Aneliese PDV

"Uma nuvem encobre uma cidade costeira,
Eu vejo os navios passando e imagino se ela poderia estar
Lá fora e sóbria como uma fonte para a solidão,
Por favor, persista garota,
Está na hora de nos encontrarmos e fazermos bagunça.
Uma nuvem encobre e silencia minha felicidade,
Mil navios não poderiam me tirar da aflição.
Desejava que você estivesse aqui,
Eu sou um seguidor ferido,
Preciso agora que me coloque nos eixos, me corrija.
Eu chamo seu nome pelo ar, ninguém poderia se comparar.
Espere, há uma luz, há um incêndio iluminando o sótão,
Ou algo melhor, eu não poderia me importar menos,
Só fique um pouco comigo.
Eu desenhei seu rosto atrás dos meus olhos,
Um sótão em chamas, a prova do prêmio, anomalia."

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Anna Molly – Incubus

~*~

Eu estava horrível.

Queria pensar que era exagero e que soava superficial, mas meu reflexo no espelho me impedia de ser racional.

Minha bochecha que havia estado um tanto inchada na véspera, agora melhorara consideravelmente, mas um hematoma arroxeado tinha se formado próximo a meu lábio, apesar de ser uma marca pequena era perfeitamente visível e me incomodava. Como se não bastasse eu permanecera quase a noite inteira insone, quando finalmente conseguira dormir já passava das quatro da manhã e a consequência eram olheiras fundas que haviam se formado debaixo de meus olhos.

— Estou parecendo um zumbi. Estou mesmo!

A solução fora tomar um banho caprichado, apesar de não surtir grande efeito contra as marcas, servira para me revigorar. A maquiagem me ajudou a sentir mais confiante e aproveitei para secar o cabelo, ondulando as pontas. Definitivamente queria ficar bonita, pois não conseguia deixar de me achar uma anomalia esta manhã.

O machucado quase não doía, apenas algumas vezes dependendo de como eu falasse. Pensei sobre o encontro problemático que havia tido com Lauren e não consegui encontrar um ponto positivo em nossa conversa. Analisando-a via que tinha sido inútil para ambas as partes.

Eu não havia me esquecido das considerações que tinham me impedido de dormir esta madrugada, de fato tudo o que pensara estava perfeitamente nítido em minha cabeça e o efeito era oposto ao esperado: não acreditava se tratar de incoerência, mas sim de notável exatidão.

Edward Cullen fora capaz de causar grande influência sobre mim, tão poderosa que se manteve presente mesmo quando ele não estava e me fez agir sem pensar. A Aneliese de antes jamais se envolveria com alguém sem estar apaixonada, jamais deixaria que as coisas saíssem do controle, eu costumava ser impecavelmente centrada quando se tratava de amor, era bastante reservada. Só que ultimamente não estava em meu juízo perfeito.

Trinquei o maxilar, profundamente aborrecida com a direção que meus pensamentos tomavam. Depois que me permitira ser sincera era impossível voltar atrás, mesmo que quisesse. E não havia dúvidas de que estivesse envergonhada por ser vítima de minhas atitudes.

Era minha vida, eu deveria estar no controle!

Passei tanto tempo no andar de cima que quando desci Charlie não estava mais na casa, isto fez com que me sentisse mal, pois sabia que ele não saía sem se despedir, provavelmente não o ouvira partir por causa do som alto do secador. Decidi que lhe pediria desculpas quando o encontrasse à noite.

Comi às pressas duas torradas, não pude me alimentar melhor e compensei bebendo um grande copo de suco, esperando que me ajudasse a enganar o estômago até o horário de almoço. A manhã estava nublada e curiosamente quieta, me fez sentir como se estivesse dentro de um domo de vidro. Quando abri a porta, não pude ir direto para a picape, pois no chão da entrada havia uma caixa de papelão, se tratava de uma entrega, pude constatar pela etiqueta do correio, mas era algo muito inesperado, o carteiro obviamente havia passado depois que Charlie saíra, eu não tinha ideia de que o serviço postal da cidade funcionasse tão cedo.

Me abaixei para olhar os escritos e me admirei ao deparar com meu sobrenome. A encomenda era para mim, curiosa resgatei a embalagem do chão e a trouxe para dentro.

