Yellow

Capítulo 04 - Sonhos


A biblioteca do colégio era enorme, era a parte mais legal do lugar. Alguns metros depois deles estavam as prateleiras cheias de livros, muitas delas. No final, depois dos corredores, estavam algumas mesas de estudo e as enormes janelas, por onde, de longe, eles conseguiam ver a neve caindo intensamente.

Antes das prateleiras tinha uma parte quase vazia, com apenas algumas mesas grandes de madeira. No lado direito ficava a pequena escada para um pequeno primeiro andar com uma prateleira grudada à parede, que ia de um canto da parede ao outro. Lá em cima não tinha mesas, apenas algumas almofadas gigantes para se sentar.

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Aquele lugar era realmente grande.

Eles ouviram um leve ruído e Alfie exclamou:

— Pronto!

Harry se sentou em uma cadeira e colocou os pés na mesa. Os outros sentaram na mesma mesa. Alfie se juntou a eles instantes depois.

— Finalmente um aquecedor, eu estou congelando — disse Sally, esfregando as mãos.

— Vamos ficar aqui até alguém chegar — falou Troye.

— Mas ninguém sabe que estamos aqui — disse Molly.

— Eles irão procurar, não se preocupe.

— Então... Esqueceu trabalho de biologia. — Mia apontou para Troye. — Provavelmente saíram no tapa como duas leoas. — Apontou para Sally e Molly. — Tentou defender a amiga otária. — Ela apontou para Alfie. — E você, qual o seu problema? Eu já te vi umas três vezes na detenção — ela perguntou a Harry.

— Bem, se você já me viu três vezes por lá, não sou o único que tem problemas.

Ela riu.

— Já gostei de você.

— Eu só estou cansado de estudar, não ligo pra isso — respondeu ele, despreocupadamente. — Por isso não sou bem um aluno exemplar...

— O que você quer fazer da vida, então? — perguntou Molly. — Somos jovens, estudar é a única coisa que precisamos fazer, nosso único dever.

— Como se você fosse a melhor aluna da sala, não é?

Ela não respondeu.

(Santigold – Disparate Youth)

— Eu estou cansado da escola, cansado das pessoas — continuou ele. — Eu consigo imaginar as vidas de cada pessoa nessa escola apenas olhando para elas, mas as pessoas olham pra mim e não veem nada, não sabem quem eu sou de verdade...

— Então, quem é você de verdade? — disse Mia.

Ele abaixou a cabeça e respirou fundo.

— Deixa pra lá.

— Bem, pelo menos as pessoas olham pra você — disse Troye. — Eu estou nessa escola há cinco anos e ninguém nunca me notou... Eu consigo contar todos os meus amigos nos dedos de uma mão. — Ele riu.

— É simplesmente como a vida é — disse Harry. — Um sistema de classes estabelecido em cada cultura. Se na sociedade temos os ricos e o pobres, na escola temos os populares, como ela. — Ele apontou para Molly. — E os invisíveis como você. — Em seguida apontou para Troye.

— Onde você se encaixa nisso?

— Oh, eu não sou invisível... Todos me enxergam, todos me olham estranho e se perguntam por que diabos eu nunca sorrio e não falo com ninguém.

Eles ficaram em silêncio por alguns instantes, talvez estivessem refletindo um pouco.

— Eu já estou acostumado com os olhares e com os comentários. — Ele olhou para Troye. — Eu daria tudo pra ser invisível como você.

Mais um silêncio desconfortante.

— Vocês não me conhecem, mas eu conheço cada um de vocês. — Dessa vez ele olhou para Molly. — Qual é o seu sonho, princesa? Encontrar um homem pra casar? Colocar silicone na bunda?

— Você realmente não me conhece.

— Mas eu acertei?

— Não.

— Então, qual é o seu sonho?

— Viajar pelo mundo, conhecer diferentes culturas e não ficar presa a um homem.

Ele sorriu.

— Eu estava apostando no silicone — disse Alfie, fazendo Mia e Sally rirem.

— E você, pequeno. — Harry apontou para Troye. — Qual é o seu sonho?

— Eu não sei. — Ele deu de ombros. — Ser rico, talvez... É um pouco superficial, eu sei, mas talvez seja isso que eu quero.

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— Entendo. Quem não quer ser rico, afinal?

— Eu não — falou Molly.

— O quê? — disse Harry, surpreso.

— Eu não quero ser rica — ela repetiu. — Eu não quero terminar com minha mãe... Eu não quero continuar sendo quem eu sou.

Harry sorriu timidamente, percebendo que talvez estivesse errado sobre ela.

— Eu sou uma pessoa terrível — disse ela, abaixando a cabeça. — Eu até entendo o porquê de você ter gritado daquele jeito comigo. — Ela olhou para Sally. — Eu não sou uma pessoa que pede desculpas.

— Então deveria considerar — falou Alfie.

