Sete Maneiras de Ser Humano
As trevas da razão - Avareza
As trevas da razão
Seus olhos castanhos deslizavam pelas notas, em suas mãos, com agilidade e cuidado.
– Vai doar dinheiro pra campanha do colégio?
A voz, grave e doce, desenhou, em seus lábios, um sorriso espontâneo e infantil, enquanto levantava o rosto em direção às palavras.
– Oi, professor! Não sei se vou doar não, por quê?
– Porque você tá aí parada, na frente da diretoria, contando seu dinheiro. Imaginei que estivesse pensando na campanha que o colégio propôs.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!– Na verdade, eu tô pensando nela sim. Eu tava indo embora pra casa, e, passando em frente da diretoria, me lembrei da campanha. Mas acho que não vou doar.
Ele se surpreendeu com a confissão, porém, a racionalidade no tom de voz da aluna o fizera mascarar suas emoções. O que levaria uma jovem a pensar daquele modo?
– Mas por que não? - resolveu investigar.
– E por que sim? - respondeu, sem alterar-se.
– Porque pessoas precisam desse dinheiro...
– Eu também preciso dele.
Ele sustentou aquele olhar gélido, que roçava-lhe o rosto, sincero e ingênuo em sua racionalidade monstruosa.
– O dinheiro não é de seus pais?
– É minha mesada, e já é o segundo mês seguido que peço ela adiantada.
O professor abafou, em sua garganta, um suspiro aflito.
A ganância cegava-lhe. A miséria parecia-lhe distante, ou, ao menos, mais distante que suas necessidades e privilégios.
Pousou-lhe a mão no ombro e falou, cuidadoso:
– Acho que eu não sou ninguém pra dizer o que é certo ou errado, e, por isso, quero te contar minha opinião. Eu achava que doar dinheiro era o jeito mais fácil de praticar a caridade, exatamente pelo fato de que, para nós, da classe média, ele não nos falta. Mas até dar uma esmola parece difícil hoje em dia.
Os olhos da jovem desviaram-se dos dele, incomodada e entristecida consigo própria. Ela não via nada, porém. Olhava para dentro de si, pálida de vergonha.
– Desculpe se fui indelicado - concluiu, desprendendo aquele suspiro dos lábios. – Cada um sabe de si, e não estou aqui para julgar ninguém. Se vai doar ou não, cabe a você escolher.
E sorriu gentilmente como despedida, dando-lhe as costas e seguindo seu caminho.
Ainda com o dinheiro nas mãos, viu-o partir.
Fale com o autor