Aneliese PDV

"Acho que você teve o melhor de mim,
Você está dormindo com o inimigo,
E me deixou completamente sozinha.
A batida diminui, estou tão sozinha,
Meu coração para, eu já sei...
Você me deixou completamente sozinha.
Estou farta e cansada da bagunça que você fez comigo,
Você nunca vai me pegar chorando.
Você deve ser cego, se não pode ver
Que sentirá minha falta até o dia em que morrer.
Sem mim, você é nada.
Eu desisto, finalmente superei esse drama que me fez passar.
Acreditei em você, você mentiu e deixou tudo pior.
Me despedaçou.
Então, basta olhar em volta:
Quem está completamente sozinho agora?"

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Blind – Kesha

~*~

Era a segunda vez que eu me pegava encarando fixamente o pequeno relógio sobre o balcão e novamente precisava de alguns momentos de concentração para garantir que ele se encontrava em perfeito funcionamento. Porque eu tinha de alimentar esta ridícula suspeita de que as pilhas poderiam estar falhando? Não havia nada de errado com o tempo, ele se desenrolava da mesma forma e depois de me ver outra vez dispersa em meu próprio trabalho tive de ser severa comigo mesma e admitir que a ansiedade estava conseguindo levar o melhor de mim.

Eu não devia ter insistido nisso. Onde estava com a cabeça?

Suspirei. Era meu lado covarde tomando partido, o nervosismo exercendo perfeitamente seu papel ao me subjugar.

Era sábado e o baile seria dali a algumas horas...

Eu cumpria minha jornada de trabalho na loja pela primeira vez apenas por obrigação, pois só o que queria fazer era sair de onde estava e ir logo me aprontar. Era uma ocasião importante e, além disso, seria a primeira vez que me arrumaria para tal evento sem o auxílio de minha mãe; assim como quando fazia compras, neste quesito ela insistia em se envolver. Ao menos eu acreditava ter tudo o que precisava e experiência suficiente de anos e anos observando as maquiadoras e cabeleireiras trabalharem em minha silhueta, esperava que fosse suficiente para que conseguisse causar uma boa impressão e evitar que no pior dos casos saísse de casa parecendo um espantalho.

Jessica havia me feito o favor de trazer as coisas que haviam ficado em seu carro na quarta-feira, eu tivera tempo de conferir as sacolas e fazer uma combinação mental do que precisaria para atingir o efeito desejado.

O dia anterior na escola havia sido muito tranquilo, a maioria dos professores evitara passar conteúdos extensos, a atmosfera estivera leve e descontraída. Os preparativos podiam ser vistos em toda parte, bexigas, laços e todo o tipo de coisa brilhante e espalhafatosa se encontrava sendo manipulada pelos voluntários. Edward não estivera em lugar nenhum à vista, o que de certo modo ajudou a elevar meu ânimo.

Eu lembrava bem da conversa nada agradável que havíamos tido há dois dias e observando as circunstâncias que nos cercavam agradeci pelo espaço que teria longe de sua presença, pois sem dúvidas agora só voltaríamos a nos ver no próximo dia de aula.

Senhora Newton aproveitara o baixo movimento para resolver algumas pendências no depósito e me encarregara de manipular a caixa registradora o que era na realidade um grande reconhecimento. Mike cuidava do atendimento nos corredores e me ajudava vez ou outra que um cliente aparecia. Porém por se tratar de um dia tranquilo as maioria dos minutos eu passara organizando mercadorias ao longo do maciço balcão de madeira.

— Psiu.

Ouvi o chamado sobre minha cabeça, pois estava agachada remexendo em algumas caixas e me ergui dando de frente com Mike.

— Muito trabalho? – Brincou.

— Não tanto quanto nos outros dias.

— Sim, hoje as coisas estão meio paradas. Se continuar assim provavelmente mamãe irá fechar a loja depois do almoço.

Juntei os lábios tentando conter o sorriso e a exaltação, aos sábados eu cumpria um horário menor que o habitual, se a mãe de Mike resolvesse fazer o que ele dissera significava que eu conseguiria chegar em casa quase duas horas antes do esperado.