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Virei o pequeno embrulho nas mãos e logo fui capaz de reconhecer a caligrafia desajeitada.

— Rafaela?

Meus olhos ficaram grandes de surpresa e a ansiedade se instalou em meu peito, não esperava por algo assim e fiquei emocionada. Sentia saudades de minha amiga, saudades de minha casa. O momento fora oportuno, pensar nas pessoas que se importavam comigo me ajudou a não me sentir tão sozinha.

Busquei por uma tesoura e rapidamente me desfiz da fita adesiva, o interior da caixa me revelou duas coisas: uma carta e um porta-retratos que já vinha equipado com uma foto. Rafaela e eu durante a viagem que havíamos feito com a turma do colégio, um momento especial.

Não quis que as lágrimas se formassem, mas elas não seguiram meu desejo, olhar aquela imagem me trouxe inúmeras recordações de um tempo em que tudo era simples, nós nem mesmo havíamos completado quatorze anos. Havia sido pouco antes de eu ter conhecido Alex, quando ainda era uma menina inocente, quando relacionamentos amorosos não me tiravam o sono. Parecia que o passado estava distante demais quando sequer havia completado uma década desde que tirara aquela fotografia, tudo era notavelmente diferente. Será que durante aqueles dias eu sequer poderia imaginar que acabaria presa dentro das páginas de um livro? O que diria se fosse capaz de prever o futuro, será que fugiria do destino? Ou apenas esperaria que acontecesse?

Era quase impossível chegar a uma conclusão quando eu já estava dentro do ocorrido.

Não escolhera um dia bom para chorar, tive que conter a emoção para evitar que toda a maquiagem escorresse por minhas bochechas. Ao me recompor fui até a sala e encontrei um espaço entre os retratos sobre a lareira, Rafaela me mandava um beijo de onde estava enquanto a pequena Aneliese ao seu lado sorria abertamente, ambas pareciam felizes, as faces coradas depois de muitas horas se divertindo. Ao fundo era possível contemplar o anoitecer sobre a baía, o mar capturado em meio ao movimento incessante das ondas e algumas nuvens perdidas no céu. Um dia passado em paz, será que eu voltaria a ver a vida pela mesma perspectiva de antes?

Não saberia responder.

O que tanto teria de passar nesta nova realidade se um dia decidisse voltar para casa? E quando voltaria para casa? Forks de repente me pareceu um lugar estranho, presa às recordações de minha terra natal eu não podia dizer que não sentisse saudades. Será que deveria enfim partir? Será que conseguiria não somente encontrar o caminho de volta, mas deixar para trás tudo o que vivenciara em Crepúsculo?

De algum modo estas informações eram demasiadas para lidar. O mundo que agora habitava reivindicou minha atenção e fui obrigada a largar todas as questões para trás.

Uma passada rápida pelo banheiro serviu para consertar a maquiagem borrada, ao descer peguei a carta e a guardei na mochila, disposta a lê-la assim que tivesse tempo, joguei o embrulho no lixo e saí apressada. Perguntaria a Charlie mais tarde se ele gostaria que eu mudasse o porta-retratos de lugar, mas por enquanto ele permaneceria onde o colocara. Estava incrivelmente atrasada e só o que pude fazer foi dirigir rumo à escola, ocupada com meus pensamentos enquanto procurava inventar uma desculpa para dar ao professor quando chegasse.

Por causa dos minutos de atraso esperava não encontrar nenhum estudante à vista, mas quando me aproximei do colégio pude ver que muitas pessoas andavam de um lado para o outro, conversando entre si. Manobrei a picape para dentro do estacionamento e tive que fazer uso da buzina a fim de abrir espaço entre os pedestres, tive impressão de que toda a escola estava fora das salas de aula.

Desliguei o carro, peguei minha mochila e saí. Mal tinha dado alguns passos quando um brilho estranho me envolveu, reconheci as luzes da sirene de um carro de polícia e minha respiração acelerou de espanto.

— Aneliese!

Jessica e Angela andavam até mim entre o aglomerado de gente.

— O que houve meninas?

— Um estudante do primeiro ano está desaparecido desde ontem à tarde.

— O quê? É sério?

— Sim. A polícia está à procura dele, os pais acabaram de sair da sala do diretor.

— A mãe do garoto estava em prantos, como era mesmo o nome dele Ang?

