A nevasca continuou por toda a noite após a reunião de Harry com Dumbledore e Moody, e de manhã ainda continuava a ventar forte, deixando a camada de neve fofa em torno do castelo ainda mais espessa.

Harry não dormiu bem a noite. Em adição a ter sonhado novamente com o misterioso orbe negro, a sua Gina não parava de surgir em seus sonhos, sendo torturada, machucada. O sol ainda não havia levantado completamente quando ele desistiu de tentar dormir novamente, e resolveu que o melhor que tinha a fazer era tomar um banho e trabalhar em seus futuros planos. Faltava menos de uma semana para o fim do ano, e por mais tentador que fosse permanecer naquele universo onde sua família estava viva, ele sabia, em seu âmago, que ali não era o seu lugar.

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Depois de limpo e devidamente arrumado, Harry saiu de seus aposentos e se dirigiu até a biblioteca. Ela agora se mantinha aberta todo o tempo, para quem precisasse, mas naquela hora da madrugada, estava escura, silenciosa e deserta. Com um feitiço invocatório, Harry reuniu em sua volta tudo o que achou ser necessário para se inteirar ainda mais da situação em que aquele mundo se encontrava. Charlotte costumava dizer que uma guerra se vence com conhecimento e informações, muito mais que com força bruta.

Com cuidado, Harry espalhou todo seu material de pesquisa em cima da maior mesa que encontrou. Mapas, livros, jornais e redações de ex-alunos cobriram os três metros de extensão da mesa de carvalho, e mantiveram Harry ocupado por algum tempo até achar um material de leitura que realmente fosse ajudar, no caso, antigas edições da revista “O Pasquim”.

Harry sorriu quando reconheceu a revista, e ficou satisfeito de ver que as matérias escritas por Xinophilius Lovegood em tempos de guerra tinham a tendência de deixar os animais fantasiosos de lado, e se focavam em política e técnicas de autoproteção. As reportagens eram de leitura fácil, e bastante abrangentes, falando abertamente sobre política externa e parecia ser bem informada em relação aos ataques que aconteceram. Em um pequeno caderno, Harry anotava com uma pena enfeitiçada, tudo o que ele achava crucial para montar seus futuros planos, e em um grande mapa, pequenas bandeiras de cores diferentes marcavam territórios tomados por Voldemort completamente, governos que foram derrubados, países que ainda se mantinham firmes na guerra, e até mesmo os locais onde os maiores massacres aconteceram, como quando um grupo de comensais aniquilou todos os moradores de Buenos Aires que fossem contra Voldemort, trouxas ou bruxos.

Harry descobriu que, embora a magia não fosse mais escondida dos trouxas desde pouco depois do ataque aos Potter em 1981, foi apenas em 1995, quando Snape subiu ao poder como Ministro da Magia da Inglaterra, que a Lei do Sigilo foi posta abaixo.

Horas se passaram rapidamente, e o relógio anunciou sete horas da manhã quando Harry alcançou a última edição d’O Pasquim que a biblioteca da escola tinha. Nela, a revista mostrava um mapa interativo onde os comensais eram mais propensos a agir, e Harry percebeu satisfeito que ele estava quase idêntico ao mapa que ele mesmo estava montando.

— Você parece bem ocupado aí, campeão. – Harry levantou o rosto depressa para a origem do som, ele não havia percebido que não estava mais sozinho. James o olhava com um jeito muito próximo do orgulho, enquanto Sirius encarava o amigo com uma descrença divertida.

— Campeão? – Sirius debochou, seu inconfundível sorriso maroto nos lábios – Sério?!

— Pareceu um momento para “campeão”. – James balançou os ombros minimamente enquanto circundava a mesa para ter uma melhor visão do que Harry estava fazendo. – Nossa, parece que você se manteve bem ocupado, Harry. Porque as cores diferentes...?

— Minha tutora me ensinou isso na Academia de Aurores. – Harry entregou para James a legenda das cores das bandeiras e se espreguiçou, sentindo vários ossos de sua coluna estalarem gostosamente. – Charlotte me ensinou tudo o que eu sei sobre psicologia política, acho que isso é um bom trunfo, por mais que esse seja um universo diferente.

— Charlotte? – Sirius perguntou distraído, analisando com cuidado as anotações que Harry fez em seu novo caderninho.

