Horror candy - Pesadelos escritos

DA PRÓXIMA VEZ USE AS ESCADAS


O lençol se transmutava num pano úmido, encharcado pelo pesar, minha pele se arrepiava cada vez mais, não bastou muito para que eu percebesse a minha pior crise de abstinência. Minhas unhas sujas de sangue, as coxas arranhadas, os braços mordidos, os batimentos acelerados correndo rumo à linha do trem.

Endireitei-me para o lado da cama, olhei o chão de madeira com tufos de cabelo. Surgiu como plano de fundo dos meus mais obscuros pensamentos a vontade imparável de arrancar a unha do meu menor dedo. Não me questione por qual motivo tal ação se tornou a mais racional, numa crise, ou você sana, sucumbe ou tenta controlar. Os mais fortes dos homens não sai ileso. Imagine um covarde como eu.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

As lágrimas se misturaram ao suor, o negro do quarto parecia tomar o solo repleto de vidros por causa da cólera inexpugnável. Levantei o tronco e parei, por um lapso, de me debater, levantei a mão e utilizando a outra posicionei dois dedos para arrancar a maldita unha.

Não consegui fechar os olhos, meus recônditos sentimentos pareciam me pedir para que eu apreciasse o momento como um aniversário feliz em plena época do funeral dos chacinados.

Puxei levemente, logo admiti que pouca força não ajudaria, precisaria puxar, pungente, enérgico. Pisquei e retomei.

(Ahh, sente? A unha se descolando da carne, o sangue sendo bombeado para fora, manchando sua alma, sua integridade, sua cama)

Arranquei, impiedoso... Ingênuo, estúpido. A dor inexplicável, o alcançar dos astros submersos.

Encolhi a mão, abafei o grito com o travesseiro sanguinolento. O vizinho do apartamento ao lado começou a triturar a minha parede com a sua música intensa, quem dera tivesse um bom gosto.

Literalmente alcancei a minha porta, abri-a, e corri para o elevador, enfrentaria a tempestade e o ciclone de Minnesota por um aspirar violento. Pelo branco se tornando cor natural.

Tintei o corredor de sangue, numa irrupção de dor e desejo soqueei o interruptor chamando o que deveria ser uma porta para o sucesso (ou fracasso) que se tornou um local extremamente previsível para morrer.

Entrei e acionei o botão para me levar ao térreo. As portas se fecharam. Lembre-se disso. Fitei-me no espelho, uma imagem fiel era demonstrada, com todas as imperfeições. A roupa maltratada, empalidecido, o dedo ainda com a marca do anel e os olhos fundos e irreparáveis. Senti meu corpo se entregando a um torpor doentio, meus pais apareceram como fumaça, os dois tocaram meu ombro. Reconheci minha mãe com seus óculos clássicos e a saia bege e perscrutei meu pai com sua barba branca volumosa.

Papai disse:

— Lembra quando eu falei na mesa de jantar que você é e sempre foi o que sempre quis? Recorda da sua reação? A risada tímida levando o garfo a boca, ainda não sei como cortou o septo. — Disferiu três risadas sinceras e sublimes — Queria que aquele tempo voltasse.

Mamãe não recuou:

— Tempos felizes, você nos acordava e dormia entre nossos corpos febris, beijava meu rosto quando o Sol aparecia na janela, pedia desculpas e querendo mostrar independência fazia seu próprio leite. O que aconteceu, filho? Esse é o futuro?

Chorei compulsoriamente, o elevador parecia ter descido o bastante, mas não parava, justifico que nestes momentos não é possível pensar com episteme, você engole seus medos e vai por lá mesmo, esquecendo que as escadarias são melhores para claustrofóbicos.

Meus pais haviam partido, não era algo inesperado.

Um som estridente ecoou, tremeu o espelho... Meu Deus... O elevador havia parado no meio do processo. O suor esfriou. Meus instintos primitivos tomaram conta e acredite, o mais real era o desespero.

As portas não abriam, tudo escureceu, uma luz vermelha acendeu no topo. A trepidação inicial parecia uma garoa comparada àquele apocalipse.

Escárnio: um viciado claustrofóbico preso no sua pior fobia.

Relaxe, desta vez não descreverei a noite horripilante que passei entre as paredes que se encolhiam com o meu débil corpo ali dentro.

Os bombeiros arrombaram as portas com um pé de cabra arcaico, já era manhã. Um deles vomitou. Pergunte-se o motivo. Um corpo jogado num dos cantos, um dos antebraços roído até o osso, no outro canto: dentes incluindo os sisos da infância.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Os vidros rachados. As unhas entre os restos dos cabelos. O ápice da loucura? O abdômen semiaberto combinando com as mãos ensanguentadas como um assassino psicótico depois da caça.

Lágrimas de sangue. Tão poético, tão mordaz.

A polícia encontrou cocaína no meu apartamento... Ainda me pergunto, por qual motivo saí desesperado do quarto quando o que eu precisava estava na cabeceira da cama? Isso não faz sentido. O que me enxotou do quarto tão rapidamente? O que... Não... Quem?!

Ahh. Se eu pudesse não lembrar. Claro, ele. Ele.

FIM

11/01/16

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.