5 Colours in Her Hair

Para termos sucesso é preciso esforço.


109 dias antes do baile

LILY

Até o fim dos meus dias eu provavelmente não saberei dizer como acabei aceitando e compactuando com tudo aquilo. Ser popular, conquistar o cara popular, conquistar todo o grupo popular, exigia bastante esforço, e bastante mentiras também.

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— Não, mãe. Está tudo bem — acalmei minha mãe ao telefone. Ela estava começando a se preocupar com minhas “mudanças”. Okay sua filha ser reclusa em casa e ter o cabelo pintado de cinco cores diferentes. Mas não está okay ela começar a se preocupar com roupas, maquiagem e alimentação. — Eu me viro no jantar.

— Se você quiser, pede pra entregarem alguma comida — disse ela. Estava em um surto de remorso por não ter tido tempo de abastecer a geladeira. Esse era provavelmente uma trabalho que eu deveria começar a exercer.

— Pode ser. Mas não se preocupe não, mãe — de acordo com a dieta de Marlene, eu provavelmente pularia o jantar.

O horário de descanso dela acabou, e nos despedimos. No começo, logo que ela começou com os turnos extras, mamãe ligava para mim o tempo todo. Acho que ela tinha medo que eu me sentisse solitária. Ou ela se sentia solitária naquele hospital, quem sabe.

Morte não tem lógica, penso eu. Em um momento você está com sua família, planejando a compra de um carro novo, completando seu quadragésimo primeiro aniversário, observando a mais nova apresentar o projeto na feira de ciências, pensando que no próximo ano será a vez da mais velha ir para a faculdade. Mas está tudo bem, você e sua mulher têm tudo planejado, você só tem a agradecer pela família linda que construiu. Então você morre. Do nada, você não existe mais.

E o mundo nem fica sabendo. Cobradores ainda ligam para sua casa perguntando sobre o Sr. Evans. Ainda encontram sua esposa na rua e perguntam como anda Carl. O que antes estava okay, agora desmorona na família. O que fazer com os casacos e sapatos que você não vai mais usar? Como sua esposa, sua jovem e linda esposa, pode conseguir sobreviver ao dia a dia, alimentando duas bocas famintas, mesmo com o coração partido? E elas? As suas crianças? Como elas podem acordar sem você? Sem seus abraços e beijos? Quem vai amedrontar os namorados da mais nova? Aconselhar a mais velha quando ela for para faculdade? Não tem lógica em morrer.

Quando meu pai morreu, cinco anos atrás, nós acabamos por enfrentar o pior momento de nossas vidas. Por mais que você queira apenas chorar e sentir a perda irreparável em sua vida, ainda existem aqueles detalhes práticos, como por exemplo, como íamos nos sustentar ?

Rapidamente descobrimos que a pensão que o governo fornecia não dava para muita coisa. Meu pai acabou sempre por fazer muito dinheiro fora do serviço, dinheiro esse que agora fazia falta.

As economias foram acabando, as contas se acumulando. Petúnia tinha que ir pra faculdade, exatamente como papai queria, mas com que dinheiro?

Primeiro tivemos que arrumar uma casa menor. Menor e mais barata, uma que pudéssemos pagar. Depois de cinco anos o lugar já era tão familiar quanto qualquer coisa, embora o bairro nunca deixasse de ser o pior ambiente possível para se viver. Então os turnos no hospital dobraram. O carro foi à venda. As dívidas diminuíram, mas as economias eram nulas. O dinheiro era contado para as despesas da casa e da universidade. Nenhuma possibilidade de melhora.

Olhei para a tela do celular onde o aviso de chamada encerrada dividia espaço com o de uma nova mensagem.

— Sirius está perguntando qual a cor da calcinha que eu estou usando agora — contei para Marlene após ler a mensagem.

— Me atualize, por favor. Quando vocês começaram a falar sobre a roupa íntima um do outro?

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A morena estava deitada na minha cama havia um bom tempo, coisa que estava se tornando estranhamente frequente. Havia muito tempo desde que eu tivera “amigas” que frequentavam minha casa, ou coisa do tipo. Não que eu pudesse classificar a McKinnon exatamente assim. Nós tínhamos uma relação quase trabalhista.

