Diário Virtual

Meu ex melhor amigo


Estava tão pensativa que não vi Bryan entrando na minha casa, e levei um susto ao vê-lo na minha cozinha. Ele provavelmente percebeu que tinha algo errado, e não foi só pelo fato de eu estar segurando tão firme o cabo de uma faca e olhando de forma acusadora pra ele. Bryan tinha passe livre para entrar sem nem tocar a campanhia. Tudo bem que ele faz isso desde... Bom, desde sempre, mas agora estávamos brigados. Ou seja, o infeliz não tinha mais esse direito. Então ele perguntou se eu estava bem, e a conversa foi tipo :

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– Não, eu não estou, seu traidor desgraçado.

–Hum, certo. O que houve?

– O que houve é que você é um completo idiota. Ta tudo acabado entre a gente. Como você pode fazer isso?

– Por que você ta com essa faca na mão? Guarde isso antes que se machuque

– Você não ouviu o que eu disse? Bryan, como pode? Você era o meu melhor amigo, meu irmão.

– Vai me dizer o que ta pegando ou vou ter que adivinhar?

– Você mandou meu diario virtual pro David!! Foi isso que aconteceu.

– Ah.

– Você nao vai negar?

– Não.

– Isso porque você não tem vergonha, não é? Olha pra essa sua cara, nem parece arrependido. Sabe como isso me machucou?

E ele ficou lá, abrindo os armários à procura de doces. Como se não soubesse que o carregamento só chegava amanhã, quando a mamãe fosse fazer compras. Bryan pegou uma embalagem quase vazia de doce de abóbora e finalmente respondeu :

– Foi pro seu bem.

E foi aí que perdi os poucos neurônios que me restava.

– Fora. Da minha... Casa!– gritei, furiosa.

Bryan terminou de mastigar as sobras do meu doce, deu de ombros e se preparou pra sair.

– Ok. Falo com você quando não estiver tão... - ele se virou pra me olhar e voltou a andar. - Bom, tchaw. A gente se fala depois.

Simples assim. Bryan nem ao menos negou. E uma parte de mim queria que ele negasse, pra que eu pudesse acreditar nele. Porque, bem, ele não era só o meu melhor amigo, era o meu ÚNICO amigo. E amigos não fazem isso.

Ele sabia o quanto eu amava o David, o quão desesperada eu estava por esse amor impossível. E isso foi... Sabe, surreal.

Quem garantiria que o David nao leria ele todo? David leria o meu diário inteiro e me acharia a maior idiota de todos. Provavelmente tiraria sarro de mim. Ou quem sabe... Não, não posso deixar minha mente divagar.

Quais as chances dele ler, descobrir meus sentimentos por ele e retribuir? Se bem que... Não, a vida não é como os livros que leio. Seria perfeito se ele por acaso me amasse durante esse tempo todo, e tivesse receio de confessar.

Mas se isso acontecesse... Iríamos andar juntinhos, eu poderia encostar nele. Abraçá-lo, sentir o seu cheiro. Passar a mão no cabelo dele e ver se era tão macio quanto eu imaginava.

Quem sabe numa realidade alternativa. Uma em que eu ainda teria meu melhor amigo. Uma em que eu não fosse a aberração do colégio, ou a invisível. Fala sério, quem olharia pra mim? Antes das férias e de uma consulta com um demartologista, estava com o rosto cheio de espinhas inflamadas.

Por outro lado e pensando um pouco, talvez tudo isso não fosse tão grave assim. Tudo bem, era péssimo e horrível. E sei que falhei miseravelmente todas as vezes que tentei chegar no David e dizer :

– Eu te acho incrível, você é lindo, o boy magia que quero ter do meu lado. Sou apaixonada por você e queria te contar.

Mas e a coragem pra confessar? No ralo. E eu sei que me empolgava muito e ficava enchendo o saco do Bryan por causa disso.

