente não ia conseguir manter o relacionamento à distância. Até porque, esta começou a surgir quando passei a me dedicar ainda mais aos estudos para não ter problemas para vir.
Mas por que eu estou pensando nisso? Por que eu vi o Harry beijando outra? A vida é dele. Harry é solteiro. Tem mais é que aproveitar a vida mesmo. Eu apenas não sei quando vou começar a fazer isso. Não posso voltar a me privar. Já sou maior de idade, independente e empoderada. Vou curtir a minha vida do jeito que deve ser.
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