Sentimento Incompleto

Resultados positivos e negativos


Eu não sei colocar em palavras os dias que seguiram depois daqueles, eu e Rin tínhamos nos acertando, finalmente, havíamos nos livrado do inferno e de Akita e companhia. Aos poucos, retomávamos a confiança e o carinho um no outro, de modo que eu sentisse que jamais teria o mesmo sentimento se ela não fosse tão próxima, em todos os sentidos. Ainda éramos os mesmos, gêmeos, mas agora sabia que podíamos contar que era bem mais que isso.

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Logo depois, meus pais voltaram. Achei que seria pior. Minha mãe ficou mais irritada com minha tia por ter tomado a decisão sem ela do que pela saída em si. Fiquei feliz ao descobrir que, nem que fosse só no fundo, ela notou que tinha alguma coisa errada, pois meu pai comentou. E não tão feliz quando descobri algo que já suspeitava e despertou uma leve aflição do passado: meus pais não pagavam a cara e dupla mensalidade da Kunugigaoka Academy ou os gastos extras. Eles pagavam só a de Rin e meu avô mandava o dinheiro da minha, sem o direito de questionar. Na verdade, nem era para Rin ir junto, se minha mãe não gostasse da YP e tirasse ela de lá também. O plano do meu avô ainda era formar um herdeiro e isso era preocupante.

Enfim, nas primeiras semanas de agosto, houve uma madrugada diferente durante esses dias tranquilos. Não conseguíamos dormir, na tarde daquele dia era a audição. Conversávamos sobre o que faríamos para convencer minha mãe.

Luka já morava e se virava com a mãe desde os catorze anos por causa de alguns problemas, dos quais acho que só Meiko tem conhecimento, por algum motivo. Como a Crypton é até mais afastada dela do que de nós, ela planeja se mudar para mais perto quando for possível e Miku também, as duas juntas, e Miku tem insistido para Rin e eu irmos.

Também notamos que minha mãe desconfia das nossas fugas ao quarto um do outro e já deixou bem claro, "não quero que isso continue". Apesar disso, nada nos impediu naquela noite, junto das conversas e dos planos, o clima agitado que aguardava o dia seguinte nos envolveu. Foi o terceiro beijo, contando o do ano passado? E então o quarto, o quinto... e a certeza de que definitivamente as coisas tinham mudado. Além de gêmeos, também amantes.

Talvez não tão importante, mas descobri do que se travavam algumas das letras de músicas que Rin escondia. Teria ficado preocupado, se não entendesse ou se não tivesse algumas parecidas. Foi suficiente para termos um plano de fuga em casos de emergência.

Por fim, a última coisa que marcou esse dia, a audição.

Não tinha como expor tantas emoções diferentes ao mesmo tempo em palavras comuns, só tinha certeza de que era o que queria fazer pelo resto da minha vida. Entre os momentos que não estávamos ansiosos, acalmando a Miku ou nos acalmando, comemorávamos tudo o que tivesse direito. Tínhamos passado. Fazia um bom tempo que não nos sentíamos tão vivos.

Voltamos para casa ainda agitados. Luka, Meiko e Kaito foram com Miku, ofereceram ajuda primeiro, no entando era melhor ter o ambiente mais calmo possível. Abri a porta, era apenas um final de tarde.

— E então?! – minha tia perguntou animada da cozinha, onde ainda conversava com com minha mãe sobre a escola.

— Passamos! – eu e Rin respondemos, igualmente animados, antes mesmo de entrar na sala.

— Eu sabia! – gritou de volta.

Ela e meu pai vieram até a sala comemorando, minha mãe parou no corredor, ao lado da escada e respirou fundo.

— Que bom que passaram, mas...

— Mas nada, Allana! – minha tia interrompeu, abraçando nós dois ao mesmo tempo como sempre fazia e ainda feliz. – Não tem nada pra colocar defeito aqui.

— Isso não vai levar... – começou outra vez, sendo impedida dessa vez pelo meu pai.

— É completamente diferente, outro caso.