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Ele me olhou de soslaio.

— Está doida pra ir pra casa, não é?

Não respondi. Mike era muito rígido quanto aos assuntos de trabalho, pensei que talvez devesse ter escondido melhor minha emoção.

Contudo ele sorriu em seguida.

— Tudo bem Liese. Imagino que as garotas fiquem assim mesmo em relação a uma festa, nem quero pensar no tanto de tarefas que vocês realizam apenas pra uma noite – bufou.

— Homens nunca querem saber dos procedimentos, contudo sempre aproveitam muito bem os resultados – semicerrei os olhos.

O sino da porta da loja anunciou a chegada de um cliente e Mike se afastou para atendê-lo me dando chance de voltar a meus afazeres. O trabalho de organizar os vários itens do balcão era fácil e dava brecha para que minha mente vagasse sem pudor. Durante as horas em que estivera ocupada com o serviço eu pensara sobre tantas coisas, a maioria delas fútil.

A cada meia hora mais ou menos o tema era automaticamente trocado por meu cérebro como se ele mesmo se cansasse de insistir no mesmo assunto. Nesta rodada eu refletia sobre Bella e sua vida no Brasil. Ao longo do último mês pouco havíamos nos falado e nossas mensagens em geral eram curtas. Não houve mais nenhuma ligação de nenhuma das partes e de certa maneira presumi que ela deveria ter tantas coisas para ponderar quanto eu. Nunca realmente parara para analisar esta situação em que ela se encontrava e via que no caso dela de algum modo tudo devia parecer mil vezes pior.

Saberia ela que não passava de uma personagem? Que não era real?

Isto é crueldade, acusou minha mente. Mesmo? Pensei que fosse apenas a realidade rebati debilmente.

Quando diálogos internos como este começavam a tomar lugar significava que estava na hora de eu diminuir a intensidade das avaliações.

Do momento em que Mike viera falar comigo até o horário do almoço levou cerca de uma hora e meia, mas ao menos foi um período proveitoso, pois consegui concluir meu serviço com perfeição. Senhora Newton enfim surgiu dos fundos da loja e anunciou o que eu esperava. Depois que fizesse minha refeição eu devia voltar apenas para registrar minha saída e estaria livre.

Claro que não estava com fome, apesar de apenas ter tomado o café da manhã há várias horas, mas me obriguei a comer toda a porção de verduras e macarrão que trouxera, pois sabia bem que estômago vazio e ansiedade não formavam um belo par.

Era quase uma hora da tarde quando passei pela porta da Newton’s Outifitters me despedindo de Mike com um aceno. Tivera chance de fazer uma ligação avisando o xerife que sairia mais cedo e ele já me esperava no estacionamento, corri até o carro porque chovera a manhã toda e o tempo fechado insistia em permanecer à tarde.

— Espero que dê uma trégua à noite – torci observando as gotas escorrendo pela janela.

Charlie fungou uma risada.

— É o grande dia, garota.

Eu ri.

— Bem, eu não chamaria de ‘grande dia’, mas sim, é um dia especial. Ainda mais levando em conta que faz muito tempo que não vou a uma festa dessas.

— Me disse uma vez que seus pais sempre compareciam a eventos sociais.

— Sim, é verdade. Mas não era o que se pode chamar de ‘festa’, pelo menos não para mim. Havia sempre gente muito mais velha e em geral eu só ia para cumprir o papel de filha exemplar. Mas hoje espero verdadeiramente me divertir – sorri involuntariamente antecipando a alegria de poder ter uma noite para realmente deixar os problemas de lado.

— Contanto que não se exceda na diversão, sabe que ainda tem hora para chegar em casa, não é? Já falei com Jake, deixei algumas regras de comportamento bem explícitas que eu espero serem observadas.

Minhas sobrancelhas se ergueram.

— Você falou com Jake? Nem quero imaginar como deve ter sido essa conversa... De todo modo, não imagino o que possamos fazer de tão absurdo, somos adolescentes, não loucos.