— Spencer Davies.

— Isso. Ele era filho único.

— Ele é o filho único Jess. Ainda é.

— Ah Angela, você acha mesmo que ele está vivo? Não viu a cara dos policiais? Já devem saber de tudo, só não querem dizer.

— Jessica, tenha respeito!

— Quem são os policiais? Charlie está aqui?

— Não Liese, ele deve estar na delegacia coordenando a busca.

— Disseram que isso aconteceu ontem, vocês têm certeza? Em geral não se espera no mínimo setenta e duas horas para se considerar desaparecimento?

— Exatamente. Por isso digo que o caso é grave. Ouvi dizer que ele costumava ser um garoto muito reservado, mal saía e os pais logo deram por sua falta. Uma amiga minha mora perto da família e disse que ouviu os gritos da mãe chamando por ele. O levaram do quintal da própria casa!

— Não seja ingênua Jessica, você está realmente passando dos limites, mal sabe o que Lisa falou, além disso, como é possível alguém simplesmente desaparecer assim sem mais nem menos? Enquanto nada é oficializado lhe aconselho a parar de tratar o garoto como morto. Isso é muito cruel, até mesmo para você!

— Está bem, não irei insistir. Vou deixar você mesma constatar que Spencer jamais reaparecerá, algo ruim aconteceu com esse menino. Eu já ouvi histórias assim, pessoas simplesmente sumindo dos lugares sem deixar nenhuma pista, você pode procurar na internet e confirmar o que digo. Já aconteceu antes, é horrível!

Eu ouvia tudo o que conversavam e não sabia o que falar, uma sensação esquisita tinha tomado conta de mim, fui obrigada a concordar com Jessica, o clima era de tragédia, as pessoas cochichavam e olhavam ao redor preocupadas, esperando talvez que o garoto aparecesse entre a multidão.

Mas era um conto mal explicado, histórias como essa tendiam para o lado ilusório, as pessoas gostavam de uma fofoca, mesmo quando lidavam com a dor de alguém. Como podia ser certo de que se tratasse de um crime? Não queria soar descrente, mas jovens costumavam armar brincadeiras, às vezes apenas para gerar comoção.

— Porque afinal estão todos aqui do lado de fora?

— Estão fazendo uma busca e senhor Greene não quis que ninguém ficasse, pois isto poderia atrapalhar o trabalho dos policiais.

— Uma busca? Mas não faz sentido, o que eles pensam? Que o tal Spencer está escondido debaixo das carteiras?

— Eles procuram por pistas – esclareceu Jessica. – Quantas vezes tenho que dizer que o caso é mais sério do que vocês pensam?

— Jessica, porque você está tão convencida dessa versão?

Esperei por alguma resposta estúpida, mas ela ficou em silêncio e suspirou.

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— O que foi?

— Nada.

Porque agia estranhamente?

— O que é que você não está querendo nos dizer? – Angela também havia notado a diferença no jeito dela.

Jessica olhou para os lados da mesma maneira desconfiada que eu vira algumas pessoas fazendo, depois inesperadamente nos segurou pelo braço e nos puxou para longe do aglomerado, até nos sentarmos em um banco de cimento próximo às arvores.

— Eu vi uma coisa ontem – cochichou.

— Viu? Viu o que?

— Shhh, fale baixo ou não direi nada.

Ela olhava de forma mal humorada para Angela e não parecia estar blefando. Depois de um minuto continuou:

— Às segundas-feiras minha mãe costuma ir fazer compras em Tacoma e eu sempre a acompanho. E enquanto voltávamos pela rodovia ao anoitecer uma coisa surgiu na floresta, parecia um urso, mas era muito maior. E quero dizer realmente maior. O vulto cruzou a pista bem em frente ao nosso carro e apesar de não ter durado mais que alguns segundos foi suficiente para que notássemos a silhueta – parecia atemorizada. - Minha mãe está tomando calmantes a cada quatro horas, quase perdeu a direção de nosso carro e isso a deixou muito nervosa.

— O que exatamente você quer dizer com ‘uma coisa’?

— Eu não sei, era uma espécie de animal gigantesco, os vidros do nosso carro chegaram a sacudir quando ele passou.

— Hmmm.

— Você não acredita em mim, não é Angela? Será possível que hoje tirou o dia para me irritar?

