Para Além da Beleza

Capítulo 5


A casa de Christian era magnífica, ficava no último andar de um prédio e com uma parede toda de vidro onde mostrava a vista para a maravilhosa cidade cheia de luzes. Era também impessoal, com tons bege e cinza, e nada que indicasse sobre quem vivia ali.

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A chuva estava torrencial, tinha sido boa ideia ter parado do que andar pela estrada naquela tempestade. Jamie tomou um banho quente na casa de banho comum, usou uma camisola emprestada e deixou a roupa na máquina de secar.

Chris estava sem a camisa, exibia o peito com pelos quase invisíveis tirando os do baixo-ventre que formavam um pequeno triângulo e desapareciam pelas calças dentro.

— O que é?

— Aguardente. — Ele entregou o copo e colocou uma música a tocar no aparelho sofisticado. Jamie se admirou ao apreciar a coleção de música Jazz.

— Miles Davis! — Exclamou assim que o som começou a soar. — Adoro o álbum Kind of Blue. Estou surpresa.

Chris fez um brinde ao ar e riu quando viu a cara feia de Jamie ao dar um gole da bebida.

— A ver se te deixa com a língua dormente. — Espicaçou e a médica revirou os olhos e foi se sentar no sofá de veludo bege, com almofadas azuis e cinza. O seu telefone agora contava com vinte chamadas não atendidas.

— Namorado?

Assustou-se ao ver o jovem Dash espreitar por trás e apoiar a cabeça no descanso do sofá.

— Ele teve um imprevisto e acabou por me deixar no restaurante.

— A mãe dele morreu?

— Não, foi de trabalho.

Christian deu a volta e se sentou a alguma distância dela. Abanou a cabeça negativamente.

— Então na hora que ia sair deveria ter vindo ter contigo e te colocado num táxi. Não seriam cinco minutos a impedi-lo de fazer isso. Ou teria pedido na receção do restaurante.

— Ele pensava que ia voltar. — Justificou, o tom de voz mostrava o desagrado pelo que ouvia.

— Mas não voltou. — Sublinhou e soltou um suspiro exasperado. — O escritório dele ardeu?

— Não. — Jamie agora abria as mensagens, e lia as desculpas esfarrapadas do namorado por tê-la abandonado naquele lugar distante e sozinha. Riu de si própria. — É possível amar alguém e ter vergonha dessa pessoa?

— Ou se ama ou não se ama... Johnson.

— Jamie. Pode chamar de Jamie.

Jamie — repetiu, os olhos semicerrados analisavam com atenção. — Se o teu namorado tem vergonha de você, é porque não te ama. Deve gostar de se afundar no meio das tuas pernas, mas não vai passar disso.

A prima de Darcelle levantou os olhos cheios de dor e não conseguiu disfarçar.

— Desculpa, sou sincero demais. — Bebericou um pouco mais da bebida.

— E nas tuas relações também?

— Especialmente. Não quero uma namorada, nem mulher e nenhum vínculo. Só ofereço cama e presentes — afirmou, estava esticado preguiçosamente. — E muito prazer, é claro.

— Presentes?

— Claro. Toda mulher gosta de presentes, não? Se me pedir algo, eu dou. Desde que esteja ao meu alcance. Não faças essa cara, Johnson! Tudo na vida é uma troca de interesses, se alguém quer estar contigo é porque tens algo que lhe interessou, seja material ou emocional.

— Muita praticidade.

— Ao invés de ficares aí a chorar por um idiota, posso-te ensinar a ser prática!

Jamie virou a cabeça de tal forma que quase quebrou o pescoço. Dash deu de ombros com o descaso habitual.

— É uma pena que eu seja gorda, não faço teu tipo — ironizou com certa malícia, o sorriso estranho preso nos lábios. Nem parecia que bem há pouco estava desfeita em lágrimas.

— Quando foi que eu disse que gostava de magras? — retorquiu, e sua voz descarrilou. Pela primeira vez parecia não estar controlado.

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— Não tenho certeza de fazer parte do estilo de mulheres ao qual estás habituado. — O que estava a fazer? A flertar com um completo estranho? Seria uma forma de vingança por Lorenzo? E por que a presença e a voz de Dash fazia com que sentisse um formigueiro nas zonas baixas?

