A Diferentona

Festa do Pijama


Chegando à casa de Virginia, me deparo com uma enorme mansão branca assim que ela estaciona em frente ao lugar.

— Eu já te contei que meus pais são muito ricos? – Ela se vira para mim. Balanço a cabeça positivamente. – Tipo, eles são tão ricos que podem te comprar uma família nova ou até mesmo ressuscitar a sua antiga.

Ao entrarmos na residência carregando um monte de sacolas, tenho mais noção do quão grande é o recinto.

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— Eu sempre me perco aqui – Virginia fala sacando o celular. – Por isso, toda vez, recorro ao GPS para saber onde estou e aonde quero ir.

Subitamente, uma mulher de idade e com o olhar cansado aparece para nos receber.

— Boa tarde, senhorita McBitch – ela diz.

— Emily, essa daqui é a Dolores, minha escrava latina – Virginia me apresenta à mulher. Aceno timidamente para ela. – Meus pais a chamam de empregada, mas para mim é a mesma coisa. Se essa preguiçosa não me obedece, eu meto o chicote nas costas dela.

— A senhorita precisa de algo? – pergunta Dolores.

— Agora não, puxa-saco – ela responde. – Pode se retirar e assistir à novela mexicana das seis. Pelo jeito é a única coisa que vocês, pobres, têm como entretenimento. – E se volta para mim depois que a empregada vai embora. – Vamos pro meu quarto. Fica no andar de cima.

Subimos uma escadaria de mármore e andamos até o final de um longo corredor, onde há uma porta que dá para o quarto de Virginia. Antes de entrarmos, imagino uma masmorra cheia de objetos de tortura, mas, na verdade, o quarto é como o de qualquer outra adolescente, só que mais espaçoso e rosa. Uma vez dentro do cômodo, McBitch fecha e tranca a porta. Ao ligar um rádio sobre o criado mudo, uma canção da Taylor Swift toca em alguma estação. De repente, as três gritam histericamente.

— Eu não acredito que é a nossa música! – Karina fala, animada.

— Isso é tão top! – diz Greta.

— O que é top? – Virginia pergunta.

— É uma gíria brasileira – ela responde.

Em seguida, elas iniciam a cantoria junto com a artista:

So it's gonna be forever
Or it's gonna go down in flames
You can tell me when it's over
If the high was worth the pain

Got a long list of ex lovers
They'll tell you I'm insane
'Cause, you know, I love the players
And you love the game
...

No momento em a que a canção termina, outra (dessa vez, da Inês Brasil) começa a tocar, e elas param de cantar. Contudo, eu berro empolgadamente e me descabelo toda por essa ser a minha música favorita, portanto, acompanho Inês a partir do segundo em que ela solta a voz:

Hoje eu tô, que tô, que tô
Hoje eu tô, que tô, que tô
Se é pro baile de funk
Eu vou contigo, meu amor
Mas se for pra fazer guerra
Não me chama que eu não tô

Make, make, make love
É muito melhor, demorou
(demorou, demorou)...

UI, QUE DELICIA! – giro com os braços abertos ao som de Make Love.

— Bicha, pare – Virginia fala desligando o aparelho. – Você não pode gostar de Inês Brasil. É suicídio musical.

— Totalmente – Greta concorda. – Além disso, só os homossexuais ouvem isso. Você não é, né?

— Não – digo. – Desculpe.

Toc, toc, toc.

Ouço batidas na porta.

— Meninas, vocês estão aí? – Diz alguém do lado de fora com uma voz feminina e abafada. A maçaneta começa a chacoalhar freneticamente.

— Já estou indo! – Virginia revira os olhos e caminha em direção à porta.

— É a mãe da Virginia – Greta me conta sussurrando. – Por ser casada com um cirurgião plástico, ela recentemente botou hidrogel no traseiro. Nós a chamamos de “bunda de concreto”. Logo você vai entender o porquê.

A porta é destrancada e uma mulher de cabelos loiros nada naturais entra. Deve ter por volta de quarenta anos, no entanto, há tanta plástica no rosto que aparenta possuir dez a mais. Ela usa salto alto e um vestido vermelho bastante decotado, sendo impossível não prestar atenção em seus peitos que parecem duas bexigas prestes a explodirem. Se me pedissem para definir a mãe de Virginia McBitch em duas palavras, eu diria: “boneca inflável”.

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— E aí, meninas? – ela diz empolgadamente. Sua expressão é assustadora. Os olhos são arregalados como se algum médico tivesse tirado suas pálpebras e a boca, esticada num largo sorriso, não se mexe quando fala. – Acabei de chegar e, por causa da música alta, notei que vocês estavam aqui. Só passei para dar um “oi”.

— Pronto, já deu – diz Virginia com rispidez. – Pode ir embora agora.

— Quem é a sua nova amiga? – Ela pergunta, referindo-se a mim, assim que percebe minha presença.

— Mãe, essa é Emily – responde McBitch, impaciente. – Emily, essa é a insuportável da minha mãe.

— Muito prazer, senhora McBitch. – Me aproximo, estendendo a mão para cumprimentá-la, no entanto, ela me abraça.