— Me desculpe Jessica, mas esta sua história está mais para ‘contos da carochinha’. Não existem ursos na Península Olympic e você sabe bem disso.

— Eu não disse que se tratava de um urso, falei que era parecido. Pa-re-ci-do. Entendeu? Porque é que eu iria inventar uma coisa dessas? E já disse que minha mãe também viu, acha que ela está fingindo?

— Eu não sei o que acho, mas sei que você não está soando muito plausível. E além do mais, o que isso tem a ver com o desaparecimento? Você ficou branca quando Liese lhe questionou o porquê de insistir que Spencer Davies não está vivo.

Ela deu de ombros.

— Simples. Aquela coisa está solta por aí e deve tê-lo pego.

A risada de Angela fez Jessica cruzar os braços com irritação.

— Faz todo o sentido! Basta juntar as pistas, pense bem: o garoto sumiu da própria casa, os pais acham que algo ruim lhe aconteceu, a polícia está em estado de alerta, o diretor permitiu que a aula fosse suspensa só para ajudar no caso, quando foi que ele dispensou os alunos, mesmo que por poucos minutos, sem que no mínimo houvesse uma desgraça iminente? Sabe como ele é... Eu já falei e repito: algo ruim aconteceu com Spencer Davies, tenho certeza. Mas se você prefere não acreditar, tudo bem. A verdade vai aparecer mais cedo ou mais tarde.

— Se a criatura horripilante que você e sua mãe afirmam ter visto é real, porque nenhuma das duas contou a ninguém? Ao xerife, por exemplo - Angela fez um gesto largo em minha direção e Jessica pareceu repentinamente se lembrar de que eu também estava ali, seu olhar passou a meu rosto e seus lábios tremeram.

— Nós íamos, mas recebemos a notícia do desaparecimento e mamãe achou melhor não dizer nada, segundo ela os policiais poderiam nos interrogar e ela não gosta de se envolver em boatos. Os vizinhos iriam comentar...

— Quer dizer que além de vocês duas somente Aneliese e eu sabemos do ocorrido?

— Bem, é. Eu também não deveria ter dito nada, ela vai me matar se descobrir que contei, prometi guardar segredo.

A língua comprida de Jessica era tão traiçoeira que serviria para enforcar ela mesma. Estava óbvio que se arrependia de ter dito, mas agora era tarde, parecia pensar que eu de algum modo poderia lhe causar problemas com o xerife, entretanto minhas preocupações estavam muito além do que suspeitava.

Meu silêncio não fora opcional, à medida que escutara o relato, a capacidade de falar me faltou. Não havia dúvidas de que o que Jessica havia visto fora um lobo, a descrição batia perfeitamente com o perfil dos gigantescos protetores de La Push, mas a associação com o garoto era que me confundia. Logicamente não pensava que qualquer um dos lobisomens tivesse feito mal a um humano, mas porque tinha a impressão de que a resposta estava bem em frente ao meu nariz?

Acabava de ver a situação por um panorama diferente, era verdade que pessoas não desapareciam sem motivo, a não ser que fossem vítimas de algum tipo de violência, humanos infelizmente eram bons em maltratar uns aos outros, ocasionalmente revelavam ser tão sanguinários quanto os vampiros.

Vampiros...

Seres sedentos por sangue, perfeitamente capazes de fazer mal a uma pessoa. Excepcionais em serem discretos e não deixar pistas. Famintos. Mas quem afinal faria isso? Os Cullen eram os únicos a viver nas redondezas e se alimentavam de animais. Todavia eventualmente recebiam visitantes que não compartilhavam de sua dieta e acidentes poderiam acontecer.

Estremeci quando acabei por me recordar da vez em que eu quase fora a presa de um deles. Se Edward não tivesse chegado a tempo, a história seria outra. Isso queria dizer que nem sempre os Cullen podiam conter os instintos de seus amigos, mais do que isso, eu sabia que eles nada faziam a respeito. Eu não tinha mais qualquer ligação com aquela família, desconhecia se haviam visitantes em sua residência neste momento e era possível que houvesse. Se por acaso esta fosse a explicação para o desaparecimento do jovem, com efeito, nenhum humano ficaria sabendo.

Ainda que atestasse sua boa conduta e soubesse de sua intenção em se misturar, eu acreditava que fossem passíveis de acobertar um ataque, afinal era crucial que sua verdadeira identidade permanecesse oculta.