— Eu já te mostro! — Christian largou o copo na mesa de apoio e subiu o sofá até se aproximar de Jamie. Não deixou ela falar o que queria, apenas a beijou com força e desejo. Sabia que mulheres fragilizadas costumavam ser mais suscetíveis, mas iria ficar muito chateado se ela só estivesse a usa-lo para esquecer o namorado. O desejo era verdadeiro e crescia no meio de suas pernas.

Jamie deixou de pensar quando as mãos se perderam por baixo da camisola, explorando seus seios e se infiltrando dentro da sua cueca. Gemeu sem pudor, o cheiro de Chris a inebriava e o calor a descontrolava. O facto de se sentir desejada e apreciada por outro homem contribuía para o momento excitante.

Não quero que tenhas vergonha de mim — ordenou Chris quando lhe tirou a camisola e ela se escondeu por baixo dos braços. — Tudo em você é natural, eu gosto.

Johnson soltou os braços e deixou que ele a beijasse nos seios e na barriga, brincasse com seus mamilos e subisse com a língua até ao queixo e depois a sua boca. As calças jeans foram arrancadas, e não demorou a introduzir-se com força dentro dela.

Os dois gemeram, os corpos se chocavam freneticamente como se fosse possível esgotar todo o sabor um do outro. Até desabarem para o tapete, cansados e satisfeitos.

— Quem diria que toda aquela implicância era tensão sexual?— O psicólogo decidiu quebrar o clima, os olhos fixavam o teto e tinha o rosto vermelho pelo sexo quente.

— Isso... não deveria ter acontecido.

— Não?

Não. — Depois do prazer, a vergonha começava a chegar de mansinho. — Eu tenho namorado.

— Qual? O que te abandonou no restaurante sozinha? — Christian ergueu o corpo e se sentou, a olhar para ela com um ar incrédulo.

— Ainda assim. Tenho que me dar ao respeito!

— Estamos no século XXI. — Engoliu em seco. — Quando duas pessoas têm atração, elas transam.

— Me leva para casa?

— Não.

Não?

Deitou o corpo másculo sobre ela mais uma vez, o rosto estava tão perto que conseguia sentir a respiração.

— Vais-me explicar direitinho como é isso de não se dar ao respeito...

Jamie fechou os olhos quando sentiu a língua atrevida deslizar para baixo e encontrar a sua parte íntima. Estava a trair Lorenzo, mas não parecia se importar de momento.

***

O carro de Christian estacionou em frente a casa da médica, tinham tomado banhos em casas de banho separadas, e Jamie vestira suas roupas já secas. A viagem de regresso tinha sido em silêncio, o jovem solteiro nunca levara nenhuma mulher para sua casa, quanto mais permitir que dormissem lá.

A Johnson estava com o olhar distante, pensava em como explicar a prima tudo que tinha acontecido. Talvez fosse melhor permanecer calada, uma vez tendo certeza de não voltar a deixar aquilo se repetir. Ainda assim, o pior de tudo era não sentir nenhum remorso por ter traído Lorenzo! Um comportamento inaceitável mas bem fora do seu controle. Tinha adorado cada segundo em que gozara na boca e contra o corpo do homem ao seu lado, e não sentia nenhum peso de consciência. Chris podia achar que Jamie não passava de uma oferecida ou o que quer que fosse. Ela não se importava.

— Chegamos. — Pareceu acorda-la dos pensamentos. Ao longe o céu começava a adquirir outra tonalidade, revelando o amanhecer. O corpo dorido era testemunha do sexo ardente e gostoso.

— Então... até. — Apressou-se em abrir a porta do carro, não queria ter o azar de Darcelle espreitar ou algum vizinho. Todos ali sabiam que tinha namorado.

— Espera. Toma isto, é para você.

Jamie virou o rosto ao receber algo como um bilhete, mas depois olhou bem e viu um cheque com uma pequena quantia exorbitante, a seu ver, com a assinatura Dash. Fechou a porta do carro.

— O... quê? — A voz chegou a falhar, e levantou os olhos escuros como a noite para encarar o belo Don Juan à sua frente. Dash esboçava um sorriso pateta no rosto.

