Legami Di Amore

Lettera e proiettile


Scorpius olhou para o recém transfigurado relógio que indicava dez minutos para meia-noite e, em seguida, avistou Alvo de longe, conversando com Alice. Rolou os olhos. Ele estava deveras mal humorado naquela noite, principalmente pelo fato de que Rose se esquivava dele a todo instante. Havia conseguido dançar uma única música com ela, além dos diversos olhares mortais que recebeu de sua parte. Não foi nada agradável, em geral.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Quando Alvo lhe avisou sobre o que Roxanne havia dito, seu humor ficou mais ameno. Era um pouco egoísta de sua parte exigir a atenção de Rose numa situação como aquela. Primeiro porque estava grávida, segundo porque estava se formando, encontrando sua família e, de todas as coisas que pensava, provavelmente Scorpius sequer estava elencado na lista de relevâncias. Por isso foi incapaz de sustentar sua insatisfação por muito tempo, e não se importou muito quando ela comentou que iria na Torre do Relógio conversar com o traste do McLaggen. Não adiantaria ele dizer, de novo, que aquele ser desprezível era uma encarnação do mal de quinta categoria; então, ficou quieto, e apenas observou sua feição preocupada enquanto falava.

— Podemos dançar um pouco depois — sua sugestão foi dócil o suficiente para que Scorpius arriscasse lhe dar um beijo na testa.

— Se não estiver disposta não tem problema — ela assentiu, encostando sua cabeça no ombro dele. Scorpius lhe envolveu com os braços, mas rapidamente teve Rose se desvencilhando com um sorriso de algo próximo a pena. Ele decidiu não contestar.

— Já volto.

— Tudo bem — sequer foi escutado, o que lhe fez respirar bem fundo enquanto a observava andar em direção a saída.

Minutos depois, Scorpius estava esperando Alvo para que fossem para a sala de Poções enquanto remoía os detalhes da noite. Deveria ser algo rápido, direto e sem ladainhas para que pudesse voltar antes que Rose e tentar salvar alguma parte da formatura para guardar com apreço em sua lembrança. Embora se livrar do Sr. Binns sempre seria algo bom. Sorriu com isso e se assustou logo em seguida pelo tapinha nas costas que levou de Alvo. Seguiram o caminho até as masmorras em silêncio. Não seria vantajoso deixar escapar uma única sílaba sobre o assunto, era mais do que óbvio que as paredes de Hogwarts tinham ouvidos e más intenções.

Ao chegarem na sala, fecharam a porta e deram de cara com Roxanne olhando alguns vidros de poções dentro do armário.

— Pontuais — a voz dela ecoou pela sala. Scorpius logo foi se acomodando num banco em frente à bancada que Alvo costumava ocupar.

— Apenas uma das minhas diversas qualidades — Alvo disse, tirando seu paletó, que jogou em seu amigo. Deu meia volta para pegar seu caldeirão enquanto Roxanne se aproximava. — Conte as coisas para Scorpius, não tive muito tempo para discorrer sobre o assunto.

— Estava mais ocupado com a Alice — Scorpius o delatou, apoiando-se na bancada. Roxanne riu um pouco sem humor e depositou na mesa um saquinho com três balas azuis. — Já vi isso antes.

— Claro que já, a Rose está viciada nessas porcarias — ela deu ombros. Scorpius pegou o saquinho transparente para ver de perto. Eram balas perfeitamente redondas de vários tons de azul misturado. — O que eu disse para o Al é que talvez o envenenamento dela não tenha sido um ataque solo porque, francamente, a esquisitice de Rose não tem nada a ver com a gravidez.

— Hm, é — Scorpius concordou, estendendo as balas para Alvo. — Mas…

— Até onde eu consegui lembrar, ela começou a ingerir essas balas depois daquela poção, e… Não é estranho?

— Depende do que você considera ser estranho — Alvo acendeu o fogo embaixo do caldeirão e se apoiou na bancada com as duas mãos. — Dizem que os hormônios da gravide-

Ela tem estado estranha — Scorpius o interrompeu. Poderia ser ingênuo de sua parte culpar pequenos aglomerados de açúcar, mas algo fazia seu coração arder quando pensava na instabilidade que vivia com Rose dia após dia. E Roxanne verbalizar que concordava era uma prova de que talvez algo estivesse mesmo acontecendo de uma forma muito sutil.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Estranha como? Quer dizer, não podemos deixar passar o fato de que Rose não é das mais normais, hum? — Alvo balançou o saquinho transparente em frente aos olhos e pegou uma das balas. Observou uma de perto, segurando-a entre o polegar e o indicador.