Ele me olhou como quem dava pouco crédito a tais palavras. Soltei uma risada breve e assenti.

— Está bem, nós cometemos loucuras às vezes e sei que eu também me aproveitei de sua bondade Charlie, mas você confia em mim, eu sei que sim. E imagino que apesar do que diz também tenha uma estima elevada pelo filho de Billy.

— E espero que se mantenha assim.

— E eu também.

Alcançamos a casa e a conversa se encerrou enfim. Charlie voltou ao trabalho e eu corri para me abrigar da chuva forte. Me livrei de minhas botas, deixando-as perto da porta e subi para o quarto com pressa, contudo ao chegar parei de imediato e respirei fundo. Eu havia criado uma espécie de esquema que usaria para me guiar nos preparativos e acreditava em minha capacidade, então a ansiedade não me ajudaria em nada.

Com os nervos contidos pude continuar a seguir a lista, já que havia começado os preparativos na véspera. As unhas já estavam pintadas, a pele previamente limpa. No geral o serviço pesado havia ficado para a sexta-feira à noite e hoje eu só teria de frisar o que já começara. Parecia muito cansativo, mas eu aproveitava cada passo da experiência, pois de todo modo significava diversão. Eu realmente viera me esforçando nos últimos dias para me tornar uma pessoa melhor, fosse nos estudos, fosse no trabalho procurava sempre dar o máximo de mim e não podia negar estar ansiosa pelo tempo de folga.

O tema do baile era cassino, mas estaria mais explícito na decoração eu imaginava; quanto à roupa, as garotas iriam abusar de seus vestidos de festa e os rapazes teriam de dar um jeito de garimpar um smoking. Considerava uma ideia muito conveniente, pois meu conhecimento em geral se baseava em trajes chiques e acreditava que teria dificuldade se tivesse, por exemplo, que bolar uma fantasia.

Com o passar das horas eu checava minha lista que diminuía, riscava os itens que já havia executado e me focava nos demais. Não deixei de me alimentar apropriadamente para evitar que meu estômago vazio acabasse por me trazer problemas.

As nuvens do lado de fora estavam consideravelmente escuras e notei que avançavam pelo céu numa velocidade notável. A chuva havia por sorte diminuído e torci para que parasse quando fosse a hora. Enquanto observava a vista através da janela ouvi o ruído baixo de meu celular indicando que eu recebera uma mensagem.

No último mês meu contato com Bella se aprofundara, sentia que estávamos mais próximas e confidenciávamos uma a outra nossos segredos. Ela me relatava sempre os avanços de seu relacionamento com Alex e não havia dúvidas de que tinha muito mais sorte do que eu, todas as vezes que o mencionava parecia uma garota apaixonada; não que ela fosse muito literal, era mais porque eu a conhecia tão bem que não tinha quaisquer dúvidas quanto a seus sentimentos.

Por vezes me pegava pensando no quão estranho era formular em uma frase que Isabella Swan era a nova garota de meu antigo namorado, mas a estranheza logo passava e dava lugar ao senso comum que eu adquirira com meus vários meses morando em Forks.

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Li sua breve mensagem. Ela sabia do baile e me desejava uma noite divertida. Sorri com suas palavras e pensei que estava certa em sua vontade e que eu deveria fazer o possível para tornar aquilo real. Tivera chance de voltar para casa, mas decidira ficar e tinha de fazer minha decisão valer a pena. A única coisa que me incomodava era pensar em Lauren, ninguém mais havia tido notícias dela e tudo indicava que não compareceria à comemoração. Eu ainda me sentia de certa forma culpada por ela estar no hospital, mas dei a mim mesma a chance de esquecer isto. Talvez fosse melhor que ela ficasse de repouso, ajudaria a se convalescer.

Era por volta das sete e meia quando ouvi o ruído de pneus triturando o cascalho. Charlie havia chegado no exato momento em que eu terminava de me aprontar. Conseguira cumprir todos os tópicos de minha ‘lista de afazeres pré-baile’ e me sentia um tanto especial. Respirei fundo e comecei a descer os degraus. Charlie não estava em nenhum lugar à vista e em meio ao silêncio pude ouvi-lo conversando com alguém do lado de fora, por vezes ele engatava um papo animado com um vizinho e demorava alguns minutos para aparecer. Sem mais o que fazer além de esperar decidi ir até a sala onde me sentei calmamente no sofá.

