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Meu Melhor Amigo
Apenas encaro o teto do quarto com a constelação que Lucca e eu colamos nele há tanto tempo. Os adesivos de planetas e estrelas brilhavam no escuro e quando éramos mais novos, fingíamos ser astronautas desbravando aquela galáxia particular. Agora esses adesivos estão apagados e esquecidos no teto do quarto do meu melhor amigo.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Sinto quando a cama cede com o peso do meu melhor amigo.
— Perfeito, não esqueça que eu preciso de tudo pronto pelo menos duas horas antes do início do baile.... Não acho que seja pouco tempo – ele revira os olhos de forma dramática – Estou te avisando com dias de antecedência que quero essa estrutura pronta duas horas antes do baile. Espero que não haja atrasos.
Lucca deixa o celular preso entre a orelha e o ombro enquanto me puxa para perto. Consigo ouvir a voz irritada do responsável pelo buffet do baile falando de forma rude com Lucca.
— Ok, se você acha que não tem capacidade para isso é só dizer. Meu pai vai amar saber que a empresa na qual ele confiava não é capaz de fazer algo tão simples.
As palavras “meu pai” causam o efeito que Lucca deseja e o homem passa a falar de forma suave e mansa na linha.
A discussão que estão tendo é sobre a estrutura que Ícaro nos pediu para arrumar, mesmo com os desenhos detalhados do garoto o homem encarregado do serviço não conseguia entender porque ter algo daquele tipo em um baile de escola.
— Toc toc— Jullie cantarolou passando pela porta do quarto do filho com uma bandeja em mãos – Trouxe cookies.
— Só um momento – Lucca pediu para o homem no telefone – Foram feitos por você?
— Não – Jullie revirou os olhos avelã como os do filho – As empregadas me proibiram de usar a cozinha na minha própria casa!
Lucca deu um meio sorriso e se levantou voltando a falar com o homem no telefone enquanto caminhava pelo quarto. O lugar onde ele estava sentado na cama foi ocupado pela mãe com a bandeja de cookies e dois copos de leite com achocolatado em mãos.
— Está cansada? – ela pergunta com os olhos expressando preocupação.
— Um pouco – confesso – Toda essa agitação com os preparativos do baile estão me deixando... Ansiosa.
A realidade é que estou cada vez mais ausente, quando não estou resolvendo algo sobre o baile estou postando no blog ou dormindo. Esses últimos dias eu vivo no que se pode chamar de piloto automático.
— Acho que te entendo um pouco – Jullie pega um dos cookies no prato eleva até seus lábios – Eu não sou a maior fã de bailes do mundo, sabe?
Apenas assenti. O baile de Jullie no Saintine Marie tinha sido perfeito até terminar na tragédia que custou a vida do irmão dela, Lucca Daniel Way.
— Notei que você parece preocupada – ela prossegue – Está com problemas para decidir em qual faculdade vai se inscrever? Se for isso, posso ajuda-la a pesquisar as mais adequadas.
Um arrepio percorre minha espinha, já havia me esquecido de que meu último ano no Saintine significava ir para a faculdade.
— Não decidi nem mesmo o curso que irei fazer – pego um cookie da bandeja e o mordo. O sabor agradável confirma que não foram feitos por Jullie.
— Ai está uma coisa da qual não sinto falta nenhuma, o horrível peso de ter que decidir o que vai fazer pelo resto da vida e a possibilidade de terminar escolhendo errado e se condenar para sempre.
Apenas a encarei em silêncio esperando que percebesse o quão positiva ela havia sido em suas afirmações.
— Desculpe – ela sorriu – Algumas vezes sou sincera demais.
— É, eu percebi – suspiro – Tenho receio de escolher errado e terminar em um lugar distante sem ter como voltar.
Sem ter como ser a Secret.
— Eu sei que isso não vai acontecer – ela diz de maneira sincera – Você sempre terá uma rota de escape, alguém que irá busca-la.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!— Nós duas sabemos que minha mãe não me buscaria nem na padaria – brinco.
— Não falei dela – Jullie olha para Lucca e entendo o que ela quer dizer, ele realmente iria a qualquer lugar apenas para me ajudar sem pensar duas vezes – E você não precisa ter medo das mudanças que a aguardam – acrescentou – Por mais assustador que pareça agora, você pode errar uma ou duas vezes sem problemas. Você ainda é muito nova e pensar que está decidindo sua vida é uma tolice, Anna.