— Não sei explicar, Al, mas… Ela foge de mim ao mesmo tempo que me acusa de estar distante, ela não acredita em mim ao mesmo tempo que me ama desesperadamente, discutimos por ela se sentir abandonada e no instante seguinte estamos escolhendo o nome do nosso filho. Eu acho isso estranho.

— Rose está confusa, qualquer um consegue perceber — Roxanne apontou, debruçando-se sobre a bancada. — E é óbvio que envolve você, Scorpius.

— Até eu teria vontade de sair correndo de você numa situação dessas, cara — Scorpius cruzou os braços, incrédulo pela fala de Alvo, que parecia sério. Roxanne o fitava com um ponto de interrogação. — Ela está carregando uma criança. Dentro da barriga. Aos dezessete anos. Rose Weasley é a pessoa que estamos falando. Vocês acham que o maior plano dela era esse?

— Você acha que o meu maior plano era esse?

— Olhe bem para o que você disse, Scorpius. Nem tudo é sobre você — Alvo riu cínico, procurando apoio na prima. — Vocês não eram namorados nem nada e, de repente, são pais de um bebê. Não é normal temer o futuro?

— Você claramente não está falando da mesma coisa que nós — passando a mão pelo rosto, Scorpius suspirou dolorosamente.

— Sim, você tem razão, Alvo, é normal uma adolescente se sentir amedrontada, confusa e insegura com a perspectiva de ser mãe aos dezessete anos. Mas tem alguma coisa que está escapando pelo vão de nossos dedos.

— Então me fale o que — o Potter pediu. — Porque eu, sinceramente, não sei o que estamos procurando.

— Estamos procurando o motivo da existência dessas balas, estamos procurando respostas para o envenenamento, estamos procurando ligar um fato no outro.

— Tudo bem — ele ergueu as mãos em rendição. — E se acharmos algo?

— Mais uma prova para o inquérito que vai ser aberto — Scorpius respondeu, vendo a bala cair dentro do caldeirão em alta temperatura.

As mãos de Scorpius gelaram quase que imediatamente, seu estômago revirou e o ar, durante alguns instantes de silêncio mórbido, pareceu faltar. Ao mesmo tempo em que pensava que a situação não era propícia para uma tranquilidade, sentia que algo estava impedindo as coisas de desenrolarem. Ele estava disposto a qualquer coisa. Arriscar, jogar a vida para o alto ou virá-la no avesso, contanto que fosse possível vivê-la ao lado de Rose. Talvez a grande loucura fosse essa: buscar, aos dezessete anos, meios de começar a estruturar algo que deveria durar para sempre. Ele não tinha culhões para isso, nem Rose.

Sua única aposta era o amor e, pelo que via, não era o suficiente.

Scorpius falava as coisas erradas nas horas erradas sem perceber, mesmo com as melhores intenções. Seu amor não parecia o suficiente para Rose, seu apoio não parecia o suficiente, ele não parecia ser o suficiente… E estava se dando por inteiro, mais do que nunca. Se não fosse o bastante, infelizmente era o que tinha.

Estar ali, vendo Alvo enfeitiçar as balas, era desesperador. Não havia mais opções: ou o problema era inteiramente de sua relação defasada com Rose ou algo estava contribuindo para essa defasagem.

— Isso vai demorar um século — Alvo sussurrou, aparentemente um tanto preocupado. — Se eu conseguir até uma hora antes do trem sair vai ser um milagre.

— Não demorou tudo isso com a poção.

— Poções são misturas elaboradas de ingredientes, mas substâncias sólidas envolvem mais encantamentos verbais do que outra coisa.

— E se você chegar à conclusão de que isso é apenas uma bala?

— Vou ter que ficar dias trancado no meu quarto pensando em como manipular feitiços sem quebrá-los, e quais feitiços um idiota das trevas poderia usar num negócio açucarado — deu ombros enquanto despejava um líquido amarelo. — Você não consegue ver nas cartas, Rox?

— Ver o quê?

— Sei lá, se isso é feito de poção ou de feitiço. Já seria um bom começo.