Repentinamente o burburinho das vozes se tornou mais pronunciado e muitas cabeças se voltaram para a mesma direção, acompanhei minhas amigas ao vê-las se levantar e consegui avistar os policiais caminhando pelo estacionamento rumo à viatura. O sinal de entrada soou e aos poucos os alunos começaram a convergir para o prédio, fiz o mesmo, mas Jessica me conteve, segurando de leve meu braço.

— Ei Liese, você não dirá nada ao xerife não é?

Procurei sorrir, mas tive certeza de que mal a convenci.

— Não direi nenhuma palavra, pode ficar tranquila.

Ela assentiu.

— Obrigada. Vai ser mais fácil não ter de lidar com uma possível bronca, na realidade prefiro deixar o assunto morrer.

— Acho que sua mãe logo esquecerá o que viu, você deveria fazer o mesmo.

— É o que acha?

— Sim.

Suspirou pesadamente.

— Também não acredita em mim, não é? Assim como Angela.

Abri a boca procurando lhe responder, mas logo a fechei. Tive pena porque sabia melhor do que ninguém que ela falava a verdade e mesmo assim não iriam acreditar. Eu também já estive naquela situação e não podia ajudar, estava de mãos atadas, presa ao compromisso de manter em segredo a existência destes seres míticos.

— É melhor entrarmos.

Notei sua expressão de aborrecimento quando começou a andar, rapidamente se afastando de mim, contive a vontade de lhe chamar, pois não havia muito que pudesse lhe dizer. Qualquer palavra que proferisse poderia colocar a alcateia em evidência e eu tinha por obrigação protegê-los, assim como faziam com os moradores daqui.

Dei graças pela conveniência de Angela não ter dado crédito às informações, caso contrário poderia acontecer da história se espalhar e ganhar credibilidade, o que representaria um belo de um contratempo. Os lobisomens eram assustadores, era verdade, mas sua aparência não revelava suas verdadeiras intenções, eles se preocupavam com a vida humana, tentavam mantê-la a salvo de um único inimigo em potencial: os vampiros. E apesar de os Cullen terem desígnios parecidos, eles em geral falhavam.

Sua presença era o que trazia outros de sua espécie e isto deixava a população ainda mais desprotegida. Se a vida de um pobre garoto havia sido tirada pelas mãos de alguém ligado aos Cullen, inevitavelmente a culpa também recaía sobre eles. Parecia muito irresponsável de sua parte, muito mesquinho e hipócrita!

Eu não poderia confortar Jessica, tampouco ter chance de alertar Jacob, já que ele sequer estava falando comigo, mas havia uma pessoa a quem eu tinha o dever de exigir explicações. E faria isso em minha condição de humana - uma humana privilegiada por saber mais do que os outros. Não era necessário expor ninguém, tampouco era este meu intuito, porém não ficaria de braços cruzados esperando que o tempo revelasse a autenticidade dos fatos.

A família de vampiros sequer tinha motivos para temer, sua força sobre-humana era suficiente para garantir sua segurança e em decorrência disso faziam o que bem entendiam. Não tinham porque se importar, sequer respeitar alguém como eu.

Uma coisa ínfima, porém fundamental, entretanto havia se modificado: minha coragem. Sentira na pele o quão atroz um vampiro podia ser e isto havia me tornado mais forte e disposta a lutar com toda a alma para me manter a salvo. Fora por causa deles que alguém de quem eu gostava muito se ferira e beirara a morte, fora por causa deles que eu tinha estragado a amizade mais preciosa que encontrara em Forks.

Sempre interferindo em meu destino, sempre me deixando à mercê de seus caprichos...

Eu fora terrivelmente tola e estava cansada de não reagir, de me calar e não fazer nada e permitir que as circunstâncias decidissem qual seria meu caminho. Queria saber a verdade sobre o paradeiro de Spencer Davies, me parecia muito errado que uma família sofresse com a ausência de um filho de que talvez nunca mais chegassem a ter notícias. Mais de uma vez a vítima fatal poderia ter sido eu e ninguém teria ficado sabendo. O silêncio seria eterno.

Então se eu tinha a chance de evitar que o sofrimento de uma mãe se prolongasse, era exatamente o que iria fazer.