Entardecer

Capítulo 1


Alguns dizem que sou elétrica, imperativa, falo muito e não escuto os outros. Eu costumava ser assim, era mais fácil não me ouvir e deixar a cabeça vazia. Não é ruim não se dar atenção às vezes, não deixar que você vença e que as pessoas ruins te influenciem. “Crie sua própria realidade”, eu dizia, e funcionou.

Ir a praça sempre foi algo que eu gostei de fazer. Tudo era bom lá. O cheiro. O tempo. O momento. O sentimento. Era ver tudo e não ver nada. Observar como as pessoas interagiam sem vê-las, só sentir. Os animais pequenos são reconfortantes e ficar sozinha, sentindo, é incrível. O mundo em si tem muito a oferecer se você souber onde procurar, o que é não procurar, o segredo é apenas olhar ao redor e ver. Enxergar, como um bebê, tudo a sua volta, pela primeira vez. E lá estava você e uma nova primeira vez.

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Você não me notou, imerso em pensamentos. Não sei dizer o que me atraiu a você, pessoas não chamam a minha atenção, e sim o que elas fazem. Com você foi diferente. Não fazia absolutamente nada e ao mesmo tempo fazia tudo. Um imã pra os meus olhos, sentidos e curiosidade. Você era interessante até parado, de olhos fechados, sentindo o vento. Sentia as coisas diferente mesmo sem esboçar reação, via tudo diferente mesmo de olhos fechados, inclinava o corpo pra longe do sol ao mesmo tempo que sentia o calor dos raios aconchegantes do final da tarde. Não sei dizer quanto tempo te observei, mas quando dei por mim era noite e você havia ido embora, de olhos fechados, sabendo exatamente pra onde ir. Seu corpo tinha tanta uma certeza do que se encontrava a sua volta que não era preciso enxergar.

Sentado, desconfortável no banco duro, você se remexia. As vezes seu rosto se contraía: raiva, frustração, tristeza, ódio. Você esboçava sem notar e quando notava, rapidamente assumia o semblante neutro, ignorando o mundo e lidando sozinho com o que quer que tivesse na cabeça. Era lindo de uma maneira que não sei explicar. Naquela tarde em que pus meus olhos em ti, vi mais do que a pessoa, pude a alma. O éter. O coração. O espírito. A psique. O pensamento. A essência. O indivíduo. Não importa como chamem, era você.

Seus olhos eram profundos e vazios. Ou rasos e cheios. Escuro e claro. Denso e disperso. Opostos a cada segundo. Pertenciam tanto a tua alma que no segundo em que a luz os atingiu eu arquejei. Nunca havia visto algo tão bonito.

E em um piscar você havia ido ou assim pareceu. Fiquei uma eternidade absorvendo e gravando na alma tudo o que pude, sentindo o fascínio que você me causou. Sabia que, a partir daquele dia, eu seria levada a você aonde estivesse. Sabia que não precisaria te procurar, eu te acharia. Não precisaria pensar, te sentiria.

E mesmo que você não tenha me enxergado, eu mal poderia esperar pra te ver de novo.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.