Ela olhou para ele e depois para baixo de novo. Pensou um pouco.

— Você me desculparia?

Sally abriu um tímido sorriso e Molly também, considerando aquilo como um "sim".

— Às vezes eu também queria ser invisível — disse Alfie. — Eu sei bem o que é ser o alvo de olhares julgadores. — Ele soltou uma risadinha nervosa. — Às vezes acho que queria sumir.

Mia deitou a cabeça no seu ombro e segurou sua mão.

— Você acha que tem poucos amigos? — disse ele, olhando para Troye. — Eu só tenho ela.

Mia sorriu, mas não como se estivesse feliz. Era diferente.

— E eu? — falou Molly. — Sou a garota mais odiada da escola, meu namorado me trai frequentemente e todas as minhas amigas falam mal de mim pelas costas.

— Ah, coitada da garota branca e rica que não tem amigos — disse Alfie, ironicamente. — Você nunca vai saber o que é ser alvo de piadas por ser negra e se vestir como uma mulher, ninguém nunca vai chegar até você, segurar no seu pescoço e mandar você virar homem! — ele exclamou.

Todos ficaram em silêncio.

— Isso aconteceu com você? — perguntou Sally, em um baixo tom de voz.

Ele não respondeu, estava com a cabeça baixa, mas ela podia ver que seus olhos estavam marejados.

— Eu sinto muito — Molly falou.

— Tenho certeza que sim — disse ele.

— Não fique assim, Alfie — falou Mia. — Você é a maior diva que eu já conheci.

Ele sorriu levemente. Ela enxugou as lágrimas dele.

— O meu sonho é ser rapper — falou Mia, fazendo Alfie rir, enquanto ainda enxugava algumas lágrimas.

— É sério? — perguntou Harry.

— Mais ou menos — disse ela. — Eu tenho talento, juro.

— Ela tem mesmo — falou Alfie.

— O meu sonho é ser atriz — disse Sally, timidamente, como se aquilo fosse estúpido.

— Agora, isso é um sonho legal! — Mia riu.

— É estúpido. — Sally deu de ombros.

— Não, querida, é claro que não é — falou Alfie. — Na verdade, é mais fácil do que parece, você só precisa se mudar para Los Angeles.

— Já o meu sonho é ter um sonho — disse Harry.

— Como assim? — perguntou Troye.

— Eu sou realista demais para saber que não poderei realizar nada do que pensar, a não ser que meu sonho seja morar na rua lutando para sobreviver.

— Você já percebeu que todos os realistas são pessimistas? — disse Molly.

Ele riu.

— O que posso fazer? A realidade é uma merda.

— O futuro não pode ser tão ruim assim, afinal, você estuda na melhor escola da cidade — falou Molly.

— Bolsa parcial, e minha vó tenta se virar com o que ganha — disse ele. — Eu não sei o que estou fazendo aqui.

— Você não mora com seus pais? — perguntou ela.

Ele a olhou em silêncio por alguns instantes, depois olhou para os outros, que pareciam esperar a resposta.

— Você acha que tem Stephen King nessa biblioteca? — ele perguntou, ignorando a pergunta, e se levantou, caminhando até um dos corredores cheios de livro. Depois ele sumiu.

Os outros cinco se entreolharam, surpresos.

— Alguém deveria ir falar com ele — disse Mia.

Sally se levantou em silêncio e passou por um corredor com prateleiras de livros até chegar do outro lado, onde encontrou Harry ajoelhado em uma cadeira, olhando a neve cair pela enorme janela de vidro.

— Você está bem? — perguntou ela, sem se aproximar.

Ele não a olhou, apenas fechou os olhos e suspirou.

— Estou — respondeu, friamente.

— Ela não teve a intenção de...

— Eu sei.

Ele olhou para ela e depois para a janela.

— Eu sei.

Sally se aproximou e tocou o ombro dele.

Harry se afastou, aborrecido.

— Você não precisa falar sobre isso — disse ela. — Vamos voltar, procurar algo divertido para fazer enquanto estamos presos aqui.

Ele a encarou depois de alguns segundos em silêncio e respirou fundo.

***

Molly estava um pouco preocupada.

— Eu não queria ser insensível — dizia ela. — Eu sou tão estúpida.

— Você não sabia — falou Alfie.

— Aliás, saber o quê? Nós também não sabemos — disse Mia.

— É melhor não tocarmos nesse assunto de novo — concluiu ele.

— Eu acho que deveríamos jogar alguma coisa — falou Sally, quando voltou e se sentou na cadeira. — Não tem jogos de tabuleiro aqui?

— Eu acho que tem xadrez, mas eu não sei jogar isso — respondeu Alfie.

— Nem eu — disse Molly.

Harry se sentou na mesma cadeira e ficou com a cabeça abaixada. Os outros o olhavam com preocupação, mas com medo de falar algo.