Mudblood

Draco


De acordo com a Mitologia Grega, humanos foram originalmente criados com quatro braços, quatro pernas e uma cabeça com duas caras. Temendo seu poder, Zeus dividiu eles em dois seres diferentes, condenando-os a passar o resto de suas vidas à procura de suas outras metades.

Era brilhante, não de um jeito bonito, como se ele passasse óleo de cozinha. Tinha uma cor meio amarelada, tipo feno, depois de mastigado pelo cavalo. O Sr. Clark tentava esconder o estrago, fazendo com que os três fios que sobraram na sua cabeça cobrissem os dez metros quadrados que eram sua careca.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Não estava dando certo.

Era esse tipo de coisa que eu pensava no meio da aula de Física. Afinal, no que mais eu pensaria? Naquelas fórmulas gigantes que cobriam o quadro? Na minha nota vermelha no boletim? Obviamente não.

Senti um toque leve nas minhas costas. Norrie tinha jogado uma bolinha de papel, tentando se comunicar comigo. Olhei pra trás, mostrando o dedo do meio pra ela. Eu sabia o que viria em seguida. Eu já tinha passado por aquilo milhões de vezes. Dentro do papel provavelmente estaria uma lista de motivos para eu ir na festa de abertura da temporada dos jogos que ia ter daqui á três meses. E ela nunca tinha ido nem a um jogo de beisebol.

Norrie fazia isso todo santo ano. E em todo santo ano eu era arrastada com ela para a maior festa do colégio. Ela conseguia me colocar num vestido curto, em saltos altíssimos e me obrigar a ver três horas de adolescentes bebendo, caindo em piscinas, terminando namoros e transando ao ar livre. Ela era manipuladora, quase uma psicopata.

Ela sempre ia pra esse tipo de coisa esperando que sua alma gêmea estivesse lá. Norrie queria algo clichê, algo do tipo beijos na chuva. Ela era esperançosa, de um jeito que não fazia bem pra ela. Gostava de pensar que acharia o cara certo, mesmo com um pulso em branco. Por esse tipo de coisa, eu não entendia o fenômeno que era nossa amizade.

Abri o papel, ainda que hesitante.

Vou te apresentar um cara que entrou na minha classe de biologia. Ele é novo.

Revirei os olhos. Aquilo era tão ela. Se tinha algo que Norrie gostava mais do que me fazer usar vestidos, era me empurrar pra todo cara bonito que ela conhecesse, ás vezes os não bonitos também.

Eu tenho a impressão de já ter passado por isso antes, e você? Ela provavelmente conseguiria ler a ironia estampada na frase. Joguei o papel.

Não recebi resposta nenhuma, o sinal tocou. Fugi da sala, antes que ela tentasse alguma coisa.

Eu tinha conseguido me livrar das garras da ruiva, me trancando no ônibus escolar, tentei ler o resto do livro que estava nas minhas mãos. O Paul, o motorista, me deixava ficar lá se eu não contasse pra diretora que ele dirigia bêbado nas noites de sexta, quando levava o time de lacrosse pra algum jogo.

Tinha um solo de guitarra saindo do rádio, bem baixinho. Algo sobre matar aula me deixava quente por dentro, mas não me fazia ignorar a chuva que caía do lado de fora. Ouvi a porta ser aberta, o frio entrando junto com o Alex. Ótimo.

— Se você vai se juntar a Norrie e tentar me jogar pro novato, pode dar meia volta – disse entediada. Ninguém interrompe a minha leitura sem um motivo plausível, era uma cláusula no contrato da nossa amizade. Cláusula essa que meus amigos preferiam ignorar.

Depois que a Norrie conseguiu juntar o Alex com a sua alma gêmea, – momento de revirar os olhos – Alex, que sempre tinha pensado como eu, ignorando toda essa idiotice de marca e verdadeiro amor, se voltou para o lado negro da força e agora ajudava Norrie a me empurrar pra cima de qualquer ser masculino que demonstrasse ter bom senso. Eu tinha os piores melhores amigos do universo.

O que me impedia de chacoalhar o Alex, fazendo ele voltar a si, era ver que ele estava verdadeiramente feliz com o namorado. Claro que tinha sido golpe de sorte.

