Desvios

Capítulo 8 - Incertezas


A garota dos cabelos castanhos presos em maria-chiquinhas esticou os braços, espreguiçando-se. Em seguida, ela apertou uma almofada cor-de-rosa em formato de coração contra o peito. Sua câmera estava a postos, apenas aguardando inanimadamente para o começo da nova temporada do De Voiceando. O programa não só era divertido, como rendia muitas curtidas e retweets para Denise, além de, é claro, aparecer um colírio para os olhos vez ou outra.

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A enxurrada de propagandas antes de o programa começar irritou profundamente a garota, apesar de não tanto quanto a demora das amigas para virem até a sala. Ela jogou a almofada para o outro lugar do sofá vermelho e deu uma olhada em uma das várias páginas do Facebook, e nada conseguia a tirar do tédio.

— VOCÊS TÃO COMENDO A MINHA COZINHA? – Denise surtou. Ora essa, além de atrasadas, as meninas ainda estavam destruindo a casa dela?

A porta se abriu com força, batendo contra a parede. Uma menina dentuça, de macacão jeans e tênis, apareceu. Ela olhou com raiva para a filha dos donos da casa.

— O que você quis dizer com “vocês”? – esbravejou Mônica.

Denise fingiu surpresa, como se Mônica fosse sonsa.

— Eu quis dizer você e a Magali, ué. – Denise deu de ombros.

— Mas eu não tinha um apetite insaciável como a Magá – apontou Mônica, quando a outra passou por ela e dirigiu-se ao lado de Denise no sofá, com um pedaço de melancia em mãos.

Magali simplesmente ignorou. Desperdiçar o que parecia uma melancia maravilhosa daquelas para tentar defender-se não valia a pena. A Magali esganada tinha ficado na infância.

— Só que você é gorda, miga. #Prontofalei – Denise fez uma hashtag com as mãos.

— O que você disse? – gritou Mônica, correndo até perto da Denise com um punho erguida.

— Ai, Mô, me poupe, se poupe e nos poupe. – Denise sabia muito bem como a dentucinha funcionava. Ela nunca a agrediu antes, e Denise tinha certeza que não era agora que a história mudaria.

— E agora, a nova temporada de De Voiceando – falou a voz da TV. Denise empurrou o corpo da Mônica em direção à Magali.

— O programa começou – justificando o empurrão.

Mônica se deu por vencida e sentou no tapete no chão, emburrada. Magali ignorava a cena, preocupada com sua melancia, que por sinal já estava na metade. Denise digitava furiosamente no celular a cada apresentação. Tudo tornou-se estranho quando Mônica recebeu várias mensagens, até que ela começou a digitar furiosamente. Aquilo preocupou Magá, já que, bem, Mô não era Denise.

A morena curvou-se para tentar ler quem era, e então entendeu o que se passava.

— O que o Cebola quer? – perguntou ela, curiosa.

— AUGH! – Mônica bloqueou o celular. Ela virou para encarar Magá, brava. – Ai que susto, Magali. – Mônica desbloqueou o aparelho e o entregou para a amiga. – Veja o que esse idiota está fazendo.

Magali olhou para a conversa desde o início. Ela não entendia como Cebola ainda não tinha desistido, sério. O que havia de errado com ele? O garoto nunca valorizava a Mô, e agora queria mudar a história.

Porém, ela também não entendia sua amiga. Afinal, Cebola salvara a vida do namorado dela, e ele até parecia não ter ciúme dela, o que era um avanço tremendo. As mensagens eram todas sobre DC e a ideia maluca de fazer um trabalho sobre planos falíveis e o garoto pedindo para que Mô convencesse o namorado a desistir daquela ideia. Magali devolveu o aparelho para a dona.

— Conta o bafão, amiga. – disse Denise. Pelo visto, a menina tinha visto todas as mensagens. Mônica pegou o celular e guardou no bolso.

— É o Cebola. Agora que eu acho que ele superou, ele fica falando o tempo todo do DC, e não de um jeito bom. É óbvio que eu vou defender o Do Contra. Então se ele sabe que nós vamos brigar por isto, por que fica me mandando mensagens? – Mônica deitou no tapete macio, parecendo exausta de repente.

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— Isso nem dá ibope mais. Vocês nunca se resolvem, o público não gosta disso, nem vale a pena postar – Denise resmungou.

— Denise! – repreendeu Magali.

— Quê?! Sua amiga traíra! – gritou Mônica.

Denise estirou a língua.

— Chega de mimimi, fofa. O boy quer te dar atenção, quer que vocês voltem a ser amigos, e você fica aí dificultando. – Denise voltou a tirar fotos do De Voiceando e digitar no celular. – Para, né? Ou você volta a tratar o garoto como seu amigo, ou corte a cebola pela raiz.

— Vou pedir uma sugestão a alguém confiável. O que você acha, Magá? – perguntou Mônica.

— Ahá! Depois a amiga traíra sou eu, né? Bleh! Fique você sabendo que eu ajudei você a achar o amor da sua vida junto com a Magali, tá? Magoei. – Para uma pessoa que não parava de escrever no celular, Magali pensou que talvez ela não estivesse tão magoada assim.

A morena pensou um pouco. Ela vinha andando tão desnorteada com Quim, que parecia não ser a pessoa capaz de aconselhar ninguém. Ela nem conseguiu animar o Cascão, apesar de que os dois fariam um trabalho em breve e ela ainda não tinha desistido.

— Mô, eu acho que a Denise está certa – respondeu Magá, por fim.

— Quê??! – Mônica se surpreendeu.

— AHÁ! – Denise desviou sua atenção da TV e do celular para fazer sua melhor cara de: Vai criticando, monamu, quero ver depois segurar a marimba.

— É sério, Mô. O Cebola parece querer sua atenção, e não no sentido romântico – Magali continuou. – Ainda assim, é sempre bom deixar a guarda alta.

Mônica ainda estava chocada. Ela parou de olhar para Magá com queixo caído e pegou seu celular, apenas para olhá-lo. Magali sorriu compreensiva. Sua amiga era esperta, ela ia tomar a melhor decisão.

— Voltamos já com De Voiceando – Com aquele silêncio entre as garotas, Magali se assustou quando o apresentador da TV voltou a ser ouvido.

— E aí, Magá? – começou Denise. – Tem algum babado pra contar? Eu não falo pra ninguém, sérião. – A garota piscou seus olhos várias vezes, com intuito de parecer sincera. – Só não me fala de menino que carente aqui já basta a Mônica.

— EI! – Mônica reclamou.

— Te adoro, more. – Denise fez um coraçãozinho com as mãos.

Magali encostou as costas no sofá, e pensou sobre Quim. Ela estava ficando muito solitária? Ou ela apenas estava magoada pela falta de confiança no garoto? De repente, tudo o que a menina queria era se esconder em sua cama, com os fones de ouvido para escutar alguma música triste.

Ela forçou um sorriso. Não é como se ela fosse contar sobre ela e o Quim de qualquer maneira.

— Não tenho nada pra falar – respondeu.

Denise fez biquinho e pareceu ter planejado falar algo, quando o programa voltou. Magali tentou prestar atenção no De Voiceando, porém a única coisa que ela pensava era o rapaz que agora trazia tanta incerteza para os sentimentos dela.