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— Olsen. Charlotte Olsen. – Harry concordou, esfregando os olhos por trás dos óculos, então ele não pode ver o olhar que James e Sirius trocaram, mas ele sentiu a mudança de tensão, por isso levantou os olhos novamente. – O que foi?

— Charlotte? Branquinha, olhos castanhos, cabelos louros mais cacheados que um saco de molas? – Sem dúvidas, essas características não condiziam com a mulher que treinou Harry, mas era uma descrição perfeita de como ela parecia nas fotos da época em que a tutora estudou em Hogwarts, por isso Harry concordou balançando afirmativamente a cabeça. – Isso é impossível. Lottie era delicada, e meiga. Ela não sabia lutar direito, tinha medo até da própria sombra...

— Era uma verdadeira Grifinória. – James olhou para Sirius com um olhar duro, mas o suavizou quando se dirigiu a Harry. – Lottie morreu ajudando Lily a fugir dias antes da minha filha nascer. Se não fosse por ela, nem minha esposa, nem minha filha teriam sobrevivido ao ataque que sofremos. Eu não estava em casa. Talvez, se eu estivesse lá...

— Ela ainda teria lutado bravamente. – Harry cortou o pai, tentando parecer o mais firme que conseguia. Então ele estava certo, o nome da irmã era em homenagem à sua tutora. Só não poderia imaginar que tivesse sido preciso seu sacrifício para isso. – Se bem conheço a Charlotte...

— É, antes de tudo, ela era teimosa como um hipogrifo. – Sirius riu saudosamente, devolvendo o pequeno caderno a Harry, que começou a devolver seu material de pesquisa para as devidas prateleiras. – Lembra daquela vez que ela cismou que a Dorcas tinha...

— A Biblioteca só têm edições d’O Pasquim até novembro de 1996. – Harry interrompeu as lembranças dos homens mais velhos, lembrando-se que tinha achado esse fato estranho. – Sabem onde eu consigo as mais recentes?

— Bem... essa foi a última edição da revista, Harry. – James levou a mão à nuca inconscientemente, do mesmo jeito que o filho fazia quando nervoso – Essa era a melhor revista jornalística do país, provavelmente de toda a Grã-Bretanha, e Voldemort e seus seguidores não planejavam deixar que ela continuasse a se manter contra seu reinado.

— O que aconteceu com o editor? Com Xinophilius Lovegood? – Os dois homens mais velhos se entreolharam cabisbaixos, e não foi necessária uma resposta verbal para Harry entender que o homem havia sido assassinado. – Oh, Merlin... E Luna? O que aconteceu com a filha dele?

— Ela desapareceu. Era do mesmo ano que Lottie, mas não chegou a terminar os estudos. – Sirius respondeu à pergunta quando James pareceu muito desconcertado com o leve desespero do filho. – Dizem que enlouqueceu de dor, e foi percorrer o mundo em busca de vingança. Nunca mais ouvimos falar nela. Você a conhecia, em sua realidade?

— Luna é uma de minhas amigas mais próximas. Ela me ajudou em alguns dos piores momentos que tive. – Harry se sentou novamente, sentindo todo o cansaço das horas não dormidas se acumularem de repente. – Moody tem razão, precisamos nos apressar.

— É verdade, Dumbledore havia te convidado para discutirem os próximos passos que daremos. – James se sentou ao lado de Harry, visivelmente se esforçando para tirar a mente do mais jovem do estado sombrio que estava antes – Como foi? Decidiram alguma coisa?

— Sim, já temos um novo objetivo traçado. – Harry massageou levemente as têmporas, antes de se espreguiçar e levantar do banco onde estava, se dirigindo à porta da biblioteca com seus novos objetos de estudo. – Mas para isso precisamos esperar que Dumbledore consiga entrar em contato com Draco Malfoy.

— Jovem Draco? – Sirius se espantou – Para que vocês precisam dele? Porque não chamar o pai?

— Sabe, eu nunca engoli Lucius Malfoy. – James comentou sonhadoramente enquanto os três caminhavam pelos corredores ainda desertos – Não completamente.

— É claro que não, ele fazia questão de fazer da sua vida um inferno, Pontas. – Sirius riu rapidamente com a lembrança – Mas e então, Harry, porque o jovem Draco?

— Nós precisamos dele para um... erm, interrogatório. – Harry respondeu pausadamente.