Sozinha no cômodo quieto foi difícil ignorar as borboletas se revirando em meu estômago, o relógio em cima da lareira avançava vagarosamente minuto após minuto. Quando dei por mim já estava completamente ansiosa e cheia de caraminholas na cabeça. Pensava se Jacob conseguiria se separar dos lobos e cumprir sua promessa... E teria conseguido algo para vestir? O que eu faria se ele surgisse à minha frente usando uma de suas bermudas surradas e sem camisa? E teríamos de ir até a escola na minha caminhonete o que também não me agradou. Eu gostava do veículo, mas ao menos hoje ficaria feliz em fazer uso de algo um pouco mais sofisticado. Talvez se pedíssemos uma carona a Charlie ele não fizesse objeção.

Detestava soar esnobe, mas eu só queria ter uma noite perfeita. Por mais que tivesse certeza de que esta palavra sequer existia. Será que eu já presenciara algo perfeito em toda minha vida?

O ruído da chave sendo colocada na porta me tirou de meus devaneios e me levantei começando a caminhar de volta para onde viera. Talvez Jacob tivesse se esquecido e pensei que o melhor a fazer seria pedir a Charlie que me levasse até La Push, eu não queria nem imaginar que todo meu esforço poderia não valer de nada. Sam teria de se virar, mas ele liberaria meu amigo por algumas horas quer ele quisesse ou não.

— Charlie, já que você chegou eu estava pensando...

Ele surgiu à minha frente, mas não estava sozinho e minhas palavras ficaram presas em minha garganta enquanto eu observava a pessoa a seu lado.

— Jake?

Ele sorriu.

— Sim, sou eu. Estou enganado ou hoje é o dia tão esperado? – Brincou.

Eu apenas gaguejei uma resposta. O fato era que eu chegara a vê-lo com um traje social no infeliz dia do enterro de Billy, mas me parecera algo que ele emprestara de alguém, afinal quem se ocuparia em adquirir vestes novas para uma ocasião tão triste? Eu sequer o culpara, mas pensara que hoje o encontraria praticamente com a mesma vestimenta. Só que me enganara.

Ele vestia smoking. E não havia dúvidas de que era uma peça nova, pois reluzia e destacava seus traços de uma forma única. Estava muito bonito!

— Você está bem Aneliese – elogiou Charlie.

Eu o olhei e por algum motivo comecei a rir.

— Obrigada. E me desculpem, mas... Nossa Jacob, eu tinha certeza de que você não viria e, no entanto aqui está você e... Bem...

Seu sorriso se alargou.

— Eu sei. Estou um gato.

O xerife revirou os olhos e eu ri ainda mais enquanto me precipitava para perto deles.

— Está bem, está bem. Agora acho melhor vocês acertarem a estrada ou vai acabar ficando tarde demais e eu bem posso mudar de opinião quanto a isto de crianças saindo para festas ao anoitecer.

Jacob sacudiu a cabeça.

— Você e Billy se combinam, os dois são rabugentos.

Charlie o fitou carrancudo e vi que ele conteve um sorriso.

— Ótimo Liese. Você está pronta? É melhor irmos ou realmente acabaremos tendo que ficar.

Jacob me ofereceu o braço como um cavalheiro e aceitei com um sorriso.

— Você está me parecendo muito à vontade Jacob Black e estou impressionada com seu nível de galanteio.

Ele me olhou muito faceiro.

— Lobos tem muito mais a oferecer do que você imagina.

Ele conseguia sempre me deixar sem jeito e baixei o olhar sentindo as bochechas quentes, fechei a porta ao passarmos e só então olhei ao redor. Havia um veículo estacionado atrás da radiopatrulha e era uma caminhonete, porém em nada se parecia com a minha, esta era bonita e sofisticada.