E então eu já nem sabia do que se tratava, era o assunto que ninguém tocava. Rin e eu já nem sorríamos mais.

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Olhava pra baixo e diria apenas que era no mínimo fora do comum ver três pessoas já consideradas adultas discutindo assim. Já a Rin, nem indiferente como eu, nem triste. Aquilo era raiva, com certeza.

— Pode ser outro caso, mas não impede de que vá acontecer o mesmo! – minha mãe finalmente conseguiu dizer uma frase inteira.

— Não vamos negar. Agora não dá mais – Rin respondeu primeiro, completamente séria e firme. – Tarde demais, você querendo ou não, a gente vai continuar, sim.

— Lillian – meu pai repreendeu, era mais medo do que viria do que para realmente fazê-la parar.

Minha tia nos soltou, em silêncio, alternava o olhar entre todos nós e parecia tentar decidir de que lado ia ficar. A situação tinha mudado.

— Vão negar, sim! – minha mãe rebateu, no mesmo nível, visivelmente chocada com a atitude inesperada que a filha tinha tomado. Nós dois costumávamos aguentar em silêncio, eram raras as situações que tínhamos escolha. – Ainda da, é só dizer, "não".

— Se é tão fácil, do mesmo jeito que é fácil pra você tomar decisões sem pensar nos resultados ou em quem vai afetar – Rin voltou a falar, sem perder a firmeza e o controle, ainda que carregasse cada palavra com todo ódio acumulado até de anos atrás –, tudo bem, eu nego. Não, mãe. Não, para você.

Meu pai respirou fundo, ele jamais brigaria conosco ou chegaria a apoiar minha mãe nesse ponto, porém, agora, Rin talvez tivesse exagerado um pouco. E eu estava do lado dela.

Então, ele sorriu torto para Rin e eu e voltou o olhar para minha mãe, minha tia fez quase o mesmo. No fundo era bom ver que pela primeira vez, Rin tinha deixado o que queria bem claro e que iria atrás disso.

— Se isso estiver relacionado com essas "fugas" de madrugada...

— Allana! – Meu pai e minha tia tentaram fazer ela parar. Preferi não pensar no que isso significava.

Não, realmente não tinha nada relacionado com nós dois, o assunto era outro. Minha mãe estava estressada e começou a misturar tudo, só pra contra-argumentar.

— Eu já deixei bem claro, isso não vai funcionar – insistiu, aumentando um pouco a voz para que ninguém interrompesse. Rin nem pareceu ter sido afetada, já eu recuei um pouco. – Aqui não. Aqui eu não vou concordar.

Eu já tinha ouvido essa frase antes, e foi a mesma que minha mãe ouviu quando resolveram voltar para o Japão. Felizmente, eu não era o único desconfortável ali e minha tia entendeu de onde vinha a fúria da irmã. Isso era péssimo. Seja lá o que meu avô queria, tinha conseguido.

— Tudo bem, a gente não precisa ficar aqui.

Eu quase segurei Rin e neguei a proposta, apenas de imediado, então eu pensei duas vezes e não era uma ideia ruim. "Aqui não", foi deixado bem claro. Se ela não queria...

— Se é independência que vocês querem... – minha mãe começou, não expressava se arrepender.

— Vocês dois vão ficar aqui, sim! – meu pai parou-a de novo, o mesmo desespero. – Quantos anos acham que tem?

— Nós dois já não ficamos sozinhos por várias semanas desde os dez anos? – finalmente consegui argumentar.

Eu e Rin tomávamos conta de tudo quando meus pais estavam fora. Meu pai simplesmente desistiu de discutir depois dessa.

— Vamos fazer essa teimosa se acalmar – minha tia também desesperou-se, nada que fosse fazer as duas orgulhosas mudarem de ideia. – Eu fico aqui! Quanto tempo precisar.

Nós tínhamos um plano, mais ou menos. Os três ali sabiam que era bem possível nós dois acabarmos indo com Luka e Miku. Só não achamos que realmente seria preciso, não tão antes do combinado.