— Acho que vocês estão confusos. Draco é um ótimo oclumente, mas não sabe a arte de legimência. – Sirius franziu as sobrancelhas, confuso. – Além do mais, quem vocês precisam interrogar? A Ordem tem ótimos bruxos peritos nisso.

— Precisamos interrogar o Monstro. – Harry despejou em um único fôlego. – Ele provavelmente é o único ser ainda vivo que sabe do paradeiro de uma das horcruxes de Voldemort.

— Monstro, o elfo? Esse Monstro?! – Sirius parecia devastado, tanto que ele ficou paralisado onde estava, olhando boquiaberto para Harry.

— Seu irmão, Régulos, se virou contra a causa de Voldemort e por isso foi morto. – Harry continuou, ainda na crença que seria melhor contar toda a verdade de uma vez. – Mas antes de morrer, ele descobriu sobre as horcruxes. Como ele fez isso, eu nunca soube, mas ele conseguiu até mesmo trocar a horcrux original por uma cópia, na esperança de conseguir descobrir como destruí-la e ajudar a derrotar o antigo mestre. Foi assim em minha realidade, pelo menos... Mas pelos fatos que tenho coletado, acredito que a história tenha se repetido aqui também. Por isso preciso do Monstro, para nos contar se isso realmente aconteceu. E por isso precisamos do Draco; Dumbledore acha que ele é a única pessoa capaz de convencer o Monstro a falar a verdade.

— Eu mandei ele embora... – Sirius parecia aterrorizado. – Ele está trabalhando pra Beatriz! E se ele contou para ela... É tudo culpa minha!

— Não tinha como você saber, Almofadinhas... – James tentou consolar o amigo, mas Sirius simplesmente deu as costas aos dois e foi embora sem dizer mais nenhuma palavra.

— Sirius, espere... – Harry até tentou ir em direção ao padrinho, mas foi impedido pela mão de James em seu ombro.

— Deixa, ele precisa de um tempo para pensar. – Ele parecia preocupado, mas tinha uma certeza na voz de quem já viu o amigo passar por alguma situação parecida. – Para onde você ia levar tudo isso? – Ele apontou com o queixo para os pergaminhos enrolados e o pequeno caderno que Harry carregava.

— Para os meus aposentos. – Harry respondeu prontamente. – Eu queria montar algo que me ajudasse a visualizar melhor os próximos passos que precisamos dar...

— Deixa eu adivinhar. – Um sorriso orgulhoso cresceu minimamente no rosto de James – A Academia te ensinou isso?

— Foi provavelmente a primeira coisa que nos ensinaram. – Harry sorriu, nostálgico. – Logo depois que nunca deveríamos nos atrasar, em hipótese alguma. Charlotte era muito rígida em relação a isso.

— Sabe, eu cheguei a me inscrever na Academia, mas saí quando a Guerra realmente eclodiu. Não sei como Lily conseguia dar conta dos deveres da Ordem e da Escola de Medibruxos. Ainda bem que ela tinha acabado de se formar quando descobrimos que ela estava grávida do nosso primeiro bebê – Harry sorriu ao perceber que o pai parecia perdido em lembranças felizes, mas seu bom humor acabou rapidamente quando outra memória o atingiu – Você não imagina como nós ficamos felizes quando soubemos. E como ficamos devastados quando... O atentado. Lily ficou inconsolável, se não fosse pela nossa Lottie, não acho que ela teria sobrevivido a essa perda. Nós tínhamos tantos planos, sabe? – A voz de James se tornou mais baixa, e Harry começou a se perguntar se ele ainda estaria falando com ele, e não apenas pensando alto. – Fazer compras para Hogwarts, a primeira varinha... A primeira vassoura de verdade, ah, ele seria um voador e tanto. Tenho certeza que ele me venceria sem dificuldades mas essa oportunidade foi tirada de mim.

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— Eu realmente sinto muito. Eu cresci órfão, também nunca tive a chance de voar com meu pai. – Harry parou de andar para entrar no corredor onde ficava seus aposentos. Ele sabia que estava se aproximando demais, mas aquilo era tão tentador, era sua única chance, e ele iria aproveitá-la. Por isso, depois de depositar seu material de pesquisa com cuidado na mesinha de centro em frente à lareira, Harry se virou para James e disse em um só fôlego. – Que tal uma partida agora?

— Como? – James olhava confuso para ele, mas seu rosto estava aberto em um enorme sorriso.

— Eu não tenho uma vassoura aqui, mas se me emprestarem uma, eu gostaria muito de voar com você.

