Proesiando

Petit Mort


A primeira vez que provou daquela droga foi em um recital, junto a um desconhecido. O vício foi irreparável, no momento em que inspirou a fumaça de um cigarro e se afogou em um redemoinho de sensações. Sentiu-se compreendido.

Encantou-se, decidiu que queria algo assim para a sua vida. Aquela overdose de amor, capaz de matar.

Com o tempo, foi perdendo as esperanças. A frivolidade dos romances modernos lhe entediava. Era tudo muito passageiro, fugaz, miúdo. Acreditou por um segundo que ninguém jamais recitaria versos no pé do seu ouvido, deixou o romance para os outros. A velhice marcava seus anos em rugas, sentia-se velho, tornou-se soturno.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Naquela biblioteca, sua mão tropeçou em outra, na lombada de um livro. Os versos foram lhe foram sussurrados, improvisados por uma voz rouca, espontâneos como um respirar.

“Teu olhar oblíquo

me encanta, me diz

em francês, la petite mort

em minha língua, tu

meu belo petiz.”

Os dois mandaram a Métrica para junto do Decoro, devorando-se entre as estantes C e D.

Não deixou provas daquela cena nada infantil. Sequer um papel com o número do outro gravado, memorizou-o. Levou consigo as únicas testemunhas da pequena morte: um exemplar de Drummond de Andrade, outro, de Castro Alves.