Renegados

Capítulo 5 - Coldre


A construção em que Lucien instalara seus aliados era grande o suficiente para que a maioria dos membros tivesse seu próprio quarto. Prioritariamente, os mais importantes tinham os melhores. Axell era a carta na manga do plano e por isso, seu quarto era o mais agradável possível, além de ter uma janela que permitia que as brisas dos dias entrassem no cômodo. Poucos eram os móveis, mas o arranjo e a disposição deles davam ao quarto uma sensação reconfortante.

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Ainda era manhã quando uma das abas da janela do quarto de Axell se abriu estupidamente; o sol havia acabado de mostrar seu resplendor. O ranger da madeira o fez pular da cama de susto. Momentaneamente, uma leve tonteira se apossou dele, e ele recuou com a reação. Assim que o baque do susto o abandonou, Axell notou uma silhueta familiar sentada na beirada da janela observando-o. Segurando uma maça pela metade, Knight o encarava com cobiça nos olhos.

Axell suspirou ao lembrar-se do pedido de Lucien do dia anterior. “Deixe que ela te faça de aprendiz.”

— Você só pode estar de brincadeira — Murmurou enquanto esfregava o rosto com uma das mãos. Sentiu remelas serem reveladas ao passar os dedos na região superior do rosto e forçou-se a limpar os olhos.

Com a mão contrária a que segurava a maça, ela levantou o dedo indicador e o pressionou contra os lábios ressecados.

— Só eu quem pode falar aqui — Axell mirou-a com incredulidade. Ele estava começando a duvidar da sua capacidade de lidar com a mulher. Os lábios dele estavam comprimidos.

Knight avançou na direção de Axell e ao chegar a polegadas de seu corpo, estendeu a mão para o rosto dele. Instintivamente, Axell recuou; o que não impediu que ela segurasse o queixo do homem e o erguesse para que os olhos de ambos se encontrassem.

— Um rosto tão bonito... — Ela passou um de seus dedos no lábio inferior de Axell, deixando-o desconfortável e levemente corado — Eu ainda quero aproveitar esse rosto, então não feche a cara para mim novamente, tudo bem?
Axell deixou que as rugas de sua testa se desfizessem, porém permaneceu em silencio.

— É assim que eu gosto — Ela sorriu abertamente, os dentes amarelados ainda residiam em sua boca. Contudo, o odor podre saíra.

— Você tem dez minutos para me encontrar no salão de treinamento.

Dito isto, ela se foi.

Não fora um pedido, mas uma ordem; e Axell sabia bem disso. Ele não conseguia aceitar que teria que passar por aquilo, porém se recusava a negar aquele pedido de Lucien. Aceitando seu destino do dia, ele jogou-se de costas na cama abruptamente, respirou o mais fundo que pôde, buscando inspiração, e levantou-se rapidamente outra vez. A missão implícita que Lucien não falara o aguardava; conquistar a afeição da mulher, acima de tudo.

Axell vestira-se rapidamente, não havia motivo para se demorar levando em consideração seus poucos bens. Sentindo os mornos raios de sol entrando por sua janela, deixou o quarto e se encaminhou para a escada central.

A construção tinha partes no subsolo também, e o salão de treinamento residia nesta área. A localização deles era privilegiada. Quem quer que olhasse, acharia que era apenas mais uma guilda ou um bordel qualquer; mas caso conhecesse o interior do lugar, veria que era muito maior do que aparentava. Há muito havia sido uma guilda de assassinos, o que explicava as construções abaixo da terra; era uma rota de fuga brilhante.

Axell continuou descendo as escadas, corria em direção à lareira. Na pressa, esbarrou em um dos brutamontes que ali moravam enquanto pulava degrau após degrau rapidamente, fazendo-o quase cair.

— Mas que porra foi essa? — Wade era um homem grande e sua idade não fazia jus a sua aparência, visto que parecia ser bem mais velho do que realmente era. Os dois não se davam muito bem, Wade sempre suspeitara que Axell não era o que dizia ser e a desconfiança dele resultou em uma rixa desconfortável para ambos.

