Sentimento Incompleto

Prólogo - Uma data sem importância


Ouvi falar que a vida ficaria mais emocionante conforme o tempo passasse, e pelo jeito doze anos realmente não eram nada.

Assistia alguma coisa na televisão enrolada em um edredom, a xícara de chocolate quente aquecia minhas mãos e o sono aumentava cada vez mais. Oficializava mentalmente que aquele era o aniversário, em pleno sábado, mais entediante que já tive. Não que os outros tenham sido bons, mas aquele se superava em chatice enquanto o único filme que nos chamou atenção, mesmo entre os muitos canais, se mostrava cada vez mais desinteressante.

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Len, ao meu lado, já estava dormindo embolado na coberta há um bom tempo, eu só estava acordada para não causar um acidente com o líquido quente em mãos, não tinha ânimo nem para terminá-lo.

Miku era nossa vizinha, a primeira escolha caso quiséssemos sair daquela chatice, e ela não estava em casa. Luka morava muito longe. Kaito, Meiko e alguns outros amigos estavam mais próximos, mas quem disse que iríamos sair com frio, neve e sono?

Meus pais, como sempre, viajando; não paravam em casa nem com o aniversário dos filhos. Na verdade, não faria muita diferença, se estivessem aqui só receberíamos mais dois parabéns e quem sabe alguma lembrança, o resto estaria na mesma. E também nós dois não gostávamos de festas, assim como não ligávamos para qualquer coisa ligada ao "nosso dia", não importava. Era apenas mais um dia frio, um pouco mais chato que os outros.

A maior parte do tempo era somente eu e Len. Até dois anos atrás nossa tia ficava conosco na ausência dos meus pais, ela era uma boa companhia, mas quando minha mãe oficializou que "já estávamos grandinhos", ela começou a vir menos porque precisa resolver umas coisas em São Francisco.

Sinceramente, adorava ficar "sozinha" e ter a casa toda só para mim e Len, fazíamos o que queríamos e quase sempre com alguns amigos. Era uma parte divertida.

— Rin, tem mais na cozinha? – Len perguntou, coçando os olhos e apontando para a xícara.

— Não, mas pode ficar. Eu não quero mais. – Entreguei a xícara com a bebida pela metade e Len levantou uma sobrancelha. – Que foi?

O mesmo se aproximou e colocou a mão livre em minha testa, confuso.

— Quem é você e o que fez com a minha irmã? Ela jamais recusaria algo doce. – Senti meu rosto esquentar e minhas bochechas provavelmente ficaram vermelhas, Len estranhou minha reação e riu, tentando disfarçar. – Ou está com febre?

— É o tédio, estou sem ânimo nenhum. – Dessa vez ele apenas assentiu e tentou colocar a mão gelada na minha bochecha quentinha, a segurei antes que o fizesse. – Fui pega de surpresa, não precisa estranhar.

— Eu não estranhei nada, foi você. – Novamente, segurou a risada. Soltei sua mão e voltei a olhar para a televisão enquanto minhas bochechas esquentavam novamente, minha expressão ainda era de "nada". – Tá, tá bom, só tentei te animar um pouco. Agora é sério, está tudo bem ou é só seu humor de sono mesmo?

— Por que não estaria? É sono. – Len deu de ombros e foi minha vez de segurar a risada por admitir. Nada do que acontecia no momento era fora do nosso normal.

Fazia um tempo que eu e Len compartilhávamos momentos assim, desde que começamos a passar mais tempo sozinhos. Não tínhamos ninguém por perto o tempo todo além de um ao outro. Era alguém que eu confiava, que sempre estaria ali e que me correspondia, mesmo que não tenha sido sempre assim... mas isso não importava mais.

Apenas a ideia de que um dia talvez deixe de ser assim, mesmo que leve tempo, já me despedaça um pouco por dentro. Não dependia de Len, eu só não quero que isso acabe ou que um dia... ele possa estar longe.

Meu celular apitou e cortou meus pensamento. Uma mensagem de Miku. Uma pequena felicidade brotou em mim.

"Desculpe não estar por perto e nem voltar à tempo. Demorei mais do que o previsto na casa dos meus tios.

Complicações com o metrô, muita neve ;o;

Fiz os bolinhos especialmente para vocês, minha avó insistiu com o mimo pela minha ausência, pena que vão chagar atrasados. Espero que tenham um feliz aniversário mesmo assim! S2 S2"

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Abaixo, uma foto da mesma com um sorriso triste e alguns cupcakes de chocolate com cobertura amarela embalados e cobertos por um plástico transparente de bolinhas vermelhas, como um presente. Atrás, a vista da estação, neve por toda parte.

Sorri de canto e mostrei a mensagem para Len, que teve a mesma reação.