– Ele é tão lindo, Bry. Os olhos dele são como portas para o paraíso. E o sorriso dele? Passaporte para o céu. Eu o amo tanto, Bry. Não, isso não é passageiro nem apaixonite. Sabe quando você olha pra alguém e tem certeza de que aquela é a pessoa certa pra você? E você sente que deve se casar com ela? Imagina a cena. Eu, casada com ele. E nós teríamos lindos bebezinhos de olhos verdes, e você seria padrinho deles. Não, não me olhe com essa cara. E ah, os cachorrinhos. Nos teríamos lindos cachorrinhos bonitinhos e fofinhos. Voce acha que ele gosta de animais? Eu acho que sim. Pare de revirar os olhos.

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Tudo bem, eu irritava o Bryan além da conta com esse assunto. Porque pra ele ter feito isso é porque não estava mesmo me aguentando, deve ter sido uma espécie de vingança. Será que eu deveria pedir desculpas? Não. Se ele estava farto de mim e da minha voz, ele poderia ter dito. Me arrancaria umas lágrimas, claro, porque eu não teria mais ninguém pra falar do meu príncipe, mas doeria menos. Bryan pode ter arruinado todas as minhas chances com minha alma gêmea.

Isso foi o pior ato que ele já fez pra mim em relação ao David. Seguido dos famosos :

1- Fingir que não está me escutando quando falo do David.

2- Fazer caretas quando falo do David.

3- Dizer que é tudo bobagem minha.

4- Mandar eu falar isso pro David.

5- Comer os chocolates que eu comprava pro David.

Mas isso é porque ele não sabe o que é amor. Esse sentimento que te faz pensar na pessoa amada o tempo inteiro. Se perguntar se ela ta bem, o que ta fazendo. Ele não sabe a dor que sinto. Porque amar dói. Não ver aquela pessoa, não ouvir a voz dela, dói. E saber que talvez vocês nunca fiquem juntos, porque voce é incapaz de dizer.

Tudo bem, eu entendo o Bryan em algum sentido. Ele nunca se apaixonou por uma garota. Os únicos amores dele são seu console de videogame e seu computador. Se ele pensa em casamento, filhos?

– Namoro nao dá Xp, Lyn.

Pra ele as coisas são simples assim. Só espero que um dia ele sinta metade do que sinto. Não, espera, não desejo não. Porque o peito parece estar rasgado aqui dentro de mim. Por mais que Bryan tenha vacilado, a vida toda ele estave do meu lado e não posso desejar coisas ruins a ele.

Desde aquele fatídico dia em que eu fui na cozinha pegar uma jarra de água para a professora, e sem querer eu me desequilibrei porque um garoto passou correndo e a jarra caiu em cima de mim e fiquei ensopada. E enquanto os alunos ficavam tirando sarro e rindo de mim e eu estava quase chorando, porque assim, quando você tem 8 anos e isso acontece você só quer chorar e chamar sua mamãe, Bryan apareceu, pegou na minha mão e me levou até a diretoria. Enquanto eu limpava minhas lágrimas com a mão e tentava parar de soluçar, eles pegaram outro uniforme e pediram pra eu vestir ele.

Então eu saí do banheiro, depois de me trocar, e vi ele parado na porta, me esperando.

– Oi - Eu disse.

– Olá- ele falou.

– Obrigado por me ajudar.

– Nao foi nada.

Então a gente ficou se encarando, sem graça, até que ele perguntou se eu queria salgadinho. E eu disse que sim, porque eu amo salgadinho.

Bryan comprou um pacote e comemos sentados num banquinho. E quando eu me senti melhor ele me levou pra minha sala. E daquele dia em diante eu não tive mais que passar os intervalos sozinha, olhando as outras crianças brincarem. Eu podia procurar alguém ali no meio da multidão, mas isso durou até ele terminar a 4° série e mudar de turno.
E Bryan pode ter feito muita coisa que me deixou chateada, coisas que fazia com que a gente ficasse sem se falar por semanas.

Mas dessa vez ele pegou pesado. Foi na ferida, no David. E ele sabia que isso era um TABU. E agora eu teria que arrumar um novo amigo. Alguém que me ajudasse na minha lição de casa, que fosse assistir a um filme comigo. Alguém com quem eu poderia falar .