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Axell respirou fundo.

— Desculpe, Wade.

— Desculpas não reparam nada, pirralho.

— Mesmo assim, desculpe. Eu estava com pressa e...

— Acha que eu me importo? Vai, sai logo daqui.

Axell rogava por paciência sempre que colidia com Wade, e graças aos deuses, ele a ganhava. Forçando-se a aliviar o semblante, saiu em disparada novamente. Na sala de visitas, havia uma lareira, e nela, tudo ocorria.

Ainda haviam cinzas espalhadas no local em que o fogo antes crepitava, e ao se agachar nele, sentiu os dedos enegrecerem. A parte que deveria ser preenchida por parede era, na verdade, um encaixe de pedra que ao ser empurrado, liberava uma pequena passagem para o outro lado do cômodo.

Uma passagem rústica, porém útil.

Os mais novos aliados sempre soltavam risadas de deboches ao ver alguém empurrar a rocha, a infantilidade da comparação da posição em que ficavam com a da de uma mulher na cama os faziam gargalhar. Axell nem mais se importava, era homem o bastante para enxergar a estupidez existente nessas comparações de desrespeito.

Um som ríspido atingiu seus ouvidos. Notou que havia empurrado o encaixe de pedra o bastante para que ela caísse no pequeno vão que existia logo a frente dela. “Graças aos deuses”, agradeceu. Ele odiava a força que precisava fazer para mover aquele encaixe. Com o espaço livre, ele se esgueirou para a escuridão do buraco e sumiu do alcance dos raios de sol da manhã.

Assim que seu corpo adentrou por completo no espaço, ergueu-se. O encaixe de pedra repousava no pequeno vão que ficava a polegadas da entrada do buraco. Juntando toda a força que lhe cabia, segurou as extremidades da rocha e levantou-a para o ar, jogando-a logo em seguida ao seu local de encaixe; fechando novamente a entrada da lareira.

Com a entrada selada, Axell começou a procurar a tocha que sempre repousava à direita da entrada. Como o fogo era um elemento chamativo, acha-la não fora difícil. Uma escadaria em direção ao subterrâneo se estendia e o fogo era sua única iluminação.

O campo abaixo era como um labirinto, propositalmente, claro. Por este motivo, muitos não podiam entrar lá sem permissão de um tutor. Felizmente,
Axell conhecia cada pedacinho daquelas extensões. Seguindo a ordem certa de corredores, chegaria a uma enorme porta de madeira pútrida. E após isso, bastaria abri-la para o inferno começar.

As portas, percebeu Axell, começavam a tomar uma grande importância na vida dele. Era como se seu próprio passado fosse aberto e desfiado pouco a pouco. Por um lado, ele gostava, pois talvez fosse mesmo a hora de aceitar-se para si mesmo; mas por outro lado, ele tinha medo de quem desfiaria os fios de sua vida.

Jogou os pensamentos de lado para deixar um suspiro pesado sair de si e encorajou-se.

Com um ranhar estranho, a porta se abriu; e para além dela, os cabelos negros de Knight se revelaram. A porta se fechou atrás dele e Axell encarou os olhos longínquos da mulher.

Sem que ele pudesse reagir ou se dar conta do que estava acontecendo, ela puxou uma adaga de seu coldre e lançou-a na direção de Axell. Quando ele percebeu o que vinha em sua direção, já era tarde demais. Ele não fazia ideia de onde Knight havia mirado, ou se havia realmente mirado em algum lugar, pois a adaga cravou-se na porta de madeira logo após rasgar sua orelha. Instintivamente, ele tocou seu lóbulo e as partes acima dele.

Sangue.

Sangue escorria de sua orelha, fora um corte perigoso. E se aquilo fosse parar na cabeça dele? Ou em sua garganta? No que diabos Knight estava pensando?

Rapidamente, Axell olhou para a adaga encravada na madeira da porta e retornou o olhar para ela. A expressão dele demonstrava tudo que a garganta o impossibilitava de dizer. Com nojo aparente, ela proferiu sua explicação.

— Você demorou treze minutos.