— Consigo ver que você está apressado para sair daqui — ela franziu o cenho e fitou Scorpius de soslaio, abrindo a boca de espanto em seguida. — Vocês dois estão!

— Tenho que voltar para o salão antes que a Rose chegue do grande bate-papo com o McLaggen na Torre do Relógio — Scorpius murmurou, entediado. — Devo contar para ela o que estamos tentando achar?

— Óbvio que não. A não ser que queira ouvir um sermão de como você é injusto com o Ryan — imitando a voz da prima, Roxanne conseguiu arrancar um sorrisinho dos dois. — Ele é uma boa pessoa, tem um bom coração, não podemos julgar ele só porque você não vai com a cara dele.

— Ele é tão imbecil que talvez nem amortentia daria um jeito — Alvo riu, mexendo o líquido de cor indefinida que girava em sentido anti-horário. Roxanne cerrou os olhos.

— Como que funciona amortentia mesmo? — Roxanne perguntou, causando um grande ponto de interrogação no rosto pálido de Scorpius. Alvo revirou os olhos em indignação. — Ou você vê o futuro ou faz líquidos malucos. Os dois não dá, Potter.

— Amortentia é a poção do amor mais forte que existe, gera uma paixonite muito forte ou algo próximo de uma obsessão — o rapaz deu ombros, focado em sua mistura. Novamente, ficaram minutos em silêncio, que foi quebrado pelo tom de voz preocupado de Scorpius.

— Tenho que ir. Quando Rose for dormir eu volto.

— Sentirei saudades — Alvo suspirou, levando um peteleco na cabeça. — Fique de bico fechado.

— Sua ordem é uma ordem, Potter.

Ao sair, Scorpius fechou a porta sem fazer barulho algum.

Roxanne se pôs a andar pela sala, voltando a admirar os vidrinhos coloridos de poções e alguns caldeirões em péssimo estado de conservação. Alvo permaneceu onde estava, concentrado, mexendo sua mistura no mesmo ritmo, sem aumentar ou diminuir a velocidade. Sua aparente calma incomodou um pouco Roxanne, que sentia suas têmporas latejarem com os pensamentos que estava tendo. Por isso não demorou muito para voltar até a bancada onde o primo estava. Escorou-se bem ao lado dele para que pudesse falar em tom baixo.

— Quais as chances dessas balas serem de amortentia?

— Poucas. Se fosse, Rose estaria louca de amor, no mínimo.

— Mas elas existem?

— Depende, Rox. Amortentia é a poção mais poderosa, não existe meio termo — Alvo encarou os olhos castanhos não satisfeitos da garota. — Ou a pessoa se apaixona ou ela não foi feita corretamente.

— Até para as maldições imperdoáveis existe um meio termo, você sabe disso. Como deduzimos o efeito de uma poção sobre alguém?

— Não sabemos exatamente. Depende do peso de quem ingere, depende do tempo entre a fabricação e a ingestão, e também da relevância de quem fez, do poder de atração e tudo mais, no caso da amortentia. E, por mais que você queira teimar, fazer uma poção forte é muito difícil.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Muito difícil quanto?

— Ingredientes, tempo, habilidade com poções. Nem todo mundo tem ovos congelados de Chizácaro para fazer uma amortentia de repente, não é algo que se compra em Hogsmead e guarda numa geladeira.

— Deve ter sido algo premeditado — Alvo a olhou descrente. — Uma poção que demora para ser feita, leva ovos não sei de que e é toda complicada, sem dúvidas foi planejada por um tempo.

— Pode até ser, mas não sei de alguém capaz de fazer uma realmente boa em Hogwarts. E não acredito que o Slughorn tenha dedo nisso.

— Não é porque você é aluno favorito dele que não tem outras pessoas que entendem um pouco de misturas esquisitas — deu ombros. — Por que alguém repartiria uma poção em balas?

— Para servir de reforço. Toda poção tem uma duração, para que dure por mais tempo ela deve ser ingerida constantemente.

— Muito esperto. Há chances de uma amortentia perfeitamente executada não funcionar?

— Sinceramente? Acho que não.

— Nada é capaz de quebrar o efeito? Que não seja um antídoto ou-

Algumas batidas na porta precederam o virar da maçaneta, interrompendo Roxanne. Aparentemente um pouco perdido, a figura de Adam apareceu.