— Ele perguntou minha cor favorita — expliquei, deixando Sirius no vácuo por mais um tempo. Eu ia acabar pagando por isso com uma sumida repentina ou uma saída brusca. Meros mortais não deixam Sirius Black falando sozinho, afinal. — Eu disse que dependia do objeto em que ela estava. Aí ele apareceu com essa pergunta da calcinha.

— Por que você não respondeu uma coisa mais simples, Evans? — bufou ela.

Marlene reclamava, mas eu particularmente achava que eu estava me saindo muito bem. Havia se passado uma semana desde que conversei — realmente conversei — com Sirius. Desde então, conversávamos nos corredores — e ele tinha aquela desagradável mania de ficar enrolando mechas do meu cabelo nos dedos — e trocávamos mensagens — sempre com a supervisão rígida de Marlene ou James.

— Faz parte de fingir ser enigmática, creio eu — respondi revirando os olhos.

— Diz que isso não é do interesse dele — respondeu ela. — Por acaso você não sai por aí perguntando a cor da cueca dele. Está cedo demais para esse tipo de indecência.

— Semana passada vi você marcando uma sessão de amassos com um cara que havia conhecido duas horas antes — lembrei, enquanto elaborava a resposta para Sirius. — Você quer mesmo falar sobre coisas precoces?

— Mas esta sou eu, Evans — riu ela. — Existe um abismos entre as coisas que você está preparada para fazer, e as coisas que eu faço.

Corei involuntariamente.

Parte de se conviver com Marlene McKinnon e James Potter era ser constantemente lembrado do quão inexperiente você é, e como sua vida é uma porcaria. Os dois possuíam aquele prazer de apontar cada falha, e cada idiotice sua, e destacar o quão maravilhosos, sortudos e perfeitos eram.

E mesmo assim, a arrogância do casal não era nada comparada a arrogância de Sirius. Eu queria pular de um prédio a cada sessão de convencimento e auto parabenização, mas isso provavelmente estragaria o plano.

— Eu achei que não conseguiria passar dos primeiros dias disso, e veja só, estamos há uma semana nisso — comentei, enquanto Sirius ria e digitava algo sobre sua cueca ser branca, caso eu quisesse imaginar. — Sirius e eu estamos nos dando super bem, as pessoas já sabem o meu nome, e até sorriem nos intervalos, a inscrição para rainha do baile foi feita e logo posso começar a campanha. Eu estou até frequentando a academia.

Aquela era sem dúvida uma das piores partes. Três vezes por semana eu tinha que frequentar aquele lugar horroroso, porque de acordo com Marlene, eu fui escolhida porque tinha um corpo legal, mas precisava passar do manequim 38 para o 36 até janeiro, pois esse era o tamanho certo de um vestido de baile.

Uma rotina diária de manutenção do cabelo, que creme passar a que horas, o que comer, o que não comer, como andar, tópicos para conversas, fofocas, números de telefones, como cuidar das unhas, e da pele, e livrar o rosto de cravos e espinhas, como conquistar o cara mais popular da cidade, e fazer todos pensarem que você é uma coisa completamente diferente do que é de verdade, tudo isso e muito mais naquela pasta rosa infernal. Aquele negócio deveria ser comercializado. Ou estudado.

— Uma semana, Evans — lembrou Marlene. — E até agora nem o zelador está disposto a votar em você, e Sirius definitivamente só está esperando uma hora para te comer. E logo ele vai cansar.

— Sua sinceridade é cruel — resmunguei.

— Se até a vida é uma vadia, querida — sorriu ela, voltando-se para o próprio celular. —, por que eu tenho que ser gentil?

Revirei os olhos e voltei minha atenção para o celular. Ótimo, Sirius estava dando o troco pelo tempo sem resposta que tinha ficado durante a ligação.