Jacob percebeu que eu analisava o automóvel e encolheu os ombros.

— Peguei emprestado só dessa vez. Pensei que você talvez não ficasse muito satisfeita de usar o meu meio de transporte – comentou enquanto tornávamos a caminhar.

Ergui uma sobrancelha.

— Estou tentando imaginar a que se refere, acaso não estava pensando em se transformar e me levar em cima de suas costas, não é?

Fiquei magoada com o pensamento, esperava um pouco mais de consideração da parte dele.

— Eu não disse nada disso, é você quem está falando - não parecia estar brincando.

— Mas então a que se refere?

Paramos ao chegar perto do carro, eu vagamente havia me dado conta de que a chuva havia cedido e talvez não demonstrasse, mas ficara completamente satisfeita.

— À minha moto.

Meu rosto se iluminou ao compreender suas palavras. Havia me esquecido de Jacob estivera reformando uma motocicleta antiga e de fato não chegara a pensar que ela realmente pudesse chegar a funcionar um dia.

— Não pode ser! Você conseguiu consertar?

— É claro que consegui. Teria inclusive terminado bem antes, mas mal tinha tempo para trabalhar nela.

Semicerrei os olhos e analisei seu rosto.

— E aquele monte de sucata foi realmente transformado em um meio de transporte decente? Em um que não seja passível de explodir na primeira curva?

Seu semblante demonstrava mau humor.

— Sou um bom mecânico, sabia? Perfeitamente capaz de consertar uma moto velha.

Eu o havia aborrecido e pensei que este não era o momento certo para ter uma conversa dessas.

— Só estou preocupada com você.

Ele me olhou e seu rosto ficou suave.

— Sei que sim, mas já lhe disse que posso me cuidar. Talvez não tenha percebido, mas além de bonito sou rápido e forte. Acho que você ganhou o pacote completo.

Soltei um som de ultraje.

— E lá vamos nós.

Jacob riu baixinho e se aproximou.

— Então pensou que eu não viria, não é? Não lhe assegurei de que estaria aqui? E tive sorte em usar minhas economias nessa roupa, pois como suspeitava você está absurdamente linda.

— Usou suas economias para comprar o smoking? Jacob, você não devia...

— Está tudo bem. – Me interrompeu. – De verdade. Realmente valeu à pena.

Pegou minha mão e me puxou para perto em seguida me envolvendo em seus braços.

— Porque tenho a leve suspeita de que você vai me beijar?

— Porque é exatamente o que vou fazer.

Seu rosto chegou muito perto do meu.

— Não acho aconselhável fazermos isto aqui – assinalei me afastando alguns centímetros. – Charlie não vai gostar nenhum pouco.

Ele trouxe a mão até meu rosto e acariciou minha bochecha.

— Acredite em mim, Charlie não se importa com isso, nós conversamos quando cheguei e ele agora sabe o que sinto por você e sabe que é real.

— Falaram sobre isso? Mesmo?

— Achei que não haveria um momento melhor e acho que fiz bem. Agora posso beijá-la ou abraçá-la sabendo que tenho o consentimento de seu pai – sorriu. – A não ser que a senhorita apresente mais algum argumento contra. E então? Quer que eu me afaste?

Estava perfeitamente ciente de sua mão afagando minha pele enquanto a outra me segurava com firmeza pela cintura, mantendo nossos corpos próximos. Ele tinha um cheiro bom, algum perfume amadeirado, marcante. E seu olhar não falhava em sustentar o meu. Ali junto a ele eu me sentia bem, me sentia segura, me sentia tranquila. E agora descobrira que por algum milagre o xerife aprovara nosso relacionamento e não iria interferir. Isto só me dava ainda mais certeza de que minha vida com Jacob seria completamente diferente de tudo que vivi até agora. Com ele as coisas fluíam naturalmente, como sempre fora.

— Não – falei por fim. – Não quero que se afaste jamais.

Ele assentiu e vagarosamente tornou a se mover logo selando nossos lábios.