— O que fazem aqui? — ele perguntou com o cenho franzido.

— O que você faz aqui! — Alvo retrucou, sem olhá-lo. — Não me diga que Lilian está com você; ou, pior, que você está com outra garota.

— A sala está ocupada, de qualquer modo — Roxanne completou, aproximando-se mais de Alvo para cobrir um pouco da visão do caldeirão.

— Apenas vim avisar que Alice está te procurando.

— Fale para ela esperar — a voz dele tinha uma certa irritação, que fez Adam respirar fundo.

— Não sou correio, Potter.

Bateu a porta.

Alvo grunhiu de raiva, mas manteve o ritmo constante. Foi quando pegou a varinha e fez com que a poção se mexesse sozinha para que pudesse se apoiar na bancada e negar com a cabeça. Roxanne estava quieta, olhando para o nada.

— O amor é a magia mais poderosa que existe — ele disse de repente. — Se essa coisa entre ela e o Scorpius é amor, sorte a dela. É a única explicação.

— Alvo… Essa coisa entre eles é o bebê.

— Você está me dizendo que a Rose está sob efeito de uma poção do amor há sabe-se lá quantos meses e que o bebê impede que a poção funcione? É isso?

— Basicamente.

— Loucura — ele riu. — Primeiro porque eu tenho certeza de que isso pode ser até um imperius sólido, mas não é amortentia; segundo porque… Claro que não, Roxanne. Um feto não tem condições mágicas de…

— Como vamos saber que é amortentia?

— Aspecto perolado e… Alguma coisa de Rose.

— Vamos aguardar então.

[...]

Rose estava com o coração na mão quando disse para Scorpius que iria para a Torre do Relógio conversar com Ryan. Havia perdido, simplesmente, o colar que ganhara no Natal. Ele havia ficado tão bom com seu vestido, mas, de repente, sumiu. Levou a mão para o colo enquanto andava pelo castelo, lamentando por ser tão irresponsável.

Rose não entendia muito bem o porquê, apenas havia sido invadida por uma forte onda de tristeza nos dias que antecederam a formatura. Nem mesmo ver sua família havia lhe alegrado o suficiente, nem ter Scorpius como seu par, nem como se formar em Hogwarts. Algo pulsava dentro de seu organismo, e ela não se referia a Leo; era mais como a sensação de uma energia que precisava ser urgentemente liberada. Talvez fosse apenas uma mistura de ansiedade por tudo que ainda havia para acontecer e pelos momentos daquela noite que parecia interminável.

Não havia tido coragem para falar algo além de um boa noite para Draco Malfoy. A família de Scorpius era tenebrosa. Sempre ouviu dizer que Scorpius tinha o comportamento parecido com Astoria, mas Rose deveria discordar. O único sorriso que chegou até ela foi o de Daphne, que elogiou seu vestido e a valsa que haviam dançado. Narcisa e Lucius Malfoy sequer olharam em direção a ela, e talvez fosse melhor se Astoria não lhe tivesse olhado, sua feição não foi das mais agradáveis. Por isso saiu de lá o mais rápido que pôde. Quando deu o horário combinado com Ryan, sentiu toneladas de diabretes da cornualha serem tirados de seus ombros e, conforme andava, tentava ao máximo esquecer todo o desconforto que havia passado.

Ao terminar de subir as escadas de madeira, viu que Ryan já estava ali, com os braços para trás. Ele sorriu ao vê-la.

— Parece que alguém não está tão feliz com a formatura — Ryan disse. Rose sorriu e negou com a cabeça antes de ficar de frente para ele.

— Nem tudo é perfeito.

— Embora eu queira muito concordar, devo dizer que você está bem próxima da perfeição essa noite — ela não respondeu, sentindo as bochechas corarem. Demorou um pouco para que Rose olhasse para a feição relaxada de seu amigo. Ficaram em silêncio durante alguns instantes. — Não está sentindo falta de nada?

— Deveria? — com a mão que estava atrás de suas costas, Ryan mostrou que segurava um colar de ouro com um pingente de cristal. — Como achou? Eu tinha certeza que havia perdido enquanto descia as escadas, estava até preocupada.

— Vi ele no chão. Eu estava um pouco atrás de você quando ele caiu. O fecho estava quebrado, aparentemente — ele segurou as duas pontas do colar e ficou fitando-o por alguns segundos. — Posso?