Eu estaria mentindo se dissesse que conversar com ele era ruim 100% do tempo. Não era. Como tudo nesse plano era uma experiência diferente. Tinha uns assuntos interessantes, umas conversas divertidas, até alguma troca de cultura — embora ele não gostasse de assistir filmes ou séries, nem ler livros. Mas não demorava muito para o popular estúpido aparecer. Nem para que eu me lembrasse da fatídica festa e o quão filho da puta ele poderia ser. Na maior parte do tempo, conversávamos sobre a escola, sobre gostos pessoais — alguns fabricados, natureza, por exemplo, definitivamente, não fazia parte dos meus —, sonhos futuros, coisas do tipo. James me alertava para deixar passado e família de lado. Não era como se eu estivesse muito disposta a entrar em algum desses tópicos.

Marlene estava pendurada no celular, então decidi não perturbá-la. Fiquei revirando o apanhado de fofocas sobre Hogwarts High School, querendo saber que importância teria na minha vida saber que Alyssa About estava sendo traída por Amus Diggory, com Mary MacDonnald. A vida de uma rainha, disse Marlene uma vez, é ajudar, mas para isso você tem que estar a par dos problemas, assim dando o melhor conselho. Isso dizia muito do porquê da McKinnon preferir contratar uma pessoa para conquistar os eleitores à tentar ganhar ela mesma. Eu ainda queria saber como eu poderia desempenhar esse papel. O que diachos eu poderia fazer por Alyssa?

Meu celular vibrou e antes que eu tivesse esperança de ser Sirius me tirando do castigo, vi o nome de Petunia na tela, junto a uma mensagem quilométrica.

“ Lily, não conta para a mamãe, mas…” assim começava a mensagem, como todas as outras.

— O que te faz pensar que eu me importo? — resmunguei para o celular, digitando uma resposta mal criada e apagando logo em seguida. Marlene apenas levantou uma sobrancelha, olhando para mim, como se dissesse “o que foi agora?”. — Minha irmã. Essa estúpida. Está voltando para casa daqui há duas semanas, a faculdade entrou em recesso, e ela não tem mais dinheiro para ficar lá. Filha da mãe. Até quando ela acha que vai conseguir enganar mamãe? Até quando essa idiota acha que vai fingir que não reprovou de quase todas as matérias semestre passado, e não vai se formar? — Marlene me olhava com as duas sobrancelhas erguidas. Merda. Percebi a besteira tarde demais. Era um segredo, se minha mãe soubesse antes de Petunia dar um jeito nas coisas… E afinal, não era como se eu precisasse de mais um segredo meu na cestinha de Marlene. — Esquece isso, okay? Falei sem querer.

— Não se preocupe, querida, seu segredo está seguro comigo. Em grande parte porque eu não me importo, e eu provavelmente vou esquecer — sorriu ela, um sorriso muito próprio de Marlene, o que não me deixou nada confiante em suas palavras. — Bom, Evans, adoraria ficar e ouvir você reclamando da sua pobre vida mediocre, mas o gatinho com que estou conversando decidiu que quer mais que apenas conversar, se é que me entende — ela piscou enquanto levantava-se da cama e colocava os sapatos.

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Afastei o pensamento do que Marlene podia ter estado conversando esse tempo todo com o tal gatinho, e desci as escadas para levá-la até a porta.

— Hasta la vista, baby — disse ela enquanto entrava no carro e ia embora.

Entrei em casa novamente, com o pensamento de talvez ser eu mesma por algumas horas, quando a campainha tocou.

Parado em frente a minha casa, encostado na mureta, estava James Potter. O cabelo molhado parecia até que havia sido penteado, usava uma camiseta de banda, cinza, e jeans. Parecia pronto para sair.

— Potter?

— Já comeu, Evans? — perguntou ele sorrindo para mim. Atrás de James, eu notava agora, havia um carro novo, preto. James dirigindo? Essa era novidade para mim. Não era segredo algum que ele havia sido pego dirigindo embriagado, três anos antes, e atropelara um ciclista, enquanto saía de uma festa.

— Não… — respondi meio incerta. — Por que? Fez reserva em algum restaurante?

— Na verdade — respondeu ele, sorrindo ainda mais —, eu fiz. Vá se aprontar, Evans. Hoje você tem um encontro.

E de forma totalmente inexplicável, eu sorri. Subi as escadas dois degraus por vez, sentindo meu estômago revirar de nervosismo e expectativa. Eu teria um encontro com James Potter.