— Sei lá, compra um carro. Não precisas mais passar o que passaste esta noite.

A bofetada que veio a seguir, nenhum dos dois estava a espera. Chris pigarreou e viu o cheque ser amassado na mão da negra.

— Não tens que me pagar por ter sexo. O que pensas que sou?

Pagar? É um presente meu. Acho que é algo necessário. — Levou a mão à bochecha dorida, sem deixar de esconder o desgosto por Jamie não ter aceitado.

— Um presente depois de termos dormido juntos? Humilhas-me.

— Eu falei que gosto de dar presentes, não vejo qual é o mal. Se andas a pé e precisas de um carro, e eu posso dar? Qual é o problema? Vocês mulheres são um bicho complicado: Se o namorado não dá nada, reclamam. Quando alguém dá, também reclamam.

— Para, para, para! — Repetiu em seguida com a mão ao alto e todos os cinco dedos abertos. — Eu não sou nenhuma prostituta.

— Prostitutas não sobem no meu carro. É um presente, já disse.

— Me sinto muito ofendida agora, não quero sequer voltar a olhar mais na tua cara. — Quando Jamie ia abrir a porta do carro, ouviu um clique dos botões a serem trancados automaticamente.

É mentira — afirmou Christian com os olhos verdes fixos no dela. — Mentira que não queres mais me ver.

— Então paga pra ver!

— Quanto? — Ele tirou o talão de cheques e arrancou um esgar irritado da sua companhia. Riu.

— Vocês ricos pensam que podem tratar tudo com dinheiro, pois estão enganados. Minha dignidade não está a venda. Eu estava triste e carente, mas amo meu namorado. Agora me deixa sair!

Christian não insistiu dessa vez, deixou a jovem sair para casa, assistindo ela subir antes de arrancar com o carro.

A médica não dormiu naquela manhã, os pensamentos confusos e contrários ao corpo satisfeito. Queria se odiar, ter vergonha pelo menos, mas nada disso acontecia.

Acordou cedo para fugir da prima e chegou mais cedo ao plantão onde trabalhou e ajudou os colegas e pacientes até ao meio dia quando parou com uma enfermeira para comer qualquer coisa. Se assustou quando o nome foi chamado pelo interfone do hospital, e Johnson desceu até a receção onde os colegas de vários anos se amontoavam na entrada do hospital.

— Senhora Johnson? — Um entregador veio com uma paleta. — Por favor assine aqui.

Não era um daqueles entregadores de pizza mal vestidos que costumavam bater na sua porta. Este falava bem e vestia um fato bem cortado. Ainda assim não foi mais forte que o baque que levou ao ver um carro importado recém-fabricado com um laço vermelho estacionado no parque público.

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Parecia coisa de novela mesmo, mas não era. Por um momento pensou que Lorenzo tinha enviado flores como pedido de desculpas, mas não. Aquilo era obra de Christian Dash!

A Sede do edifício Beauchamp ficava bem no centro da cidade, um prédio alto todo cinzento e cheio de espelhos, se destacava pela forma e o grande símbolo de um cavalo com as patas frontais erguidas para o alto.

— Boa tarde. Gostava de falar com o senhor Christian Dash. — Pela primeira vez se sentia intimidada, agarrava a bolsa junto ao peito e os olhos apreciavam todo o saguão de entrada e a rececionista azeda que parecia estar com fome há três dias.

— Tem hora marcada? — A mesma pergunta de sempre, não lhe dirigindo o olhar sequer duas vezes. — Não estamos a receber currículos.

— Diga a ele que é Jamie Johnson. Só preciso de cinco minutos! — Insistiu, um quanto nervosa. Mordia os lábios com força e observava as pessoas cheias de elegância que entravam e saiam sem parar. Se perguntava como é que Darcelle conseguia se colocar a vontade naquele meio.

— Minha senhora, não trabalhamos assim. Aqui não é a casa da...

A irritação lhe subiu a garganta junto com a bile, e deu meia volta caminhando em direção aos elevadores. Ouviu a rececionista chamar por si, mas Jamie olhou as placas para ler onde os nomes e os sectores se encontravam e seguiu logo para o andar da administração. Assim que as portas se abriram de par-em-par, deu de cara com um grande espaço aberto dividido por paredes falsas e cheias de mesas e computadores. Ao longe se via um grande gabinete de vidro todo requintado, mas não foi preciso muito para ver Chris debruçado sobre um de seus colaboradores.