— Claro — Rose se virou de costas e segurou seu cabelo. — Obrigada por ter achado. Não gostaria de falar para Scorpius que tinha perdido.

— Ele quem te deu?

— Sim, no natal — uma boa energia fluiu pelo corpo de Rose quando ela tocou o pingente.

— Hm — ele enfiou as mãos nos bolsos de sua calça social e suspirou dolorosamente de frente para Rose. Riu sozinho antes de usar o resto de coragem que lhe restava. — Eu pedi para que você viesse Rose, porque… É a nossa última noite em Hogwarts, talvez seja a única oportunidade que eu tenha para lhe dizer isso. Independentemente da minha opinião sobre o Scorpius, ou dos meus sentimentos por você, eu não quero ter que me afastar — sutilmente, Ryan tirou uma das mãos do bolso para que pudesse tocar o braço gelado de Rose. — Me encontro numa situação em que ver você cabisbaixa me aflinge, como agora. O que houve?

— Muitas coisas estão acontecendo juntas, apenas isso.

— Imagino que Scorpius tenha sua participação nessas coisas.

— Nós dois temos — era quase possível de se escutar as batidas fortes do coração de Rose, que sentia não apenas as pontas dos dedos ficarem geladas, mas todo seu corpo.

— Você… Realmente gosta do Scorpius?

— Eu o amo — eram palavras que há certo tempo não se permitia proferir espontaneamente. Havia se tornado complicado encontrar suporte em outras pessoas para expressar o que sentia. Scorpius andava estranho, Dominique chateada e Roxanne em outro mundo. E até mesmo naquele instante não era capaz de encontrar nos olhos brilhantes de Ryan um suporte; aos poucos, um tipo de medo começava a lhe consumir. — E amo o que teremos também.

— Vão se casar? — seu rosto expressava um misto entre confusão e desdém. Rose negou, trazendo para si um olhar extremamente curioso e forte.

— Teremos um filho — Rose pôde ver Ryan empalidecer e levar a mão, que antes sorrateiramente lhe acariciava, para a boca.

— Um filho? — repetiu, incrédulo. — Você está grávida? — Rose assentiu, dando um pequeno passo para trás. — Dele?

— De quem mais? — respondeu no ímpeto, cruzando os braços. A partir de então, Rose começou a respirar mais fundo pela imediata angústia que começava a gerar um aperto intenso em seu coração.

Ryan não respondeu, nem desviou seus olhos dos de Rose, que pareciam furiosos.

Não foi necessário muito tempo para que a feição da garota mudasse completamente. Sua respiração estava acelerada, seu coração poderia sair pela boca a qualquer momento e suas pernas estavam bambas ao ponto de parecer que não aguentavam mais seu peso. Com a garganta seca, ela pensava em alguma coisa para dizer, embora não queria ter que dizer mais nada.

— Não quis te ofender — Ryan sibilou, depois de um tempo, dando dois passos para ficar mais perto da garota. — O que eu mais quero, Rose, é te ver feliz. Você significa muito para mim. Não sei como, nem quando, mas você se tornou especial. Posso te dar um abraço?

Cansada, Rose assentiu. Era estranha a sensação de abraçar Ryan, de tê-lo afagando seu cabelo e de sentir seu perfume extremamente forte. Depois de alguns instantes, encostou o rosto no ombro dele e fitou o chão, não sabendo o que estava fazendo ali ainda. Precisava voltar para o salão, precisava encontrar Scorpius e tentar diminuir os batimentos da bomba-relógio que parecia estar dentro de seu peito. Por isso fez um esforço para se afastar dos braços firmes de seu amigo.

Não era necessário dizer mais nada. De uma forma meio esquisita, as evidências eram claras e Rose conseguiu percebê-las ao ouvir o suspiro de Ryan ao ter que soltá-la. Ele nutria sentimentos por ela, sentimentos que, de fato, não indicavam um desejo de amizade. Só que as munições de Rose já haviam acabado, mesmo se quisesse algo com ele o que mais lhe importava, naquele momento de sua história, era a vida de seu bebê, não tinha espaço para Ryan, visto que nem Scorpius estava cabendo direito no enredo.

— Até mais, Ryan — ela disse, um pouco atordoada.

— Até.

