Wrong Number

Conversando com um desconhecido.


Encarei minha irmã enquanto seu sorriso se ampliava. Eu não esperava outro contato. A garota disse que pediria para ele retornar, mas que motivo esse tal de Magnus teria para fazê-lo? Toda a situação da madrugada já não foi embaraçosa o suficiente?

— Ele está pedindo desculpas – Isabelle me entregou o telefone.

“Sinto muito pela noite passada, estranho. Bebi um pouco mais do que devia e hoje quando acordei, uma amiga disse que eu estava no telefone com alguém ontem e que era para retornar a ligação. Foi estranho ver que a última chamada tinha sido para você. Por acaso falei alguma coisa estranha? Se sim, me perdoe, eu fico um tanto inconsequente quando bêbado.”

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Pensei durante alguns segundos sobre o que deveria responder. Tinha que ser algo simples e objetivo, não queria estender esse diálogo mais do que o necessário. Isabelle me observava atentamente com uma expressão curiosa.

— O que você vai dizer?

— Que está tudo bem e que ele não falou nada demais – murmurei enquanto começava a digitar.

— Devia agradecer pelos conselhos.

— Muito engraçada – revirei os olhos e me concentrei na mensagem.

Assim que terminei de digitar, reli o que tinha escrito.

“Tudo bem. Não, você não disse nada demais, apenas coisas normais que bêbados costumam dizer”

Apertei a tecla para enviar e no mesmo instante ouvimos o barulho da campainha.

— Está esperando alguém? – inquiri.

Isabelle pareceu lembrar de algo e se apressou para atender a porta. Estiquei o pescoço, na tentativa de ver quem era a pessoa parada do lado de fora, e meus olhos se arregalaram com a visão do melhor amigo nerd de Clary.

— Alec, esse é o Simon –

— Oi – cumprimentei, tentando não deixar transparecer o quanto estava achando aquela situação bizarra.
O que aquele garoto estava fazendo ali? Olhei de relance para minha irmã e só naquele instante percebi que ela estava arrumada demais para quem ia ficar em casa. Não, pensei, isso não pode ser verdade. Tive que me segurar para não rir. Eles dois estavam saindo? Isabelle e o menino nerd?

— Bom, acho que já vou indo – falei me levantando.

— Eu te acompanho até o carro – Isabelle se ofereceu.

Me despedi rapidamente de Simon e eu e minha irmã seguimos pelo corredor estreito do prédio. Assim que a porta do elevador se fechou e estávamos somente nós dois, lancei meu olhar inquisitivo na sua direção.

— O que foi? – ela questionou com um sorriso no rosto.

— Simon? Não é exatamente o seu tipo – comentei.

— Acho que está na hora de dar uma chance para os caras legais – ela se virou para observar seu reflexo no espelho – Além do mais, ele é um nerd gato.

— Se você diz – murmurei.

— Sabe, talvez ele e Clary tenham algum amigo solteiro – disse me encarando de forma sugestiva.

— Não, obrigado – revirei os olhos – Não preciso de ajuda para conseguir encontros.

— Considerando o seu histórico de relacionamentos, acho que você precisa. Conhecer pessoas novas é um dos passos para seguir em frente, lembre-se disso.

A porta do elevador se abriu e nós passamos pelo Hall de entrada em direção à rua, meu carro estava estacionado quase na frente do edifício.

— Te vejo no domingo? – ela se encostou na lateral do carro enquanto eu retirava a chave do bolso.

— Claro – entrei no veículo e já estava pronto para dar a partida.

— Se precisar de mim, é só ligar, agora você tem o número certo.

Eu assenti e assim que nos despedimos, segui pelas ruas em direção ao meu prédio. Por conta do horário, acabei ficando preso no trafego em um trecho perto da ponte do Brooklyn. Avaliando a situação do local, eu gastaria pelo menos uns vinte minutos parado naquele engarrafamento. Tirei o celular do bolso e percebi que tinha uma nova mensagem. Era de Magnus.

“Coisas normais que bêbados costumam dizer? Desculpe, mas se a conversa de bêbado que estou acostumado a ouvir, for o que falei para você ontem, não sei como ainda está me respondendo”

Tinha que admitir que Magnus parecia ser uma pessoa legal. Apesar de toda a situação constrangedora, ele mandou uma mensagem para se desculpar e parecia estar levando aquilo de maneira bem descontraída. Isso de certa forma me deixou mais relaxado. Acho que o que mais me assustava na ideia de contar sobre Jace para um estranho, era o medo de julgamento. Daquela pessoa me achar repulsivo pelos sentimentos que tenho ou pelo que sou. No entanto, Magnus não parecia se importar, ou pelo menos estava bêbado demais para lembrar do que eu dissera na mensagem.

De repente, me senti mais à vontade em relação aquele homem. Eu tinha contado meus problemas, mas ele também fez algo embaraçoso, era como se estivéssemos quites. Ele provavelmente ia se desculpar mais uma vez e era isso. Íamos seguir com as nossas vidas e tudo o que aconteceu ontem seria apenas uma história engraçada.