— Ali está! — A rececionista apareceu no outro elevador, acompanhada por mais dois seguranças. — Perdão senhor Dash, esta mulher...

— Deixe estar. — Vestido num fato de três peças não parecia a mesma pessoa, salve o cabelo sempre bagunçado e a barba por fazer. Conduziu Jamie pelo braço até sua sala, sendo alvo de olhares e fechou as persianas. — Veio me agradecer, certo?

— O que foi que falei hoje pela manhã?

— Que ficaste ofendida pelo cheque. Então comprei o carro pessoalmente. Bonito não?

A negra soltou um riso desconfortável, podia sacudir aquele convencido ali mesmo.

— Não quero seus presentes — disse, tentando manter a compostura.

— Seus amigos não a podem oferecer nada? — Chris sentou na ponta da longa mesa escura, e sacudiu os cabelos rebeldes do rosto.

— Não sou sua amiga.

— Conhecidos, então.

— Nem isso.

O jovem Dash fez um falso ar admirado, abrindo a boca rosada num espanto forçado.

— Gemes daquele jeito com um completo estranho?

— Século XXI, não é? — Retrucou e atirou as chaves do carro para o psicólogo que as encaixou. — Não quero nada seu.

— Quando posso oferecer presentes, nesse caso?

— Se fossemos namorados seria diferente!

— Opa! Assim vai andar a pé para sempre.

Jamie bufou de raiva. Tinha perdido a hora do almoço e estava cansada pela noite mal dormida. Despediu e ia sair quando Chris saltou da mesa e a segurou pelo braço.

— Queres namorar, é isso?

— Contigo? — Johnson riu na cara dele. — Nunca.

Bom, porque já deixei bem claro que eu não namoro. Agora pega essas chaves e para de escândalo. Não precisas inventar nada para vir me ver. É só marcar.

— Não sejas tolo! — Soltou-se da mão dele com força. A cabeça negando a aproximação que o corpo agradecia.

O som do telefone fixo apitou e uma voz se ouviu.

Senhor Dash, Lorenzo Wright já chegou para a entrevista.

Ela não conseguiu disfarçar e levou a mão a boca quando escutou o nome do namorado.

— Lorenzo! — Exclamou. — Pelo amor de Deus, o que vou dizer para ele?

— Conheces? — Chris estreitou os olhos verdes ao perguntar, sendo astuto demais para entender com facilidade. — Não me digas que é o namorado fujão? É ele quem tem que dizer algo, pois não?

O coração da médica batia sem parar, estava tão encostada a parede de vidro que em algum momento pensou que a fosse trespassar. Dash caminhou até ao telefone e inclinou a cabeça para falar.

Mande entrar.

Não demorou muito para a porta abrir e Lorenzo entrar com uma pasta na mão e um sorriso aberto que morreu logo a seguir ao ver a namorada congelada ali.

— Jamie?

— Conhece? Jamie é minha amiga, acredita que a encontrei sozinha na chuva exatamente ontem que o senhor Wright teria dito que me viu a jantar no restaurante com minha família. — Encarou os olhos verdes na mulher com quem compartilhara várias posições sexuais. — Parece que o Lorenzo teria ido levar a babá dos irmãos a jantar como agradecimento por ter cuidado deles. Que exemplo de bondade!

Enquanto Christian sorria, por sua vez, Jamie tinha os olhos cheios de lágrimas e não resistiu a sair do gabinete às pressas, sem olhar para trás. Esquecia-se da traição cometida, concentrada na dor de algo a qual nunca quisera acreditar.

Chris a seguiu em passos apressados, chamando a atenção dos demais. Já tinham visto várias loiras, ruivas e morenas a saírem daquele lugar. Negra era a primeira.

— O que foi? Já não me humilhaste o bastante por hoje?

— Não. Só agora percebi que quando Lorenzo me ligou a contar aquilo se referia a você. E isso me chateou bastante.

Não tem de quê!

Jamie entrou no elevador, e os dois ficaram a olhar um para o outro, até as portas se fecharem.