Rose deu meia volta, desceu as escadas e andou a passos largos até o salão. Conforme se distanciava da Torre do Relógio, mais apertado seu coração ficava, a ponto de doer. Em sua mente, tentava chamar Scorpius, pedindo para que ele fosse até onde estava, porque sentia-se fraca o suficiente para acreditar que poderia desmaiar num dos corredores em que se arrastava. Por sorte, quando chegou na ponta da escada, Scorpius estava olhando em sua direção, e quase voou sobre os degraus para alcançá-la e segurar-lhe por debaixo dos braços.

— O que foi? — ele perguntou, tirando alguns fios de seu rosto pálido. Ela negou com a cabeça, e envolveu o pescoço de Scorpius com o resto das forças que tinha.

— Estou me sentindo fraca — foi o que disse antes de desmaiar nos braços dele.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

[...]

Alvo encarava seu caldeirão quase sem piscar. Seus óculos estavam largados no meio de um livro de poções que costumava ler durante as aulas do senhor Binns. Era um livro antigo e avançado, mais avançado do que o pobre cérebro de minhoca dele conseguiria acompanhar. Apesar de tentar aplicar os teoremas complexos para reverter os ingredientes daquela bala, sua única conquista foi saber que açúcar, ao menos, era um deles. Porém, o caramelo não serviria de nada por hora.

Havia mais duas balas, mas Alvo não queria arriscar. Não conseguir tirar nada daquela pequena esfera esquisita era absurdamente frustrante, além de ser o motivo pelo qual ele e Roxanne permaneciam na sala. Passava das três e meia da manhã, e nem Scorpius havia dado mais algum sinal de vida.

Enquanto Alvo tentava ter algum insight, Roxanne mexia com um baralho como se fosse uma máquina. Misturava, dividia em três montes e virava as três primeiras cartas de cada um. O único som que escutavam era proveniente do seu embaralho, mas ela também não parecia estar tendo sucesso.

— Valete, valete, valete! — ela exclamou pela centésima nona vez, fazendo Alvo desabar sobre a mesa, num profundo desânimo. — Traidor, traidor, traidor. Pelos brincos de argola de Morgana, Alvo! — chiou, fazendo com que todas as cartas levitassem e fossem puxadas em direção ao chão. — O que vamos fazer?

— Não tem nada a fazer, Roxanne — ele disse como se fosse óbvio, erguendo a cabeça para fitar a prima. — Eu não consigo fazer nada com essa bala idiota, então… Podemos contar para o meu pai o que sabemos e insistir para o Scorpius abrir o inquérito.

— O que sabemos?

— Se eu não consigo reverter ela, significa que foi enfeitiçada. Quem deu as balas para a Rose? Ryan, e ele é o seu valete. É isso que sabemos.

— Ele não é o valete das cartas — Alvo deu ombros. — Nós sabemos que a ingestão dessas balas deixa Rose esquisita, e temos a hipótese de que o efeito não é como o esperado por causa do bebê, além do quase aborto dela.

Você tem essa hipótese — pontuou. — Eu acredito que se ela tiver amortentia, ou foi muito mal feita ou está causando outra coisa que não estamos vendo. E, sobre o valete, quem poderia ser mais traidor do que o Ryan? Ele se fez de amigo do Scorpius por um tempo, quando na verdade nutre profundo sentimentos de… — Alvo pareceu ironicamente pensativo — ódio.

— Ele não é o valete das cartas — Roxanne replicou, fazendo as cartas levitarem e formarem um monte bem em sua frente.

Alvo esticou o braço para pegar seu óculos e levantou-se do banquinho para ver de perto o que Roxanne iria fazer. Ele não acreditava muito nesse negócio de cartomancia, mas era o único recurso que estavam tendo. Ela tirou cinco cartas do monte e colocou uma do lado da outra, para virar uma de cada vez.

— Valete de paus, três de espada, dama de ouro, rei de ouro, dois de espada, rei de copas, valete de espada. Traidor, mentira, garota, rapaz, conflito, rapaz, traidor — antes que Alvo pudesse falar algo, Roxanne fez as cartas levitarem novamente. — Tudo bem, agora ele é o valete. Valete de espada. O traidor que eu vejo é esse valete de paus que tem conflitos com a dama e com o rei de ouro, e está ajudando o valete de espada numa armadilha com o rei de copas. Scorpius é o rei de copas, Ryan o valete de espada. Temos mais três pessoas envolvidas.