Olhei para Jullie e a enxerguei como realmente é, uma mulher que perdeu o irmão quando ainda era uma adolescente foi obrigada a assistir enquanto ele morria para salva-La, vive um romance capaz de deixar qualquer princesa da Disney com inveja e aprendeu a gerenciar os negócios da família. Garota, autora, mãe, apaixonada, filha, irmã, administradora... Ela não foi apenas uma coisa, ela foi várias.
Talvez eu deva dar atenção para o que ela diz.
— Acho melhor eu voltar para meus afazeres – ela deposita um singelo beijo em minha testa antes de se dirigir até a porta aberta – Antes que eu me esqueça, acho que você daria uma ótima jornalista.
— Por que? – pergunto curiosa.
— Existem alguns secrets que não se deve contar – ela apenas me olhou dizendo “eu sei de tudo”.
Acho que não sou tão boa escondendo segredos quanto imaginei que era.
Cinco minutos depois, Lucca desliga o celular se jogando na cama e pega um dos biscoitos na bandeja.
— Estou ficando maluco com esse baile – resmunga – Acho até que estão nascendo cabelos brancos em mim.
Não contenho a gargalhada e passo a mãos no cabelo preto como o breu dele.
— E tem rugas também – brinco.
— Rugas? – ele fica alarmado antes de relaxar a expressão – Não me diga que são de preocupação.
— Pode acreditar que são, está na hora de usar um rejuvenescedor facial.
— Vou roubar algum da minha mãe depois.
— E a tinta de cabelo dela também – toco a ponta do nariz dele com meu dedo indicador – Não podemos deixar esses fios brancos expostos para o mundo.
— Tem razão.
As palavras do Ícaro começam a rodar minha mente. Para mim a relação entre Lucca e eu sempre foi uma amizade, o ciúmes que senti por garotas que se aproximaram dele era apenas de amiga querendo proteger o amigo bocó, mas... Só talvez exista a hipótese de não ser.
Contudo, não cheguei a conclusão final sobre isso. Tenho medo da resposta.
— O que foi? – ele pergunta com a voz baixa e levemente rouca.
— Só estou pensando em algo que ouvi.
— Foi sobre mim?
— Pode-se dizer que foi.
— E foi algo bom?
Encaro os olhos dele refletindo a curiosidade que sente e sorrio.
— Estou tentando decidir isso.
Quando Lucca e eu conseguimos convencer os pais dele a financiarem o baile recebemos como brinde a responsabilidade de cuidar de cada mínimo detalhe referente a decoração do ginásio e afins, o diretor até se ofereceu para juntar um grupo de alunos interessados e nós recusamos. Eu sei que você deve estar pensando que somos dois malucos por recusar ajuda quando ela é obviamente necessária, acontece que somos gênios do mal e às vezes gostamos disso.
O ginásio se tornou um lugar proibido para os alunos com exceção de nós e temos carta branca para ficar aqui quando quisermos sob o pretexto de arrumar o baile.
— Acho que já tem uma semana que não vamos a aula de química – Lucca comenta enquanto dedilha algumas notas no violão.
— Não estamos recebendo falta – comento sem deixar de digitar freneticamente uma nova postagem para o blog.
— E ainda vamos ganhar nota. Cara, devíamos fazer um baile todo mês.
— Seria legal se os seus pais topassem financiar todo mês quase 80% do gasto total com a preparação do baile.
— Do jeito que são desligados, íamos nos formar na faculdade antes que eles descobrissem.
Enquanto conversamos calmamente pelo menos uma dezena de funcionários andava de um lado para o outro pelo ginásio organizando mesas e arrumando decorações.
— Quando essa galera descobrir que o trabalho escravo está proibido, vocês vão ter que fugir do país.
A voz de Ícaro faz com que Lucca e eu paremos o que estamos fazendo para olha-lo. O hipster conseguiu autorização para entrar no ginásio e ver como está a estrutura que nos pediu.
— Oi pra você também – digo – Veio conhecer nosso monstrinho?
— Mas é claro.
Lucca apenas revira os olhos e entendo que sou a responsável por apresentar Ícaro ao seu novo amigo.
Faço um sinal para que ele me siga até o meio do salão e mostro a versão real do que ele idealizou no desenho.
— O que acha?
— Perfeito.
O sorriso dele fica tão parecido com o do Coringa que um arrepio percorre minha espinha ao vê-lo.
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