Beijar Jacob sempre me deixava consciente de minha humanidade e também da dele. Todo seu contato era repleto de calor, de vida e talvez eu só não pudesse me esquecer de que ele era um lobo pela força sempre presente de seu abraço. Eu sentia minha face quente quando nos separamos e gostava da sensação. Me senti tão jovem e despreocupada naquele momento, podia até distinguir meu coração batendo levemente.

— Vamos senhorita?

Mais uma vez eu sorri e era real.

— Sim.

E eu estava feliz. Apenas isso. Como há tempos não me encontrava. Agradeci por essa noite e agradeci pela chance que recebia de simplesmente esquecer tudo e ir em frente.

Eu estava muito surpresa com o capricho da decoração, talvez meu humor estivesse influenciando meu julgamento, mas a escola praticamente se transfigurara em um lugar lindo, totalmente diferente. Durante a semana eu observara os enfeites sendo criados, mas era diferente vê-los em ação. Havia luzes iluminando a fachada e flores criando o famoso arco onde os casais paravam e pousavam para a foto. E o interior estava repleto de bexigas, laços e fitas descendo suavemente do teto, a música era alta e agitada e todos pareciam estar aproveitando.

Fora engraçado ver a reação de minhas amigas quando as apresentei Jacob, não havia como negar que o traje social o valorizava e caía muito bem. E ele soubera ser educado e charmoso, sua companhia completava toda a alegria que eu sentia por estar aqui.

Era libertador poder ser eu mesma, rir e brincar e descontrair de tantas coisas estranhas que estivera vivendo. E fiquei satisfeita de observar que Jacob também parecia estar bem, ele merecia muito mais que eu essa pausa.

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As pessoas ainda chegavam o que significava que a festa estava só no começo. As mesas do refeitório haviam sido adornadas com papel crepom e um enfeite de centro brega, mas isto não me incomodou. Jacob não fez objeção de ficar próximo de meus amigos, estávamos de pé perto de nossos lugares enquanto ele me falava sobre como eram estas ocasiões na escola da reserva.

— Sério Liese, você teria que ver por si própria. Mas até que é legal, e lá não temos essas frescuras de roupa engomada, você poderia usar calça jeans e camiseta.

— Bem original.

— Sim – ele riu. Então seu olhar se desviou para um ponto além de mim e sua feição se tornou obscura.

— Jake. Está tudo bem?

Seu queixo estava tenso e os olhos semicerrados e sem poder evitar me virei à procura. Levei poucos segundos para identificar o que acontecia e para perceber que Jacob não era o único atento a cena.

Havia um casal parado na porta principal, a garota usava um ousado vestido de baile e sorria de orelha a orelha acenando animada para os amigos. Mas eu não me importei muito com ela, não quando reconheci o rapaz a seu lado.

Não...

— Oh meu Deus! Aqueles são Lauren e Edward Cullen? – Jessica esganiçou-se. – Como assim? Alguém sabia disto? Liese, você sabia?

Não respondi. Não consegui dizer nada, eu ainda pensava que podia estar tendo alucinações. Edward viera ao baile, eu tivera certeza de que ele não faria isso! E acompanhava Lauren Mallory... Eles sequer se falavam, como de repente poderiam estar tão próximos?

A imagem da conversa que eu havia tido com ela há alguns dias invadiu minha mente.

“Você disse que não tem mais nada com o Edward e que eu saiba, ele não convidou ninguém, então pensei que talvez estivesse apenas esperando ser chamado. Quero dizer, você vai com outro, porque ele não poderia fazer o mesmo?”

Sim, era verdade. Ele tinha esse direito, eu só não pensava que realmente fosse usufruir dele. Então ao final Lauren conseguira o que tanto queria.

Mas como?

Sentia meu pulso acelerado e meu rosto quente e tive de me lembrar que estava em público e tinha de me conter, eu não podia demonstrar que ficara afetada pelo que via, na realidade eu sequer tinha este direito. Porque eu me importava? Não falara inúmeras vezes que queria Edward bem distante de mim? Não o dissera para seguir em frente e me deixar em paz? Aquele dia na Newton’s voltara a frisar que não havia mais lugar para ele em minha vida e que eu estava feliz com Jacob...