— O problema desse negócio é que não é nada objetivo — Alvo reclamou, assustando-se com o súbito movimento das cartas em direção à mão de Roxanne, que novamente embaralhou e fez um monte. Voltando para o seu livro, Alvo sentia os ombros pesados.

Aquele momento, em sua própria essência, trazia consigo uma carga extra de responsabilidade que não sabiam lidar. Alvo havia imaginado algo muito diferente para a sua festa de formatura, como varar a noite dançando com Alice ou fazendo alguma idiotice com Scorpius e Adam para fechar seus sete anos com chave de ouro. Porém, sentia-se um grande idiota, incapaz de ajudar em uma situação como a que estava vivenciando. Não havia nada a ser feito além de criarem diferentes hipóteses com o mesmo vício de culpar Ryan McLaggen por tudo. Alvo sabia que ele tinha suas armações de psicopata por trás de toda a história, mas reconhecia que ele mesmo estava falhando miseravelmente na missão de provar sua teoria. Roxanne, por sua vez, sentia-se mais estúpida ainda por não conseguir enxergar nada, ou talvez por não saber interpretar o que as cartas estavam lhe dizendo. Seu coração latejava ao pensar que poderia não ter o dom que sempre se orgulhou, ou que não fosse tão boa assim em clarividência.

Foi por volta das cinco horas da manhã que Alvo desistiu de tudo aquilo e lhe entregou a última bala de tulipa restante, pois uma estava com ele e a outra havia testado no caldeirão. Alguns minutos depois de Alvo, Roxanne também foi embora, mas decidiu se enfiar na sala precisa, e ao entrar no escuro que a sala havia se transformado, sentiu-se menos perdida. A única coisa, bem no centro, era uma mesa com uma bola de cristal e uma cadeira.

Respirando bem fundo, Roxanne colocou a bala de tulipa do lado direito e a carta do valete de paus do lado esquerdo, e se concentrou para admirar uma visão que durou cerca de dez segundos. Ela viu uma cabeleira ruiva correndo, a caixinha de joias de Rose, um colar consertado, e uma esfera de luz que tentava não ser contaminada pela escuridão ao seu redor.

— Isso não é uma visão — disse para si mesma, bufando.

Pegou a bala e a carta violentamente e deixou a sala precisa, não sem antes olhar para a bola de cristal pela última vez. Talvez ela estivesse mostrando que o dom de Roxanne fosse outro, como uma memória muito boa. Lembrava-se da caixinha de Rose caindo do nada no quarto, da capa de invisibilidade de seu primo, mas isso nada tinha a ver com a resposta do que procurava.

O caminho até o seu dormitório foi torturante. Segurava seus sapatos com as pontas dos dedos e limpava suas lágrimas de impotência com o pano de seu vestido. Era isso, no final das contas. Conseguia sentir que havia algo errado, algo perigoso acontecendo, a aura de Rose não estava normal, as coisas estavam acontecendo de uma forma nublada, mas não tinha recursos para achar uma solução, ou apenas colocar o problema sobre a mesa de uma forma clara. Em meio a fungadas, Roxanne chegou até sua cama, assustando-se ao perceber que Dominique estava acordada, olhando em direção ao nada.

— Onde estava?

— Na sala precisa — Roxanne sentou na cama, jogando o par de sapatos no chão e, posteriormente, deitando-se. Com os resquícios de tristeza, raiva e adrenalina, seu corpo parecia uma grande gelatina de abóbora. — O que você faz acordada?

— Rose passou mal, foi para a Ala Hospitalar e eu estava até agora há pouco com ela. O pai do Scorpius disse que seria melhor ela já ir para casa e… É isso.

— Passou mal como?

— Não sei. Scorpius só contou que quando ela voltou da Torre do Relógio disse que estava fraca e desmaiou em seguida.

— Estranho.

— Tudo tem estado muito estranho — Roxanne passou as mãos pelo rosto, não conseguindo segurar seu choro de medo.

— O que vamos fazer, Rox?

— Não sei.

Era difícil, em momentos como aquele, aceitar a realidade de que não havia nada que pudesse ser feito e que não havia provas para basear nenhuma teoria absurda, pelo fato de que tudo parecia real e conciso demais. Tudo não seria, apenas, um período ruim na vida de Rose?