— Façam o que quiserem – minhã mãe declarou, por fim. De qualquer forma, era tarde demais. – Se não querem interferência nas decisões de vocês, tudo bem.

Rin agarrou minha mão, me levando pela escada até o quarto dela enquanto os três ficavam para trás e tentavam convencer minha mãe a mudar de ideia.

— Len, o que a gente vai fazer? – perguntou agitada, trancando a porta e se jogando no pufe em seguida.

Rin suspirou, não consegui identificar o que significava. Me espremi ao seu lado e ela encostou a cabeça no meu ombro com os olhos fechados. Achei que tudo fosse se acalmar.

— A gente só vai arrumar mais problema pra Luka – continuou. – Pra todo mundo. Como sempre.

— Você não está pensando em desistir...?

— Não! Len... O que foi que eu fiz? O que a mãe fez?! – Ela desencostou, apenas pra me fitar com clareza. – A gente precisa fazer alguma coisa, só que outra coisa. Não era pra sermos praticamente expul...

— Rin, calma – com toda paciência possível, a impedi de continuar a frase. Houve uma pequena pausa. – Não vamos, não precisamos – falei, ponderando cada palavra. Rin passou um tempo me olhando nos olhos em silêncio, procurando uma brecha antes de ter certeza. – Mesmo que ela tenha ficado muito irritada, a gente precisava fazer alguma coisa. Ainda temos tempo de pensar em outra coisa.

Desviou o olhar, desistindo. Voltou a encostar no meu ombro e pegou o celular, mandando mensagem para que Miku nos esperasse lá em baixo.

Criamos um vácuo de culpa e medo, onde paramos para pensar em tudo. Pela primeira vez desde toda a briga, em silêncio de fato.

— E se ela descobrir, Len...?

— Cedo demais pra ter medo. – Sorri, vendo-a retribuir e se acalmar. – Não vamos pensar nisso agora. Já não temos um plano pra isso?

Não, não era. Sabia que não estava certo adiar tanto uma explicação, mas o que eu podia fazer ali? Criar mais desespero?

Por fim, esperamos até perceber que a sala finalmente estava vazia e fomos até Miku. Meiko e Kaito já tinham ido, só Luka ainda estava lá.

Depois de explicarmos tudo, Luka recomendou que tivéssemos mais cuidado, e depois elogiou Rin porque não achou que nos livraríamos tão rápido de tantos problemas, e brigou de novo por arrumarmos mais tão rápido quanto. Uma irmã mais velha de outra família.

— Tudo bem, por mim e até pela minha mãe, que vocês dois fiquem lá no apartamento conosco até nós quatro conseguirmos nos mudar. Já que não vão mudar de ideia, pelo menos pensem direito onde vão ficar. É certeza, isso?

Asami, que agora seria também nossa empresaria, deu a opção de morarmos nos apartamentos do prédio da Yamaha. Porém, mudaria uma coisa ou outra do contrato e precisaríamos nos mudar para Tóquio. Um tanto deslocado.

Recordei de Rin dizendo que só iriamos trazer mais problemas e eu fui o primeiro a desistir.

— Minha mãe pode até botar a gente pra fora com todas as palavras, mas acho melhor começar logo a riscar a nova lista de problemas. Se ela fizer isso, vai ter que aguentar nós dois mesmo assim.

Percebi que lá no fundo o instinto aventureiro de Rin tinha até gostado da ideia, e que só agora tinha refletido a situação. Apesar de Luka e da mãe dela nos conhecerem desde que minha mãe estava grávida e serem praticamente da família, eu não levaria esse assunto até as duas sabendo que já tem os próprios problemas. E Luka disfarçou, mas tinha um visível ar de preocupação, talvez quisesse ajudar mesmo sem achar uma boa ideia. Isso não era nada bom.

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O celular de Rin tocou, era a tia Ágata. Ligou o viva-voz e ouvimos silenciosamente a proposta. Concordamos. Então, era certeza, em casa não ia dar para ficar.