Avatar: A Lenda de Kyoshi

XVI - A União


O dia já começara alegre; com Xudok lambendo o rosto de Myoshi a fim de acordá-la e visando no futuro uma possibilidade de brincadeiras e comidas com sua dona.

Sua felicidade em lambê-la, pulando de um lado para o outro e rodopiando no mesmo lugar, era tanta que até Kyoshi esboçava um sorriso hora ou outra.

O alce-leão-dente-de-sabre jamais estivera tão feliz e tratando Myoshi tão bem quanto nos últimos dias. Imaginou que, ao receber tantos maus tratos de Handu e seus homens, o animal passou a valorizar Myoshi e o amor que recebia ainda mais.

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Myoshi levantou, ainda meio sonolenta, enquanto Kyoshi já estava acordada, sentada em sua cama, dobrando uma pequena rocha tranquilamente.

E tranquilamente têm sido os dias em Omashu após o julgamento. Treinava sua dobra de fogo com o calejado e experiente Lee diariamente, aperfeiçoava sua dobra de terra com Kyoshi quando sua irmã estava de bom humor, brincava com seu alce-leão-dente-de-sabre e conversava e ria com a Rainha Maru.

Por mais que não tenha visto a rainha nos últimos dias, Maru cedeu o melhor dos aposentos do palácio para Myoshi e sua irmã, e garantia de segurança para elas e seus animais de estimação. Para melhorar, os batedores de Handu informaram que o exército de Chin enfrentou problemas na estrada, e portanto, demoraria para cercar a cidade.

Com tudo na paz dos espíritos, Myoshi recebeu a servente da rainha que viera trazer o desjejum, e junto com sua irmã, Bicudo e Xudok, comeu até se estufar e ficar com vontade de deitar e dormir. Porém, hoje era mais um dia de treino com Lee.

— Estou indo treinar. — Avisou para a irmã.

— Treinar? — Ela questionou. — Aquilo tá mais pra brincadeira. Se fosse comigo, você sairia queimada todo treino.

— Você não estaria me treinando, então. Lee é tão bom professor que eu já consigo executar tudo que ele me ensinou.

— Exatamente. É o momento de ele te ensinar outros movimentos, então. Se você continuar nos mesmos, não vai evoluir nunca.

Myoshi olhou para a irmã pensativa e deixou o quarto.

O dia estava ensolarado. Myoshi esgueirou-se por entre os corredores em direção ao pátio de treinamento, onde Lee a esperava pacientemente. Alguns guardas de Omashu patrulhavam o palácio com lanças e espada embainhadas.

Sua relação com o exército não melhorou após o julgamento, e muito menos com Handu. O silêncio era tão afiado quanto o aço, e tudo parecia uma calmaria antes da tempestade, segurada apenas por um julgamento.

Lee estava sentado no solo, meditando.

— Lee? — Ele abriu um olho. — Estou pronta para treinar.

— Claro. — Ele se ergueu em um pulo. — Vá para o outro lado do pátio e tome sua posição de costume. Hoje você bloqueará alguns golpes.

— De novo?

— A prática leva à perfeição, Myoshi.

— Essa prática não está me levando à evolução.

— Algum problema com os meus ensinamentos Myoshi? Pode dizer.

— Só queria tentar algo novo, só isso.

— Fogo não é como água, Myoshi. Se algo der errado, você não vai apenas se molhar. Sua natureza é ferir profundamente.

— Obrigado pelo óbvio, Lee. Mas estou preparada para me ferir.

— Está?

— Eu já estou grande suficiente pra saber se estou preparada ou não, Lee.

— Você é só uma criança em muitos sentidos, Myoshi. Apesar de ser a pessoa mais poderosa do mundo.

— Eu gostaria muito de ser uma criança ainda, Lee. Mas não sou.

— Acho que eu também. Mas farei o que você pede, Avatar.

O treino iniciou sem muita intensidade. Apenas com novas posturas e formas de efetuar golpes. Antes, Myoshi sentia apenas que produzia o fogo, agora, Myoshi sentia o fogo dentro de si a cada respiração e a cada disparo de chama, como uma onda de poder que corria pelo seu corpo.

Até que os verdadeiros exercícios começaram. Lee lançava um golpe brutal atrás do outro, sem piedade alguma. Myoshi desviava e defendia o melhor que podia, desferindo um contra-ataque quando tinha oportunidade, que eram poucas.

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Durante os minutos de sofrimento, entendeu melhor a movimentação de Lee e a luta começou a ficar mais igual. Lee parecia nervoso, ansioso até. Não pela luta, mas por outro motivo. Estava longe do seu padrão ideal.

Por outro lado, Myoshi estava melhorando gradualmente, e não cansava tanto quanto Lee devido a idade. Queimou-se uma vez ou outra durante o treinamento, seu braço ardia enquanto desferia golpes, e Lee utilizava da sua experiência para se movimentar muito menos.

Até que ele a pegou. Um dos golpes a atingiu em cheio, e Myoshi caiu com o corpo quente, defumado. Lee se aproximou e a ajudou a levantar.

— Eu avisei que você poderia se machucar.

— Eu treino com a Kyoshi, Lee. Se machucar é mais normal do que você imagina para mim. E eu aprendo melhor assim. Não vou cair nesse seu golpe novamente.

— Espero que não. — Ele disse, melancólico. — Você... me considera um bom professor?

— Do que você tá falando? Claro que sim. O melhor professor de dobra de fogo que já tive! — Brincou.

— E como pessoa? Você me considera uma boa pessoa?

— Lee, tem alguma coisa acontecendo?

— Nada. — Sorriu. — Treinamos outro dia, Myoshi.