— Na verdade, vim te chamar pra comer – ignorei ele, esperando ofertas melhores. — Regina George e sua gangue não veio hoje, se isso melhora seu humor.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Por que isso melhoraria meu humor? Eu gosto de ver o nariz torto dela! – Eu tinha quebrado o nariz de Judith um tempo atrás. Eu estava de TPM, tinha brigado com minha mãe e ela tinha falado mal de Harry Potter naquela manhã, isso tirando o fato de que ela já vinha perturbando a Norrie. Ninguém zombava do pulso em branco da minha amiga. Era uma regra naquele colégio. Ninguém podia me culpar.

Alex riu, me fazendo rir junto. Ele tinha uma risada estranha, do tipo que fazia um barulho com o nariz, como um porco.

— E tem pizza na cantina, com suco de laranja. Eu até te pago uma barra de Hershey’s se você for boazinha e não fizer birra – lembra o que eu falei sobre melhores ofertas? Pois é.

— A Norrie anda te ensinado as técnicas de manipulação dela?

A fila estava enorme. O novato tinha sentado no meu lugar na mesa, mas claro que ele só fez isso depois de pegar a última caixa de suco de laranja da cantina. A pizza era vegetariana.

Lembra o que eu falei sobre melhores ofertas? Esqueçam.

Andei até a mesa, levando minha bandeja, dividindo meu olhar de raio laser invisível entre três seres humanos que estavam na mesa. O Elliot se encolheu um pouco no seu lugar, mesmo que ele sempre se safasse da minha fúria. Eu não conseguia brigar com ele, ninguém conseguia. Por isso, Alex cutucou o loiro, indicando o outro loiro na minha frente.

— Andy, esse aqui é o Taylor. Taylor Darling. Ele veio da Inglaterra. – Elliot falou fingindo animação. Finalmente olhei pro garoto, que por algum motivo estava olhando vidrado pro meus olhos. A Norrie estava começando a me empurrar os drogados, ótimo.

Tentei fazer a vibração estranha no meu corpo passar em branco, meneei a cabeça.

Encarei ele, analisando. Os cabelos eram platinados, arrumados de um jeito charmoso, ainda que alguns fios estivessem caindo nos olhos. Olhos muito bonitos por sinal. Cinzentos, com olheiras embaixo que de alguma forma deixavam ele mais bonito. Tinha uma barba por fazer que contornava o sorriso que ele estava me dando. Draco Malfoy tinha conseguido se perder no caminho de Hogwarts.

Ele me analisou também, depois que parou com o olhar de Hannibal Lecter. Um silêncio estranho permutou na mesa. A Norrie sorrindo sonhadora, olhando de mim pra ele.

Mordi um pedaço gigante de pizza, acenando pra ele. Ele levantou uma sobrancelha, continuando com o sorriso estranho de Coringa. Acenou de volta. Mesmo que as chances de ele ser minha alma gêmeas estivessem abaixo de zero, não precisa arriscar, não é? Ficar calada é a minha melhor ideia.

— E se a gente fizesse uma maratona de HP? Aquilo consegue de alguma forma melhorar o seu humor. – Ela sabia como conseguir o que queria. O diabo era fofo e tinha cabelo ruivo.

— A gente leva sorvete. – Alex colocou o braço em cima do ombro do Elliot. Sorri, mesmo que no fundo eu soubesse que os dois dormiriam – de conchinha – quando o Harry descobrisse que é bruxo. Isso é claro se não começassem a se pegar. A Norrie pelo menos só reclamava que o Cedrico não deveria morrer.

— Chocolate – os três concordaram.

Tudo pareceu certo. Calmo.

Isso até o Elliot abrir a merda da boca.

Ele se virou para o Draco, sorrindo simpático.

— E aí, você gosta de Harry Potter? Se quiser pode ir com a gente – pela primeira vez, eu quis esganar o Elliot.

Mas o platinado sentiu o clima. Aquela era uma pergunta de vida ou morte. Ele se virou pra mim, como se me desafiando a reclamar do que viria em seguida.

— Eu prefiro Percy Jackson.