Harry tentou com todas suas forças não demonstrar o nervosismo que estava sentindo. Assim que ele terminou de falar, ele sentiu o medo de ser colocado contra a parede vir como um grande murro em seu estômago. Mas muito maior que o medo e o nervosismo, era a vontade de passar um tempo com seu pai.

— Eu sei onde podemos te arranjar uma vassoura.

***

A Escola possuía uma grande coleção de vassouras, caso fossem necessárias para alguma missão da Ordem. Obviamente, a grande maioria dos membros possuíam suas próprias vassouras, mas elas muitas vezes eram destruídas, ou precisavam ser deixadas para trás. Então, até que fossem substituídas, era de suma importância que houvessem reservas.

Inúmeras marcas e modelos ficavam estocadas no antigo vestiário de Quadribol, preparadas para quando fossem necessárias. Harry escolheu uma Cheetah 99, que mesmo sendo de uma marca pouca conhecida, tinha uma boa estabilidade em grandes velocidades.

Era difícil saber quem estava mais contente, mas de uma coisa Harry tinha certeza: parecia que James havia rejuvenescido vários anos enquanto os dois corriam até o campo de Quadribol e passavam as pernas por cima de suas vassouras, dando um grande impulso que os elevou muitos metros acima do chão.

À medida que o vento cortava frio o seu rosto e os contornos do castelo ficavam mais e mais distantes, Harry se sentiu relaxar em um dos únicos lugares que ele se sentia realmente bem: no ar.

James voava em círculos alguns metros acima dele, igualmente feliz e confortável sem o chão aos seus pés. Harry ficou admirando o voo do pai por alguns segundos, até que o homem mais velho parou ao seu lado, ofegante e contente. Ali, Harry sentiu uma cumplicidade que ele não teve nem com Remus, Sirius ou Ron, e seu sorriso se alargou ainda mais. Ele não sabia como, mas acreditava que James também se sentia assim.

Os dois ficaram se encarando por alguns segundos, apenas desfrutando dessa recém descoberta conexão, quando Harry percebeu que o sorriso de James mudou por rapidamente. Parecia muito com os sorrisos que Harry via nas fotos da adolescência do pai, um sorriso maroto, quase desafiador. E em menos de uma fração de segundo Harry entendeu que aquilo realmente era um desafio.

Mais rápido que ele julgava ser possível com aquela vassoura, Harry mergulhou. Ela poderia não ser maravilhosa, mas obedeceu bem ao seu comando quando ele saiu do mergulho em um rápido loop antes de virar à esquerda, sobrevoando os aros. Harry ficou muito satisfeito que James o ultrapassou várias vezes, tomando a liderança de sua pequena competição por vários minutos. Ele era um voador excepcional. Deslocava-se em uma vassoura com uma facilidade maravilhosa.

Os dois se provocavam todo o tempo, fazendo manobras mais e mais arriscadas, curvas cada vez mais fechadas, um querendo mostrar ao outro do que era capaz. Harry sentia o coração batendo como as asas de um beija-flor, e o sorriso não saia de seu rosto, por mais que o vento gelado de inverno cortasse sua pele dolorosamente.

Ele não sabia quanto tempo estavam naquela competição, mas com certeza já havia passado a hora do café quando os ventos fortes do Sul os forçaram a descer e desmontar de suas vassouras, comentando com muito entusiasmo cada movimento que o outro tinha feito. Pai e filho estavam tão entretidos em admirar um ao outro, que só repararam na figura altiva que vinha em direção aos dois quando ela estava apenas a metros de distância.

— Está tendo um ataque em Londres. – A professora McGonagall explicou sem parar de andar, e os chamou com as mãos em um gesto impaciente para que a seguissem. – Alguns membros estão encurralados, outros já foram ajudar, mas parece que tem capuzes carbono por lá. Toda ajuda é necessária. James, vá buscar Lily e nos encontre no Salão Principal. - Sem dizer uma palavra, James saiu correndo em direção ao castelo. – Espero que nos acompanhe, Harry.

A professora McGonagall olhava para Harry com curiosidade, mas lhe dirigiu um de seus raros sorrisos quando ele concordou prontamente.

— Como um verdadeiro grifinório. – Ela sussurrou e apoiou a mão em seu ombro rapidamente, antes de continuarem seu caminho pelo castelo, em direção à guerra.