Seu professor deixou-a com um caminhar monótono e melancólico, como se viver fosse o maior esforço que seu corpo poderia executar. Myoshi ficou para trás, sem compreender e sem falar.

Desolada, Myoshi retornou para seus aposentos lentamente, tal como seu mestre, com o corpo tão pesado quanto um bisão voador.

Banhou-se sem pressa nenhuma, tomando o tempo mais do que necessário para ficar limpa. Na maior parte do tempo, divagou por entre os pensamentos. Imaginou como seu pai lidaria com Handu; provavelmente com força bruta e ignorância, tal como a Kyoshi. Mas algo dizia para Myoshi que esse não era o melhor caminho a trilhar. Handu era um ser humano. Terrível, talvez. Mas ainda assim merecia uma segunda chance, como todos merecem.

Rainha Maru aproveitou sua segunda chance com Myoshi, e hoje estavam tão próximas quanto um Avatar e uma rainha podiam, com exceção do fato que não se viam em dias. Por isso, decidiu vê-la.

Deixando o banho, se trocou rapidamente para ir visitar a rainha. Os aposentos da monarca estava fechado com quatro guardas na frente.

— Desejo ver a rainha.

— Ela está indisposta. — Um deles disse.

— É ela que está indisposta, ou vocês?

— Pense o que quiser. — Outro respondeu. — Você não irá vê-la no momento.

— Vocês sabem que eu posso arrebentar vocês e a porta que vocês estão defendendo em alguns instantes, não é?

— E você sabe que isso só pioria a sua situação, certo? — O mesmo guarda respondeu.

— Tenha paciência, Avatar. Você vai vê-la eventualmente.

Myoshi não dignou os soldados de uma resposta. Furiosa, retornou para seu quarto, onde encontrou Kyoshi distraída com Bicudo.

— Irmãzinha! — Ela cumprimentou.

— Oi Kyoshi. Como ele está? — Perguntou, se aproximando de Bicudo.

— Melhor. Nunca mais será o mesmo, óbvio, mas ainda pode ser um companheiro e tanto. Não é Bicudo?

A ave grunhiu positivamente. Myoshi sorriu.

— Ótimo! Espero que você nunca mais quebre sua perna, Bicudo. Não sei como vai sobreviver caso contrário. — Ele pareceu ficar triste. — E cadê o Xudok?

O alce-leão-dente-de-sabre já havia crescido consideravelmente. Ultrapassava sua cintura, e logo, ultrapassaria sua altura, não tinha dúvidas. Seu filhote se transformaria em um monstro. Seu monstro. E Myoshi seria o monstro de Xudok em retorno.

— Ele está enorme Myoshi. Deve estar irritado de ficar preso dentro desse quarto. Merda, até eu estou. Ele deve estar querendo correr, respirar o ar puro, matar algumas presas.

— E ele poderá fazer tudo isso quando Chin vier até as muralhas de Omashu e ser derrotado.

— Espero que você esteja certa. — Um silêncio se prosseguiu. — Como você fez aquilo, no julgamento?

— Fiz o quê?

— Você sabe... Se transformou no Avatar Kuruk.

— Não faço ideia. Eu simplesmente... Me transformei. Na verdade, sinto que eu sou ele. É estranho.

— Se é estranho pra você, imagine pra mim. Ver minha irmã como um homem bonitão. — E riu.

— Cala a boca! — Ambas riram.

— Mas — Kyoshi retomou, acabando as risadas. — foi muito... Assustador. Dava pra sentir o poder e a energia de Kuruk. O ar ficou frio, assim como a voz dele. Aquela voz carregada de ódio e rancor.

— Eu... Sinto o ódio e rancor dentro de mim toda vez que vejo ou falo com ele. Como se fossem meus próprios sentimentos.

— Essa ligação entre as vidas dos avatares é sem dúvida sinistra. Conseguir ter os sentimentos de uma pessoa morta, e até falar com ela. Não é natural.

— Eu sinto que é a coisa mais natural do mundo. Como se ele sempre fizesse parte de mim, desde que eu era pequena.

— Uma pena que você nunca virou ele quando pequena, ia me dar um susto e tanto.

— Acredite, você não ia ser quem ia se assustar mais.

Mais um silêncio desconfortável se seguiu.

— Espero que ele apareça quando Chin chegar. — Myoshi confessou.

— O quê?

— Eu espero que ele salve todos.

— Você é a única que pode salvar a todos, irmãzinha.

— Eu não posso salvar ninguém. Eu mais coloco os outros em perigo do que qualquer outra coisa. Kuruk é tudo que eu não sou.

— Realmente, ele é bonito. — Quando viu que Myoshi não riu, Kyoshi continuou: — Você não deve depender dele, Myoshi. Você tem a sua própria força. Você é a Avatar, e ele está morto.

— Mas...

— Sem mas, Myoshi. Confie em você como eu confio. Como o próprio Kuruk confia.

— Não sei se ele confia tanto em mim...

Myoshi foi cortada pelas portas do quarto abrindo. Adentrou uma servente, com o papel mais enfeitado que Myoshi já vira.

— O que você quer aqui? Já chegou a hora da janta? — Kyoshi perguntou.

— A Rainha Maru convida vocês para sua festa que acontecerá daqui alguns dias. — Ela disse, entregando o papel para Myoshi. — Ela espera ansiosamente a presença de vocês. — A serva saiu do cômodo.

Myoshi leu o papel desacreditada.

— Festa? Eu amo festas. — Kyoshi afirmou sem pestanejar. — O que vamos comemorar?

Boquiaberta, Myoshi não conseguiu responder. Ainda processava as palavras que lera, as palavras que foram como uma facada em seu coração. As palavras que diziam o seguinte:

“Vocês estão convidadas para a união em matrimônio entre a Rainha Maru e o General Handu.”

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.