"Sem problemas, espero que sua tia tenha melhorado.

E valeu S2

Tá com uma cara ótima -u- "

Respondi por mim e Len, logo voltamos a olhar para a televisão.

— Quer ir lá fora? Ainda é umas sete da noite, não está tão tarde para desistirmos.

— Eu tô com sono, e com frio...

Len segurou minha mão e levantou, puxando-me junto.

— Vou te arrastar! – Riu, mais uma vez. – Não vou te deixar em paz enquanto não ficar feliz.

— O que deu em você?!

Não respondeu, apenas cumpriu o que disse e me levou para o quintal dos fundos.

Se a intenção dele era me "irritar", funcionou. Assim que fui solta juntei neve para acertá-lo enquanto corria, que desviou gloriosamente e tentou me acertar de volta.

Ficamos um tempo assim, mal percebi que já estávamos rindo e o tédio foi esquecido, até que fui acertada e escorreguei. Ainda rindo, Len veio até mim e estendeu a mão para me ajudar a levantar, o puxei, derrubando-o e empurrando um pouco de neve para cima dele.

As risadas continuaram por mais um tempo, até que paramos e olhamos para o céu, alguns flocos de neve caiam e percebemos o quanto estava frio.

— Um dia isso vai acabar – Len sussurrou, quase inaudível –, não vai?

— O que disse?

Ele assoprou, apenas para observar o vapor, e não deu sinal de que iria repetir.

— Melhor entrar, ou vamos ficar doentes de novo – alertei, Len apenas concordou, como se nem tivesse dito nada antes, e levantamos.

— Pelo menos esse ano não passamos o inverno todo ou nosso aniversário sem nem sair da cama... ou do hospital.

— Até que eu já me acostumei. – Mal me importei, bati as mãos pelas minhas roupas e cabelo, que quase alcançava minha cintura, pra me livrar da neve. A saúde fraca é resultado de uma longa história, antes mesmo de nascermos. – Não lembre de coisas ruins agora.

— Então... tá. Vamos pedir pizza pro jantar?

— Temos outra opção? – Len negou também e voltamos a rir, ao menos o resto da noite seria divertida.

...

— Vai vir dormir comigo? – perguntei, Len havia acabado de entrar no quarto, eu só estava o esperando para deitar. A cama dele está ao lado da minha, mas ele aqui, comigo, é diferente.

Ao chegar ao meu lado, bagunçou meus cabelos e sorriu. Está começando a ficar suspeito, me escondendo alguma coisa.

— Por que eu te deixaria sozinha? Sério, tem algo te preocupando? – questionou calmamente, aproximando-se, tomando a atitude inesperada de beijar minha testa

Meu coração acelerou, talvez eu tenha ficado vermelha. Não estava tudo normal até aqui? Ou não? Pensando bem, melhor continuar pensando que está normal.

— Por que isso tão de repente? – Len desmanchou o sorriso e olhou para o lado com as bochechas coradas.

— Desculpa. – Ele passou a mão pelos fios loiros. – Exagerei.

— Não, tudo bem. Eu posso me acostumar com isso.

De vez em quando a gente tem essas esquisitices. Então não era ao todo anormal.

Seu sorriso voltou e seu rosto ficou mais vermelho. Tentei não rir, Len não segurou. O que foi aquilo que eu disse?

Deitei e escondi a cabeça com a coberta, dei espaço para que se acomodasse ao meu lado.

— É você que está escondendo algo, começou com essa do nada – finalmente falei.

Ele gaguejou, entregando que foi pego.

— Já teve a sensação de que algo seria perdido se não agisse, mas se agir pode estragar tudo? – respondeu, quase sussurrando. Len foi o primeiro a aparecer em meus pensamentos. Nós dois nos fitamos em silêncio enquanto eu esperava sua resposta. – Confia em mim? – Assenti com a cabeça apenas, sem desviar nossos olhares. – Feche os olhos.

Inocentemente não esperava nada de mais. Percebi que Len havia levantando e apoiado o braço ao meu lado para alcançar meu rosto e com a outra mão segurou a minha, entrelaçando nossos dedos.

Quando abrimos os olhos, eu correspondia ao mesmo sentimento daquele beijo, um mero encostar de lábios. Simples e propositalmente demorado, que fez um sorriso aparecer em nossos rostos ao nos separarmos.

Len voltou a encostar a cabeça no travesseiro, não soltei sua mão e voltei a fechar os olhos, ainda sorrindo.

Como se nada tivesse acontecido, ou como se uma parte de nós soubesse o quanto era... errado? Que seriamos repreendidos? Separa... Meu sorriso se foi. Então, aquela nossa sincronia bizarra apenas nos fez fingir que nada tinha acontecido. Que não passaria daquilo.