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“Não foi nada tão ruim, sério, você só me convidou para uma festa e disse que eu deveria pegar alguém. Não é como se eu já não ouvisse isso todos os dias vindo da minha irmã”

Assim que enviei a mensagem, joguei o celular no banco do passageiro e liguei o rádio. Passei as estações procurando por algo interessante, quando me deparei com uma música conhecida. Hymn for the Weekend. Eu era apaixonado por Coldplay. Aumentei o volume e fiquei cantando enquanto tentava ignorar o som caótico das buzinas e pessoas proferindo palavrões.

Olhei para o lado e percebi a tela do meu celular se acender. Seria Magnus? Se fosse, ele respondia bem rápido.

“Me perdoe se eu estiver sendo intrometido, mas considerando sua situação, acho que sua irmã pode estar certa. Não quero dar palpite na sua vida nem nada do tipo, mas é que eu meio que entendo o que você está passando”

Pelo visto, ele não bebeu o suficiente para esquecer disso. Senti meu corpo enrijecer. Toda a tranquilidade que estava sentindo minutos antes se esvaíra. Esse não era um assunto que me deixava confortável, ainda mais quando um estranho estava tentando me aconselhar.

Pensei em todas as vezes que Isabelle tentou me fazer sentir melhor e disse que entendia o que eu estava passando. Eu amo a minha irmã, e só tenho a agradecer por todo o apoio que ela sempre me ofereceu, mas a verdade é que ela nunca seria capaz de entender. Se nem mesmo Isabelle que era a pessoa que mais me conhecia no mundo podia entender, por que esse estranho entenderia?

“Entende? Você por acaso é gay e está apaixonado pelo seu irmão de criação, totalmente hétero, que tem uma namorada?”

Só depois que enviei a mensagem, me dei conta do quanto aquilo soou irônico e rude. Que merda, Alexander, ele só estava tentando ajudar. Sentindo a culpa me atingir, mandei outra mensagem logo em seguida.

“Sinto muito por isso, é um assunto difícil, mas mesmo assim não me dá o direito de agir como um idiota”

Deixei o celular no colo e fiquei olhando para a tela me sentindo um tanto ansioso. Talvez ele não respondesse mais, mas isso seria justo, eu fui totalmente grosso. Fiquei pensando se deveria mandar mais alguma coisa quando o alerta de mensagem soou.

“Não, mas sou bissexual e durante muito tempo fui apaixonado pelo meu melhor amigo, que era hétero, e ainda fui padrinho do casamento dele com uma garota de quem não gostava nem um pouco”

Tudo que eu queria naquele momento era cavar um buraco bem fundo para me esconder. Tem como me sentir mais idiota do que estou sentindo nesse momento?

“Sinto muito”

Foi tudo o que consegui responder. Quando levantei o olhar, percebi que os carros estavam começando a se mover. Deixei o celular de lado e me concentrei totalmente na direção. O caminho até o edifício foi bastante tranquilo, não gastei mais de quinze minutos no restante do trajeto.

Assim que estacionei o carro, entrei no prédio e chamei o elevador. Enquanto esperava, arrisquei mais uma olhada no celular. Uma nova mensagem.

“Está tudo bem. Entendo se não quiser falar sobre isso, e me desculpe pela intromissão, só achei que talvez você precisasse conversar. Na época, tudo que eu mais queria era alguém com quem pudesse desabafar, achei que podia estar ajudando”

Com a mão livre, apertei o botão do meu andar quando entrei no elevador. Não sabia o que dizer depois daquilo. Tentei durante muito tempo lidar com a situação sozinho. Queria poder resolver tudo sem precisar da ajuda de ninguém, mas sabia que isso não estava dando certo. A verdade é que eu precisava de ajuda, por mais que não quisesse admitir, e esse desconhecido estava completamente certo.

Assim que abri a porta do apartamento, me deparei com uma cena que me fez querer sair dali correndo. Jace e Clary estavam sentados lado a lado no sofá, a cabeça dela estava encostada no ombro dele enquanto os dois assistiam a um filme.

— Alec, vem assistir esse filme com a gente, você vai adorar – a voz de Jace me despertou e percebi que ainda estava parado na porta encarando aquela cena.

— Eu tenho um trabalho para terminar, mas bom filme para vocês – tentei sorrir, mas tenho certeza que o que saiu foi tudo menos um sorriso.

Assim que fechei a porta do quarto, senti uma dor excruciante no peito. Eu não era capaz de superar. Toda vez que via os dois juntos, eu me sentia horrível e aquela sensação só piorava. Tinha que existir um jeito de lidar com aquilo, alguma coisa que fizesse aquela dor passar. Desbloqueei o telefone e mandei uma última mensagem antes de me jogar na cama.

“Você está certo, eu preciso de ajuda”