E eu estava feliz com Jacob, estivera até agora, nós nos dávamos bem, nós combinávamos. Eu não podia deixar que meu coração tornasse a me pregar peças, me lembrava claramente do gosto amargo do sofrimento e não queria ter de revivê-lo.

Respirei fundo e procurei me centrar. O casal abria espaço entre os alunos e tardamente notei que vinha em nossa direção, logicamente Lauren iria querer exibir seu prêmio para as amigas.

Aneliese! Censurou minha consciência.

Sim, eu estava sendo cruel. Eles estavam juntos, talvez só para o baile, mas nenhum dos dois era compromissado, eles podiam fazer o que bem quisessem de suas vidas.

— Você está bem?

A voz de Jacob me tirou da escuridão, era como se eu estivesse mergulhada num oceano profundo e precisando de algo em que me apoiar para voltar à superfície. Encarei seus olhos e eles demonstravam preocupação. Prometera a mim mesma que iria tentar ser feliz, e eu devia bons momentos a ele.

Tentei sorrir sem parecer um desastre.

— Eu estou. Está tudo bem.

— Podemos ir embora se quiser, eu não me importo, de verdade.

Sabia que se concordasse com a sugestão ele não hesitaria, não pensaria duas vezes em dar meia volta e partir, mas havíamos vindo até aqui, de certo modo havíamos lutado para ter um momento como este. E eu não iria estragá-lo só porque o garoto que quebrara meu coração mais uma vez se empenhava em destruí-lo, eu não deixaria de forma alguma que minha felicidade fosse arrancada de minhas mãos mais uma vez sem que nada eu fizesse.

— Não, nós iremos ficar e continuaremos aproveitando esta noite. Nós merecemos.

Ele me analisou por um longo momento e por fim assentiu. Me ofereceu sua mão e começou a me puxar para longe.

— Liese! Ei Liese, você não vai me cumprimentar?

A voz de Lauren soou às minhas costas e senti um frio subir por minha espinha, tive certeza de que aquele tom era espelhado nos velhos tempos quando tudo o que ela fazia era me provocar.

Virei-me e voltei para perto, Jacob passara a mão por minha cintura e me mantinha próxima, me protegendo ou talvez me limitando como se pensasse que eu poderia acabar me exaltando. Mas eu não faria isso.

— Claro que sim Lauren, me desculpe. Você está muito bonita. E como se sente? Sua cabeça está melhor?

— Eu estou ótima! Já quase não sinto mais nada. O doutor ainda tentou me fazer usar um curativo, mas de jeito nenhum que eu viria com aquele troço na minha testa. Algumas vezes me sinto um pouco tonta, mas procuro me mover com calma e Edward me ajuda e apoia quando sinto que posso cair.

Ela passou a mão pelo braço dele e se aninhou rapidamente perto de seu ombro.

— Entendo. Bem, isso é muito bom, espero que logo se recupere por completo.

— Sim, eu também. Na verdade não me lembro sequer do que houve, só vagamente que as meninas e eu havíamos ido a Port Angeles. Ed me disse que você e eu fomos perseguidas por bêbados.

Ed?

— Sim. Foi exatamente isso, mas por sorte nada grave aconteceu.

— Verdade.

Ela estava próxima a Edward e ele não se esquivava, apenas permanecia parado e calado, como se não tivesse como evitar tal coisa ou como se não se importasse. Eu tornei a ensaiar um sorriso e pude seguir Jacob para longe quando ele novamente me chamou.

Enquanto andava tive a sensação de que tudo ao redor se movia em câmera lenta. Por fora eu era uma garota bonita e feliz, mas eu nunca diria a ninguém que o que presenciara me trouxera dor. E não eram ciúmes ou tristeza. Era apenas a percepção de que minha única história de amor estava finalmente acabada, agora nada mais restava daquele sentimento, eu só queria que ele desaparecesse de vez. Observei o passado queimar em fogo crepitante e depois juntei todas as minhas forças e soprei as cinzas para longe.