— Por favor, me chame de Pamela. “Senhora” me faz parecer uma mãe velha e chata. – Ela anda até uma penteadeira e puxa a cadeira para sentar. – Mas, me contem as novidades. Quero saber de tu... – BUM! Ao sentar, as pernas da cadeira quebram e Pamela cai de bunda no chão. O quarto inteiro começa a tremer, objetos saem do lugar. Apoio-me na parede ao lado para manter o equilíbrio.

O pequeno tremor cessa.

— Desculpe, meninas. – Pamela se levanta, deixando um buraco no piso, sendo possível ver o andar debaixo através dele. A cadeira já era. – Depois que turbinei minha raba pra ficar linda igual a Barbiezinha, me esqueço que preciso ser mais cuidadosa.

— Mãe, já é o quinto terremoto que você causa essa semana! – Virginia reclama furiosa. – Você só me faz passar vergonha! Sai daqui!

— Tá bom, não está mais aqui quem abriu um buraco no chão com a bunda. – Pamela se retira do quarto, no entanto, retorna e se agacha, pegando do tapete algo parecido com um biscoito oreo. – Esqueci meu mamilo. Ele vive descolando do meu peito. – Em seguida, vai embora, fechando a porta.

— Agora que a idiota da minha mãe caiu fora, podemos começar a festa do pijama jogando “verdade ou desafio”.

— Eu nunca joguei “verdade ou desafio” – confesso.

— De que planeta você veio? – ela questiona.

— Planeta terra?

— Ok, vamos jogar imediatamente.

Virginia vai ao andar debaixo e alguns minutos mais tarde, volta com uma garrafa de vodka na mão. Nos sentamos no chão e Greta explica como o jogo funciona.

— Eu começo – McBitch diz. Ela gira a garrafa, que após segundos rodando, para e aponta para Karina. – Verdade ou desafio?

— Desafio – ela responde.

— Desafio você a enfiar o punho inteiro na boca.

— Isso é fácil demais. Já enfiei até uma bola de boliche.

— Então eu te desafio a beijar a Greta. Na boca. De língua.

— Desafio aceito – diz Karina.

— De jeito nenhum! – Greta protesta.

— Ah, me poupe! A gente sabe que você é uma lésbica enrustida e não tira os olhos dos peitos da Karina.

Greta fica boquiaberta, sem nenhuma resposta para o que Virginia acabou de falar.

— Isso é verdade? – Karina pergunta à Greta, que fica corada.

— Mas é claro que é! – McBitch responde antes que Greta possa dizer alguma coisa. – Só que você é burra demais para perceber. Agora, se beijem, piranhas!

Greta se inclina para Karina e encosta os lábios nos dela. As duas ficam longos segundos ali, trocando caricias enquanto se beijam. Sinto o cheiro do couro.

— Já chega – Virginia as interrompe. – Já tá parecendo um pornô.

— E-eu não sou lésbica – Greta gagueja sem um pingo de certeza na voz.

— E eu sou virgem de todos os orifícios – McBitch fala ironicamente.

— Eu apenas segui as regras do jogo – ela tenta convencer a si mesma. – Apenas isso. – E muda de assunto. – Minha vez. – Quando Greta gira a garrafa, ela para apontando para mim. – Verdade ou desafio?

— Verdade – digo sentindo um frio na barriga.

No momento em que ela se prepara para me indagar, meu celular toca. Retiro-o do bolso e vejo quem está me ligando. Número desconhecido.

— Vocês podem me dar licença? – pergunto às oxigenadas, levantando. – Devem ser meus avós.

— Tudo bem, só não demore – avisa Virginia.

Assim que saio do quarto e fecho a porta, atendo a ligação.

— Alô?

E aí, traidora? — diz a pessoa do outro lado da linha. Reconheço sua voz de imediato.

— Laquisha?

E eu, Judas! — fala Bart. — Laquisha pôs no viva-voz para eu participar da briga.

— Espera, como vocês descobriram meu número?

A gente roubou seus dados na secretaria da escola — Laquisha responde –, porque é isso que amigos fazem.

— E psicopatas! – acrescento.

É, nós somos isso também — ele diz.

Ficamos preocupados por você não ter aparecido na audição – ela conta –, aí fomos até a casa dos seus avós e eles disseram onde você estava.

NO COVIL DA MCBITCH! Você é burra desse jeito ou assistiu algum tutorial no YouTube?

Eu estava indo para o auditório, mas as oxigenadas apareceram do nada e me obrigaram a fazer parte da festa do pijama delas. Tudo aconteceu tão rápido e agora eu estou com uma calcinha fio dental, que compraram para mim, enterrada no rego, e acho que hoje à noite vou beijar uma garota.

— E como você não convidou a gente?

Bart!— Laquisha o repreende.

Quer dizer — ele se corrige —, como você pôde nos trocar por uma festa do pijama sapatônica?

— Me desculpem! – digo. – Mas será que eu não posso ser amiga delas e de vocês?

Claro que não! — ela responde. – Porque para elas, você não é amiga. E agora, você também não é para nós. Vou desligar. Não porque eu quero, mas porque meus créditos estão acabando. Eu poderia ficar o resto do dia te xingando, sua falsa!

Close errado, ferrugem — Bart fala.– Divirta-se no ninho de cobras.— E encerra a ligação.